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quarta-feira, 22 de junho de 2022

O mito da fênix e a combustão espontânea



Apesar de parecer mágica, a capacidade de se incendiar dessa ave mitológica conhecida por renascer das próprias cinzas é um fenômeno que pode acontecer em certas situações no mundo real





A fênix é uma ave mitológica, dotada de diversos poderes e cercada por muitos mistérios e histórias. Muito presente em nossa cultura atual, a fênix é conhecida por meio das histórias de ficção (livros, filmes, games e séries). Mas não pense que esse pássaro é uma criação moderna.


A garça de Heron, maior espécie de garça que já passou pela Terra, serviu de inspiração para o surgimento de Benu, um ser mitológico do Egito Antigo CRÉDITO: WIKIPEDIA


Há cerca de 5 mil anos, a região que hoje é conhecida como Emirados Árabes Unidos abrigava a maior espécie de garça que já passou pela Terra: a garça de Heron (também chamada pelo nome científico de Ardea bennuides). Acredita-se que essa garça serviu de inspiração para o surgimento de Benu, um ser mitológico do Egito Antigo associado à alma do deus do Sol, Rá. Essa ave sagrada também era vista como símbolo do renascimento (o que também a ligava ao deus Osíris), pois se acreditava que, a cada 500 anos, ela era capaz de se consumir em chamas e renascer das próprias cinzas.

Posteriormente, já na Grécia Antiga, surgiram histórias de um pássaro com propriedades muito semelhantes a Benu e que, na mitologia grega, recebeu o nome de fênix. Embora haja contestações



sobre a real origem desse ser mitológico, foram muitas as civilizações que cultuaram animais análogos a essa ave – ou outros pássaros com habilidades mágicas –, como os chineses, árabes, persas, entre outros povos.

Por meio das histórias orais e escritas, o mito da fênix foi se propagando ao longo dos séculos. E podemos dizer que, dentre todas as histórias de pássaros mágicos, essa foi o que mais criou raízes no imaginário popular ocidental.


A fênix na cultura pop

Muitas crianças e jovens tiveram um importante contato com a fênix por meio do universo de Harry Potter. A franquia de enorme sucesso, tanto no cinema quanto na literatura, nos apresenta a personagem Fawkes, uma fênix de enorme inteligência e lealdade que acompanhava o diretor da escola de magia de Hogwarts, Alvo Dumbledore.




Nos filmes do universo de Harry Potter, a fênix Fawkes acompanhava o diretor da escola de magia de Hogwarts, Alvo Dumbledore CRÉDITO: DIVULGAÇÃO



O primeiro contato que o jovem Harry Potter teve com Fawkes foi justamente no dia de sua queima. Em Harry Potter e a Câmara Secreta, o bruxo visita o escritório de Dumbledore e, em dado momento, quando ele se aproxima da ave (visivelmente velha e cansada), ela simplesmente se acende em chamas e é completamente consumida pelo fogo. O diretor acalma Harry, explicando que Fawkes é uma fênix e que já estava na hora de ela se incendiar para nascer novamente. A cena termina com uma bebê Fawkes nascendo das próprias cinzas.

Depois desse dia, a fênix participou de muitos momentos importantes da saga. Foi ela quem levou a espada da Grifinória para ajudar Harry na luta contra o monstro basilisco na Câmara Secreta e, depois, derramou suas lágrimas sobre o jovem bruxo para curá-lo de ferimentos graves e ainda o carregou, junto com seus amigos, de volta para o castelo, demonstrando seus poderes de cura e de enorme força. Fawkes também auxiliou Dumbledore quando o diretor fugia dos funcionários do Ministério da Magia em Harry Potter e a Ordem da Fênix, dentre outras aparições.

O filme mais recente da franquia, Animais fantásticos: os segredos de Dumbledore, que tem como foco o passado do diretor da escola, traz em seus cartazes de divulgação uma fênix em chamas. Seria essa fênix a própria Fawkes ou trata-se de outra fênix? Só mesmo assistindo ao filme para descobrir!


A ciência da combustão espontânea

O processo de queima – ou combustão – nada mais é do que uma reação química decorrente do encontro de três elementos: um combustível (qualquer material oxidável, ou seja, capaz de reagir com o oxigênio e pegar fogo); um comburente (geralmente, o oxigênio); e uma fonte de ignição (por exemplo, uma faísca, que fornece a energia necessária para a reação ocorrer). Se algum desses três elementos não está presente, a queima não ocorre.

A combustão é uma reação fundamental para a manutenção da vida humana no planeta e teve seu marco histórico de origem datado por pesquisas arqueológicas em cerca de 7 mil anos antes de Cristo, quando os povos antigos começaram a produzir fogo, possibilitando diversos avanços tecnológicos.

Você já acendeu uma fogueira ou viu alguém fazendo isso? Para esse processo, podemos usar um pedaço de madeira, que funcionará como combustível (ou seja, irá queimar). Para facilitar a queima, podemos jogar sobre a madeira um líquido inflamável (como o álcool). O oxigênio irá participar dessa reação química fazendo o papel de comburente. E você ainda precisa de uma fonte de energia, como a chama de um fósforo ou a faísca de um isqueiro. Se a madeira queimar por completo (ou seja, o combustível se esgotar), a combustão se interrompe. Se você cobrir essa fogueira, impedindo a entrada de mais oxigênio, a fogueira se apaga por falta de comburente.



A partir dessas informações, vamos pensar na combustão da fênix. O combustível dessa reação é a própria fênix (tanto que quando ela se torna somente cinzas, a chama acaba). O comburente dessa reação é o próprio oxigênio. Mas e a fonte de energia externa, a ignição? Como é possível um objeto pegar fogo sem receber nenhuma energia?

Apesar de parecer realmente mágica, a combustão espontânea é um fenômeno real. O fato de não haver uma fonte externa visível de energia não significa que ela não exista. A temperatura de um corpo está diretamente associada à energia que esse corpo tem. Isso significa que um corpo quente (em alta temperatura) é um corpo com mais energia do que um corpo mais frio. Portanto, embora não seja algo muito comum, alguns materiais podem pegar fogo espontaneamente apenas com o seu próprio calor.

Existe uma propriedade denominada ‘ponto de ignição’, que é a temperatura mínima para a ocorrência de uma combustão espontânea, sem a presença de uma fonte externa de ignição (como uma faísca).

