Villa-Lobos
Heitor Villa-Lobos nasceu no Rio de Janeiro no dia 5 de março de 1887.
Sua mãe, Noêmia Monteiro Villa-Lobos, sempre incentivou os estudos do filho, pois tencionava vê-lo formado em medicina.
A música, nesse caso, era um empecilho para os planos de dona Noêmia, que chegou a proibir o filho de estudar piano.
Heitor teve que fazer seus estudos às escondidas, principalmente os de violão.
A infância de Villa-Lobos foi feliz. Seu pai tocava violoncelo e clarineta —dois instrumentos que Heitor aprenderia a dominar—, e difícil era algum transeunte passar de noitinha em frente a casa na rua Riachuelo, onde morava a família Villa-Lobos, sem escutar alguma doce melodia.
Certamente esse convívio com a música influenciaria o jovem Heitor, principalmente seus primeiros contatos com a obra de Bach.
Heitor também costumava acompanhar seu pai à casa de Alberto Brandão, onde teve seu primeiro contato com a música nordestina —Villa-Lobos presenciou várias reuniões de cantadores e seresteiros.
Essas grandes noites recheadas de música nordestina foram vividas por Villa-Lobos na sua infância de tal maneira que seria inevitável a sua fascinação pela arte popular.
Tão grande foi a fascinação de Villa-Lobos pela música popular que, ao ser proibido pelos pais de acompanhar aqueles cantadores mais de perto, decidiu praticar escondido aquelas músicas em seu violão.
Com a morte do pai de Villa-Lobos, o sr. Raul Villa-Lobos, homem pródigo, que ganhava bem, mas gastava tudo, a vida da família Villa-Lobos sofreu drásticas alterações.
Dona Noêmia foi obrigada a trabalhar duro para sustentar a família: pôs-se a lavar e a engomar guardanapos para a confeitaria Colombo. Com a falta do pai na casa e com a mãe a trabalhar duro para sustentar os filhos, Villa-Lobos acabou conquistando uma grande liberdade. Tratou de aproximar-se de seu ídolos: os chorões.
Pagava-lhes, sempre que podia, uma boa dose de pinga. Um dos grandes problemas enfrentados pelo jovem Villa-Lobos na época era como adquirir capital suficiente para financiar aquelas tantas pingas.
E aí que entra em cena a famosa biblioteca do falecido sr. Raul Villa Lobos.
Villa-Lobos fazia "módicos" desfalques à biblioteca e, com isso, conseguia o aporte financeiro necessário para melhor entabulação diplomática com os chorões.
Nessa época, Villa-Lobos aprendeu alguns passos de capoeira com seus novos amigos e fez uma grande amizade com seu parceiro em caçadas de preás, o garoto Zé do Cavaquinho, que anos mais tarde seria também um famoso chorão e funcionário do Conservatório Nacional de Canto Ofeônico, organizado e dirigido por Villa-Lobos.
Outro grande amigo de Villa-Lobos durante sua mocidade foi o pianista polonês Arthur Rubinstein. Villa-Lobos o conheceu em um carnaval carioca. Rubinstein, que saíra vestido de mulher, encontrou Villa-Lobos, que enrolara uma cobra de verdade no pescoço, e foram, os dois, pular o carnaval. Acabaram na delegacia de polícia.
Villa-Lobos matriculou-se no curso de preparação para o exame vestibular de medicina, obedecendo à vontade de sua mãe. No entanto, aos 16 anos, fugiu de casa e foi refugiar-se na casa de uma tia -Fifina-, a fim de ter maior liberdade para frequentar os chorões e tocar em pequenas orquestras.
Dos 18 aos 26 anos, Villa-Lobos viajou pelo Brasil se apresentando como músico e teve um contato intenso com o folclore brasileiro. É nesse período que Villa-Lobos compõe "Amazonas" e "Uirapuru".
Depois desse período de andanças, Villa-Lobos retornou ao Rio de Janeiro, em 1913, e sua obra começa a avolumar-se com as composições "Cânticos Sertanejos", "Brinquedo de Roda", "Sonata Fantasia nº 1" e as óperas "Aglaia" e "Elisa".
