sábado, 31 de março de 2012

O imperador canibal


Para os inimigos de Jean-BédelBokassa, prisão era refresco. Muitos deles foram parar no freezer do ditador.

Álvaro Oppermann

Em 1979, tropas francesas invadiram a capital da República Centro-Africana, Bangui, e derrubaram o ditador local. Essa notícia tinha tudo para passar em branco, mas virou manchete internacional. Afinal, o ditador derrubado era Jean-Bédel Bokassa, uma das figuras mais extravagantes, ridículas e sinistras que já apareceram na mídia.
Bokassa nasceu numa pequena tribo em 1921. Seu nome queria dizer “pequena floresta”. Foi educado por missionários católicos. Depois, virou soldado e acabou condecorado como herói por ter lutado ao lado das forças francesas na 2a Guerra. Quando o seu país – ex-colônia francesa – ficou independente, em 1960, já era capitão. Primo do presidente, virou general em um pulo. Mas Bokassa queria mais. Em 1966, com a economia do país em frangalhos, depôs o primo e assumiu o poder. Rasgou a Constituição. Em 1972, declarou-se presidente vitalício. A tortura era generalizada no país. Os inimigos de Bokassa desapareciam misteriosamente. Enquanto o país empobrecia, Bokassa mandava construir palácios para si mesmo. A França, contudo, lhe dava apoio. Jean-Bédel era amigo do então presidente francês Valéry Giscard D’Estaing. Em 1976, ele se autoproclamou imperador Bokassa 1º e mudou o nome do país para Império Centro-Africano. A bizarrice da coroação fez a festa dos fotógrafos. A cerimônia custou US$ 30 milhões aos cofres públicos. O luxo fajuto – com direito a um trono em forma de águia dourada – parecia saído de um desfile carnavalesco.
O mundo não reconheceu o “império”, que caiu na miséria absoluta. Em 1979, num protesto de estudantes contra o governo numa escola primária, a guarda imperial metralhou 100 crianças. Foi demais. A França decidiu se desvencilhar do incômodo amigo e mandou as tais tropas acabar com a farra. Quando elas invadiram o palácio, descobriu-se o paradeiro dos desafetos do regime: o freezer de Bokassa. Em 1990, o mundo soube detalhes do horror: o cineasta alemão Werner Herzog rodou o documentário Ecos de um Império Sombrio, que mostrava os sinistros freezers do palácio, além do zôo particular do ditador. Ali, havia piscinas para crocodilos. Segundo um empregado, muitos inimigos de Jean-Bédel serviram de alimento aos bichões.

Grandes momentos
• Até hoje, antigos correligionários de Bokassa dizem que os corpos encontrados no freezer do palácio foram “plantados” pelas tropas francesas.
• Bokassa teve 17 esposas e 50 filhos.
• O julgamento de Bokassa acabou em pizza. Primeiro, foi condenado à morte. A pena foi comutada para prisão perpétua; depois, acabou sendo reduzida para 20 anos de encarceramento. Em 1993, o ex-ditador foi anistiado.
• Quando saiu às ruas, em 1993, foi recebido como herói pela população.
• Bokassa dizia ser o 13º apóstolo de Jesus Cristo.
Revista Superinteressante

A indústria da morte


Chegada de judeus a um campo de concentração nazista



Símbolo da crueldade nazista, o campo de concentração onde 1,1 milhão de pessoas perderam a vida revela como as atrocidades foram o resultado de um trabalho planejado, disciplinado e eficiente.
Celso Miranda