Para que a combustão aconteça, é indispensável a presença de três elementos: o combustível (material que pega fogo), o comburente (geralmente o oxigênio) e o calor que inicia a reação



O ponto de ignição do álcool, por exemplo, é 363 ºC. Isso significa que, se por alguma razão, o álcool for aquecido até essa temperatura, ele pegará fogo, mesmo sem uma faísca para acendê-lo.

Já o fósforo branco (usado para fabricação de fogos de artifício e bombas de fumaça) possui ponto de ignição de apenas 34 ºC, uma temperatura extremamente baixa. Por ser capaz de se inflamar espontaneamente, mesmo em temperatura ambiente, esse sólido costuma ser armazenado em querosene, pois essa substância não possui oxigênio em sua composição, impedindo que o fósforo entre em combustão.

Materiais como carvão, feno, algodão, filmes antigos, estrume de vaca e até grãos de pistache possuem pontos de ignição baixos o suficiente para sofrerem esse tipo de combustão. Um exemplo de combustão espontânea ocorre em alguns biomas, como o pantanal e o cerrado. Em períodos de seca, incêndios pontuais podem acontecer.

O que podemos concluir é que, se a fênix não for composta por feno ou outro material de baixo ponto de ignição, dificilmente ela seria capaz de entrar em combustão espontânea. Mas podemos levantar uma hipótese final.

Diferentemente dos répteis, anfíbios e peixes, as aves e os mamíferos são endotérmicos (também chamados de ‘animais de sangue quente’), ou seja, são capazes de controlar a própria temperatura corporal e manter o corpo aquecido mesmo em ambientes mais frios. Talvez a fênix seja capaz de aquecer o próprio corpo a uma temperatura tão grande que a leve à combustão. Por se tratar de um pássaro mitológico, infelizmente não podemos encontrar um desses no mundo real e estudá-lo. Portanto, só nos resta fazer especulações e nos maravilharmos com suas belas aparições nos cinemas.


Frans Wagner
Graduando em química e mediador do Centro de Ciências,
Universidade Federal de Juiz de Fora

Ingrid Gerdi Oppe
Mestranda em educação em química,
Universidade Federal de Juiz de Fora

Lucas Mascarenhas de Miranda
Físico e divulgador de ciência no canal Ciência Nerd
Universidade Federal de Juiz de Fora
Revista Ciência Hoje

terça-feira, 14 de junho de 2016

Gregos e egípcios ainda acreditam nos deuses de sua mitologia?

Tiago Cordeiro |


Os egípcios não, e os gregos... mais ou menos. No caso do Egito, a religião politeísta estava no centro da vida social desde 3200 a.C. até o século 4, quando os romanos, que já dominavam aquelas terras fazia 400 anos, decidiram que todas as suas colônias deveriam ser cristãs. Posteriormente, o país aderiu ao islamismo - hoje, 90% da população é muçulmana e o restante é quase todo cristão copta. Já os gregos passaram por um processo bem parecido: dominados pelos romanos, puderam manter seus deuses até o século 4, quando aderiram ao cristianismo. Atualmente, o país tem 98% de cristãos ortodoxos e só permite a expressão religiosa do judaísmo e do islamismo. Mas um grupo começou, na década de 1990, a tentar resgatar as antigas tradições. Eles se reúnem nos antigos templos para homenagear Zeus, Ísis e Apolo. No dia 21 de junho, por exemplo, realizam um festival em homenagem a Prometeu. Chegam até a realizar batizados e casamentos (sem reconhecimento oficial). Apesar de se levarem muito a sério, são perseguidos pelo governo.

PERGUNTA Suzana Vidorette Zanchetta, Araras, SP

FONTES Sites www.ysee.gr e www.friends-classics.demon.co.uk

CONSULTORIA Robert Parker, historiador e professor de história antiga da Universidade de Oxford
Revista Mundo Estranho

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Quem eram os centauros?



Eram seres fabulosos da mitologia grega, metade homem e metade cavalo, que habitavam as regiões da Arcádia (Peloponeso Central) e Tessália (sul da Macedônia). De acordo com a crença, teriam surgido de uma união proibida entre Íxion, rei da Tessália, e a deusa Hera, mulher de Zeus. Não há consenso sobre a formação do mito, mas é provável que tenha sido inspirado em tribos selvagens das regiões mais agrestes da Grécia ou mesmo em cavalarias nômades da Ásia Central (hunos, turcos, citas, cimérios ou sarmátios). A receita inclui, seguramente, o fascínio que os cavalos, viris e velozes, exercem sobre o ser humano desde a antigüidade. "A história dos centauros está quase sempre associada a episódios de barbárie", diz o historiador e mitólogo Cid Vasques, da PUC de São Paulo. Um dos qüiproquós atribuídos aos centauros aconteceu no casamento de Pirítoo, rei dos lápitas, quando, embaladas pela fartura de vinho, as bestas tentaram raptar ninguém menos que a noiva.
Os melhores e piores momentos dessa festa de arromba foram incluídos nos relevos do Partenon grego e, mais tarde, serviram de inspiração em obras de arte pagãs e renascentistas, colaborando para a manutenção do mito ao longo dos séculos. Não faltam histórias sobre a índole radical dos centauros, mas é certo que nem todos agissem como celerados o tempo todo. Há registros de que também sabiam se comportar com sabedoria, demonstrando habilidades especiais na equitação (por razões óbvias), caça, música e medicina. Um desses homens-cavalos, Quíron (ou Quirão), foi instrutor e professor de Aquiles, Heráclito, Jasão e outros heróis da mitologia grega.

Revista Mundo Estranho

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Mitologia dos Orixás


Livro conta sobre Mito dos Orixás
Seitas, religiões e mitos são temas correntes das obras do sociólogo e professor da USP Reginaldo Prandi que lança pela Companhia das Letras Mitologia dos Orixás

Através de contos curtos, sem autor, protagonizados por deuses e deusas, semideuses e heróis divinizados, Reginaldo Prandi conta sobre as origens da religião dos orixás no livro Mitologia dos Orixás, lançado na semana passada pela Companhia das Letras. O livro é uma coleção de 301 relatos mitológicos. As histórias são acompanhadas por ilustrações do artista
plástico Pedro Rafael e por fotos de todos os orixás que se manifestam em cerimônias do candomblé no Brasil

Ao narrar episódios com Exu, Ogum, Iemanjá e Iansã, Mitologia dos Orixás chama a atenção para o vasto patrimônio cultural deixado pelos negros iorubás ou nagôs. O culto aos deuses negros que sobreviveu e prosperou em países da América - em particular no Brasil e em Cuba -, nos últimos anos, tem chegado até a Europa. A obra ainda traduz o que os orixás fazem, querem e prometem. Na sociedade tradicional dos iorubás, é pelo mito que se alcança o passado, se interpreta o presente e se prediz o futuro.

