Marcas do Quotidiano nos Monumentos Funerários. A Representação de Animais na Tumulária Medieval do Entre-Douro-e-Minho
Pedro Chambel
O Ocidente medieval cristão conheceu profundas mutações durante os séculos XII e XIII. Se as manifestações desse processo se deram de forma mais explícita a nível das condições de vida material das populações, também se assistiu, paralelamente, a uma predisposição mental que, subterraneamente, impulsionou e acompanhou as dinâmicas sócio-económicas ligadas ao renascimento urbano, iniciado ainda durante o século XI, e que se afirmou nas duas seguintes centúrias.
Uma nova concepção do mundo acompanhou as transformações das condições materiais do homem medieval, influenciando-as, e por elas sendo influenciada. As alterações na forma de conceber o mundo do invisível e das relações entre mortos e vivos acompanharam este processo. Fruto de um fenómeno de longa duração, emergiu uma nova concepção da morte, baseada na consciencialização de que ela era um acto individualizado, com que os homens se confrontavam no momento de passagem do mundo terreno para o do Além, mediante um julgamento que iria determinar o seu futuro post-mortem.
Para tal, muito contribuiu a aceitação, por parte da hierarquia religiosa, da concepção teológica da existência do Purgatório durante o século XII, levando ao estabelecimento de uma verdadeira “geografia do Além”, segundo um processo estudado por Jacques LeGoff em relação ao conjunto da Cristandade, e por José Mattoso em relação ao Ocidente hispânico cristão.
Contudo, se as novas concepções do mundo invisível não surgiram de forma sincrónica para todo o Ocidente medieval, elas foram-se, progressivamente, uniformizando. Neste sentido, no livro sinodal de Alba, elaborado em 1410 e estudado por Maria do Rosário Bastos, encontram-se já plenamente sistematizados os lugares de destino reservados às almas dos mortos, ou sejam: o Paraíso, o limbo dos Padres (encerrado após a vinda de Cristo), o limbo das crianças, o Purgatório e o Inferno[1].
A visão do mundo post-mortem reflectiu-se na vida do homem medieval. O momento decisivo do julgamento divino após a morte, associado, agora, ao Julgamento Final da Humanidade, levou ao surgimento de um conjunto de práticas, que proporcionassem aos homens a segurança da protecção das potências do Além. Assiste-se, assim, ao emergir de rituais preparatórios do momento da morte. Era necessário que esta fosse “exemplar” e que todos estivessem preparados para o incerto momento da passagem para o mundo do invisível. Nos testamentos surgem, então, especificados os actos que deveriam ser efectuados pelos vivos, a fim de garantir a salvação da alma do morto ou o apaziguamento das suas penas.
É neste contexto, marcado pela preocupação da morte enquanto um momento vivenciado de forma particular por cada homem, que emerge, paralelamente ao surgimento das orações pelas almas dos mortos, a necessidade de personalizar o local onde o corpo do defunto irá permanecer. Os túmulos começam, então, a ostentar, desde os finais do século XI, as marcas da vivência que cada homem pretende transmitir aos seus contemporâneos, aos vindouros e aos membros da Corte Celestial, transformando-se os monumentos funerários em lugares destinados a perpetuar a imagem do defunto em vida para que ela condicione a sua vivência post-mortem.
Neste sentido, “tudo” é cuidadosamente pensado quanto ao processo de elaboração da última morada dos restos corpóreos. Monumento, simultaneamente, retrospectivo e prospectivo, nele se pretende representar a imagem que cada homem quer transmitir acerca do que foi a sua vida, e sobre o local desejado para o repouso da alma, a Corte Celestial destinada aos eleitos. O monumento funerário integra-se, assim, progressivamente, na acepção do que Jacques LeGoff denominou de monumento/documento[2].
