Registro do ofício expedido pelo intendente geral da Polícia da Corte, Paulo Fernandes Viana, ao juiz do Crime do bairro de São José, Luiz Joaquim Duque Estrada, solicitando a descoberta e o envio de vinte rapazes órfãos, ou não órfãos, para que pudessem aprender um ofício. Desta maneira, a polícia pretendia evitar a vadiagem, criando, ao mesmo tempo, súditos úteis ao reino.
Conjunto documental: Registro da correspondência da polícia. Ofícios da polícia aos ministros de Estado, juízes do crime, câmaras, etc.
Notação: Códice 323, volume 02
Datas-limite: 1810-1812
Título do fundo ou coleção: Polícia da Corte
Código do fundo: ÆE
Data do documento: 10 de dezembro de 1810
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 16 e 16v
“Registro do ofício expedido ao juiz do crime[1] do bairro de São José.
Não só no seu bairro, mas por toda a cidade procurará Vossa Mercê de inteligência com o juiz dos órfãos[2], e mesmo sem ela descobrir vinte rapazes órfãos ou não órfãos que se possam aproveitar em ofícios que se lhe podem ensinar e nos irá mandando à proporção que os for descobrindo fazendo-lhes declarar que terão ração 50 réis[3] por dia para o seu vestuário, e este ordenado se irá acrescentando ao arbítrio do mestre conforme o adiantamento, que forem mostrando, e ficarão isentos de ser soldados.
Será conveniente ir sobre isto estendendo as suas vistas, e ter listas e numeramento [sic] porque terei precisão de muitos mais para o mesmo fim, para por este modo evitar a polícia[4] que hajam vadios e ir criando vassalos[5] úteis a Vossa Alteza Real[6] bem entendido que só se trata de meninos brancos e pardos. Deus guarde a Vossa Mercê.
Rio[7] 10 de Dezembro de 1810. Paulo Fernandes Viana[8]. Senhor Desembargador[9] Luiz Joaquim Duque Estrada.”_________________
[1] Magistrado com competências semelhantes às do juiz de fora, no entanto restritas à esfera criminal. A ele, como aos juízes de fora, cabia realizar devassas sobre crimes acontecidos nos bairros (ou cidades) de sua jurisdição, visando a solucioná-los e a prender os culpados; executar as sentenças estabelecidas pelo intendente geral de Polícia da Corte (no período joanino, Paulo Fernandes Viana); e, especificamente no Brasil, cobrar as décimas, impostos cobrados aos proprietários de prédios urbanos. Os juízes do crime que atuavam no Brasil seguiam o regimento dos ministros criminais de Lisboa, cujas atribuições eram as mesmas. Com a chegada da Corte, d. João criou mais postos de juiz do crime (alvará de 27 de junho de 1808), principalmente para o Rio de Janeiro, prevendo um incremento da criminalidade em decorrência do brusco e significativo aumento populacional que a cidade sofrera com o desembarque da família real e da Corte, e pretendendo incrementar a "segurança e a tranqüilidade de seus vassalos". Cada juiz do crime respondia por um bairro ou freguesia, como a da Candelária, da Sé, de São José e de Santa Rita, por exemplo.
[2] Responsável por uma antiga repartição judicial, o juiz dos órfãos tinha a função de zelar pelos órfãos de sua jurisdição e seus bens, inclusive registrando em livro próprio quantos órfãos haviam e os bens de que dispunham, além de verificar se os mesmos estavam sendo bem geridos. Estavam entre as suas incumbências: mandar proceder ao inventário dos bens dos órfãos menores de 25 anos e nomear tutores e curadores para os órfãos e menores que os não tivessem, substituindo os pouco zelosos e castigando os culpados. Igualmente, cabia ao juiz dos Órfãos a jurisdição em todas as ações cíveis que envolvessem os órfãos, fossem como autores ou réus, até a sua emancipação. Estruturalmente, o juízo dos Órfãos era constituído pelo respectivo juiz, pelos escrivães, pelo tutor geral dos órfãos, pelo contador e pelos avaliadores e partidores.
[3] Moeda portuguesa utilizada desde a época dos Descobrimentos (séculos XV e XVI). Tratava-se de um sistema de base milesimal, cuja unidade monetária era designada pelo mil réis, enquanto o réis designava valores divisionários. Vigorou no Brasil do início da colonização (século XVI) até 1942, quando foi substituída pelo cruzeiro.
[4] A intendência geral da Polícia e do Estado do Brasil foi criada pelo príncipe regente d. João, através do Alvará de 10 de maio de 1808. A competência jurisdicional da colônia foi delegada a esta instituição, assim como a incumbência de organizar uma polícia eficiente e capaz de prevenir as ações consideradas “perniciosas” e subversivas. Foi a estrutura básica da atividade policial no Brasil.
[5] Neste período indica o mesmo que súdito da coroa. A palavra na Idade Média referia-se a uma camada privilegiada que recebia terras do Rei e uma série de benefícios.
[6] D. João VI (1767-1826), segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, que se tornou herdeiro da Coroa com a morte do primogênito José em 1788. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada louca. Foi sob o governo do então príncipe regente d. João, que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência da invasão francesa em Portugal, a família real e corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão: a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da real biblioteca; criação de escolas e academias, e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente. Deu-se, ainda, sob o seu governo, o reconhecimento da independência do Brasil no ano de 1825.
[7] Fundada em 1565, por Estácio de Sá, a cidade do Rio de Janeiro tornou-se sede do governo colonial em 1763, adquirindo grande importância no cenário sócio-político do Brasil. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos da Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro das Capitanias. As lavouras tradicionais da região eram o açúcar, o algodão e o tabaco. Com a chegada da Corte, em 1808, a cidade do Rio de Janeiro e regiões próximas sofreram inúmeras transformações, com vários melhoramentos urbanos, tornando-se referência para as demais regiões. Entre as mudanças figuram: a transferências dos órgãos da Administração Pública e da Justiça e a criação de academias, hospitais e quartéis. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos, aos milhares, em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes. O Rio de Janeiro foi um dos principais portos negreiros e de comércio do país.
[8] Desembargador e ouvidor da Corte, foi nomeado pelo Alvará de 10 de maio de 1808, intendente geral da Polícia da Corte. De acordo com o alvará, o Intendente Geral de Polícia da Corte do Brasil, possuía jurisdição ampla e ilimitada, estando a ele submetidos os ministros criminais e cíveis. Exercendo este cargo durante doze anos, atuou como “uma espécie de ministro da segurança pública”. Tinha sob seu domínio todos os órgãos policiais do Brasil, inclusive ouvidores gerais, alcaides maiores e menores, corregedores, inquiridores, meirinhos e capitães de estradas e assaltos. Entre seus feitos, destaca-se a organização da Guarda Real da polícia da corte.
[9] Juizes do tribunal de justiça.
Sugestões de uso em sala de aula:
Utilização(ões) possível(is):
œ No eixo temático sobre a “História das relações sociais da cultura e do trabalho”
œ Ao abordar o sub-tema “relações de trabalho”
Ao tratar dos seguintes conteúdos:
œ Estrutura administrativa colonial
œ Práticas e costumes coloniais
œ A manutenção do sistema colonial
Arquivo Nacional
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