Seitas, religiões e mitos são temas correntes das obras do sociólogo e professor da USP. Prandi recentemente lançou os livros Caminhos de Odu, Um sopro do Espírito: a renovação conservadora do catolicismo carismático, que foi traduzido para o italiano.

Mitologia dos Orixás, de Reginaldo Prandi, 642 págs., editora Companhia das Letras

segunda-feira, 21 de março de 2011

Os mitos gregos e sua influência na cultura ocidental

Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
Reprodução

Poseidon ou Netuno, o deus dos mares

Ao escutarmos a palavra "mitologia", quase automaticamente a associamos à palavra "grega". De fato, a mitologia grega ganhou destaque sobre a mitologia de vários outros povos pelo própria influência que a civilização e o pensamento grego exerceram sobre o mundo, em particular sobre o Ocidente. Para se ter uma idéia dessa influência, basta lembrar que a filosofia e a matemática, por exemplo, são "invenções" gregas.

Da mesma maneira, a maioria das palavras que dão nome às ciências têm origem grega: física, geografia, biologia, zoologia, história, etc. Também vêm do grego as palavras que designam os relacionamentos dos seres humanos entre si e em sociedade. É o caso de palavras essenciais, comoética, política e democracia.

Herança grega

Se conseguimos compreender a importância da herança grega para nossa civilização contemporânea - que está cerca de 3000 anos distante dela - não é difícil imaginar a influência que os gregos exerceram nas civilizações que lhes eram mais próximas em termos temporais. É o caso dosromanos, por exemplo, que dominaram a Grécia política e militarmente. No entanto, culturalmente, adaptaram-se aos modelos gregos.

Mas podemos ir mais além. Se o fim do Império Romano do Ocidente, em 476 d.C., representa o fim da influência greco-romana nos padrões culturais do mundo ocidental, que passou a ser modelado pelo cristianismo, por outro lado, a cultura e a mitologia greco-romana são retomadas ao fim da Idade Média no período que ficou conhecido como Renascimento, bem como no século 18, quando se desenvolve um movimento cultural conhecido como Neoclassicismo.

Religião e arte

Por outro lado, é importante deixar claro que a mitologia grega ou greco-romana, em suas origens mais remotas está ligada a uma visão de mundo de caráter religioso. Ao contrário, à medida que avançamos no tempo em direção aos nossos dias, a mitologia vai se esvaziando do significado religioso e ganhando, principalmente, um caráter artístico. Em outras palavras, no século 15, ao retratar uma deusa greco-romana como Vênus, o pintor Sandro Botticelli não a encarava como uma entidade religiosa, mas como um ideal estético de beleza.

Na verdade, mesmo em termos de Antigüidade, é muito difícil fazer uma separação entre mitologia e arte. A arte da Grécia antiga, por exemplo, trata essencialmente de temas mitológicos. E foi através da arte que tomamos contato com a mitologia grega: além de uma grande quantidade de templos (arquitetura), de esculturas, baixo-relevos e pinturas, a literatura grega é a principal fonte que temos dessa mitologia. Em especial, podemos destacar a obra de Homero, a "Ilíada" e a "Odisséia", que datam provavelmente do século 9 a.C., e a de Hesíodo, "Teogonia", escrita possivelmente no século seguinte.

Homero e Hesíodo

Essas três obras podem ser consideradas as fontes básicas para o conhecimento da mitologia grega. A "Teogonia" narra a origem dos deuses (Theos, em grego, significa deus). Já a "Ilíada" e a "Odisséia" tratam de aventuras de heróis, respectivamente Aquiles e Odisseu, embora a participação dos deuses em ambas as narrativas sejam fundamentais. No entanto, além delas existem ainda muitas outras obras antigas que têm como personagens entidades mitológicas - sejam deuses, semi-deuses ou heróis.

Entre elas, merecem destaque as tragédias (obras teatrais) de Ésquilo, Sófocles e Eurípedes, pois através delas conseguimos perceber com maior facilidade o significado simbólico que os mitos têm para a própria existência humana. Por meio delas, talvez se evidencie mais o significado que os mitos têm em termos psicológicos, que acabaram levando psiquiatras como Sigmund Freud e Carl Jung a analisar o significado dos mitos.

Vamos deixar de lado, porém, o significado ou os significados dos mitos. Tudo o que se disse até agora teve como exclusiva função apresentar o contexto que envolve os mitos apenas para podermos apresentar a você, leitor, os próprios mitos, ou melhor, pelo menos alguns deles.

A luta pelo poder

É interessante começar dizendo que os gregos não acreditavam que o universo tivesse sido criado pelos deuses. Ao contrário, eles acreditavam que o universo criara os deuses. Antes de mais nada, existiam o Céu e a Terra, que geraram os Titãs, também chamados de deuses antigos. O mais importante deles foi Cronos (ou Saturno, para os romanos), que reinou sobre todos os outros. No entanto, o Destino - uma entidade à qual os próprios deuses estavam submetidos - determinara que Cronos seria destronado por um de seus filhos. Por isso, mal eles saíam do ventre materno, Cronos os devorava.

Réia, sua mulher, resolveu salvar seu último filho, escondendo-o do marido. Este filho, Zeus, cumpriu a profecia, destronou Cronos e retirou de seu estômago todos os irmãos que haviam sido devorados. Com eles, Zeus passou a reinar sobre o mundo, de seu palácio no topo do monte Olimpo. A corte de Zeus era formada por outros onze deuses, seus irmãos, sua esposa e seus filhos, como se vê no quadro que segue:

