sexta-feira, 24 de março de 2017

A infância e a juventude do mais odiado ditador da História


Hitler: o ínicio
A infância e a juventude do mais odiado ditador da História

Luis Pereira


 Um jovem quase comum | Crédito: divulg. 
 
No filme A Queda, de Bernd Eichinger, o famoso ator Bruno Ganz interpreta Adolf Hitler em seus últimos dias, acuado no bunker da Chancelaria do Reich, em pleno processo de negação e declínio psicológico. A atuação magistral de Ganz fez com que muitos se perguntassem: “Podemos retratar Hitler como um ser humano?”. O historiador alemão Volker Ullrich defende que não só podemos como devemos. Ullrich é o autor de uma nova biografia do ditador nazista, Adolf Hitler Vol. 1 – Os Anos de Ascensão, 1889-1939 (Amarilys, 2016). O trabalho, aclamado pela crítica e best-seller instantâneo na Alemanha e na Inglaterra, é o primeiro tomo de uma obra em dois volumes que se propõe a preencher lacunas na bibliografia já existente e, principalmente, tratar do ser humano por trás da persona pública.

O simples processo de demonização, segundo o autor, é um erro perigoso, pois distorce a avaliação da verdadeira personalidade de Hitler, com suas contradições e antagonismos, deixando de lado os traços empáticos que fizeram dele um líder palatável às massas populares e às elites política e econômica da Alemanha. O objetivo é desconstruir o mito Hitler, presente de variadas maneiras na literatura e no debate público após 1945 como uma “fascinação (negativa) pelo monstro”. Na nova obra, Hitler é “normalizado”, mas isso não o torna “mais normal”; pelo contrário, ele parece ainda mais indecifrável. Sua imagem torna-se mais complexa, um homem de muitas faces, sempre adaptadas a diferentes públicos.


Baseando-se em pistas conhecidas e documentos revelados apenas recentemente, Ullrich discute que, se não fosse pela Primeira Guerra Mundial e as revoluções sociais que ela provocou na Europa, talvez Hitler permanecesse uma figura desconhecida às margens da História. Suas origens são, para dizer o mínimo, nebulosas. “Não sei de nada sobre a história da minha família. Nessa questão, sou uma pessoa muito mal informada (...) sou completamente desprovido de sentimentos familiares e não tenho nenhuma ligação com um clã. Isso não é de minha natureza. Eu pertenço à minha comunidade étnica”, confessou Hitler em 1942, num de seus muitos monólogos.
Talvez ele visse boas razões para ocultar sua ascendência.



O bebê Adolf Hitler

O pai de Hitler, Alois Schicklgruber, era um filho ilegítimo adotado por um tio postiço, Johann Nepomuk Hiedler (irmão mais novo do marido da mãe de Alois), numa história enrolada que sugere algum escândalo familiar abafado. Somente aos 19 anos Alois foi registrado como filho legítimo de Johann Georg, o irmão de Johann Nepomuk. Nessa ocasião, o notário alterou o sobrenome Hiedler para Hitler. Alois Hitler viria a ser um funcionário-modelo na alfândega de Braunau. Em 1885, após ficar viúvo pela segunda vez (as taxas de mortalidade na época eram altíssimas), Alois casou-se com Klara Pölz. Klara era neta do tio postiço de Alois. Portanto, se de fato Alois era filho de Johann Georg, os dois seriam primos em segundo grau. Se, como se suspeita, fosse filho de Nepomuk, o parentesco seria ainda mais próximo, o de tio e sobrinha. Em 1889, nascia Adolf Hitler, o quarto filho do casal (os três primeiros morreram cedo). Boatos sobre uma possível origem judaica de Hitler (que circulavam desde a década de 1920) não se confirmaram. Ainda assim, é irônico que o ditador que exigia um certificado de “ascendência ariana” de cada cidadão alemão não fosse capaz de demonstrar a própria.