Matar um inimigo é fácil. Basta disposição, oportunidade e alguma força. Matar milhares de inimigos dá mais trabalho. Requer poder e, não raro, uma guerra. Agora, matar milhões de pessoas, eliminar populações inteiras e varrer do mapa comunidades não é para qualquer um. Requer um arraigado sentimento de superioridade, doses cavalares de fundamentalismo, e consentimento popular. E, do ponto de vista puramente lo­gís­tico, um grande esforço de organização, pla­nejamento minucioso e disciplina. É pre­ciso ter uma máquina extremamente eficiente em mãos.
Poucas vezes na história, talvez nunca antes nem depois, um governo se sentiu tão à vontade para executar a terceira situação descrita acima quanto os nazistas na Alemanha, Áustria, Romênia, Iugoslávia, Itália, França, Bélgica, Holanda, Bulgária, Hungria, Letônia, Lituânia, Ucrânia, Bielo-Rússia e Checoslováquia, mas, principalmente na Polônia. Nesses países, os seguidores de Hitler colocaram em prática um projeto inédito de limpeza étnica que levou a deportações, evacuações em massa, expurgos, migrações forçadas, prisões e, por fim, ao extermínio planejado de quase 6 milhões de pessoas. O modelo ultimado dessa máquina de extermínio só ficou pronto com os campos construídos e operados durante a guerra na Polônia. Entre eles, o maior, localizado em Auschwitz, no sul do país. Lá, entre maio de 1940 e janeiro de 1945, cerca de 1,1 milhão de pessoas morreram. A maioria era de judeus, mas havia prisioneiros de guerra soviéticos, dissidentes políticos poloneses, ciganos e testemunhas-de-jeová. Esta reportagem não vai explicar o porquê de toda essa gente ter sido morta. Isso tem rendido nos últimos 60 anos especulações e estudos profundos da alma e da política do nazismo e da Alemanha. Nosso esforço vai se concentrar em explicar como os nazistas planejaram e operaram a maior indústria de extermínio de todos os tempos. Que inteligência esteve por trás dessa máquina de assassínio em massa? Que ideologia a justificou? E quem foi quem no sistema: militares, empresários, cientistas, arquitetos, políticos, juristas, carcereiros e burocratas.
Raízes do mal
No final de abril de 1940, uma comitiva militar de 6 veículos cruzou a região da Alta Silésia, no sul da Polônia. As estradas poeirentas tornavam a viagem difícil e o avanço lento. A paisagem se limitava a extensos trechos de florestas e campos sem cultivo. Por duas horas, nenhum vilarejo foi visto. No segundo carro do cortejo estava Rudolf Hoss, um proeminente capitão da SS, a temida tropa de choque nazista. O local que eles procuravam aparecia nos velhos mapas como um conjunto de galpões construídos pelo Império Austro-Húngaro durante a 1ª Guerra Mundial, todos de madeira, a maioria em péssimo estado. No mapa da nova Europa que os nazistas desenhavam, porém, o nome daquele lugar no meio do nada ganharia destaque e ficaria para sempre marcado na história.
Seis meses antes, a Alemanha tinha invadido a Polônia e iniciado a 2ª Guerra. Agora os nazistas colocavam em marcha o plano de utilizar o número crescente de prisioneiros de guerra nas fábricas e indústrias alemãs, onde seriam explorados como mão-de-obra escrava. Hoss tinha uma missão e tanto pela frente: “Precisava criar um campo que pudesse abrigar 10 000 pessoas, antes da chegada do inverno”, escreveu. Em apenas 20 dias chegariam os 728 primeiros prisioneiros de Auschwitz: todos homens poloneses, fortes e saudáveis, acusados de resistência. Entraram pelo portão da frente, onde Hoss mandara escrever: Arbeit macht frei (ou “O trabalho liberta”). A frase, que cheira como um apfelstrudel de sarcasmo, revela a prioridade dos nazistas naqueles primeiros tempos da guerra: conquistar territórios para a Grande Alemanha e transformá-los, rapidamente, em mais um pistão da azeitada indústria de guerra. Apenas 3 meses após sua inauguração, já havia 8 000 pessoas no local.
Localizado a 30 km de um conjunto de minas com algumas das melhores jazidas de carvão da Europa, o campo de Auschwitz também chamou a atenção de um grande grupo industrial químico alemão, a IG Farben, que apresentou ao governo nazista um plano para instalar ali uma fábrica de borracha e combustíveis sintéticos. Os empresários fariam enormes investimentos na região. Em troca, pediam a garantia de mão-de-obra abundante. E barata.
A idéia ganhou de cara um apoio de peso: o marechal Heinrich Himmler, comandante supremo da SS, um dos homens fortes do Reich. Segundo o historiador Christopher Browning, da Universidade da Carolina do Norte, nos EUA, longe de ser uma iniciativa isolada, a construção de campos como Auschwitz – que Himmler chamava de colônia-modelo – estava intimamente ligada aos planos de expansão da Alemanha, revelando dois dos principais temas que qualquer nazista recitaria de cor: o lebensraum (ou “espaço vital”) e a superioridade racial.
Aqui, talvez seja necessário um parêntese. Para os nazistas, o lebensraum era o espaço necessário para a expansão territorial e a prosperidade do povo alemão. O plano incluía a reintegração de todos os povos germânicos – inclusive os do Brasil. A idéia desse Shangri-lá nazista no leste desemboca na segunda máxima do rosário nazista: a questão racial. Já que era no lebensraum que os nazistas prometiam a reunificação da raça ariana, representada pelas populações de origem germânica, ficavam de fora eslavos, judeus, ciganos. “As teorias de supremacia racial não eram novas, nem exclusivas da política nazista nos anos 30. A novidade é que, com o início da guerra, os alemães sentiram-se à vontade para pôr em prática seus planos de limpeza étnica e racial”, diz Browning. Fecha parêntese.
Himmler esteve em Auschwitz pela primeira vez em março de 1941. Numa reunião secreta, ele anunciou seu desejo: que a capacidade do campo pulasse para 30 000, o que faria de Auschwitz o maior dos campos de prisioneiros. Esses planos de ampliação só foram descobertos recentemente, após a morte do arquiteto alemão Fritz Ertl, que tinha guardado reproduções do projeto. Pelas plantas, é possível ver que o novo complexo previa até dormitórios para oficiais da SS. Himmler tinha ali seus próprios aposentos, para os quais cada móvel, dos aparadores às poltronas, das mesas de trabalho aos enfeites na parede, foi desenhado com exclusividade.
Enquanto isso, os prisioneiros trabalhavam duro, cavando fossas, fabricando tijolos, construindo prédios, abrindo estradas, colocando trilhos, carregando e descarregando trens. E, apesar do foco no trabalho – como se diria hoje em dia –, Auschwitz já demostrava outra vocação: mais da metade dos 23 000 prisioneiros enviados no primeiro ano para o campo morreu antes de completar 20 meses na prisão, abatida pela fome, exaustão e maus-tratos.
Aniquilação
Em maio de 1941, as tropas alemãs invadiram a URSS. Em 4 semanas de combates, foram feitos 3 milhões de prisioneiros – 2 milhões morreriam antes de 9 meses na prisão. Segundo o historiador britânico Robert Gellately, autor de The Specter of Genocide (“O Espectro do Genocídio”, inédito no Brasil), a invasão da URSS alterou os rumos da guerra no leste, iniciando a guerra de aniquilação, ou vernichtungskrieg, termo utilizado por Hitler para explicar que o objetivo alemão seria destruir completamente o Estado comunista. Para os nazistas, a aniquilação dos soviéticos era justificável: primeiro por causa das crenças racistas, que viam na mistura do comunismo com o judaismo a pior raça possível – eram numerosas as comunidades judaicas na URSS. Depois, do ponto de vista prático e logístico, o desfecho das vitórias que fatalmente aconteceriam elevaria sobremaneira a quantidade de prisioneiros sob os cuidados da Alemanha, tornando-se inviável garantir sua sobrevivência.
Em 22 de maio de 1941, a comissão econômica do 3º Reich se reuniu para discutir a logística após as primeiras semanas da invasão. As atas desse encontro foram encontradas em Berlim após a guerra e permaneceram durante muito tempo secretas. Recentemente foram publicadas pelo historiador americano Richard Overy, no livro Russia’s War (“A Guerra da Rússia”, sem tradução em português). “Se quisermos avançar em território soviético, temos que reduzir o consumo de alimentos e de energia das populações locais”, diz um trecho do relatório. Mais adiante, o documento conclui: “Nada de falsa piedade. Milhões morrerão de fome”.
A entrada em cena dos prisioneiros soviéticos acelerou os planos de extermínio nos campos. Em julho de 1941, membros do Programa de Eutanásia de Adultos, o Aktion T4, visitaram Auschwitz pela primeira vez. Criado em 1937, o programa de limpeza genética dos nazistas incluía a eliminação de crianças portadoras de deficiências ou com doenças terminais e a esterilização de adultos nessas condições. “Após o início da guerra, o T4 foi levado aos territórios ocupados e a lista passou a incluir adultos que não estivessem aptos para o trabalho”, diz Gellately. Os indesejáveis eram enviados para clínicas como a de Sonnestein e lá conduzidos a salas com falsos chuveiros, cujos canos não estavam ligados à água, mas a cilindros de monóxido de carbono. Cerca de 70 000 pacientes foram assassinados assim, entre 1939 e 1941. Naquele mês de julho, o T4 selecionou 575 prisioneiros de Auschwitz para morrer assim.
“A experiência da T4 na utilização de gás nas execuções foi a resposta para um problema logístico”, diz o historiador Michael Vildt, da Universidade de Hamburgo. Em 1941, os fuzilamentos em massa tornavam-se cada vez mais comuns. Os einsatzgruppen da SS (literalmente “grupos de mobilização”, mas que pode ser traduzido como “operações móveis de assassinato”), circulavam por trás das linhas de combate e perseguiam civis soviéticos e membros das comunidades judaicas da região, contando, muitas vezes, com o apoio de voluntários locais – ucranianos, lituanos, letões, entre outros – para capturar, fuzilar e enterrar os corpos. Em 15 de agosto daquele ano, Himmler assistiu à execução de prisioneiros acusados de incitar uma revolta contra os alemães em Minsk, na Bielo-Rússia. Em seus diários, encontrados em 1998 nos arquivos da extinta KGB, Himmler relatou que as vítimas chegaram em caminhões a um campo onde havia valas já abertas. Ao ver as covas, alguns presos tentaram correr e foram baleados, 1, 2, às vezes 3 vezes. “Enorme esforço para fuzilar apenas 100 pessoas”, anotou o líder da SS. Após o “esforço”, o general Erich von dem Bach Zelewski teria dito a Himmler que havia mais um inconveniente: o efeito negativo sobre os soldados. O rito sumário, a morte de crianças, velhos e mulheres civis, estaria abalando o moral dos seus homens.
“Himmler saiu dali convencido de que era preciso arrumar uma maneira melhor de matar”, afirma Vildt. “Tanto que incumbiu Albert Widman, tenente da polícia técnica e científica da SS, um veterano do T4 na Alemanha, de adaptar suas experiência com monóxido de carbono aos campos de prisioneiros.” Em junho, Widman havia questionando a viabilidade de deslocar cilindros do gás para locais de execução fora da Alemanha. Diante disso, ele sugeria um novo tipo de câmara de gás volante – caminhões fechados que tinham o cano de descarga voltado para o interior do veículo. Na mesma época, em Auschwitz, Karl Fritzch, tenente da SS e vice de Rudolf Hoss no comando do campo, fazia suas próprias experiências. Segundo Hoss, foi durante uma viagem dele a Berlim, que Fritzch teria tido a idéia de usar ácido cianídrico para eliminar os prisioneiros. Na época, uma marca popular desse produto era comercializada com o nome de Zyklon B (“ciclone”, em português) e ele estava fartamente disponível em Auschwitz, onde era usado para combater as constantes infestações de piolhos e outros insetos – o veneno tinha a vantagem de ser altamente tóxico e invariavelmente letal. Fritzch escolheu o bloco 11 para seu primeiro teste com Zyklon B. Numa noite entre o fim de agosto e o início de setembro de 1941, portas e janelas do galpão foram vedadas e os guardas da SS receberam máscaras de proteção. Cerca de 160 prisioneiros foram colocados nas celas do porão e o Zyklon, espalhado pelo local. Na manhã seguinte, muitos continuavam vivos. A dose teve de ser repetida até que todos morressem. Hoss admitiu “Essa história do gás me tranqüilizou. Sempre tive horror das execuções com pelotões de fuzilamento. Fiquei aliviado ao pensar que seríamos poupados daqueles banhos de sangue”.
No final daquele ano, Auschwitz havia ficado pequeno para tanta atividade, e o engenheiro Karl Bischoff foi incumbido de desenhar o projeto que praticamente criaria um novo campo, a 3 km do anterior. O local escolhido fora ocupado por uma pequena aldeia que os poloneses chamavam de Brzezinka, mas ficaria famoso pelo nome em alemão: Birkenau. O projeto previa 100 000 prisioneiros e estrutura de uma pequena cidade. Diferentemente do antigo Auschwitz, de onde a maioria das plantas e projetos desapareceram, o desenho original de Birkenau foi localizado entre os documentos secretos da antiga URSS, em 1990. Ele revela que, desde o início, o local foi desenhado para abrigar os prisioneiros em condições repugnantes. Não havia água encanada ou assoalho nos barracões. Adaptados dos antigos campos da Alemanha, onde cada preso tinha seu catre, os planos de Birkenau previam a colocação de 3 pessoas no mesmo espaço, ou 550 pessoas por barracão. As plantas originais revelam que Bischoff não ficou satisfeito com esses números. Onde se lia “550 por barracão” há uma anotação feita à mão, com o número riscado e trocado por 774. Ou seja, o espaço que nos campos da Alemanha era usado por 1 prisioneiro em Birkenau receberia 4.
Solução final
A invasão da URSS revelou outro aspecto que teria desdobramentos trágicos nos territórios ocupados: o anti-semitismo. A presença de um grande número de comunidades judaicas no país sempre foi apregoada pelos nazistas como prova da conspiração entre bolcheviques e judeus, que teria sido responsável pelos males que assolaram a Alemanha após a 1ª Guerra. “Os judeus começaram a ser sistematicamente perseguidos na Alemanha em 1933, bem antes da guerra. Mas foi nos territórios soviéticos que o anti-semitismo se manifestou numa vertente até então inédita: o extermínio sistemático”, diz Robert Gellately. O britânico Christopher Browning concorda: “O plano nazista para liquidação dos judeus desenvolveu-se por etapas, durante a 2ª metade de 1941, e não era consensual em toda a cúpula nazista. Até a invasão da URSS não se pode afirmar que havia o objetivo de realizar o extermínio”, diz. Segundo ele, o aumento brutal do número de prisioneiros, que superlotou campos e guetos, e a percepção de que a vitória na URSS não seria rápida, fez os nazistas concluir que deportar judeus para o leste consumia homens, armamentos e recursos demais.
Em 31 de julho de 1941, Hermann Goering, um dos homens mais poderosos da cúpula nazista e próximo de Hitler, encomendou ao general Reinhard Heydrich da SS a elaboração de um plano completo de “solução final da questão judaica”, que se tornaria o Protocolo de Wannsee, apresentado à cúpula nazista em Berlim no início de 1942 numa reunião que teve como anfitrião Adolf Eichman, do Ministério Central da Segurança. Antes mesmo do encontro em Wannsee, porém, os primeiros trens de deportação de judeus para os campos de extermínio já haviam partido em 15, 16 e 18 de outubro de 1941, de Viena, Praga e Berlim, respectivamente.
Os superlotados guetos poloneses tornaram-se a primeira escala da viagem de centenas de milhares de judeus rumo aos campos de extermínio. Em janeiro de 1942, os primeiros 2 500 judeus de Lodz foram enviados para Chelmno, um pequeno campo na Polônia, dirigido por Herbert Lange, um dos líderes do Programa de Eutanásia de Adultos. Imediatamente ao chegar, os prisioneiros foram obrigados a se despir e levados até uma casa sem janelas. Atrás deles as portas foram lacradas. Um caminhão encostou junto a uma das laterais do prédio e o escapamento foi conectado a uma rede de canos que levava o monóxido de carbono para dentro da casa. Depois de algumas horas, a maioria estava morta. Aqueles que resistiram foram fuzilados. Operações semelhantes estavam sendo feitas em diversos campos na Polônia, como em Belzec, por exemplo, onde morreram os judeus do gueto de Lublin.
Em julho de 1942, Himmler anunciou que todos os judeus sob autoridade do Governo Geral – que era como chamavam a Polônia ocupada – deveriam ser evacuados até o fim do ano. Uma meta e tanto, já que havia 2 milhões de judeus na Polônia, 400 000 só no gueto de Varsóvia. O impacto da notícia em Auschwitz foi tamanho que Rudolf Hoss passou a realizar duas e não mais uma reunião semanal. Todas às terças e sextas, pontualmente às 9 horas, ele juntava seu pessoal para discutir a administração do campo, garantir o ritmo das obras em Birkenau e coordenar a chegada dos novos prisioneiros. Num desses encontros foi decidida a construção de novas câmaras de gás. Adaptadas a partir de duas velhas casas, as chamadas “casinha vermelha” e “casinha branca” tornaram-se, na prática, duas caixas de tijolos com portas e janelas lacradas e apenas duas aberturas: uma na frente por onde os prisioneiros entravam caminhando e uma saída na parte de trás, por onde os corpos eram retirados. Outros campos poloneses, como Treblinka, Sobibor e Belzec, tornaram-se genuínas fábricas de morte. Treblinka, o maior deles, ficava a 100 km de Varsóvia e lá 900 000 pessoas foram mortas. Muito menor que Auschwitz, o campo todo tinha apenas apenas uma plataforma de trens, meia dúzia de barracões e um enorme complexo de câmaras de gás, com capacidade para 2 000 pessoas ao mesmo tempo. O comandante de Treblinka, Franz Stangl, mandou plantar flores, pintou as plataformas em tons vivos e colocou placas com os horários de chegada e partida dos trens, como se aquilo fosse uma estação de verdade. Disfarçou as câmaras de gás em salas de banho, para que os prisioneiros permanecessem calmos, sem reclamar, sem tentar fugir ou provocar confusão. A oferta do banho tinha, ainda, um objetivo muito prático (e muito cínico). Nus, os corpos depois de mortos não precisavam ser despidos, o que poupava as roupas para serem reaproveitadas. Entre os prisioneiros enviados para lá, 99% estavam mortos duas horas após desembarcar do trem.
A escalada de mortes causava outro desafio logístico: livrar-se de tantos corpos. Em Auschwitz, no início, eles eram enterrados, mas com o verão o cheiro se tornava insuportável. Em setembro de 1942, Hoss visitou o campo de Chelmno e lá conheceu um método de cremação único e muito eficiente. Ele contou que o coronel Paul Blobel tinha mandado abrir valas de 3 x 3 metros e 4 metros de profundidade. A um metro do fundo, instalava barras de aço transversais. Depois, despejava gasolina no buraco. Sobre as barras ele depositava os corpos intercalando-os com lenha, para que queimassem completamente. As cinzas caiam pelo vão entre as barras, liberando a grelha para que pudesse ser usada novamente. Quando elas atingissem a altura das barras de aço, bastava manejar a estrutura para cima, até que toda a vala ficasse repleta de cinzas. Humanas.
Em março de 1942, embora mais de 1 milhão de judeus já estivessem mortos, cerca de 80% de todos os que morreriam durante a guerra ainda estavam vivos. Durante os 12 meses seguintes, a porcentagem se inverteria. Em maio de 1943, apenas 20% de todos os judeus que morreram no Holocausto ainda estavam vivos.
Apogeu e queda
Os arquitetos alemães estavam trabalhando duro em Auschwitz na 2ª metade de 1942, na construção dos novos crematórios em Birkenau. No projeto inicial, os prédios sob o nível do solo serviriam como necrotérios, para onde os corpos seriam levados e queimados. No entanto, as plantas passaram por consecutivas alterações. O enorme porão foi dividido em salas menores e a rampa entre os porões 1 e 2, por onde desceriam os corpos, deu lugar a uma escada de degraus largos. Algo aparentemente incoe­rente, já que o prédio receberia mais gente morta do que viva. As portas duplas, que abririam para dentro, foram substituídas por uma porta única, abrindo para fora, com vedação reforçada e um visor. No final das alterações, o necrotério havia se transformado numa supercâmara de gás, que matava até 2 000 pessoas em uma hora e garantiria a fama do lugar.
Outro nome para sempre associado a Auschwitz, o médico Josef Mengele, chegou ao campo no início de 1943. Mengele instalou-se no crematório 2, onde mantinha consultório, ambulatório com 8 leitos e laboratório. Ali, ele realizou estudos genéticos – uma obsessão nazista – e fez experiências médicas ligadas à guerra, como com gangrena e queimaduras. Uma de suas atividades prediletas era realizar autópsias simultâneas em gêmeos, algo raríssimo – em que outras circunstâncias dois irmãos gêmeos morrem ao mesmo tempo e no mesmo lugar? No laboratório de Mengele, assim que morria um gêmeo, seu irmão era trazido e assassinado.
Em meados de 1943, Auschwitz atingiu seu tamanho máximo. A estrutura se parecia com uma pequena cidade. Para os soldados da SS, a vida era boa. Havia mercearias, cantinas, cinema, clube esportivo e um teatro com programação regular. A turma promovia festas e bebedeiras. O complexo industrial montado pela IG Farben produzia de armamentos a tinta e faturava US$ 250 milhões ao ano, em valores atualizados. Os cerca de 100 000 prisioneiros ficavam divididos em 45 subcampos. Havia um só para mulheres, com 30 000 prisioneiras. Perto dali ficava o “Canadá”, uma área que recebeu esse nome porque o Canadá era tido como um país rico, próspero e, sobretudo, pacífico. Lá funcionava a triagem da bagagem dos presos: de roupas a relógios, o que pudesse ser reaproveitado era enviado para a Alemanha. Para os prisioneiros, aquele era um dos poucos serviços almejados, pois era onde se vivia melhor.
Havia também prisioneiros que trabalhavam diretamente com os alemães, como alfaiates, barbeiros e garçons. Mas o trabalho sujo sobrava para o sonderkommando (“comando especial”, em português), o grupo de prisioneiros, judeus ou não, que ajudavam os alemães na operação dos assassinatos. Cada conjunto de câmaras e crematório funcionava com 100 prisioneiros e apenas 4 alemães, aos quais cabia somente introduzir os cristais de Zyklon B. Os prisioneiros eram quem recolhia os corpos e os levava a um elevador. Outra turma os recolhia lá em cima e tratava de queimá-los nos fornos ou em grandes valas a céu aberto.
Até o início de 1944, 550 000 pessoas já haviam sido mortas em Auschwitz. A essa altura, os Aliados sabiam o que ocorria lá e nos demais campos poloneses. Os prisioneiros passaram a conviver com a esperança (e com a desilusão) ao verem e ouvirem aviões aliados sobrevoar o complexo. Em agosto, a unidade da IG Farben em Monowitz, a apenas 6 km de Birkenau foi destruída por um ataque britânico. Os prisioneiros se perguntavam por que as linhas de trem ou as câmaras de gás não eram bombardeadas. E essa é uma das grandes questões da guerra que continuam sem resposta.
Com americanos e ingleses pelo ar e o Exército Vermelho pelo chão, o ritmo de mortes em Auschwitz caiu. Se em julho foram 10 000 execuções por dia, nos meses seguintes o número chegou a menos de 1 000. Hoss, então, resolveu eliminar o maior número de prisioneiros possível. No dia 2 de agosto, 21 000 ciganos foram ao crematório 5. Imaginando que seriam os próximos, os sonderkommando se rebelaram – em 7 de outubro. Atacaram os guardas e tentaram fugir, mas foram capturados e só não acabaram todos mortos porque havia 4 000 cadáveres para serem queimados. Para puni-los, Hoss decidiu alinhá-los e fuzilar 1 em cada 3. Sobraram apenas 92.
Em janeiro de 1945, veio a ordem para que se esvaziasse o campo. Documentos, plantas e telegramas foram queimados e crematórios e câmaras de gás, explodidos. Os soviéticos haviam interrompido as linhas e os trens não chegavam mais ao campo. Por isso, os últimos 50 000 prisioneiros que restavam foram obrigados a andar por 35 km, em meio à neve e sob - 20 ºC. Quem parou ou atrasou a marcha foi morto no caminho. O Exército Vermelho chegou a Auschwitz em 27 de janeiro. Não havia muito mais gente a libertar – apenas 1 200 prisioneiros fracos e doentes que haviam sido abandonados. Em 30 de abril, Adolf Hitler se matou num porão de Berlim. Em 5 de maio, a Academia Naval de Murwick, em Flensburg, norte da Alemanha, território ainda controlado pelos nazistas, foi sede da última reunião da SS. Rudolf Hoss esperava que uma derradeira e heróica ação fosse anunciada. Mas o marechal Himmler despediu-se do grupo e recomendou que todos aproveitassem o colapso do 3º Reich para sumirem no meio da multidão. Hoss então trocou sua farda de oficial por um traje comum da Marinha e se misturou a outros marinheiros em Sylt, uma ilha de veraneio sem nenhum valor estratégico. Himmler foi capturado dias depois e se matou engolindo cápsulas de cianeto de potássio.
Com o nome de Franz Lang, Hoss empregou-se numa fazenda em Gottrupel, norte da Alemanha. Acabou denunciado pela esposa, que havia sido presa e estava sob ameaça de deportação para a URSS. Preso enquanto dormia num estábulo, Hoss foi levado ao Tribunal de Nuremberg. O julgamento levou 3 semanas – tempo que aproveitou para escrever suas memórias, de onde as declarações reproduzidas nesta reportagem foram retiradas. A sentença – morte na forca – foi cumprida em 16 de abril de 1947, num pátio quase vazio em Auschwitz.
Mengele escapou para a Itália e com a colaboração das autoridades locais conseguiu passaporte e uma passagem para a Argentina. Viveu no Paraguai e no Brasil, onde morreu, em 1979, incógnito. Adolf Eichmann se escondeu na Argentina até 1960, quando foi seqüestrado por espiões israelenses. Julgado em Tel-Aviv, ele foi condenado e enforcado. Franz Stangl, o eficiente comandante de Treblinka, fugiu para o Brasil, onde trabalhou no almoxarifado da Volkswagen usando o próprio nome, até 1967, quando foi enfim deportado para a Alemanha. Morreu de ataque do coração aguardando o julgamento. Personagens menos importantes, como o tenente Oskar Gronning, que recolhia os bens dos prisioneiros no “Canadá”, também ficaram impunes. Após a guerra, ele empregou-se na área de recursos humanos de uma multinacional . Em 1964, foi nomeado juiz trabalhista, função que exerceu até se aposentar. Nunca foi julgado e vive hoje em Hannover.
Em 1963, os 22 últimos acusados por crimes em Auschwitz foram julgados: 17 saíram condenados, 6 à pena máxima de prisão perpétua. Ao todo, 8 000 homens da SS trabalharam em Auschwitz. Sete mil sobreviveram à guerra. Oitocentos foram julgados. A 90% deles, nunca foi imputado qualquer crime.
Rudolf Hoss
Proeminente capitão da Schutzstaffel, a polícia política de Hitler, mais conhecida pela sigla SS, liderou o campo de prisioneiros de Daschau, na Alemanha, antes de ser nomeado para comandar Auschwitz. Super- dedicado ao trabalho, em suas memórias escreveu que só se arrependia de “não ter podido dedicar mais tempo aos filhos”.
Lebensraum
Elaborado por Konrad Meyer, professor da Universidade de Berlim, o Plano Geral do Leste previa o reassentamento, na região entre a Alemanha e a Rússia, de 10 milhões de alemães espalhados pelo mundo. Para isso, cerca de 31 milhões de pessoas seriam declaradas “racialmente indesejáveis” e enviadas para a Sibéria. E as restantes, usadas como escravas.
Heinrich Himmler
O plano nazista para liquidação dos judeus não era consensual em toda a cúpula nazista, dividida entre o extermínio e a exploração. Comandante supremo da SS, Himmler era um dos expoentes do grupo que defendia o “extermínio pelo trabalho”.
Karl Fritzch
Tenente da SS, era um tipo de vice de Hoss em Auschwitz que assumia o comando quando o chefe estava fora. Numa dessas ausências, foi o primeiro a testar o Zyklon B para envenenar prisioneiros.
Zyklon B
Era comercializado na forma de cristais, que sublimavam em um gás tóxico ao entrarem contato com o ar. Só foi utilizado pela primeira vez por causa da iniciativa de Fritzch. Mas logo cairia nas graças dos nazistas, ao se mostrar o gás capaz de matar mais rápido.
Albert Widman
Membro do programa de eutanásia de adultos, Albert Widman recebeu a missão de adaptar suas experiências com monóxido de carbono aos campos de prisioneiros. Como transportar os cilindros seria caro demais, Widman sugeriu criar caminhões fechados, com o escapamento voltado para dentro do veículo. Mas a idéia não emplacou: o processo era lento demais – e matava apenas 30 prisioneiros por viagem.
Karl Bischoff
Engenheiro aviador e major da SS, foi um dos autores do projeto de expansão de Auschwitz que criou o novo campo de Birkenau. Depois disso, conseguiu se esconder – seu envolvimento com o genocídio só foi descoberto depois de sua morte, em 1950.
Chelmno
Foi o primeiro campo de extermínio a usar gases tóxicos para matar judeus, no final de 1941. Mais tarde, seria também o primeiro a desenvolver fornos crematórios. Quem chegava lá era informado que seria enviado para trabalhar na Alemanha, mas que antes deveria passar por um banho de higienização. Para dar veracidade ao teatro, os soldados da SS se preocupavam em vestir jalecos brancos e se fingir de médicos. No total, 152 000 pessoas foram assassinadas em Chelmno.
Josef Mengele
Médico e cientista, serviu na frente leste, onde recebeu a cruz de ferro por bravura. Em Auschwitz realizou experiências com cobaias humanas, como Eva Mozes Kor, húngara judia, que tinha 9 anos. “Três vezes por semana meu braço era amarrado para restringir o fluxo sanguíneo. Depois eles tiravam meu sangue até eu desmaiar.” A irmã gêmea de Eva, Míriam, não passava pelas mesmas privações, para que os efeitos do “tratamento” pudessem ser comparados.
IG Farben
A indústria química alemã já havia sido a maior do mundo, mas a derrota na 1ª Guerra Mundial deixou-a em situação delicada. Foi aí que Hermann Schmitz teve a idéia – inovadora e óbvia: reunir as maiores empresas do setor em uma grande corporação, a IG Farben. A agenda econômica dos nazistas, um dos aspectos mais populares do regime, previa o fortalecimento das empresas através de grandes conglomerados. O governo garantia bons contratos, restrições à concorrência externa e um controle policial dos sindicatos. Do seu lado, as empresas garantiam aumento da produção e do emprego. A IG Farben aderiu ao esforço de guerra – produziu o pesticida Zyklon B, usado nas câmaras de gás. Ao fim do conflito, durante o esforço americano para normalizar a Europa – que incluiu ocupação militar, apoio financeiro e uma dose de “deixa para lá” – o conglomerado se desfez e as empresas voltaram a utilizar os nomes originais: Bayer, Basf, Hoechst e Agfa.