Os doze deuses olímpicos
Nome grego
Nome latino
Características
Zeus
Júpiter
Era o senhor do céu, o deus das nuvens e das chuvas, e tinha no raio a sua maior arma. No entanto, não era onipotente. Era possível opor-se a ele ou mesmo enganá-lo.
Poseidon
Netuno
Irmão de Zeus, era o senhor do mares e ocupava o segundo lugar na hierarquia do Olimpo.
Hera
Juno
Irmã e mulher de Zeus. Era a protetora dos casamentos. Muito ciumenta, vingava-se sempre dos constantes relacionamentos adúlteros do marido.
Hades
Plutão
Dominava o mundo subterrâneo, onde habitavam os mortos: o Tártaro, onde eram punidos os vilões, o Elíseo, onde eram recompensados os heróis.
Palas Atena
Minerva
Gerada da cabeça de Zeus, era sua filha favorita e a deusa da sabedoria.
Apolo
Febo
Filho de Zeus e Leto, era identificado com o Sol e considerado o deus da música e da cura - artes que ensinou aos homens
Ártemis
Diana
Irmã gêmea de Apolo, era a deusa da caça e da castidade.
Afrodite
Vênus
Deusa do amor e da beleza, que a todos seduzia, fossem deuses ou simples mortais.
Hermes
Mercúrio
Filho de Zeus e mensageiro dos deuses, dos quais era o mais esperto ou astuto. Por isso, protegia comerciantes e ladrões.
Ares
Marte
Filho de Zeus e Hera, é o deus da Guerra, considerado, por Homero, "a maldição dos mortais".
Hefesto
Vulcano
Deus do fogo, ferreiro e artesão, que fabricava os utensílios e as armas de deuses e heróis.
Héstia
Vesta
Era o símbolo do lar e foi mais cultuada pelos romanos que pelos gregos.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Hades mitológico: o Príncipe das Trevas

Tereza Kawall


Quando descoberto, Plutão recebeu um dos epítetos atribuídos a uma importante divindade greco-romana, o deus Hades. No panteão da mitologia geco-romana, Hades era divindade misteriosa e temida. “Príncipe das Trevas”, “Deus do Mundo Subterrâneo”, destino final da sombra dos mortos. Seu nome significa “o invisível”. Era também conhecido por Plutão, que significa “rico”, pois era proprietário de todas as riquezas que existem sob a Terra.

Hades era filho de Cronos (o Tempo) e de Réia (deusa da Terra), e irmão de Zeus (rei dos deuses) e de Posêidon (deus do mar). Acredita-se que durante a titanomaquia recebeu dos ciclopes um capuz ou capacete que tornava seu portador invisível. Na partilha que se seguiu à luta, coube-lhe o controle do mundo subterrâneo e dos mortos.

Hades aparece raramente nas lendas, embora seja muito mencionado. Os principais episódios de que participa são o do rapto de Perséfone, filha de Demeter (deusa da fecundidade), com quem mais tarde se casou.
De Hades, nenhum favor ou benefício era esperado. Assim, ele não tinha templos e nenhum culto específico lhe era dedicado. Seu nome não era pronunciado, e a ele se referiam por meio de eufemismos. Era, também, raramente representado. Quando isso ocorria, mostravam-no com um cetro e, às vezes, com uma cornucópia, símbolo da fartura e da riquesa.
REVISTA PLANETA
EDIÇÃO 409

terça-feira, 27 de julho de 2010

Mitos e cosmologias indígenas no Brasil (parte 2)

Edição a partir dos textos Mitos e cosmologias indígenas no Brasil: breve introdução (1992) e Mito, razão, história e sociedade (1995), de Aracy Lopes da Silva

Povos Jê

Tempty Suiá, retirado do mito /Como Aconteceu Antes dos Brancos Chegarem. Fonte: Livro de História / Professores Indígenas do Parque Indígena do Xingu. Vol. 1. São Paulo: Instituto Socioambiental; Brasília: MEC, 1998(p.03).

Entre povos da família lingüística Jê, o cosmos é concebido como habitado por diferentes humanidades - a subterrânea, a terrestre, a subaquática e a celeste – que existem desde sempre. O tempo das origens é o da indiferenciação e da desordem, da convivência e da interpenetração daqueles domínios. Astros, como o Sol e a Lua, são gêmeos primordiais que vivem aventuras na terra e aqui deixam o seu legado, antes de partirem para sua morada eterna. Nos mitos Jê, há referências explícitas às atividades de subsistência e às práticas sociais de modo geral. Instituições sociais – a nomeação dos indivíduos, a guerra, o xamanismo... – têm no mito descritas as suas origens e exposta a sua essência.

Povos do Alto Rio Negro

Cobra Grande pintada sobre maloca no Alto Rio Negro. Foto: Beto Ricardo

Por contraste, caberia mencionar, a região do alto rio Negro, o noroeste amazônico, morada de povos de língua Tukano. No início dos tempos, antepassados míticos criaram o mundo que, antes, não existia. Das entranhas de uma cobra grande ancestral, que fazia o percurso do rio, saíram, em pontos precisos daquele percurso, os primeiros antepassados de cada um dos vários povos da região, determinando, assim, seus respectivos territórios, suas atribuições específicas e um padrão hierarquizado de relacionamento entre eles.

Em muitas cosmologias, as relações entre humanos e os demais seres são pensadas através da idéia da predação, numa metáfora que simbólica e logicamente aproxima caça, guerra, sexo e comensalidade. Ainda no alto rio Negro, o xamã parece estar encarregado de garantir que fluxos e volumes de energia vital compartilhada por humanos e animais mantenham-se em níveis adequados. Exageros na matança de animais deflagrariam, como contrapartida, epidemias e malefícios entre os homens, provocados por espíritos protetores dos animais. Um equilíbrio vital nas lembranças e o convívio com a idéia da morte são experiências diárias na apreciação e na condução da vida.

Povos Tupi-Guarani
Desde há mais de 500 anos, os não-índios produzem análises na tentativa de compreender as práticas sociais e as concepções cosmológicas dos Tupi-Guarani. Do espanto inicial à sistematização das informações dos cronistas, realizada entre as décadas de 1940 e 1950, passando pela catequese jesuítica e pelos episódios dramáticos da Conquista, é constante a referência central a temas como a guerra, o canibalismo, a vingança da morte através de novas guerras e novas mortes e novas vinganças.

Uma compreensão destes povos, suas sociedades e suas cosmologias, adequada aos tempos recentes de amadurecimento teórico e metodológico da antropologia, revela – apesar da grande diversidade existente entre elas, tanto no plano sociológico, quanto nas variações entre suas cosmovisões respectivas – a centralidade da noção de temporalidade como eixo sobre o qual constroem-se noções fundamentais como a de pessoa e de cosmos. Temporalidade está aliada às relações de alteridade que os Tupi-Guarani buscam sistematicamente situar fora do domínio social propriamente dito, encarnadas nos inimigos, nos espíritos, nos animais, nos mortos e nas divindades.

