Os índios não cumprem os rituais da Pascoá se estes não coincidem com dias de chuva, de colheita ou de plantio. O arcebispo da Guatemala, Pedro Cortés Larraz, dita um novo decreto ameaçando quem se esquece, assim, da salvação da alma.
Tampouco os índios vão à missa. Não respondem ao chamado nem ao sino; é preciso ir buscá-los a cavalo por aldeias e plantações e arrastá-los à força. A falta é castigada com oito chibatadas, mas a missa ofende os deuses maias e isso pode mais que o medo de apanhar. Cinquenta vezes por ano, a missa interrompe o trabalho agrário, cotidiana cerimônia de comunhão com a terra. Acompanhar passo a passo os ciclos de morte e ressurreição do milho é, para os índios, uma forma de rezar; e a terra, templo imenso, lhes dá provas, dia a dia, do milagre da vida que renasce. Para eles, toda terra é igreja e todo bosque, santuário.
Para fugir do castigo no pelourinho da praça, alguns índios se aproximam do confessionário, onde aprendem a pescar, e se ajoelham diante do altar, onde comungam comendo o deus de milho. Mas só levam seus filhos à pia batistal depois de tê-los levado, monte adentro, para oferecê-los aos antigos deuses. Ante eles, celebram as alegrias da ressurreição. Tudo que nasce, nasce de novo.
Memórias de Fogo - Eduardo Galeano
Cidade da Guatemala - 1775
Cidade da Guatemala - 1775
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