Existem poucos testemunhos sobre os primeiros anos de vida de Adolf Hitler. As informações publicadas por ele sobre o ambiente familiar no primeiro capítulo de Minha Luta certamente são uma mistura de meias-verdades e invenções, com as quais tentou angariar simpatias e tornar crível sua vocação política como líder de um novo Reich alemão. Sabe-se que Alois fora um pai severo, adepto de castigos físicos. A experiência da violência doméstica foi interpretada como uma das causas para a política assassina do ditador. No entanto, Ullrich adverte que se deve tomar cuidado ao tirar conclusões: naquela época, castigos físicos eram comumente usados com finalidade educativa. Um pai repressor e uma mãe amorosa não eram uma combinação rara entre as famílias de classe média por volta da virada do século. Hitler, portanto, teve uma infância bastante normal.


Juventude incerta

Nos anos escolares
Adolf Hitler fora um excelente aluno nos primeiros anos escolares. Como todos os garotos de sua idade, era leitor dos romances de aventura do escritor alemão Karl May (dizem que durante a guerra, principalmente nas situações mais difíceis, Hitler citava um dos heróis de May, o índio apache Winnetou, como um “paradigma de comandante militar”). Entretanto, quando fez a transição para a escola secundária em Linz, Hitler passou a ser mais um entre muitos. Terminou por abandonar a escola, após reprovações e resultados medíocres.

O fracasso em terminar o grau secundário custou caro, quando ele se inscreveu para o exame de admissão na Academia de Belas-Artes de Viena, já que o diploma era um requisito básico. Hitler (mais livre após a morte do pai, em 1903) passara a fazer visitas frequentes à capital, em que se deleitava com as paisagens da metrópole austríaca, com seus museus, a ópera, o Parlamento e a magnífica Ringstrasse. O fracasso acadêmico, que ele não contara à família ou aos amigos, foi difícil de aceitar. Muitos atribuem a perseguição aos intelectuais e seu desprezo pela intelligentsia alemã como resultado dessa rejeição.


O ano de 1907 foi marcado pela morte da mãe, em consequência de um câncer de mama. “Em meus quase 40 anos de atividade, nunca vi um jovem tão indescritivelmente triste e arrasado como o jovem Adolf Hitler”, escreveu o médico judeu que tratara Klara Hitler, doutor Eduard Bloch, em uma anotação de 1938. Não há indícios de que o tratamento médico feito por Bloch tenha sido a causa do patológico ódio antissemita de futuro Führer. No próprio dia do funeral, Hitler foi até o consultório dele para agradecer pelos cuidados com a mãe. Em 1938, quando o líder fez sua entrada triunfal na “cidade natal” Linz, após ter anexado a Áustria, dizem que perguntou imediatamente pela saúde do “bom e velho doutor Bloch”. Dentre todos os judeus de Linz, Hitler colocou o médico sob a proteção da Gestapo. No final de 1940, a família Bloch conseguiu emigrar em segurança para os Estados Unidos.

Há relatos de que Hitler também manteve relações cordiais com judeus nos abrigos e pensionatos vienenses em que morou entre 1908 e 1913. Viena era na época a grande metrópole europeia, centro de uma vida econômica e cultural efervescente, com uma enorme comunidade de intelectuais e artistas de vanguarda. Naquela cidade, os problemas do Estado multinacional austro-húngaro podiam ser observados como numa lente de aumento. Nenhuma outra apresentava uma taxa de imigrantes tão elevada. A reação dos habitantes locais ao “perigo” de uma “infiltração estrangeira” produzira desde o final do século 19 a criação de associações e partidos que estampavam o nacionalismo radical entre as suas bandeiras. A imigração maciça, principalmente de judeus orientais, despertou temores de uma “judaização” de Viena; o sucesso dos imigrantes judeus, bem-educados e orientados a subir na vida, despertou inveja e amargura nos habitantes nativos.

Hitler escreve em Minha Luta que os anos em Viena foram de miséria e pobreza. Outra meia-verdade, pois, enquanto durou a herança materna, a pensão de órfão e a ajuda que recebia de uma tia, Hitler teve condições de manter seu estilo de vida habitual: não fazer nada. Quando a tia que o socorria também faleceu, ele então teve de buscar o próprio sustento.

Artista sem futuro
No outono de 1909, Hitler chegou a viver num abrigo para moradores de rua, onde conheceu Reinhold Hanisch. De manhã cedo, os ocupantes do abrigo tinham de deixar o lugar, retornando somente à noite. Durante o dia, Hanisch e Hitler tentavam ganhar alguns trocados fazendo bicos. Ao saber da inclinação artística do colega de abrigo, Hanisch sugeriu que Hitler pintasse os cartões-postais da cidade para que ele os vendesse em bares e restaurantes, dividindo a receita. O sucesso da empreitada foi maior que o esperado e em 9 de fevereiro de 1910 ambos conseguiram trocar o abrigo por um pensionato masculino. Hitler viria a morar ali pelos três anos seguintes.
A parceria com Hanisch durou pouco.