Bibliografia citada
FAUSTO, Carlos. “Fragmentos de História e Cultura Tupinambá: da etnologia como instrumento crítico de conhecimento etno-histórico”. In: CARNEIRO DA CUNHA, M. (org.). História dos Índios no Brasil. São Paulo, Cia das Letras/Edusp/SMC, 1992
GALLOIS, Dominique. Mairi Revisitada. São Paulo, NHII-USP/Fapesp, 1993.
LALLEMAND, Suzanne. “Cosmogonia”. In: AUGÉ, M. (org.) A construção do mundo. Edições 70, Lisboa, 1978.
LEACH, Edmund. “O Gênensis enquanto um mito”. In: Edmund Leach (org. Roberto da Matta), Ed. Ática/Grandes Cientistas Sociais/Antropologia 38, 1983, pp. 57-69.
LÉVI-STRAUSS, C. “A gesta de Asdiwal”. In: Antropologia Estrutural Dois, Ed. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 1976.
LOPES DA SILVA, Aracy. “A expressão mítica da vivência histórica: tempo e espaço na construção da identidade xavante”. In: Anuário Antropológico/82, Tempo Brasileiro/Universidade Federal do Ceará, Rio de Janeiro e Fortaleza, 1984. ------. “Mitos e cosmologias indígenas no Brasil: breve introdução”. In: Índios no Brasil. Grupioni, Luís Donisete Benzi (org.). São Paulo, Secretaria Municipal de Cultura, 1992. ------. “Mito, razão, história e sociedade”. In: LOPES DA SILVA & GRUPIONI (orgs.). A Temática Indígena na Escola. Brasília, MEC/MARI/Unesco, 1995.
SAHLINS, Marshall. Ilhas de História. São Paulo, Cultrix, 1989.
VIDAL, Lux. Grafismo Indígena. Estudos de Antropologia Estética. São Paulo, Studio Nobel/Fapesp/Edusp, 1992.
VIVEIROS DE CASTRO, E. & CARNEIRO DA CUNHA, M. “Vingança e Temporalidade: os Tupinambá”. In: Anuário Antropológico/85, Ed. Universidade de Brasília e Ed. Tempo Brasileiro, Brasília e Rio de Janeiro, 1986.

Povos Indígenas no Brasil

Mitos e cosmologias indígenas no Brasil (parte 1)


Mitos e cosmologia
Edição a partir dos textos Mitos e cosmologias indígenas no Brasil: breve introdução (1992) e Mito, razão, história e sociedade (1995), de Aracy Lopes da Silva

O que são mitos?
Uma das maneiras pelas quais os especialistas costumam conceber os mitos inclui sua definição como narrativas orais, que contêm verdades consideradas fundamentais para um povo (ou grupo social) e que formam um conjunto de histórias dedicado a contar peripécias de heróis que viveram no início dos tempos (no tempo mítico ou das origens), quando tudo foi criado e o mundo, ordenado. O que se enfatiza, dessa perspectiva, é o caráter de narrativas que os mitos têm.

O mito (assim, no singular) pode também ser definido com um nível específico de linguagem, uma maneira especial de pensar e de expressar categorias, conceitos, imagens, noções articuladas em histórias cujos episódios se pode facilmente visualizar. O mito, então, é percebido como uma maneira de exercitar o pensamento e expressar idéias. Quais seriam, porém, suas características distintivas?

Estas duas definições coincidem no que é essencial: primeiro, ambas indicam que os mitos dizem algo e algo importante, a ser levado a sério; segundo, ambas apontam também para o fato de uma das especificidades do mito estar na maneira de formular, expressar e ordenar as idéias e imagens pela qual se constitui como discurso, e pela história que narra; por fim, ambas sugerem uma relação particular entre o mito (ou os mitos), o modo de viver e pensar e a história daqueles povos responsáveis por sua existência.

De que falam os mitos?
Indiferenciação entre humanos e animais, que se relacionam como iguais; céu e terra próximos, que quase se tocam; viagens cósmicas, homens que voam, gêmeos primevos, incestos criadores; origens subterrâneas; dilúvios; humanidades sub-aquáticas; caos, conquistas, transformações... É o mundo tomando forma, definindo lugares e características de personagens hoje conhecidos.

São os temas míticos, que narram aventuras e seres primordiais, em uma linguagem que se constrói com imagens concretas, captáveis pelos sentidos; situadas em um tempo das origens, mas referidas ao presente, encerrando perspectivas de futuro e carregando experiências do passado. Assim, complexos, são os mitos.

São, também, extremamente variados, já que são criações originais de cada grupo com identidade cultural própria, referidos às suas condições de existência e à cosmovisão aí elaborada. Mas é igualmente inegável a sua condição de variações sobre temas comuns, compartilhados não apenas localmente mas, em alguns casos, em escala universal. Particulares e locais, universais e essencialmente humanos. Talvez resida aí uma parte do fascínio e do mistério dos mitos.

Em universos sócio-culturais específicos, como aqueles constituídos por cada sociedade indígena no Brasil, os mitos se articulam à vida social, aos rituais, à história, à filosofia própria do grupo, com categorias de pensamento elaboradas localmente que resultam em maneiras peculiares de conceber a pessoa humana, o tempo, o espaço, o cosmos. Nesse plano, definem-se os atributos da identidade pessoal e do grupo, que é distintiva e exclusiva, e construída no contraste com aquilo que é definido como o “outro”: a natureza, os mortos, os inimigos, os espíritos.

É central a definição do que seja a humanidade e de seu lugar na ordem cósmica em contraposição a outros domínios - habitados e controlados por seres de outra natureza - vistos, às vezes, como momentos diversos de um processo contínuo de produção da vida e do mundo. No cosmos concebido, há ordem, há classificação, há oposição lógica, há hierarquia, categorias inclusivas e exclusivas. Mas há também movimento e um jogo constante com o tempo, seja para suprimi-lo, permitindo aos viventes humanos um reencontro possível com o passado, os ancestrais, as origens, seja para torná-lo eixo da própria existência, destinada a completar-se e a constituir-se plenamente após a morte, na superação eterna das limitações da condição humana.

Mito e sociedade
Os mitos são um lugar para a reflexão, falam de complexos problemas filosóficos com que os grupos humanos devem se defrontar. Têm muitas camadas de significação e, são repetidamente apresentados ao longo da vida dos indivíduos que, à medida que amadurecem social e intelectualmente, vão descobrindo novos e insuspeitos significados nas mesmas histórias de sempre, por debaixo das camadas já conhecidas e já compreendidas.

