Negrinho do pastoreio
"Só para três viventes ele olhava nos olhos: era para o filho, menino cargoso como uma mosca, para um baio cobos-negros, que era o seu parelheiro de confiança, e para um escravo, pequeno ainda, muito bonitinho e preto como o carvão e a quem todos chamavam somente o Negrinho.
A este não deram padrinhos nem nome; por isso o Negrinho se dizia afilhado da Virgem, Senhora Nossa, que é a madrinha de quem não a tem."
(João Simões Lopes Neto)
Escravo, órfão, o menino pertencia a um fazendeiro rico, cruel e arrogante. Maltratado por todos, principalmente pelos filhos do senhor, sofreu inúmeros castigos e barbaridades. Ao perder a tropilha de cavalos de seu amo, foi surrado sem piedade. Seu corpo moribundo foi, então, jogado à boca de um enorme formigueiro, para que as formigas o devorassem. No dia seguinte, o fazendeiro, atormentado, correu ao local e não mais encontrou o supliciado. Em vez disso, viu Nossa Senhora e o Negrinho, seu afilhado, são e feliz, montado em um cavalo baio, pastoreando uma tropilha de cavalos invisíveis.
O Negrinho do Pastoreio é mito de origem gaúcha, com fundamentos católicos e europeus, divulgado com finalidades morais. A compensação e redenção divinas aos sofrimentos terrenos. A tradição popular concedeu-lhe poderes sobrenaturais, canonizando-o. Possui inúmeros devotos. Afilhado da Virgem, encontra objetos perdidos, bastando prometer-lhe um toco de vela que será dado à madrinha. Em algumas versões, oferece-se também, um naco de fumo para o menino.
Baseado no mito popular, Augusto Meyer criou a seguinte Oração ao Negrinho do Pastoreio:
Eu quero achar-me, Negrinho!
(Diz que você acha tudo)
Ando tão longe, perdido...
Eu quero achar-me, Negrinho:
A luz da vela me mostre
O caminho do meu amor
Negrinho, você que achou
Pela mão da sua madrinha
Os trinta tordilhos negros
E varou a noite toda
De vela acesa na mão
(Piava a coruja rouca
No arrepio da escuridão
Manhãzinha, a estrela d'alva
Na voz do galo cantava
Mas quando a vela pingava
Cada pingo era um clarão)
Negrinho, você que achou
Me leve à estrada batida
Que vai dar no coração
(Ah! os caminhos da vida
Ninguém sabe onde é que estão!)
Referências bibliográficas
Azambuja, Darci. "Negrinho do pastoreio". Província de São Pedro; revista de difusão literária e cultural. Porto Alegre, Livraria do Globo, setembro de 1945, p.107-109 <>
Callage, Roque. No fogão do gaúcho. Porto Alegre, Ed. Livraria Globo, 1929
Cascudo, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro, 1954 | 9ª edição: Rio de Janeiro, Ediouro, sd
Cascudo, Luís da Câmara. Geografia dos mitos brasileiros. 2ª ed. São Paulo, Global Editora, 2002, p.328-334
Damasceno, Athos. "Negrinho do Pastoreio; transposição poética da lenda colhida por J. Simões Lopes Neto". Província de São Pedro. Porto Alegre, Editora Globo, março de 1947, nº 8, p.53-56
Lopes Neto, João Simões. Contos gauchescos e lendas do Sul. <>
Lopes Neto, João Simões. Simões Lopes Neto; contos e lendas. 2ª ed. Rio de Janeiro, Editora Agir, 1960. Nossos Clássicos, 5
A. O. "Coisas do folclore brasileiro: Negrinho do Pastoreio". O Dia, Rio de Janeiro, 30-31 de dezembro de 1962, terceiro caderno, p.2
"Negrinho do Pastoreio". Revista Esso, novembro-dezembro de 1951
"Oração ao Negrinho do P, em Morais, Carlos Dante de. "Augusto Meyer e a infância". Província de São Pedro. Porto Alegre, Editora Globo, dezembro de 1949, nº 14, p.76
"Conversa pequenina". O Jornal. Rio de Janeiro, 21 de julho de 1963, suplemento feminino
"Negrinho do Pastoreio: o santo homem do campo". Gazeta Comercial, 06 e 13 de novembro de 1966
Jangada Brasil
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