Morte todo dia
Com mais de 100 000 prisioneiros e a chegada diária de trens lotados, o extermínio no maior campo de concentração nazista atingiu sua capacidade máxima entre novembro de 1942 e o final de 1943. A indústria do assassinato funcionava assim:
1. Triagem
Em primeiro lugar, homens fortes e jovens. Depois, mulheres sem filhos. Quem não tivesse esse perfil, dificilmente sobreviveria ao primeiro dia em Auschwitz. Mães, crianças, velhos, doentes e feridos eram assassinados imediatamente. Quem reagisse era fuzilado na hora. Cerca de 70% dos prisioneiros que chegaram a partir de 1943 acabaram mortos nas câmaras de gás.
2. Esforço
As jornadas eram duras: não menos que 12 horas diárias de trabalho em obras de manutenção e expansão do campo, recuperação de estradas e operação das fábricas da IG Farben. Cada prisioneiro recebia 3 refeições por dia, que limitavam-se a pão, café e sopa de batata, às vezes engrossada com aveia ou farelo de trigo.
3. Contagem
Sem banheiros ou calefação, os prisioneiros dormiam amontoados: em alguns casos, com 5 pessoas por cama. Todos os dias, de manhã e à noite, eram levados para fora dos barracões e contados, fizesse chuva, sol ou neve. Judeus, ciganos, soviéticos e presos políticos não ficavam juntos. Viviam separados e eram mortos separados.
4. Engenharia
Os novos complexos, inaugurados em 1943, já haviam sido construídos prevendo o extermínio em massa. As câmaras de gás ficavam abaixo do nível do solo e tinham uma única abertura no teto, por onde os soldados da SS, protegidos por máscaras especiais, introduziam os cristais de ácido cianídrico.
5. 20 minutos
As aberturas eram conectadas a longas colunas que levavam o gás até o subsolo, onde as câmaras eram totalmente vedadas. A morte chegava em até 10 minutos, mas por garantia os corpos eram removidos apenas uma hora depois. O serviço era feito por prisioneiros dos sonderkommando, em grande carrinhos que pareciam caçambas com rodas.
6. Fornos
Ligados às câmaras, havia 5 fornos a gás que, juntos, podiam destruir 5 000 corpos por dia. As altas temperaturas deixavam poucas cinzas e resíduos, eliminados através da chaminé. Como em alguns momentos os fornos não atendiam à demanda, que chegou a 20 000 mortos por dia, alguns corpos eram queimados em valas abertas ao ar livre.