É assim que as sociedades indígenas conseguem apresentar conhecimentos, reflexões e verdades essenciais em uma linguagem que é acessível já às crianças que entram em contato com questões cuja complexidade irão aos poucos descobrindo e compreendendo.

É por todas estas razões que os mitos são, em sua plenitude, de difícil compreensão. As verdades que dizem e as concepções que contêm, embora refiram-se a questões pertinentes a toda a humanidade, são articuladas e expressas com valores e significados próprios a cada sociedade e a cada cultura. Para chegar até elas é, portanto, essencial um conhecimento bastante denso dos contextos sócio-culturais que servem de referências à reflexão contida em cada mito.

Os mitos falam sobre a vida social e o modo como ela é organizada e concebida em uma determinada sociedade. Não a espelham, simplesmente: problematizam-na, tornam-na objeto de questionamento e incitam a reflexão sobre as razões da ordem social. Podem – e, de fato, muitas vezes o fazem – terminar por reafirmá-la (Lévi-Strauss, 1976), mas isto não se dá de forma mecânica.

O que são cosmologias?
São teorias do mundo. Da ordem do mundo, do movimento no mundo, no espaço e no tempo, no qual a humanidade é apenas um dos muitos personagens em cena. Cosmologias definem o lugar que os humanos ocupam no cenário total e expressam concepções que revelam a interdependência permanente e a reciprocidade constante nas trocas de energias e forças vitais, de conhecimentos, habilidades e capacidades que dão aos personagens a fonte de sua renovação, perpetuação e criatividade. Na vida cotidiana, essas concepções orientam, dão sentido, permitem interpretar acontecimentos e ponderar decisões. São expressas através da linguagem simbólica da dramaturgia dos rituais. Música, ornamentos corporais, entre outros recursos, permitem o contato com outras dimensões cósmicas, com momentos outros do mundo e do processo da vida (e da morte).


Mito e história
O mito, como a cultura, é vivo. Já que simultaneamente produto e instrumento de conhecimento e reflexão sobre o mundo, a sociedade e a história, incorpora como temas, os processos perpetuamente em fluxo nos quais se desenrola a vida social. São produtos elaborados coletivamente, nos quais novas situações são articuladas e tornadas significativas (como exemplos desses processos, ver Gallois, 1993 e Lopes da Silva, 1984).

Os mitos são parte da tradição de um povo, no entanto a tradição é continuamente recriada: caso contrário, perderia o sentido, seria apenas reminiscência, e não memória de experiências passadas que são tornadas referências vivas para o presente e para o futuro. Os mitos, assim, mantêm com a história uma relação de intercâmbio, registrando fatos, interpretações, reduzindo, por vezes, a novidade ao já conhecido ou, inversamente, deixando-se levar pelo evento, transformando-se com ele (Sahlins, 1989; Fausto, 1992).

Há até pouco tempo, as sociedades indígenas eram entendidas, pelos estudiosos, como sociedades “sem história”. Imaginava-se essas sociedades voltadas para o passado mítico, empregando sua criatividade no sentido de manter-se igual a si mesma, negando o fluxo da história, neutralizando as transformações e reconhecendo como processos, apenas os de recomposição do modelo tradicionalmente seguido. Foram assim concebidas num primeiro momento dos estudos antropológicos e, em consonância com isto, foram definidas como sociedades “tradicionais, sagradas e fechadas” sobre si mesmas, imunes à mudança. Desta perspectiva, os povos indígenas só “entravam na História” a partir de seu contato com os “brancos”, como partícipes da história ocidental.

Estas idéias foram forçosamente revistas. Percebeu-se que aí havia uma visão etnocêntrica que impedia a compreensão das sociedades nativas em seus próprios termos. Sabe-se hoje (e isto é tema atual de inúmeras pesquisas) que as culturas humanas desenvolvem variadas lógicas históricas, maneiras de pensar, relacionar-se e viver os processos históricos.

Panorama da Diversidade
Veremos referências mais concretas aos modos indígenas específicos de conceber o cosmos e de se situar nele. Segue a ilustração, feita aqui apenas como ponto de partida.

Temas comuns
A recorrência de assuntos, noções, figuras e imagens nas mitologias indígenas sul-americanas foram objeto da obra consagrada de Claude Lévi-Strauss, que revelou, por debaixo e através das variações locais, problemáticas comuns. O simbolismo prolífico e as imagens ricas e diversificadas dão concretude às noções abstratas, filosóficas, que expressam a visão indígena do mundo. Simetrias, inversões, valorações antagônicas que se alternam, homologias, alteração de ênfases... são mecanismos da lógica do mito e, nesta medida, da lógica do pensamento humano, ambos postos em movimento para propiciar a reflexão sobre oposições, tais como a de natureza/cultura; vida/morte; homem/mulher; particular/geral; identidade/alteridade. As mitologias e as cosmologias indígenas tratam, portanto, de temas com que se preocupam todos os homens, com menor ou maior grau de elaboração, expressão ou consciência. São temas, como se vê, que remetem à essência do que significa ser humano e estar no mundo. Por isto mesmo, apesar do estranhamento inicial trazido por signos desconhecidos - que carregam concepções inesperadas, articuladas a teorias cuja tradução escapa à primeira aproximação - a comunicação é possível e se dá não só na pesquisa e na divulgação, como também fascina e desafia.

Povos Indígenas no Brasil

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Mito e verdade: os deuses gregos em Walter Otto


Mito e verdade: os deuses gregos em Walter Otto

Autor buscou a verdade dos mitos gregos além dos textos e imagens em que aparece

Qual é o estatuto dos mitos gregos em nosso mundo? O que chamamos de “mitologia grega” tem para nós o mesmo significado que qualquer outra? Impossível colocar essas questões sem entrar na arena de um grande debate. Os próprios conceitos de “mitologia” e “mito” suscitam, hoje, séria discussão; questiona-se a invenção algo caprichosa de um objeto de contornos pouco claros, inspirado em uma espécie de fantasma da erudição clássica: um produto tardio de compiladores no crepúsculo do helenismo.