Importante, não era, porém, apenas o túmulo, mas também o lugar onde ele iria permanecer. Dentro ou adscrito a uma igreja, um mosteiro, ou, mais tardiamente, a uma catedral, e, nestes templos, em espaços destinados ao apaziguamento das preocupações dos vivos, procurando os locais eleitos pelos santos homens que deveriam proteger o indivíduo e encaminhá-lo para o reino dos venturosos. Nas instituições religiosas constroem-se, então, arcossólios e “abrem-se” capelas, com decorações murais e escultórias, onde os túmulos eram depositados segundo um plano minuciosamente escolhido. Nada devia ser deixado ao arbítrio, visto assim o exigir a segurança da vida eterna.
A elaboração dos monumentos funerários, enquanto fruto das preocupações dos vivos acerca do seu incerto futuro, envolvia a existência de condições materiais que os tornassem possíveis. Eram, assim, os grandes senhores eclesiásticos e leigos quem detinha os meios necessários à sua construção, visto ela exigir uma mão-de-obra especializada que era preciso pagar. Contudo, também eram eles os supostos protagonistas do mundo terreno: reis, nobres e eclesiásticos consideravam-se como os zeladores da “ordem terrena”, pelo que consideravam dever ser a sua memória, verdadeira ou idealizada, que merecia ser perpetuada. No fundo, era a eles que se dedicavam os livros de linhagens, as crónicas e os relatos da vida dos santos ou dos proeminentes eclesiásticos.
É, portanto, neste contexto que pretendemos reflectir sobre as marcas do quotidiano inscritas nos monumentos funerários. O nosso objectivo é a análise do monumento tumular enquanto “documento” que apela à decifração do que nele se quis transmitir ao mundo dos vivos e à Sociedade Celeste. Restringiremos o nosso estudo às imagens de animais presentes na tumularia, pretendendo indagar como o seu simbolismo se liga à idealização das representações de uma vida que merecia uma “morte santa” e “exemplar”. O âmbito geográfico do nosso inquérito é o da região de Entre-Douro-e-Minho, a área onde o mundo senhorial português encontrava raízes mais profundas e onde a riqueza e o poder se encontravam essencialmente ligados à ruralidade.
Interessa-nos, assim, perceber até que ponto os notáveis desta região se interessaram por manifestar nos monumentos funerários que para eles mandaram construir, entre os séculos XIII a XV, a representação da Natureza, em particular os animais, como forma de explicitarem um quotidiano marcado por uma forte ligação à terra e aos seus valores. Para tal, começaremos por realçar as manifestações de personalização da morte que se encontram na generalidade dos túmulos.
Segundo Mário Jorge Barroca, “a personalização do sepulcro no Entre-Douro-e-Minho encontra as suas raízes no séc. XI”, acrescentando o autor que, no entanto, ela só se viria a impor no segundo quartel da centúria seguinte[3]. A primeira forma de personalização dos túmulos manifesta-se na sua decoração. Inicialmente titubeante, com decorações figurativas incipientes constituiu, desde logo, um marco distintivo dos sepulcros. Encontramo-los, assim, decorados com elementos que procuravam transmitir a condição social do defunto em vida, como as representações de espadas e cavalos que remetem para a classe dos homens-de-armas. Outras figurações, como a da tampa tumular da igreja do antigo mosteiro de Paço de Sousa, onde se representa um abade, são mais elucidativas, visto nela se associar directamente ao defunto um báculo abacial.
Convirá referir que estes primeiros esboços de imagens de uma morte personalizada se apresentam associados à existência de Obituários, onde se registava, conjuntamente com o nome do defunto, a notícia descritiva da decoração do seu túmulo, permitindo conservar a sua identificação e a perpetuação da memória do defunto, ao mesmo tempo que se garantiam as celebrações rituais prescritas por este em vida. Como veremos, a ornamentação dos túmulos foi-se tornando cada vez mais elaborada, encontrando-se na arte funerária do Entre-Douro-e-Minho alguns dos monumentos escultórios mais notáveis da nossa medievalidade.