A solução final
Na manhã de 20 de janeiro de 1942, o general Reinhard Heydrich pousou o próprio avião sobre o lago congelado de Wannsee. O frio de -15 0C havia afastado quase todos os turistas da região. Era o cenário perfeito para a reunião de 15 dos principais membros do Reich. Em pauta, um tema dos mais relevantes: a solução final da questão judaica.
Heydrich abriu o encontro lendo um documento assinado pelo marechal Hermann Goering, chefe da Força Aérea e número 2 de Hitler. “Ficam incumbidos de tomar todas as medidas logísticas e financeiras para solucionar totalmente a questão dos judeus na esfera de influência alemã”, ele leu. A seguir, sugeriu que todos consultassem os papéis colocados em suas pastas. Lá estava uma análise da política de incentivo à emigração judaica e dados sobre a quantidade de judeus que restavam na Europa – 11 milhões. O número precedeu a conclusão do general de que era impossível alimentar essa gente toda. O representante da administração do governo geral da Polônia ocupada, Josef Bühler, pediu a palavra e sugeriu que a “solução judaica” fosse logo iniciada, porque “na Polônia havia tantos judeus sem utilidade”.
A reunião durou apenas duas horas e deu origem a um documento que ficaria conhecido como Protocolo de Wannsee. “Depois da conferência, 90% dos judeus que chegavam aos campos eram levados direto para as câmaras de gás”, escreveu a historiadora Annalena Staudte-Lauber, em Holocaust (inédito no Brasil). Trinta cópias com o relato das discussões foram feitas. Uma delas acabou descoberta em 1947 – é até hoje o documento mais explícito acerca do genocídio planejado pelos nazistas. “Com o Protocolo, o tratamento aos judeus entrou em uma nova fase”, diz o historiador Robert Gellately. “No início, havia discriminação e restrições de trabalho e estudo. Em seguida, ocorreram as expropriações de bens e o confinamento em guetos. Depois de Wannsee, iniciou-se o extermínio”, diz. Gellately, porém, concorda com os historiadores que questionam a importância do Protocolo. “Nenhuma decisão importante foi tomada lá.” Para ele, a opção pelo extermínio dos judeus já havia sido feita. O encontro apenas confirmou seu caráter prioritário dali em diante.

