domingo, 23 de agosto de 2009

Comunidades messiânicas: as outras Canudos


Novo estudo e relançamento de um clássico lembram as outras comunidades messiânicas do século 19
por Fabiano Onça
Do alto de uma pedra, um homem sisudo e desgrenhado conclama seus devotos a realizar mais sacrifícios. Em breve aquela mesma rocha se abriria e, de dentro dela, emergiria “El-Rei” dom Sebastião para salvá-los. Em aprovação, centenas de fiéis entoam uma ladainha. Estamos falando de Canudos e Antônio Conselheiro? Não. A cena descreve um povoado de 80 anos antes: a Cidade do Paraíso Terrestre, em Pernambuco.

Além de Canudos, que ficou famosa ao ser retratada em 1902 por Euclides da Cunha, em Os Sertões, outras cidades tentaram estabelecer governos próprios. Também eram lideradas por um “messias”, pregavam o sebastianismo – a crença de que dom Sebastião, rei de Portugal morto no século16, voltaria para salvar o Brasil – e sofreram terríveis ataques do governo.

Esse momento da história está sendo lembrado com a reedição do clássico O Messianismo no Brasil e no Mundo. Publicado em 1965 pela historiadora Maria Isaura de Queiroz, o livro revelou a abrangência do fenômeno no planeta. Além dele, um estudo do mexicano Guillermo Palacios mostrou outras caras do movimento. “O messianismo deve ser entendido também como uma festa de procissões, pelas quais as comunidades tentaram mudar seu mundo”, diz ele.

Saiba mais
O Messianismo no Brasil e no Mundo, Maria Isaura de Queiroz, Alfa Omega, 2003

O sertão é meu país
O messianismo de norte a sul do Brasil
Cidade do Paraíso Terrestre da Serra do Roncador (Pernambuco, 1817)

Líder - Silvestre José dos Santos, ex-soldado, chamado de “O Profeta”

Objetivo - Moradores aguardavam a chegada de dom Sebastião, que brotaria da pedra encantada e concederia riqueza e imortalidade a todos

Que fim levou - Foi exterminada por um destacamento do governador da província em 25 de outubro de 1820

Reino Encantado (Pernambuco, 1836)

Líder - João Antonio dos Santos e depois seu cunhado, João Ferreira, chamado de “Rei”

Objetivo - Profetizava que dom Sebastião estava prestes a desencantar, por meio de sacrifícios humanos. Os fiéis mortos seriam recompensados com juventude, vida eterna e riquezas

Que fim levou - Em 14 de maio de 1838, para quebrar o encantamento, foram sacrificadas 30 crianças, 12 homens, 11 mulheres e 14 cães. O próprio Rei se imolou no dia 17. Os fiéis restantes foram massacrados por forças do governo

Juazeiro, A Cidade Santa (Ceará, 1872)

Líder - Cícero Romão Batista, o “Padre Cícero”

Objetivo - Pregava a volta aos valores tradicionais da religião católica, com a proibição de rodas de música, consumo de álcool e prostituição

Que fim levou - Resistiu a um ataque de três meses do governo estadual entre 1913 e 1914. Por causa da habilidade política do seu líder, a cidade recebeu apoio do então presidente Hermes da Fonseca. Juazeiro tem hoje cerca de 200 mil habitantes

Muckers (Rio Grande do Sul, 1872)

Líder - Jacobina Maurer, esposa do curandeiro Jorge Maurer

objetivo - Jacobina afirmava que era a reencarnação de Cristo e viera escolher os eleitos antes do juízo final. Nomeou 12 apóstolos e ordenou a seus fiéis que não obedecessem a ninguém exceto a ela

Que fim levou - A população resistiu a várias investidas do governo local em seu templo-fortaleza. No último ataque, o templo foi incendiado. Jacobina fugiu, mas foi morta depois, com 17 fiéis, no esconderijo do grupo

Caldeirão (Ceará, 1926)

Líder - José Lourenço, o “Beato Zé Lourenço”

Objetivo - Viver uma espécie de cristianismo rústico, com votos de pobreza e simplicidade. As cerca de 5 mil pessoas trabalhavam em lavouras coletivas

Que fim levou - Os mandantes locais acusaram o beato de comunismo. Em 1935, destruíram a cidade e dispersaram os fiéis. O beato fugiu para uma propriedade na Bahia com alguns seguidores, onde faleceu em 1946

Revista Aventuras na Historia

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