Outra forma de personalização dos sepulcros encontra-se nas epígrafes que constituíram “uma das formas mais directas e eficazes” de o efectuar. Segundo Mário Jorge Barroca, foi durante os séculos XII e XIII, quando a personalização dos monumentos funerários se afirma de forma decisiva, que surge um grande número de epígrafes. No entanto, o uso do epitáfio já se vinha afirmando desde o século XI, restringindo-se, numa primeira fase, aos nobres e, alargando-se, posteriormente, aos clérigos, tornando-se estes dois grupos sociais os detentores exclusivos das epígrafes durante quase toda a Idade Média, visto a penetração do epitáfio nos meios não nobilitados ou privilegiados da sociedade do Entre-Douro-e-Minho, ser “um acontecimento tardio, que só se verifica no séc. XIV”[4].
Tanto a decoração como a epígrafe, para além de dignificarem e individualizarem os monumentos funerários, também promoviam a preservação da memória linhagística, segundo o princípio de que a recordação do passado era uma condição de legitimação do presente. Por outro lado, dados os interesses patrimoniais detidos pela fidalguia nos mosteiros onde os seus familiares se encontravam sepultados, o registo identificativo dos túmulos servia para reiterar junto da comunidade monástica os direitos que sobre ela exercia o grupo familiar do defunto, ao mesmo tempo que a existência nos mosteiros patronais de um panteão linhagístico, originava uma promoção prestigiante para os membros da respectiva congregação monástica, ao mesmo tempo que “trazia consigo doações testamentárias que não eram de desprezar”[5].
A inscrição dos brasões dos falecidos nos monumentos funerários constituía, igualmente, um “sinal” eficaz da personalização dos monumentos funerários, prolongando-se a sua função identificatória até aos dias de hoje. Na verdade, vários foram os túmulos que puderam ser identificados devidos aos escudos-de-armas nele ostentados. Neste sentido, Augusto Ferreira do Amaral afirma que as primeiras manifestações de brasões tumulares em Portugal surgiram em meados do século XIII, destacando, entre os primeiros exemplares, os túmulos de D. Paio Guterres da Cunha, hoje desaparecido, que se encontrava na galilé da igreja de S. Salvador do Souto e o de D. Tibúrcio que se encontrava na Sé Velha de Coimbra[6].
De uma forma geral, a codificação heráldica não só individualizava o possuidor das armas, como o filiava na família portadora do escudo-de-armas, constituindo, assim, uma forma de integração linhagística.
Um exemplo particularmente esclarecedor, a que nos referiremos mais tarde, é o túmulo quatrocentista de Lopo Dias de Azevedo, nele surgindo um brasão onde a águia, o símbolo heráldico dos Azevedos, figura ao centro, enquanto na bordadura se representam leões, os animais representativos do escudo-de-armas da família dos Coelhos, de onde era originária a mãe do defunto. Ora, significativamente, foi esta representação heráldica que permitiu a moderna identificação do nobre tumulado[7].
Torna-se, assim, patente como os brasões eficazmente aliam a função identificatória do indivíduo sepultado à da sua integração num determinado grupo linhagístico. No caso do Entre-Douro-e-Minho, a presença de brasões remonta à segunda metade do século XIII, começando-se a detectar a partir dos finais do século XIV, a presença de timbres coroando os brasões[8].
Porém, a forma mais explícita de personalização dos túmulos foi o jacente, sendo a partir dele que se expressa, mais exemplarmente, o propósito de “cunhar” o túmulo com uma explícita referência ao defunto. Na verdade o jacente procura fornecer uma representação física do morto. Segundo Mário Jorge Barroca, ele constitui uma “manifestação essencialmente aristocrática e masculina”, resultando “da importação de uma moda estrangeira”[9]. Ora, se o primeiro jacente conhecido em Portugal se encontra em Alcobaça e remonta aos finais do século XIII, nele se representando D. Urraca, a mulher de D. Afonso II, no nosso país, ele apenas se institui como uma manifestação típica durante o século XIV, altura em que se assiste a “uma verdadeira explosão na criação deste tipo de monumento funerário, o que se verifica logo na primeira metade do século”. No Entre-Douro-e-Minho, o mais antigo jacente conhecido é o de D. Rodrigo Sanches, uma obra efectuada por escultores conimbricenses em meados do século XIII[10].