Para saber mais
The Specter of Genocide,
Robert Gellately, Cambridge University Press, 2003.
The Origins of the Final Solution
Christopher Browning, William Heinemann, 2004.
The Architect of Genocide: Himmler and Final Solution
Richard Breitman, Alfred Knopf, 1991.
Revista Superinteressante

sábado, 24 de março de 2012

Jardim Botânico – Rio de Janeiro

Situado na Rua Jardim Botânico, 920, no bairro do mesmo nome, ocupa uma área de 141 mil metros quadrados, sendo pouco mais da metade de matas naturais e o restante, cultivado.
Com a vinda da família real, em 1808, foi criada a primeira fábrica de pólvora na colônia, localizada no antigo engenho de cana Rodrigo de Freitas. Ali, pouco depois, foi inaugurado por D. João VI o Real Horto e nele plantadas sementes de especiarias das Índias Orientais. Também foi construído um arboredo com cerca de 5 mil espécies classificadas, além de milhares de plantas ornamentais, cultivadas em estufas e estufins, compreendendo 187 famílias botânicas o que constitui uma das maiores exposições de plantas em um jardim botânico em todo mundo.
Embelezando a paisagem, lá estão duas esculturas do mestre Valentim, as primeiras estátuas fundidas no Brasil, em 1753. No Jardim Botânico acha-se, ainda, o pórtico neoclássico da antiga e demolida Imperial Academia de Belas Artes, montada no Jardim Botânico em 1940, no final da aléia de palmeiras, pelo IPHAN, e o antigo portão da fábrica de pólvora, construção de alvenaria.
Atualmente, o Jardim Botânico é centro de pesquisas.
Tombamento federal em 1973.
Documenta Histórica. Cyro Corrêa Lyra.

Igreja e Convento de Santo Antônio – Rio de Janeiro

Situada no Largo da Carioca, no morro de Santo Antônio, foi erguida no século XVII, pelos frades franciscanos, sua casa conventual, tendo as obras do convento e da capela sido iniciadas em 1653. Mais tarde, junto à ladeira, foi aberto um cemitério, destinados aos escravos. Muralha que circunda a área teve início em 1715, sendo concluída em 1722.
A igreja tem três portas no primeiro pavimento, três janelas de peitoril com vidraças no coro, em frontão reto e um óculo no tímpano. O convento desenvolve-se em torno do claustro quadrado, com arcaria no primeiro piso. O prédio tem três pavimentos, abriga cerca de 100 celas e 5 salões, cozinhas e dependências. O convento é enriquecido com obras de pintura, escultura e azulejaria.
O frontão neocolonial data de 1922 e sofreu várias alterações. A sacristia estende-se por trás da capela-mor, com portadas de mármore e portas de jacarandá almofadadas.
Tombamento federal em 1938.
Documenta Histórica. Cyro Corrêa Lyra.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Para Hobsbawm - Revoltas de 2011

Para Hobsbawm, protagonismo da classe média marca revoltas de 2011

Andrew Whitehead
Para historiador, classe operária perdeu seu papel histórico

A classe média foi a grande protagonista e força motriz das revoltas populares e ocupações que marcaram o ano de 2011. Esta é a opinião de Eric Hobsbawm, um dos mais importantes historiadores em atividade.
Em entrevista à BBC, o historiador marxista nascido no Egito, mas radicado na Grã-Bretanha, afirma ainda que a classe operária e a esquerda tradicional - da qual ele ainda é um dos principais expoentes - estiveram à margem das grandes mobilizações populares que ocorreram ao longo deste ano.

''As mais eficazes mobilizações populares são aquelas que começam a partir da nova classe média modernizada e, particularmente, a partir de um enorme corpo estudantil. Elas são mais eficazes em países em que, demograficamente, jovens homens e mulheres constituem uma parcela da população maior do que a que constituem na Europa'', diz, em referência especial à Primavera Árabe, um movimento que despertou seu fascínio.
''Foi uma alegria imensa descobrir que, mais uma vez, é possível que pessoas possam ir às ruas e protestar, derrubar governos'', afirma Hobsbawm, cujo título do mais recente livro, Como Mudar o Mundo, reflete sua contínua paixão pela política e pelos ideais de transformação social que defendeu ao longo de toda a vida e que segue abraçando aos 94 anos de idade.
As ausências da esquerda tradicional e da classe operária nesses movimentos, segundo ele, se devem a fatores históricos inevitáveis.
''A esquerda tradicional foi moldada para uma sociedade que não existe mais ou que está saindo do mercado. Ela acreditava fortemente no trabalho operário em massa como o sendo o veículo do futuro. Mas nós fomos desindustrializados, portanto, isso não é mais possível'', diz Hobsbawm.
Hobsbawm comenta que as diversas ocupações realizadas em diferentes cidades do mundo ao longo de 2011 não são movimentos de massa no sentido clássico.
''As ocupações na maior parte dos casos não foram protestos de massa, não foram os 99% (como os líderes dos movimentos de ocupação se autodenominam), mas foram os famosos 'exércitos postiços', formados por estudantes e integrantes da contracultura. Por vezes, eles encontraram ecos na opinião pública. Em se tratando das ocupações anti-Wall Street e anticapitalistas foi claramente esse o caso.''
À sombra das revoluções
Hobsbawm passou sua vida à sombra - ou ao brilho - das revoluções.
Ele nasceu apenas meses após a revolução de 1917 e foi comunista por quase toda a sua vida adulta, bem como um autor e pensador influente e inovador.
Ele tem sido um historiador de revoluções e, por vezes, um entusiasta de mudanças revolucionárias.
O historiador enxerga semelhanças entre 2011 e 1848, o chamado ''ano das revoluções'', na Europa, quando ocorreram uma série de insurreições na França, Alemanha, Itália e Áustria e quando foi publicado um livro crucial na formação de Hobsbawm, O Manifesto Comunista, de Marx e Engels.
Hobsbawm afirma que as insurreições que sacudiram o mundo árabe e que promoveram a derrubada dos regimes da Tunísia, Egito, Líbia e Iêmen, ''me lembram 1848, uma outra revolução que foi tida como sendo auto-impulsionada, que começou em um país (a França) e depois se espalhou pelo continente em um curto espaço de tempo''.
Historiador diz que revoluções no mundo árabe tomaram rumo inesperado

Para aqueles que um dia saudaram a insurreição egípcia, mas que se preocupam com os rumos tomados pela revolução no país, Hobsbawm oferece algumas palavras de consolo.
''Dois anos depois de 1848, pareceu que alguma coisa havia falhado. No longo prazo, não falhou. Foi feito um número considerável de avanços progressistas. Por isso, foi um fracasso momentâneo, mas sucesso parcial de longo prazo - mas não mais em forma de revolução''.
Mas, com a possível exceção da Tunísia, o historiador não vê perspectivas de que os países árabes adotem democracias liberais ao estilo das europeias.
''Estamos em meio a uma revolução, mas não se trata da mesma revolução. O que as une é um sentimento comum de descontentamento e a existência de forças comuns mobilizáveis - uma classe média modernizadora, particularmente, uma classe média jovem e estudantil e, é claro, a tecnologia, que hoje em dia torna muito mais fácil organizar protestos.''
BBC Brasil

Trocando mitos por história - Hobsbawm


Entrevista com Eric Hobsbawm: Trocando mitos por história

Eric Hobsbawm é um historiador merecedor de todo o respeito. Num tempo em que a atividade central da grande maioria dos historiadores burgueses consiste na reescrita da história de acordo com as conveniências da ideologia dominante, a sua fidelidade à matriz marxista na investigação e no método serve de exemplo, independentemente das discordâncias que este ou aquele aspecto da sua obra suscitem.