Para que o negócio fosse rentável, era preciso pintar um quadro por dia, como cobrava o colega. Mas Hitler argumentava que se tratava de um trabalho artístico, para o qual era necessário estar inspirado; quando não estava, passava o dia lendo jornais ou participando de discussões políticas na sala de leitura do pensionato. Em agosto de 1910, Hitler acusou Hanisch de tê-lo enganado e deixado de pagar por algumas telas vendidas. Passou então a vender suas obras por meio de Jacob Altenberg e Samuel Morgenstern, dois judeus proprietários de uma loja de artes. Ambos pagavam a Hitler muito bem, permitindo-lhe independência financeira. Além de preferir fazer negócios com comerciantes judeus, Hitler mantinha boa convivência com outros moradores do pensionato que eram de origem judaica. O ex-sócio Hanisch viria a afirmar que “naquela época, Hitler não odiava os judeus. Isso só aconteceu mais tarde”.

O contraste entre o pintor de telas parceiro de marchands, colega de quarto de judeus e o futuro ditador genocida é desconcertante. Para Ullrich, uma coisa é certa: mesmo que quisesse, Hitler não teria conseguido evitar contato com correntes antissemitas naquela Viena da virada do século. Políticos vienenses que Hitler admirava batiam constantemente na tecla do inimigo externo judeu: Georg von Schörener, o líder do pangermanismo austríaco a quem Hitler cita como influência fundamental em Minha Luta, associou sua campanha pelo “germanismo” com um antissemitismo até então desconhecido na Áustria; o prefeito Karl Lueger não media palavras ao dizer que “a Grande Viena não deve se transformar numa Grande Jerusalém”, além de acusar a “imprensa judaica” de compor uma imagem estereotipada de judeus abastados, intelectualmente refinados e arrogantes. Seria uma surpresa se o jovem Hitler não tivesse sido influenciado por isso.

Um outro aspecto desses anos que alimenta a curiosidade de historiadores é a suposta homossexualidade de Hitler. Na contramão de diversas obras que veem nas ações do ditador indícios de uma orientação sexual frustrada e reprimida, Ullrich não se convence de que Hitler pudesse ter tido relações homoafetivas no período em que morou nos pensionatos masculinos. No entanto, inúmeras fontes dão conta de um comportamento celibatário do futuro Führer. Numa metrópole vanguardista e de costumes em ebulição como era Viena, em que peças teatrais de Arhtur Schnitzler e quadros permissivos de Gustav Klimt causavam escândalo, o jovem Hitler vivia um ascetismo quase monástico.

Ao que tudo indica, ele também não recorria a prostitutas. Segundo um amigo da época, isso se dava principalmente pelo medo de contrair uma doença sexualmente transmissível bastante comum na época: a sífilis. Mas talvez a ideologia pangermanista de Schörener também tenha desempenhado um papel nisso. Além de defender a superioridade cultural dos alemães, a dissolução do império multinacional Habsburgo e a formação de um Império Alemão único, Schörener defendia também o celibato até os 25 anos, a fim de tonificar a força física e intelectual. Se Hitler se manteve fiel a esse mandamento de castidade, ele ainda não tinha dormido com nenhuma mulher ao deixar Viena, aos 24 anos de idade.

Hitler já pensava em emigrar para a Alemanha havia algum tempo. Munique era a cidade que mais o atraía. Ali, ele frequentou o meio boêmio de Schwabing e seguiu ganhando a vida pintando paisagens. Sua senhoria o descreveu como um jovem retraído, que se fechava no quarto como um eremita. Para Ullrich, a falta de contatos era apenas um sinal externo de sua profunda insegurança interna. Após um ano na cidade, Hitler teve de admitir que sua carreira artística não lhe oferecia futuro. Somente o início da Primeira Guerra Mundial, no começo de 1914, o libertaria daquele estado frustrante e sem perspectivas.

