Shakespeare
Ninguém antes dele representou a natureza humana com tanto vigor e variedade. Isso o tornou o maior dramaturgo da história
por Jerônimo Teixeira
William Shakespeare nasceu em Stratford-upon-Avon, Inglaterra, em 1564. Nada se sabe sobre sua infância e adolescência, mas acredita-se que tenha estudado em uma boa escola local (ainda que o poeta rival, Ben Jonson, afirme que ele sabia “pouco latim e ainda menos grego”). Aos 18 anos, casou-se com Anne Hathaway, oito anos mais velha do que ele. Tiveram duas filhas, Susanna e Judith, e um filho, Hamnet, que morreu aos 11 anos de idade.
Em fins dos anos 80 ou início dos anos 90 do século XVI, mudou-se para Londres, onde iria ganhar a vida como ator e dramaturgo. Não se sabe ao certo como começou a carreira. Seja como for, seu prestígio cresceu em 1594, quando passou a trabalhar com a companhia de teatro Lord Chamberlain’s Men. Os teatros, na época, eram amplos prédios de madeira, abertos no teto e geralmente circulares. O público distribuía-se em bancos ao redor do palco. Calcula-se a lotação do maior deles, o Globe, em 3 000 espectadores – Londres teria à época 200 000 habitantes.
A produção de Shakespeare, que não durou mais de 20 anos, povoaria os palcos (e as telas) dos séculos seguintes. É, sem dúvida, o dramaturgo mais encenado do mundo e o cinema lhe paga tributo há muito tempo, de Laurence Olivier a Leonardo di Caprio. Ele escreveu cerca de 40 peças, entre tragédias (Otelo, Romeu e Julieta, Rei Lear); dramas históricos (Henrique V, Ricardo III); e comédias (Muito Barulho por Nada, Sonhos de uma Noite de Verão).
Ninguém antes dele representou a natureza humana em toda a sua variedade – a paixão devastadora de Romeu e Julieta, o ciúme cego de Otelo, a ambição insidiosa de Macbeth. É aí que a importância de Shakespeare ultrapassa o palco e foi por conta disso que o crítico americano Harold Bloom deu a um livro recente sobre Shakespeare o ambicioso título de A Invenção do Humano. O motivo, diz Bloom, é que o “humano”, tal como o entendemos hoje, nunca fora tratado de maneira tão completa e complexa. Shakespeare foi o primeiro a compor personagens plenamente dotados de introversão – ao escutar a si mesmas, produzindo toda a força do monólogo shakespeareano, mudam e se desenvolvem diante dos olhos do leitor e do espectador. O enigmático Hamlet é o exemplo mais acabado disso.
Shakespeare também deve ser o escritor mais citado do mundo. Mesmo quem nunca leu Hamlet conhece o famoso “Ser ou não ser, eis a questão”. Versos seus ressoam em títulos de escritores modernos – dois exemplos são
Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, e O Som e a Fúria, de William Faulkner. O gigantismo de Shakespeare na cultura ocidental contrasta com seu aparente descaso pela posteridade. Não se sabe de uma só peça que tenha sido publicada com sua aprovação. Muitas circularam em edições piratas que trucidavam o texto sem que o autor protestasse. A primeira edição respeitável de sua obra é de 1623. De fato, Shakespeare mostrou-se mais preocupado com quem mexia em sua bolsa do que com quem bagunçava sua poesia: seu nome consta em vários litígios, tanto como credor quanto como devedor.
Shakespeare morreu em Stratford, em 1616. Os fatos conhecidos sobre sua vida são muito poucos para quem nos deu tanto som e fúria. As especulações, no entanto, compensam a escassez de fatos. Os sonetos, principalmente, alimentaram a imaginação de críticos e biógrafos. São os únicos textos conhecidos em que Shakespeare fala em primeira pessoa. Circularam entre amigos do poeta até serem publicados, provavelmente sem autorização, em 1609. Os personagens recorrentes dos sonetos – a Dama Negra, por exemplo – são cercados de mistério. O ardor com que Shakespeare dirige-se a um rapaz anônimo incendiou discussões sobre um possível homossexualismo.
As fantasias mais extravagantes dizem respeito à identidade do poeta, que, ainda em vida, foi acusado de plagiário em um panfleto escrito pelo ressentido dramaturgo Robert Greene. Também já se especulou que as peças foram escritas por algum nobre (Freud apostava no conde de Oxford), pelo poeta Cristopher Marlowe ou mesmo pelo filósofo Francis Bacon. “Uma rosa teria o mesmo perfume com outro nome”, diria a precoce Julieta. Shakespeare é a sua obra. “Sou o que sou”, afirma o bardo no Soneto 121 – e até hoje não se conhece imodéstia maior que essa.
Revista Superinteressante
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