Discordâncias que ele próprio assume frontalmente: “O que busco é o entendimento da história, e não concordância, aprovação ou comiseração”. Esta interessante entrevista é um exemplo da importância da reflexão de alguém que conta 94 anos, ou seja, de alguém que nasceu no ano da grande revolução socialista de outubro.

Estadão: No livro Globalização, Democracia e Terrorismo, de 2007, o senhor passa para os leitores certo pessimismo ao lhes colocar uma perspectiva crucial e ao mesmo tempo desconfortante: ''Não sabemos para onde estamos indo'', diz, referindo-se aos rumos mundiais. Olhando as últimas décadas pelo retrovisor da história, esse sentimento parece ter se intensificado. Em que outros momentos a humanidade viveu períodos marcados por essa mesma sensação de falta de rumos?
Eric Hobsbawm: Embora existam diferenças entre os países, e também entre as gerações, sobre a percepção do futuro – por exemplo, hoje há visões mais otimistas na China ou no Brasil do que em países da União Europeia e nos Estados Unidos –, ainda assim acredito que, ao pensar seriamente na situação mundial, muita gente experimente esse pessimismo ao qual você se refere. Porque de fato atravessamos um tempo de rápidas transformações e não sabemos para onde estamos indo, mas isso não constitui um elemento novo em tempos críticos. Tempos que nos remetem ao mundo em ruínas depois de 1914, ou mesmo a vários lugares daquela Europa entre duas grandes guerras ou na expectativa de uma terceira.

Aqueles anos durante e após a 2ª Guerra foram catastróficos, ali ninguém poderia prever que formato o futuro teria ou mesmo se haveria algum futuro. Cruzamos também os anos da Guerra Fria, sempre assustadores pela possibilidade de uma guerra nuclear. E, mais recentemente, notamos a mesma sensação de desorientação ao vermos como os Estados Unidos mergulharam numa crise econômica que até parece ser o breakdown do capitalismo liberal.

Estadão: Nações saíram empobrecidas, arruinadas mesmo, das guerras mundiais, mas é adequado pensar que havia naqueles escombros o desenho de um futuro?
Eric Hobsbawm: Sim. Se de um lado o futuro nos era desconhecido e cada vez mais inesperado, havia por outro lado uma ideia mais nítida sobre as opções que se apresentavam. No entreguerras, a escolha principal de um modelo se dava entre o capitalismo reformado e o socialismo com forte planejamento econômico – supremacia de mercado sem controle era algo impensável. Havia ainda a opção entre uma democracia liberal, o fascismo ultranacionalista e o comunismo.

Depois de 1945, o mundo claramente se dividiu numa zona de democracia liberal e bem-estar social a partir de um capitalismo reformado, sob a égide dos EUA, e uma zona sob orientação comunista. E havia também uma zona de emancipação de colônias, que era algo indefinido e preocupante. Mas veja que os países poderiam encontrar modelos de desenvolvimento importados do Ocidente, do Leste e até mesmo resultante da combinação dos dois. Hoje esses marcos sinalizadores desapareceram e os "pilotos" que guiariam nossos destinos, também.

Estadão: Como o senhor avalia o poder das imagens de destruição nos ataques do 11/9 a Nova York, tão repetidas nos últimos dias? Tornaram-se o símbolo de uma guinada histórica, apontando novas relações entre Ocidente e Oriente? Por que imagens do cenário de morte de Bin Laden surtiram menos impacto?
Eric Hobsbawm: A queda das torres do World Trade Center foi certamente a mais abrangente experiência de catástrofe que se tem na história, inclusive por ter sido acompanhada em cada aparelho de televisão, nos dois hemisférios do planeta. Nunca houve algo assim. E sendo imagens tão dramáticas, não surpreende que ainda causem forte impressão e tenham se convertido em ícones.

Agora, elas representam uma guinada histórica? Não tenho dúvida de que os Estados Unidos tratam o 11/9 dessa forma, como um turning point, mas não vejo as coisas desse modo. A não ser pelo fato de que o ataque deu ao governo norte-americano a ocasião perfeita para o país demonstrar sua supremacia militar ao mundo. E com sucesso bastante discutível, diga-se. Já o retrato de Bin Laden morto (que não foi divulgado) talvez fosse uma imagem menos icônica para nós, mas poderia se converter num ícone para o mundo islâmico. Da maneira deles, porque não é costume nesse mundo dar tanta importância a imagens, diferentemente do que fazemos no Ocidente, com nossas camisetas estampando o rosto de Che Guevara.

Estadão: Mas além da chance de demonstrar poderio militar, os Estados Unidos deram uma guinada na sua política externa a partir de 2001, ajustando o foco naquilo que George W. Bush batizou como "war on terror". Outro encaminhamento seria possível?
Eric Hobsbawm: Eu diria que a política externa norte-americana, depois de 2001, foi parcialmente orientada para a guerra ao terror, e fundamentalmente orientada pela certeza de que o 11/9 trouxe para os EUA a primeira grande oportunidade, depois do colapso soviético, de estabelecer uma supremacia global, combinando poder político-econômico e poder militar.

Criou-se a situação propícia para espalhar e reforçar bases militares americanas na Ásia central, ainda uma região muito ligada à Rússia. Sob esse aspecto, houve uma confluência de objetivos – combate-se o inimigo ampliando enormemente a presença militar norte-americana. Mas, sob outro aspecto, esses objetivos conflitaram. A guerra no Iraque, que no fundo nada tinha a ver com a Al-Qaida, consumiu atenção e uma enormidade de recursos dos EUA, e ainda permitiu à organização liderada por Bin Laden criar bases não só no Iraque, mas no Paquistão e extensões pelo Oriente Médio.

Estadão: Os Estados Unidos lançaram-se nessa campanha sabendo o tamanho do inimigo?
Eric Hobsbawm: O perigo do terrorismo islâmico ficou exagerado, a meu ver. Ele matou milhares de pessoas, é certo, mas o risco para a vida e a sobrevivência da humanidade que ele possa representar é muito menor do que o que se estima. Exemplo disso são as importantes mudanças que ocorreram neste ano no mundo árabe, mudanças que nada devem ao terrorismo islâmico. E não só: elas o deixaram à margem.

Agora, o mais duradouro efeito da war on terror, aliás, uma expressão que os diplomatas norte-americanos finalmente estão abandonando, terá sido permitir que os Estados Unidos revivessem a prática da tortura, bem como permitir que os cidadãos fossem alvo de vigilância oficial. Isso, claro, sem falar das medidas que fazem com que a vida das pessoas fique mais desconfortável, como ao viajar de avião.

Estadão: Diante dos problemas econômicos que hoje afligem os Estados Unidos, ainda sem um horizonte de recuperação à vista, o senhor diria que seguimos em direção a um tempo de declínio da hegemonia norte-americana?
Eric Hobsbawm: Nós de fato caminhamos em direção à Era do Declínio Americano. As guerras dos últimos dez anos demonstram como vem falhando a tentativa norte-americana de consolidar sua solitária hegemonia mundial. Isso porque o mundo hoje é politicamente pluralista, e não monopolista. Junto com toda a região que alavancou a industrialização na passagem do século 19 para o século 20, hoje a América assiste à mudança do centro de gravidade econômica do Atlântico Norte para o Leste e o Sul.

Enquanto o Ocidente vive sua maior crise desde os anos 1930, a economia global ainda assim continua a crescer, empurrada pela China e também pelos outros Brics. Ainda assim, não devemos subestimar os Estados Unidos. Qualquer que venha a ser a configuração do mundo no futuro, eles ainda se manterão como um grande país e não apenas porque são a terceira população do planeta. Ainda vão desfrutar, por um bom tempo, da notável acumulação científica que conseguiram fazer, além de todo o soft power global representado por sua indústria cultural, seus filmes, sua música, etc.

Estadão: Não só por desdobramentos político-militares do 11/9, mas também pela emergência de novos atores no mundo globalizado, criam-se situações bem desafiadoras. Por exemplo, o que o Ocidente sabe do Islã? E dos países árabes que hoje se levantam contra seus regimes? Qual é o grau de entendimento da China? Enfim, o Ocidente enfrenta dificuldades decorrentes de uma certa superioridade cultural ou arrogância histórica?
Eric Hobsbawm: Ao longo de toda uma era de dominação, o Ocidente não só assumiu que seus triunfos são maiores do que os de qualquer outra civilização, e que suas conquistas são superiores, como também que não haveria outro caminho a seguir. Portanto, ao Ocidente restaria unicamente ser imitado. Quando aconteciam falhas nesse processo de imitação, isso só reforçava nosso senso de superioridade cultural e arrogância histórica.

Assim, países consolidados em termos territoriais e políticos, monopolizando autoridade e poder, olharam de cima para baixo para países que aparentemente estavam falhando na busca de uma organização nas mesmas linhas. Países com instituições democráticas liberais também olharam de cima para baixo para países que não as tinham. Políticos do Ocidente passaram a pensar democracia como uma espécie de contabilidade de cidadãos em termos de maiorias e minorias, negando inclusive a essência histórica da democracia.

E os colonizadores europeus também se acharam no direito de olhar populações locais de cima para baixo, subjugando-as ou até erradicando-as, mesmo quando viam que aqueles modos de vida originais eram muito mais adequados ao meio ambiente das colônias do que os modos de vida trazidos de fora. Tudo isso fez com que o Ocidente realmente desenvolvesse essa dificuldade de entender e apreciar avanços que não fossem os próprios.

Estadão: Essa superioridade do Ocidente pode mudar com a emergência de uma potência como a China?
Eric Hobsbawm: Mas mesmo a China, que no passado remoto era tida como uma civilização superior, foi subestimada por longo tempo. Só depois da 2ª Guerra é que seus avanços em ciência e tecnologia começaram a ser reconhecidos. E só recentemente historiadores têm levantado as extraordinárias contribuições chinesas até o século 19.