Primeira Guerra Mundial

Cabo Hitler
A escalada de hostilidades que se seguiu ao assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando produziu na Alemanha um estado de euforia patriótica a favor da guerra. O escritor Stefan Zweig viria a descrever esse momento “arrebatador” como “algo de que era difícil escapar”. Com o início do conflito, Hitler afirma ter obtido uma autorização do rei Ludwig III da Baviera para servir em um regimento bávaro apesar de sua nacionalidade austríaca. O mais provável é que naqueles dias tumultuados ninguém checasse com afinco a nacionalidade dos recrutas voluntários; do contrário, Hitler não poderia ter servido.

Em meados de outubro de 1914, o recruta Hitler enfrentou seu “batismo de fogo”. Seu regimento lutou em violentas batalhas homem a homem no front ocidental, tendo perdas imensas (de 3 500 oficiais, restaram 600). Em novembro, Hitler seria promovido a cabo, encarregado de levar mensagens e ordens dos comandantes de regimento até a linha de frente. Segundo Hitler, esse trabalho colocava todos os dias sua vida em risco. Para os soldados de trincheira, os mensageiros militares não passavam de oficiais de caserna. De uma forma ou de outra, Hitler escreveu em Minha Luta: “O horror assumiu o lugar do romantismo da guerra. O entusiasmo arrefeceu gradualmente e o júbilo excessivo foi sufocado pelo medo da morte”. Antes mesmo do final da guerra, a direita radical e os pangermanistas já haviam eleito bodes expiatórios para os revezes da Alemanha: as “atividades subversivas” de sociais-democratas e esquerdistas em geral, e a suposta falta de engajamento dos judeus no esforço de guerra. A despeito dos milhares de judeus que morreram nas trincheiras, foi convocada em 1916 uma “contagem de judeus” a fim de verificar a situação do serviço militar de judeus alemães (um primeiro passo para os registros que viriam a ocorrer nos anos seguintes). Em 1918, diante da derrota iminente da Alemanha, esses grupos intensificaram sua propaganda antissemita.

O rapaz tímido ainda estava para descobrir seus dons extraordinários de oratória, mas a Revolucão Alemã, que derrubou o kaiser e instaurou uma república parlamentarista de inspiração esquerdista, provocou em Hitler tal comoção que o convenceu a abdicar de suas ambições artísticas e entrar na política. Junte-se a esse político aspirante com patronos influentes no meio militar a reação das elites econômicas ao novo governo, a fobia contra a esquerda e o ressentimento contra os judeus, e temos montado o cenário para a ascensão de Hitler e do nazismo. O Hitler pós-guerra se reinventou completamente, para prejuízo de milhões de vítimas que ele viria a fazer em sua ascensão sanguinolenta ao poder. Uma ascensão que, como Ullrich defende, merece ser mais bem compreendida.
Revista Aventuras na História

11 maneiras medievais de identificar uma bruxa


Você fala com seu gato? Tem problemas de pele? Se vivesse na Idade Média, teria más notícias...

Redação AH
 
 
 Pero que las hay, las hay... | Crédito: Pixabay
Na Idade Média - ou melhor, até o século 18 e, dependendo do lugar, ainda hoje - ser acusada ou, mais raramente, acusado de bruxaria era uma sentença de morte. Assim sendo, eram precisos testes "rigorosos" antes de se decidir pela morte de alguém. Quem desse azar de estar numa crise de espinhas, podia ir parar na fogueira. Veja alguns desses testes.

1. 100 metros fundos
A acusada de bruxaria era arrastada para um rio ou lago, despida e amarrada. Então, era arremessado para ver se flutuava. A premissa era de que a água rejeitaria a bruxa - se, flutuasse era bruxa. Não flutuasse... que pena, né?

2. Anorexia mata
As inocentes deveriam ter mais peso que o texto sagrado. Se pesasse menos que uma Bíblia - que, na época em que eram enormes e manuscritas, podiam chegar a 80 kg - era bruxa.

3. Decoreba
A bruxa deveria recitar em voz alta, de memória e sem enganos, passagens das Sagradas Escrituras. O Pai Nosso era um dos trechos prediletos.

4. Teste do toque
A vítima da bruxaria era tocada pela bruxa que supostamente lhe enfeitiçou. Caso o toque provocasse reação, estava comprovado o sacrilégio.