Claro, pode-se pensar no amplo conjunto (inabarcável, de duvidosa unidade) que motivou as compilações, na floração das narrativas por elas visadas, e dar-lhe o mesmo nome que às coletâneas: mitologia. Assim se fez. E assim se construiu um paradigma que historiadores e etnólogos passaram a aplicar universalmente, sem muito inquietar-se com a singularidade de sua origem. Mas hoje não poucos se perguntam se o emprego transcultural da noção de mito não seria abusivo. E não falta quem recorde a precária correspondência entre o significado hodiernamente atribuído a este nome e os diversos sentidos que davam os gregos a seu étimo. Todavia, mesmo os estudiosos tomados desse escrúpulo mal conseguem dispensar o emprego dos termos criticados.

A prova empírica da prática continuada parece dar razão a seus opositores. Volto, pois, à questão inicial: para nós, será a mitologia grega como qualquer outra? Aos olhos do mais famoso mitólogo contemporâneo ela é singular, cenário de um espantoso salto da razão mítica rumo ao conceito, acontecido só na Grécia. Resulta curioso que esta mitologia única, diferente de todas as demais, tenha fornecido o paradigma para a construção teórica do objeto “mitologia”, permitindo assim categorizar todas as demais.

Na verdade, Lévi-Strauss é fiel à tradição que constituiu esse paradigma. Basta para mostrá-lo recordar sua célebre afirmativa de que “um mito é percebido como mito por qualquer leitor no mundo inteiro”. Frisei a palavra sintomática: ela aponta para textos oriundos de tradição oral recolhidos e tornados em escritos por compiladores. Para o pesquisador, mitos são dados da operação “mitográfica”. Este recorte levou longe a bem-sucedida análise estrutural. Será possível outra maneira de pensar no assunto?

Falarei agora de um autor que buscou a verdade dos mitos gregos mais além dos textos e imagens em que eles aparecem: focalizando sua relação originária com o culto e tentando chegar à origem comum de ambas realidades (a narrativa mítica e a prática ritual). Os próceres das escolas de pensamento que em sua época dominavam os estudos clássicos reagiram com escândalo. Um deles, Martin Nilsson, declarou que não podia considerar científica a obra de Walter Otto; nela via um discurso religioso, coisa “de profeta”. Para este, os deuses gregos ainda vivem em nosso mundo. Walter Otto reconheceu que as histórias sagradas dos gregos perderam a autoridade de um consenso fiel. Mas também constatou que a ruptura do compromisso com a crença e o culto não bastou para as proscrever; não afastou efetivamente da consciência ocidental as figuras divinas da chamada Antigüidade Clássica. Na Poesia, na Arte, na Filosofia, elas continuam a iluminar-nos: segundo ele argumentava, nós ainda as evocamos “quando queremos falar em tom elevado do mundo e da existência”.

Eis o alvo da sua reflexão: reacender na consciência a aparição fascinante do divino que despontou no mundo helênico. Para Otto, os deuses da Hélade ainda nos falam — desde uma profundeza que teimamos em ignorar, quando nos cingimos à superfície de nossa própria cultura. Nós os olvidamos, mas eles retornam sempre, graças ao brilho verídico de sua essência… Seriam testemunho disso as iluminações de modernos homens de gênio como Goethe, Winckelmann, Schelling, Hölderlin, que falaram deles com fervor…

Otto buscou reviver a teofania original, contemplar a criativa teoria dos deuses gregos. Quis abrir-se ao divino, que para ele só pode ser vivenciado: dádiva gratuita e impossível de forçar, pois as musas só se aproximam de homens musicais, segundo ele dá a entender em seu pequeno mas admirável livro intitulado Teofania. Entende-se que este filólogo profundamente erudito tenha, afinal, optado por um método que merece ser chamado de poético. É fácil identificar seu guia máximo na reflexão sobre os deuses gregos: embora reconhecesse que o culto de Apolo, Ártemis, Hermes, Atena, Afrodite etc. pré-existiu ao mundo helênico, ele destacou a “nova revelação” dos deuses na obra de Homero. Seu famoso livro Os deuses da Grécia concentra o foco na religião homérica; mas a partir daí ele consegue derramar luz sobre todo o universo da cultura grega (que Homero iluminou) e assinalar por contraste quanto ficou “de fora”, aquém e além… Assim, ele já abria espaço nessa obra para uma outra que pouco depois escreveu, dominada pela dança fascinante de Dioniso. Seu enfoque apaixonado, fervoroso, do mundo dionisíaco provocou espanto. Era consenso na época que Dioniso seria um deus tardiamente chegado ao mundo grego; Otto sustentou que ele era uma divindade antiga na Hélade.

Pouco depois de sua morte, uma grande descoberta arqueológica lhe daria razão, contra Nilsson e outros helenistas que o achavam delirante… Otto também antecipou Lévi-Strauss na resoluta valorização de uma obra singular de Schelling, a Philosophie dermythologie — e particularmente na adoção de um princípio hermenêutico que este filósofo aí preconizou, recomendando, em vez da costumeira -exegese alegórica, adotar uma interpretação “tautegórica” dos mitos, que pelos próprios mitos devem ser explicados. Foi entusiasta de Nietzsche quando entre os helenistas ainda se hesitava em acatar a inspiração do filósofo praticamente proscrito da Filologia clássica em conseqüência do ataque de Willamowitz Moellendorf, o princeps philologorum. Walter Otto teve, sim, muito de vate; foi muitas vezes “acusado” de profeta e poeta. Sua obra continua a brilhar à luz de uma amorosa contemplação dos deuses da Grécia.

Ordep José Serra é bacharel em Letras e mestre em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UNB). Professor adjunto do departamento de Filosofia, Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Traduziu, entre outros, os livros Os deuses da Grécia e Teofania, ambos de Walter Otto, todos pela Odysseus Editora, de São Paulo

Revista CULT

sábado, 10 de julho de 2010

As fontes literárias e arqueológicas para o estudo da mitologia grega


As fontes literárias e arqueológicas para o estudo da mitologia grega

Os gregos antigos não deixaram gravações de cânticos, poemas ou fábulas, mesmo assim muita coisa chegou até nós

Como podemos conhecer a mitologia grega? A resposta pode parecer óbvia: por meio de suas histórias, não é mesmo? Bem, mas essas histórias chegaram até nós por diversos meios. Para que se possa estudar o passado, sempre temos de recorrer às fontes, aos documentos. Os gregos antigos não nos deixaram gravações dos seus cânticos, poemas ou de suas fábulas, que se ouviam no dia-a-dia das cidades gregas antigas: claro, não havia gravadores de voz. Tanto tempo depois, o que chegou até nós?