Veja bem, ainda não sabemos em que medida a cultura, a língua e mesmo as práticas espirituais da Pérsia, hoje Irã, enfim, em que medida aquele fraco e frequentemente conquistado império influenciou uma grande parte da Ásia, do Império Otomano até as fronteiras da China. Sabemos? Temos grande dificuldade em compreender a natureza das sociedades nômades, bem como sua interação com sociedades agrícolas assentadas, e hoje a falta dessa compreensão torna quase impossível traduzir o que se passa em vastas áreas da África e da região do Saara, por exemplo, no Sudão e na Somália.

A política internacional fica completamente perdida quando confrontada por sociedades que rejeitam qualquer tipo de estado territorial ou poder superior ao do clã ou da tribo, como no Afeganistão e nas terras altas do sudoeste asiático. Hoje achamos que já sabemos muito sobre o Islã, sem nem sequer nos darmos conta de que o radicalismo xiita dos aiatolás iranianos e o sonho de restauração do califado por grupos sunitas não são expressões de um Islã tradicional, mas adaptações modernistas, processadas o longo século 20, de uma religião prismática e adaptável.

Estadão: Com todos esses exemplos de ''mundos'' que se estranham, o senhor diria que a história corre o risco das distorções?
Eric Hobsbawn: Apesar de todos esses exemplos, sou forçado a admitir que a arrogância histórica ocidental inevitavelmente se enfraquece, exceto em alguns países, entre eles os EUA, cujo senso de identidade coletiva ainda consiste na crença de sua própria superioridade. Nos últimos dez anos, a história tomou outro curso, muito afetada pelas imigrações internacionais que permitem a mulheres e homens de outras culturas virem para os "nossos" países.

Dou um exemplo: hoje a informação municipal na região de Londres onde vivo está disponível não apenas em inglês, mas em albanês, chinês, somali e urdu. A questão preocupante é que, como reação a tudo isso, surge também uma xenofobia de caráter populista, que se propaga até nas camadas mais educadas da população. Mas, inegavelmente, numa cidade como Londres ou Nova York, onde a presença dos imigrantes de várias partes é forte, existe hoje um reconhecimento maior da diversidade do mundo do que se tinha no passado.

Turistas que buscam destinos na Ásia, África ou até mesmo no Caribe costumam não entender a natureza das sociedades que cercam seus hotéis, mas jovens mulheres e homens que hoje viajam, a trabalho ou estudos, para esses lugares, já criam outra compreensão. Em resumo, apesar da expansão de xenofobia, há motivos para otimismo porque a compreensão abrangente do nosso tempo complexo requer mais do que conhecimento ou admiração por outras culturas. Requer conhecimento, estudo e, não menos importante, imaginação.

Estadão: Imaginação?
Eric Hobsbawm: Sim, porque essa compreensão abrangente é frequentemente dificultada pelo persistente hábito de políticos e generais passarem por cima do passado. O Afeganistão é um clamoroso exemplo do que estou dizendo. Temo que não seja o único.

Estadão: Na sua opinião, estaríamos atravessando um momento regressivo da humanidade quando fundamentalismos religiosos impõem visões de mundo e modos de vida?
Eric Hobsbawm: O que vem a ser um momento regressivo? Esta é a pergunta que faço. Não acredito que nossa civilização esteja encarando séculos de regressão como ocorreu na Europa Ocidental depois da queda do Império Romano. Por outro lado, devemos abandonar a antiga crença de que o progresso moral e político seja tão inevitável quanto o progresso científico, técnico e material. Essa crença tinha alguma base no século 19.

Hoje o problema real que se coloca, o maior deles, é que o poder do progresso material e tecnocientífico, baseado em crescente e acelerado crescimento econômico, num sistema capitalista sem controle, gera uma crise global de meio ambiente que coloca a humanidade em risco. E, à falta de uma entidade internacional efetiva no plano da tomada de decisão, nem o conhecimento consolidado do que fazer, nem o desejo político de governos nacionais de fazer alguma coisa estão presentes.

Esse vazio decisório e de ação pode, sim, levar o nosso século para um momento regressivo. E certamente isso tem a ver com aquele "sentido de desorientação" que discutimos no início da entrevista.

Estadão: Apoiado na sua longa trajetória acadêmica, que conselhos o senhor daria aos jovens historiadores de hoje?
Eric Hobsbawn: Hoje pesquisar e escrever a história são atividades fundamentais, e a missão mais importante dos historiadores é combater mitos ideológicos, boa parte deles de feitio nacionalista e religioso. Combater mitos para substituí-los justamente por história, com o apoio e o estímulo de muitos governos, inclusive. Se eu fosse jovem o suficiente, gostaria de participar de um excitante projeto interdisciplinar que recorresse à moderna arqueologia e às técnicas de DNA para compor uma história global do desenvolvimento humano, desde quando os primeiros Homo sapiens tenham aparecido na África oriental e como elas se espalharam pelo globo.

Agora, se eu fosse um jovem historiador latino-americano, daí eu poderia ser tentado a investigar o impacto do meu continente sobre o resto do mundo. Isso, desde 1492, na era dos descobrimentos, passando pela contribuição material desse continente a tantos países, com metais preciosos, alimentos e remédios, até o efeito da América Latina sobre a cultura moderna e a compreensão do mundo, influenciando intelectuais como Montaigne, Humboldt, Darwin. E, evidentemente, eu pesquisaria a riqueza musical do continente, fosse eu um latino-americano. Isso é tudo o que eu quero dizer.

A Roda Bélica da História, por Hobsbawn

1ª Guerra, o banho de sangue

O tempo histórico era outro, avalia Hobsbawm. O mundo ficara quase um século sem um grande conflito e o conceito de "paz" fez-se sinônimo de "antes de 1914", ano em que Francisco Ferdinando, da Áustria, foi morto. Detonava-se o conflito que iria sangrar a Europa.

2ª Guerra, o mistério

O mundo sabia o que era uma guerra maciça, mas não uma guerra global. Eis a amarga contribuição da 2ª Guerra, conflito sem limites. Hobsbawm indaga: por que Hitler, esgotado na Rússia, declarou guerra aos EUA, permitindo que se associassem à Grã-Bretanha?

Guerra Fria, o absurdo

Como explicar 40 anos de tensão pela crença de que o planeta poderia explodir a qualquer momento e, contra a destruição total, só haveria a chance da dissuasão mútua? Para Hobsbawm, a Guerra Fria dos tempos de Kruchev carregou a inconclusão da Era da Catástrofe.

Guerra do Golfo, o lucro

Ao findar da Guerra Fria, lembra o historiador, a hegemonia econômica norte-americana já estava abalada. E sua superioridade militar teve que ser financiada por apoiadores de Washington. Na guerra contra o Iraque, em 1991, a potência presidida por Bush pai realizou lucros.

Fonte: O Estado de S. Paulo
http://www.vermelho.org.br

terça-feira, 20 de março de 2012

Ilha Fiscal – Rio de Janeiro

Situada na enseada da baía da Guanabara, a ilha Fiscal, outrora conhecida como ilha dos Ratos, ocupa uma área de 7.000 metros quadrados, distando do continente pouco mais de 1 km. Antiga propriedade do Ministério da Fazenda, servia de posto avançado da alfândega. Atualmente pertence à Marinha. O belo edifício que a abriga é projeto do engenheiro Adolpho José Del Vecchio.

D. Pedro II, logo ao início das obras, decidiu conhecer a ilha. Encantado com a beleza da enseada que domina a entrada da barra, exclamou `este local é um delicado estojo, digno de uma brilhante jóia`. Del Vecchio compreendeu a mensagem do Imperador e seu encantamento, e projetou uma obra arquitetônica de rara beleza.

Estruturado em estilo gótico, seguiu os moldes de castelos do século XIV, existentes em Auvergne, no sul da França. No Torreão, um raro relógio de quatro faces, de mais de 100 anos, foi instalado pela firma Krussmann, funcionando através de corda, que ainda hoje é dada duas vezes por semana. Na parte superior do castelo, os pára-raios originais ainda existem, armados em um complexo sistema que teve o cabo trocado poucas vezes.

Essa jóia arquitetônica teve sua pedra fundamental lançada em novembro de 1881 e foi finalizada, juntamente com a urbanização da ilha, em 1889. Fato histórico que marcou a ilha Fiscal foi o último baile do Império, oferecido à oficialidade do navio chileno Almirante Cochrane, em retribuição à recepção que o Chile dera a um navio brasileiro que estivera em Valparaiso. Na realidade, o baile deveria ter ocorrido no dia 19 de outubro, mas, em virtude da morte do rei de Portugal, D. Luís, que era sobrinho de D. Pedro II, a família imperial resolveu adiar o evento para 9 de novembro de 1889. Foi uma noite histórica. Calcula-se que 5 mil pessoas compareceram à recepção. Seis dias depois, acontecia a proclamação da República.

Um segundo episódio denominado Revolta da Armada, em 1893, consistiu em uma rebelião da esquadra brasileira contra o governo do marechal Floriano Peixoto acabando por atingir a ilha Fiscal que, por sua localização na baía de Guanabara, ficou em meio ao fogo cruzado travado entre a artilharia dos navios e as fortalezas das ilhas de Villegagnon e das cobras, tendo ocorrido a destrição de vitrais do castelo, paredes e infra-estrutura, mais tarde reparados.
Cyro Corrêa Lyra. Documenta Histórica, 2006.

sábado, 17 de março de 2012

O que é filosofia escolástica?