5. Bolo incrementado
A urina da acusada era misturada a uma receita de bolo e entregue a um cão. Caso a pessoa sentisse as mordidas na própria pele, era considerada culpada.

6. Dermatologia
Essa ainda hoje é um clichê: bruxas têm verrugas na ponta do nariz. A pele era vistoriada. Verrugas, pintas, cicatrizes ou marcas de nascença podiam ser consideradas provas de que o diabo havia tocado a bruxa.

7. Exorcismo forçado
Uma pessoa possuída era posta na mesma sala que a suspeita, que era forçada a gritar para o demônio para sair do corpo da vítima. Caso melhorasse, a bruxaria estava comprovada.

8. Pesadelo
Se a ré fosse vista em sonhos ou aparições, era prova de que seria bruxa, já que as feiticeiras podiam projetar seu espírito para fora do corpo.

9. Toque do transe
Caso a suposta bruxa tocasse uma pessoa no meio de um transe ou ataque e ele melhorasse, estava comprovada sua culpa - valia a mesma lógica do item 7.

10. Cozinha macabra
Ter em casa equipamentos "próprios" para rituais de magia, como velas, certas plantas ou um pilão e morteiro para misturar ingredientes era um caminho direto para a fogueira.

11. Pets
Conversar com bichos de estimação, particularmente gatos, também era sinal de pacto com o demônio.
 Revista Aventuras na História

Como fazíamos sem... Absorvente íntimo?


Incomodada ficava sua vó.... ficava mesmo!

Redação AH

 Lavadeiras em quadro de artista colombiano, 1923 | Crédito: Eugenio Zerda

Dizia o comercial de TV que incomodadas ficavam as nossas avós. Ele tinha razão. Antes da invenção do absorvente descartável, a mulherada sofria. E improvisava.

De acordo com dados do Museu da Menstruação e da Saúde Feminina, na Antiguidade, em Roma, as mulheres enfiavam pequenos chumaços de lã no interior da vagina para conter o fluxo menstrual. Em algumas tribos da África, usavam rolinhos de grama. As gregas revestiam ripas de madeira com várias camadas de retalho. Já as japonesas se viravam confeccionando canudinhos de papel. Na Indonésia, fibras vegetais eram usadas na tentativa de absorver o fluxo, ao passo que, no Egito, canutilhos de papiro faziam as vezes de absorvente higiênico. Todas essas invenções eram intravaginais – por isso, era melhor deixar um pedacinho para fora, para facilitar a retirada.

Registros arqueológicos mostram que, desde o século 15 a.C, as mulheres já pensavam em alguma espécie de proteção para aqueles dias. Mas uma das referências mais conhecidas acerca do assunto é encontrada nos escritos deixados pelo grego Hipócrates, mencionando expressamente a utilização de protetores intravaginais entre suas contemporâneas – ele viveu de 460 a 370 a.C.

Durante toda a Idade Média uma opção eram as toalhinhas higiênicas, feitas de qualquer resto de tecido – não raro, elas levavam ao surgimento de coceiras, assaduras e irritações no corpo. De todo modo, qualquer coisa devia ser melhor do que o isolamento a que as mulheres de diversas tribos indígenas eram submetidas: elas ficavam longe dos olhos dos outros, sentadas numa espécie de ninho, que absorvia o sangue.

 
Soluções para higiene feminina em anúncio dos anos 1930

Só no século 19 têm início pesquisas voltadas ao desenvolvimento de apetrechos mais funcionais. Em 1933 o absorvente interno foi patenteado, mas a novidade só chegou ao Brasil 40 anos depois. Por outro lado, toalhas descartáveis já ocupavam as prateleiras desde o fim da Primeira Guerra. Algumas tinham o formato de uma calcinha, ficando presas à cintura, enquanto outras eram presas com alfinetes – os absorventes com fita adesiva chegaram em 1970.