Em primeiro lugar, temos a tradição textual, todas as reproduções copiadas, durante séculos, dos escritos antigos, em duas línguas: grego e latim. A maioria das histórias mitológicas aparece em poemas antigos, como na Ilíada e na Odisséia, de Homero, e nos chamados Hinos homéricos, mas temos também uma poesia como a Teogonia de Hesíodo, que viveu por volta de 700 a.C. Outros grandes mananciais são as obras teatrais, as tragédias que retratam muitos personagens históricos e míticos, como o famoso caso de Édipo, de Sófocles (431 a.C.). A prosa, igualmente, apresenta muitas referências mitológicas, mesmo em obras sarcásticas como o Diálogo dos deuses de Luciano, do século 2 d.C. Por outro lado, como os gregos foram educados em sua mitologia através da transmissão oral, apenas relativamente tarde encontramos um acervo de mitologia grega. O primeiro acervo sobrevivente, e o melhor, data do século 1 ou 2 d.C. A autoria é geralmente atribuída ao grande gramático Apolodoro de Atenas e o livro intitulado A biblioteca, para indicar sua abrangência. Apolodoro é de grande importância para nós, e como a mais útil fonte isolada de mitologia grega, é sempre citada em todos os trabalhos que versam sobre o tema. Na verdade, ele não relata todos os mitos gregos, nem inclui todos os detalhes, mas fornece uma narrativa da maioria dos mitos que passaram a ter importância para além dos limites da cidade-estado local. É, sobretudo, sua interpretação do que ele julga ter importância que moldou nossa noção atual e relativamente estável do que entendemos por “mitologia grega”. Há ainda referências importantes em autores latinos, como nas Metamorfoses, de Ovídio (43 a.C. – 18 d.C.).

A Arqueologia tem produzido uma quantidade imensa de testemunhos sobre a religião e a mitologia grega antiga, a começar pelas inscrições em santuários e em outros lugares de culto, que nos permitem ter uma noção da devoção na religião olímpica em seu cotidiano. Os restos dos templos gregos mostram-nos a onipresença da mitologia entre os gregos. O templo de Apolo em Delfos, em uma paisagem montanhosa fabulosa, ainda hoje impressiona o visitante. O omphalós, ou umbigo, de mármore decorado, cópia romana do original grego, encontra-se no Museu de Delfos, e nos dá uma sensação muito direta do “umbigo do mundo”. Há, ainda, belíssimas representações na estatuária antiga, assim como nas moedas, nos vasos gregos pintados e até mesmo nas paredes romanas que reproduziam quadros mitológicos gregos. Um simples sarcófago podia mostrar imagens vívidas, como no caso de Neoptólemo, filho de Aquiles, que apedreja Plixena, filha do rei de Tróia. Personagens mitológicos como os centauros ganham vida nos relevos e pinturas antigas reveladas pela Arqueologia.

As fontes arqueológicas fornecem muitas informações independentes das obras literárias. O famoso cavalo de Tróia, usado para esconder os guerreiros gregos como um falso presente para os troianos, não aparece na Ilíada, apenas na Odisséia é mencionado, mas aparece em muitas representações antigas, como em vasos arcaicos de cerâmica. O namoro de Marte (Ares) e Vênus (Afrodite), retratado em uma parede da cidade romana de Pompéia, reproduz um quadro grego que mostra bem o caráter antropomorfo dos deuses gregos, assim como a morte de Penteu é retratada com emoção, ou como o saque de Tróia aparece algo real (para os antigos, o mito era uma história verdadeira). Hermes, o deus de tantas facetas masculinas, é às vezes apresentado como um jovenzinho.

As fontes, literárias ou arqueológicas, não falam por si só, nem são tão claras quanto podem parecer. Por isso, para que possamos estudá-las é necessário lermos também obras que interpretem a mitologia antiga e estabeleçam certos princípios de interpretação. Convém, portanto, ler aqueles estudiosos da nossa época que procuraram entender como a mitologia grega funcionava e fazia sentido. Talvez o autor mais relevante, para isso, seja o helenista francês Jean-Pierre Vernant, autor de inúmeras obras sobre a mitologia grega. Para um contato inicial, o mais saboroso, até para se ler com crianças, é o seu O universo, os deuses e os homens. Todos os seus livros para adultos são grandes guias. Em uma palavra, pode-se dizer que Vernant interpreta toda a mitologia como uma oposição binária entre princípios, como masculino e feminino, bosque e lar, rua e casa. Várias de suas obras estão traduzidas para o português.

Tendo uma leitura metodológica como essa, a leitura direta das fontes constitui o passo seguinte. O que indicar, já que há tanta coisa publicada? Essa será sempre uma escolha muito pessoal, a depender do gosto e dos interesses de cada um. A Ilíada, de Homero, na tradução espetacular de Haroldo de Campos, seria uma leitura tanto prazerosa como instrutiva, uma introdução geral. Em seguida, na mesma linha de uma versão direta do original grego e com imensa fidelidade, seria recomendável um clássico como As bacantes, de Eurípides, vertida por Trajano Vieira. Em ambos os casos, as traduções dão bem o gosto, no leitor, da especificidade do original antigo, das nuances dos personagens, dos inúmeros e importantíssimos trocadilhos e jogos de palavras.

As fontes arqueológicas podem ser bem acessadas em uma obra como Grécia, de Peter Levi, mas talvez o mais sensível seja assistir a vídeos de produtoras com assessorias científicas, como a BBC, History Channel, Discovery e National Geographic, alguns deles também disponíveis em CDs à venda na internet. Uma visita às coleções de peças clássicas no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (www.mae.usp.br) e do Museu Nacional do Rio de Janeiro (www.mnrj.ufrj.br) seria também de grande proveito.

Pedro Paulo A. Funari
é professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Coordenador-Associado do Núcleo de Estudos Estratégicos (NEE-Unicamp), autor de Grécia e Roma (São Paulo, Editora Contexto), entre outros livros

Bibliografia sugerida:

CAMPOS, Haroldo. Ilíada de Homero. São Paulo: Mandarim, 2002.
VIEIRA,Trajano. As bacantes. São Paulo: Perspectiva, 2003.
LEVI, Peter. Grécia, 2 volumes. Madrid: Del Prado, 1996 (em português).
VERNANT, Jean Pierre. O universo, os deuses e os homens. São Paulo: Cia das Letras, 2002.
—–. Mito e pensamento entre os gregos. 2a. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
MENELAOS, Stephanídes. Coleção Mitologia helênica (8 volumes), 2ª. ed. São Paulo: Odysseus Editora, 2005.

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