É uma corrente filosófica nascida na Europa da Idade Média, que dominou o pensamento cristão entre os séculos XI e XIV e teve como principal nome o teólogo italiano São Tomás de Aquino. "Uma das contribuições mais importantes de São Tomás foi ter realizado uma releitura da obra de Aristóteles dentro de uma perspectiva cristã", afirma o filósofo Marcelo Perine, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Com essa releitura, o pensador italiano tentou conciliar razão e fé, acreditando que não havia contradição entre elas, pois ambas vinham de Deus. Essa concepção é muito bem expressa por uma velha máxima sua: "Crer para poder entender e entender para crer." São Tomás de Aquino dividiu o conhecimento humano em dois. O conhecimento sobrenatural seria aquele ensinado pela fé, como a aceitação da Trindade Divina, ou seja, Deus como Pai, Filho e Espírito Santo. Já o conhecimento natural viria à luz da razão, como os teoremas matemáticos.

A corrente escolástica perderia o papel de destaque na filosofia européia por volta do século XVII, com o nascimento da filosofia moderna, que traria pensadores e cientistas como Galileu Galilei e René Descartes.
Revista Mundo Estranho

Qual é a origem da Estrela de Davi e o que ela representa?


Não se conhece nenhum registro que permita precisar o local e a data de surgimento do hexagrama, como os místicos chamam a estrela de seis pontas. Sabe-se apenas que ela já era conhecida na Índia por volta de 4000 a.C. Apesar de ficar mais conhecida como símbolo do Judaísmo, ela nunca foi, portanto, de uso exclusivo dessa religião - e pode ser vista também na arte muçulmana e na decoração de muitas catedrais cristãs da Idade Média. "O hexagrama sempre foi, para vários povos, um símbolo de proteção, representando a união do Céu com a Terra", afirma o filósofo Mário Sérgio Cortella, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O nome Estrela de Davi vem do hebraico Magen Davi, literalmente "Escudo de Davi". Segundo a tradição judaica, os soldados do rei Davi - um dos principais personagens do Antigo Testamento - traziam no escudo o hexagrama para atrair a proteção divina.

Já no século XVII, a Estrela de Davi foi consagrada símbolo oficial da comunidade judaica de Praga, na atual República Checa. Dois séculos mais tarde, passou também a representar o Judaísmo da mesma forma que a cruz simboliza o Cristianismo. Por isso, a estrela aparece não só em sinagogas e túmulos, como no centro da bandeira de Israel. O símbolo marcou também um episódio trágico do século XX: o nazismo alemão, que obrigou os judeus a usar, no braço, uma faixa com uma Estrela de Davi amarela, para serem reconhecidos pelos soldados de Hitler.
Revista Mundo Estranho

Qual é a verdadeira história do rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda?

Tudo indica que ela não passa de uma lenda. Não existe nenhum registro histórico desse personagem, que teria vivido entre o final do século V e o início do século VI, no País de Gales ou no norte da Grã-Bretanha - com a exceção de dois compêndios de relatos militares, pouco confiáveis e bem posteriores (séculos IX e X), sugerindo que Artur teria liderado o povo celta - habitantes originais da ilha, a essa altura da história convertidos ao Cristianismo - em duas batalhas vitoriosas contra os invasores saxões vindos do continente. Verdadeira ou falsa, essa história começou a se popularizar na Europa do século XII com o livro História dos Reis da Bretanha, do inglês Geoffrey de Monmouth, que narrava várias aventuras protagonizadas por Artur e seus cavaleiros. A partir daí, o mito foi adotado e expandido por diversos dos chamados romances de cavalaria.

"Foi esse gênero literário tipicamente medieval que consagrou essas figuras míticas", afirma a historiadora Teresa de Queiroz, da USP. Já a Távola Redonda teria sido inventada pelo escritor francês Chrétien de Troyes, no final do século XII - o mesmo autor que acrescentou às peripécias dos cavaleiros a busca do Santo Graal, o cálice que teria sido usado por Jesus na última ceia.
Revista Mundo Estranho

Como era a vida no quilombo dos Palmares?

O maior símbolo da resistência à escravidão apareceu nas últimas décadas do século 16, em uma área onde hoje fica a divisa entre Alagoas e Pernambuco. No começo, o quilombo dos Palmares (cujo nome vem das palmeiras que compunham a vegetação local) era formado por escravos de origem angolana, fugidos das fazendas de cana-de-açúcar da região. Mas, nos 100 anos de existência do lugar, índios e brancos marginalizados também se juntaram à população negra. No auge, Palmares era um povoado grande para os padrões da época: abrigava 20 mil habitantes e incluía nove aldeias, chamadas de mocambos ("esconderijos", no dialeto banto falado pelos negros). Apesar da aura utópica, o quilombo tinha pouco de sociedade alternativa. Pelo contrário. A própria palavra kilombo, em banto, quer dizer algo como "sociedade guerreira com rigorosa disciplina militar". "Havia pena de morte para adultério, roubo e deserção", afirma o historiador Dagoberto José Fonseca, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara (SP). Como os quilombolas não deixaram registros escritos, seus hábitos não são totalmente conhecidos. Sabe-se, porém, que eles eram governados por um rei, com o título de Ganga Zumba ("grande chefe"), assistido por um conselho composto pelos chefes dos vários mocambos. Como a existência do quilombo estimulava as fugas de escravos, os fazendeiros da região reuniram milícias para atacar Palmares durante todo o século 17. Diante dos conflitos constantes, Ganga Zumba aceitou um acordo de paz com os brancos, em 1678. Isso enfureceu os palmarinos, que assassinaram Ganga Zumba dois anos mais tarde. Seu sucessor assumiu o título de Zumbi (uma derivação da palavra "deus" em banto), liderando uma guerra contra os invasores. Mas na manhã de 6 de fevereiro de 1694 a Cerca Real do Macaco, capital de Palmares, foi ocupada por um batalhão comandado pelo bandeirante Domingos Jorge Velho. Nos meses seguintes, as outras aldeias caíram. Zumbi escapou do massacre inicial e liderou uma luta de guerrilhas, mas acabou morto em 20 de novembro de 1695.

Na livraria:

Palmares, a Guerra dos Escravos

Décio Freitas, Mercado Aberto, 1984

Zumbi

Joel Rufino dos Santos, Editora Moderna, 1985

Na internet:

www.palmares.gov.br

www.portalafro.com.br/quilombo/palmares.htm

Refúgio vigiado
Para proteger Palmares, os quilombolas construíram três cercas e dezenas de armadilhas
Até hoje, não se sabe com precisão a localização de todas as nove aldeias que formavam o quilombo dos Palmares. O certo é que a capital, chamada Cerca Real do Macaco, ficava na Serra da Barriga, em Alagoas.

As outras oito aldeias eram distribuídas ali por perto, mas em locais ainda desconhecidos

1. ENTRADA RESTRITA

A capital do quilombo era circundada por três cercas de madeira, reforçadas com pedras e guardadas por sentinelas armados. O acesso era feito por portões de madeira reforçados. A segunda cerca ficava a 300 metros de distância da primeira, e a terceira, a 500 metros da segunda. As linhas de defesa estendiam-se por mais de 5 quilômetros, com guaritas a cada 2 metros

2. ALÇAPÃO HUMANO

Dezenas de buracos de alguns metros de profundidade e camuflados com folhagens circundavam a povoação. Para empalar aqueles que caíam nos fossos ocultos, os fundos das armadilhas tinham estacas de madeira afiadas e lanças de ferro com mais de 1 metro. Apenas os quilombolas conheciam o caminho certo para entrar na capital de Palmares

3. MIX RELIGIOSO

A religião praticada em Palmares era um catolicismo misturado com tradições da cultura banto. Na capela do Cerco Real do Macaco, foram encontradas imagens de São Brás, do menino Jesus e de Nossa Senhora da Conceição dividindo os altares com estátuas de divindades africanas. Muitos negros haviam se convertido ao catolicismo ainda antes de serem trazidos ao Brasil

4. DIETA REFORÇADA

Em volta da cidadela ficavam as roças de alimentos. A lavoura mais importante era o milho, mas também eram plantados feijão, banana, batata-doce, mandioca e cana-de-açúcar. Além desses vegetais, o cardápio era completado com a coleta de frutos e a caça de pequenos animais das matas próximas

5. CASINHAS DE SAPÊ

Os moradores viviam em casas de madeira cobertas de folhas de palmeira, com iluminação artificial que usava azeite como combustível. Algumas delas tinham saídas ocultas, que permitiam escapar para o mato em caso de perigo. A mobília incluía panelas e utensílios domésticos feitos por artesãos locais ou roubados em incursões pelas fazendas vizinhas

6. DIRETAS JÁ!

Os membros do conselho que chefiavam o povoado eram escolhidos em assembléias que reuniam todos os habitantes na praça central. Lá ficavam a própria sede do conselho, uma capela, poços para armazenar água, um galpão sem paredes que servia como mercado e oficinas de artesãos — entre eles, ferreiros que faziam armas e ferramentas agrícolas

7. CONJUNTO HABITACIONAL

No interior do forte havia quatro ruas, cada uma com pouco mais de 2 metros de largura e 1 quilômetro de extensão. Ao longo delas, alinhavam-se cerca de 2 mil casas, onde viviam 8 mil moradores. Eles falavam português misturado ao dialeto banto e a palavras indígenas. Animais domésticos, principalmente galinhas, eram criados nos quintais das casas ou soltos pelas ruas
Revista Mundo Estrando