Um alívio sem precedentes, que livrou as mulheres de preocupações, como a de o que fazer para que ninguém visse o varal coalhado de retalhos suspeitos – afinal, as moças de boa família não podiam expor suas intimidades.
Revista Aventuras na História

segunda-feira, 20 de março de 2017

Como fazíamos sem... dentista

Tratar dos dentes já foi um show de horrores

Marcus Lopes

 A dor, na tela de Caravaggio | Crédito: divulgação 

Antes de existirem os cirurgiões-dentistas, a humanidade passou por poucas e boas para tratar a dor de dente. Médicos, monges religiosos e até barbeiros exerciam o ofício, que, durante muito tempo, praticamente se resumia à mera extração – com muita dor, claro.


Em 2012, foi encontrado na Eslovênia, no Leste Europeu, um dos vestígios mais antigos da existência de um dentista. Um dente de aproximadamente 6,5 mil anos de idade foi achado com um preenchimento de cera de abelha na coroa. Os estudos mostraram que o material foi aplicado na época da morte do indivíduo, mas não se sabe se foi antes ou depois. Caso tenha sido antes, provavelmente era para diminuir a dor provocada por uma rachadura nas camadas de esmalte.

Documentos sumérios feitos em tabletes de argila dão conta que, em 2750 a.C., já havia procedimentos cirúrgicos em mandíbulas. Na mesma época foram encontrados, na região da Mesopotâmia, peças para limpeza dentária, como palitos de metal. Na Idade Média, os primeiros a exercer a odontologia foram os monges católicos, que também davam seus pitacos na medicina, realizando tratamentos e cirurgias, já que tinham maior acesso ao conhecimento do que a população em geral. Após a Igreja proibir essa prática, quem herdou a função foram os barbeiros, que teriam aprendido a prática com os religiosos.

Por mais difícil que seja acreditar, durante muito tempo quem tinha dor de dente podia resolver o problema no mercado público. Sim, a profissão de dentista também foi exercida de maneira bastante rudimentar por curiosos que iam às feiras e mercados oferecer serviços de extração e tratamento de dentes, como quem oferece um produto.


A odontologia começou a evoluir de fato por volta de 1700, quando surgiram novos instrumentos, como boticões mais eficientes, e profissionais especializados. Em 1728, o francês Pierre Fauchard escreveu um tratado chamado O Cirurgião-Dentista. Em 1746, Claude Mouton publicou o primeiro trabalho relacionado a prótese dentária e, em 1756, Philip Pfaff lançou a obra Odontologia Alemã. Dois anos antes, em 1754, havia sido criado um boticão especial para a extração dos terceiros molares. O temido motorzinho, que causa tanta aflição nos pacientes, surgiu no fim do século 19, mas só chegou ao que conhecemos hoje no século 20.

TIRADENTES
O dentista prático mais famoso do Brasil foi, sem dúvida, o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, isso antes de a odontologia ser uma profissão regulamentada. No registro do seu depoimento prestado em 1789, após ser preso no episódio da Inconfidência Mineira, está registrado que o réu “não tinha nesta cidade pessoas de particular amizade, porém conhecia muita gente em razão da prenda de pôr e tirar dentes”. Ou seja, o mineiro não apenas extraía dentes dos seus pacientes mas também repunha os que faltavam, numa espécie de tratamento de prótese. Registros da época apontam ainda que ele exercia muito bem sua profissão no interior de Minas Gerais e tinha, inclusive, conhecimentos básicos de medicina. Entre os bens confiscados do mártir da Inconfidência após a prisão pela Conjuração Mineira constavam um espelho pequeno e um conjunto de ferros de extrair dentes, que foram arrematados pelo dentista prático Francisco Xavier da Silveira. Ele deixou também navalhas de barbear e instrumentos de farmácia.
Revista Aventuras  na História

Crianças em liquidação

A mãe que colocou os filhos à venda

Fabio Marton

Mãe vende filhos | Crédito: divulg
O cartaz diz: “Quatro crianças à venda – Informe-se aqui”. A mercadoria está exposta na escada: no degrau mais alto, Lana, 6 anos, e Rae, 5; embaixo, Milton, 4, e Sue Ellen, 2. A mãe, Lucille Chalifoux, que chora escondendo o rosto do fotógrafo, estava grávida de David.
Tirada em 4 de agosto de 1948, em Chicago (EUA), a foto foi publicada O anúncio chocante: sem arrependimento em vários jornais, causando comoção e fazendo surgir ofertas de ajuda de leitores comovidos. Mas uma reportagem no jornal The Times, de Indiana, mostrou, no ano passado, que a foto marcava o começo de uma impressionante história de falta de amor e maus-tratos às crianças. Vendidas ou adotadas, os irmãos se dispersaram para só voltarem a se encontrar adultos. “Fui vendida por 2 dólares, e como meu irmão, Milton, estava perto de mim chorando, o casal resolveu levá-lo também”, conta Rae. Aos 21 anos, ela reencontrou a mãe biológica. “Ela não tinha remorso, nunca nos amou”, diz. Aos 70, reviu os irmãos. David parece ter tido a experiência mais parecida com a de um lar feliz.
Revista Aventuras na História