Villa-Lobos foi um dos mais importantes e atuantes participantes da Semana de Arte Moderna de 1922. Ele apresentou uma série de três espetáculos. Mostrou ao público paulista as seguintes obras: no dia 13, a "Segunda Sonata", o "Segundo Trio" e a "Valsa mística" (simples coletânea), o "Rondante" (simples coletânea), "A Fiandeira" e "Danças Africanas"; no dia 15, "O Ginete do Pierrozinho", "Festim Pagão", "Solidão", "Cascavel" e "Terceiro Quarteto"; no dia 17, "Terceiro Trio", "Historietas: a) Lune de Octobre, b)Voilà la Vie, c)Je Vis San Retard, Car vite s'écoule la vie", "Segunda Sonata", "Camponesa cantadeira" (suíte floral), "Num Berço Encantado" (simples coletânaea),"Dança Infernal" e "Quatuor" (com coro feminino).
Villa-Lobos não foi o único compositor moderno interpretado na Semana de Arte Moderna. Junto com suas obras foram interpretadas obras de Debussy, por Guiomar Novaes, e obras de Eric Satie, por Ernani Braga, o qual também interpretou "A Fiandeira", de Villa-Lobos. O Teatro Municipal de São Paulo foi o primeiro palco "erudito" a receber as obras de Villa-Lobos.
No anos seguintes, Villa-Lobos vai para Europa afim de mostrar sua música por lá.
No dia 30 de junho de 1923, Villa-Lobos embarcou no navio francês Croix, deixando o Rio de Janeiro com destino ao velho continente. Não viajou para lá estudar ou para aperfeiçoar-se. Foi afim de exibir o que já havia produzido. Não agiu como a maioria do brasileiros que voltam de lá vaidosos de seus estudos. O autor de Fiandeira chegou à Europa já com a cabeça feita e se impôs em menos de um ano. Aliás, nenhum outro autor estrangeiro vindo de um meio atrasado musicalmente, como o Brasil daquela época, teve tanto sucesso em Paris como Villa-Lobos.
Ao regressar ao Brasil, em 1930, Villa-Lobos já era um músico em plena maturidade, consciente de seu valor e autor de uma bagagem equivalente à produção total de muitos artistas.
Para piano, tinha a numerosa série de peças infantis, entre elas, "Cirandas", "Alma Brasileira", "Saudades da Selva Brasileira" e "Rudepoema".
Trouxe também na bagagem a composição de "Epigramas Irônicos e Sentimentais", e, para música de câmara, algumas dezenas de peças para instrumento solista e piano, além de vários tercetos, quartetos, mais cinco sinfonias e outros tantos poemas sinfônicos e peças corais.
No mesmo ano em que retornou ao Brasil, Villa-Lobos fez uma turne pelo país percorrendo 66 cidades. Também foi neste ano que ele organizou a Cruzada do Canto Orfeônico, no Rio.
Nos anos seguintes, teve uma importante atividade como educador e divulgador musical. Foi o responsável pela fundação da Orquestra Villa-Lobos e pela audição da Missa Solene de Beethoven. Foi também Secretário da Educação Musical no governo Getúlio Vargas e tornou obrigatório o ensino de musica nas escolas.
Muitos afirmam que Villa-Lobos teria sido músico da corte de Vargas durante o primeiro e real ensaio articulado de se implantar um regime fascista no Brasil; para outros, Villa-Lobos era um entre vários outros intelectuais que fizeram a obrigatória passagem pelo Governo Vargas (pois a conjutura daquela época exigia) para, desta forma, alcançar seus ideais.
Em 1945, Villa-Lobos, infatigável, criou, no Rio, a Academia Brasileira de Música e foi seu primeiro presidente. Dois anos depois, foi convidado para ir aos EUA, afim de escrever, junto com os Libretistas Forrest e Wright, a opereta "Magdalena".
Villa-Lobos morreu no dia 17 de novembro de 1959, no Rio, vítima de uma crise de uremia viria.
Renato Roschel
Folha de São Paulo
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