quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Anos 20 - Arte e Cultura

Abaporu - quadro de Tarsila do Amaral, 1928.
Paulicéia Desvairada (capa), 1922. São Paulo (SP. (UNICAMP)
Alunos e Professores na Escola Nacional de Belas Artes, vendo-se Cândido Portinari (segundo da esquerda para a direita na primeira fila), 1922. Rio de Janeiro (RJ). (Projeto Portinari/AFRH 224)
Capa da Revista Fon Fon, 1916. (Nosso Século - 1910/1930 - Abril Cultural)

Anos 20
Arte e Cultura


Em síntese: Na década de 1920 era nítida a preocupação de se discutir a identidade e os rumos da nação brasileira. Todos tinham algo a dizer - políticos, militares, empresários, trabalhadores, médicos, educadores, mas também artistas e intelectuais. Como deveria ser o Brasil moderno? Através da literatura, das artes plásticas, da música, e mesmo de manifestos, os artistas e intelectuais modernistas buscaram compreender a cultura brasileira e sintonizá-la com o contexto internacional. O marco de seu movimento foi a Semana de Arte Moderna de 1922. Mas havia também intelectuais preocupados com a reforma das instituições - a começar pela Constituição de 1891 -, que se dedicaram a apresentar propostas para a reorganização da sociedade brasileira.


A entrada do Brasil na modernidade foi parte de um processo complexo em que se entrecruzaram dinâmicas diferentes. Nas primeiras décadas do século XX aceleraram-se a industrialização, a urbanização, o crescimento do proletariado e do empresariado. De outro lado, permaneceram a tradição colonialista, os latifúndios, o sistema oligárquico e o desenvolvimento desigual das regiões. De toda forma, com a expansão dos centros urbanos, modificaram-se os valores da cultura cotidiana e os próprios padrões da comunicação social. As idéias de simultaneidade, concisão, fragmentação, velocidade e arrojo passaram a expressar os tempos modernos. As Kodaks, o cinema e as revistas ilustradas captavam um mundo feito de imagens. Era inevitável que a arte expressasse as transformações trazidas pela modernidade. Mas, no Brasil, outros problemas também preocupavam artistas e intelectuais. "Nós não nos conhecemos uns aos outros dentro do nosso próprio país." A frase, do escritor carioca Lima Barreto, caracteriza bem o espírito da década de 1920. Era um tempo de indagações e descobertas. A tarefa que se impunha era a de construir a nação, e isso significava também repensar a cultura, resgatar as tradições, costumes e etnias que haviam permanecido praticamente ignorados pelas elites. A questão da identidade nacional estava agora em primeiro plano: que cara tem o Brasil? Artistas e intelectuais buscaram responder a essa pergunta, e esse esforço foi uma característica importante do modernismo brasileiro. Isso não quer dizer que o modernismo tenha sido um movimento homogêneo. Ao contrário: produziu imagens e reflexões sobre a nacionalidade profundamente contrastantes entre si.

A Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo no ano de 1922, representou uma verdadeira "teatralização" da modernidade. Mas o movimento modernista não se resumiu à Semana. Na verdade começou antes de 1922 e se prolongou pela década de 1930. Tampouco se restringiu a São Paulo. Houve também uma modernidade carioca, e a proliferação de revistas e manifestos por todo o país indica que o raio de ação do movimento foi maior do que se supõe.

Assim como a Exposição Universal do Rio de Janeiro de 1922, a Semana de Arte Moderna fazia parte da agenda oficial comemorativa do Centenário da Independência. O evento teve grande impacto na época, pois formalizou e discutiu questões que já se estavam esboçando na vida cultural. Por exemplo: como integrar tradição e modernidade? regional e universal? popular e erudito?

Mário de Andrade defendia a perspectiva de integração dinâmica do passado ao presente. No "Prefácio interessantíssimo" de seu livro de poemas Paulicéia desvairada (1922), definia o passado como "lição para meditar não para reproduzir". A tradição em si não tinha valor, a não ser que estabelecesse um elo vivo com a atualidade. Era esse o sentido dos estudos folclóricos a que se dedicou. Seu célebre livro Macunaíma (1928) mostra um herói que nasce índio, torna-se negro e no final é branco. O herói Macunaíma sobrevoa o Brasil nas asas de um pássaro. O que importava era destacar a nossa multiplicidade étnico-cultural, vislumbrar o conjunto da nacionalidade.

Outro autor modernista de renome, Oswald de Andrade, propunha no "Manifesto pau-brasil" (1924) uma síntese capaz de unir o "lado doutor" da nossa cultura ao lado popular. Já no "Manifesto antropofágico"(1928), sugeria um projeto de reconstrução da cultura nacional. Metaforicamente, deveríamos devorar e absorver de maneira crítica as influências do "inimigo" externo. As idéias do futurismo, do dadaísmo e do surrealismo poderiam ser integradas à nossa cultura desde que fossem reelaboradas. No quadro de Tarsila do Amaral intitulado "Abaporu" - que significa "o homem que come" - está expressa plasticamente a idéia da integração cultural.

O grupo dos verde-amarelos, por sua vez, tinha idéias bastante diferentes: propunha um "retorno ao passado", considerado como o depositário das nossas verdadeiras tradições. Via no popular, com sua índole pacífica, a alma da nacionalidade, a ser guiada pelas elites político-intelectuais do país. No manifesto "Nhengaçu verde-amarelo" (1929), defendia as fronteiras nacionais contra as influências culturais estrangeiras. Nesse ponto o grupo reforçava a tese do nacionalismo militarista de Olavo Bilac, fundador da Liga de Defesa Nacional e criador da figura do "poeta-soldado". As idéias dos verde-amarelos seriam mais tarde incorporadas pelo regime autoritário do Estado Novo (1937-1945).

Entre os intelectuais dos anos 20 cujas análises visavam à definição de novos rumos para o país, incluíam-se Oliveira Viana, Gilberto Amado, Pontes de Miranda. Eles escreveram ensaios que foram publicados em 1924 em uma coletânea organizada por Vicente Licínio Cardoso, chamada À margem da história da República. Na base de seu ideário estava o pensamento do político e escritor fluminense Alberto Torres.

Um dos nossos maiores problemas, na opinião desses pensadores, era a debilidade do governo federal. A Constituição de 1891 estava a seu ver ultrapassada, e isso por dois motivos principais: possuía inspiração externa e assegurava grande poder aos estados em detrimento do poder central. Urgia que o país construísse seu próprio modelo e criasse instituições adequadas à realidade nacional.

CPDOC - FGV

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