Crianças no Egito de Cleópatra morriam por desnutrição


É o que revela um estudo de 20 anos na Necrópole de Saqqara


 A rainha em sua indiferença, em quadro do século 19 | Crédito: Alexandre Cabanel 
Cleópatra VII, a última faraó do Egito, é famosa pelo luxo, tomando banhos de leite e, em certa ocasião, dissolvendo a maior pérola do mundo em vinagre para beber, numa aposta com seu amante, o general Marco Antônio. Ainda que a última história seja provavelmente invenção, numa coisa, nenhum historiador vai discordar: pobre, ela não era.


Como isso se traduzia para o povo? Muito mal, segundo uma pesquisa de duas décadas conduzida pelo egiptologista polonês Karol Myśliwiec, da Universidade de Varsóvia. Sua equipe analisou os restos encontrados de 29 crianças encontradas na Necrópole de Saqqara, na antiga capital Mênfis. A pesquisa completa passou por 500 tumbas, desde o Antigo Reino, há quase 5 mil anos. Mas essas crianças, com idades entre meses até 12 anos, foram enterradas entre os séculos 4 a.C. e 1 d.C., durante o período ptolomaico - a dinastia de Cleópatra - e início do domínio romano.

Segundo a equipe, a maioria dessas crianças morreu de infecções ou parasitoses relacionadas à perda de imunidade ao fim do aleitamento materno. Mas isso não vem sozinho: elas sofriam de cáries, anemia, deficiência de vitamina B e má nutrição em geral. Também sinusite crônica causada pelo ambiente do deserto.

Uma das crianças, cujos dentes indicavam ter 4 anos de idade, tinha o tamanho de um bebê de um ano. "Isso significa um retardamento ou inibição temporária no crescimento da criança ocorreu, provavelmente causado por uma dieta pobre em nutrientes essenciais para o desenvolvimento", afirma a bioarqueóloga Iwona Kozieradzka-Ogunmakin, da Universidade de Manchester.

                                

                       Dra. Iwona trabalhando / Polish Centre of Mediterranean Archaeology UW

Curiosamente, um dos indícios do estado precário de saúde dessas crianças é que a maioria delas não tem marcas diretas das doenças que as levaram. O que, ao contrário do que possa parecer, não significa que eram saudáveis, mas que "sucumbiram às doenças rapidamente por seu sistema imunológico fraco", segundo Dra. Iwona. Quem tem sinais de doenças é porque sobreviveu o suficiente para eles aparecerem - assim, estava num estado menos ruim que os outros.

Outra ausência significativa: o próprio número de tumbas infantis é considerado baixo. Segundo os cientistas, é possível que pais enterrassem crianças nas próprias casas, como já foi visto em outras partes do Egito, ou que os corpos, enterrados em covas rasas perto da areia, tenham sido levados por animais.

O Egito de Cleópatra está longe de ser o país exótico e atrasado que os filmes costumam mostrar. Ela foi a última governante da Dinastia Ptolomaica, gregos descendentes da conquista do país por Alexandre o Grande, em 336 a.C. Com a decadência das cidades-estado gregas, como Atenas, a capital do Egito, Alexandria, havia se tornado o novo centro cultural do mundo grego - prova disso era a Grande Biblioteca, um centro científico de onde vieram coisas como portas automáticas, máquinas de venda e o motor a vapor (que eles só usaram como um brinquedo). Com a conquista romana, o Egito seria também o celeiro do mundo.

A miséria vista no cemitério provavelmente foi azar. Segundo os arqueólogos, secas no rio Nilo provavelmente causavam períodos de escassez, que levam à desnutrição generalizada. As crianças pequenas sofriam mais que todos.
Revista Aventuras na História