O jacente apresenta uma característica de primordial interesse a nível simbólico, dada a representação escultória do defunto se encontrar na tampa do túmulo, ou seja, virado para o Céu, para o Eterno. Assim, se as representações figurativas nos laterais do túmulo surgem numa posição que permite aos vivos a sua leitura e descodificação, o jacente, colocado em cima do túmulo, oferece uma figuração orientada para o Celeste. A representação do jacente, tanto comporta uma figuração destinada à visão da Corte Celestial, como procura sugerir o momento da preparação do defunto para o julgamento perante as potências divinas, para quem apela.
Como exemplo desta topografia simbólica do túmulo, registamos, no Entre-Douro-e-Minho, o monumento funerário de Álvaro Gonçalves de Freitas, um fidalgo que foi escudeiro, desembargador e vedor da fazenda de D. João I e que faleceu entre os anos de 1418 e 1420. No seu túmulo, situado na capela de S. Brás, hoje integrada no Museu Alberto Sampaio em Guimarães, encontram-se duas representações identificatórias. No jacente, fez-se figurar ostentando o hábito de franciscano[11]. No lateral maior do arcaz encontram-se dois brasões. Assim, se para o mundo terreno dos vivos, o nobre se identifica pela sua filiação linhagística e respectiva posição social, perante Deus surge “despojado” das suas funções terrenas, optando por se representar de forma a sugerir uma ligação pessoal e íntima com o divino, aqui simbolizada pelo hábito franciscano. Tendo ou não sido por ela guiado durante a sua vida, escolheu uma imagem de devoção perante Deus no momento em que se preparou para a morte.
No entanto, conhecemos outros desígnios para as representações utilizadas noutros jacentes. Referimo-nos, por exemplo, a um sarcófago dos finais do século XIII, que se encontra na igreja do antigo Mosteiro de Pombeiro. Num dos seus laterais vê-se um cavaleiro na sua montada, estando em posição de combate e com a lança em riste, associando-se a tal figuração o seu escudo-de-armas. Ora, no respectivo jacente, o cavaleiro apresenta-se em vestes civis, sendo visíveis as suas esporas e uma espada onde figura o respectivo brasão.
Neste caso, tanto a representação dirigida para o olhar terreno, a do lateral, como aquela que se orienta para o Além, a da tampa funerária, manifestam a mesma intenção, ou seja, marcar o estatuto social de um nobre guerreiro em que a profissão de homem-de-armas se integra numa memória familiar linhagística. Não significa isto, no entanto, a escolha de uma imagem puramente leiga por parte do senhor representado no sarcófago de Pombeiro. Com efeito, no Ocidente medieval, em particular a partir do século XII, a cavalaria encontrava-se associada ao desempenho de uma missão sagrada na Terra, a efectuar no quadro da ideologia trifuncional da sociedade, e tendo como manifestação um vasto conjunto de práticas altamente ritualizadas, destinadas aos futuros membros da sacralizada sociedade cavaleiresca.
Na Península Ibérica, este aspecto encontrava-se associado, desde o século XII, à participação cruzadística dos bellatores na luta contra o Infiel, sendo a importante presença das ordens militares no reino, uma das suas mais visíveis manifestações. Sendo assim, não é de todo estranho a preocupação evidenciada pelo nobre tumulado em Pombeiro se fazer representar perante o divino ostentando elementos próprios da sua actividade guerreira, ou seja, a espada e as esporas, até porque, enquanto na sua representação cavaleiresca para os vivos ele surge em combate, para o Além ele associa-se a uma atitude de guerreiro em repouso, simbolicamente alheado dos momentos de combate e preparado para uma luta que já não é a terrena, tendo como objectivo “conquistar” um lugar na corte dos eleitos.
Em suma, torna-se patente, nestes exemplos, a existência de uma topografia tumular simbólica que se expressa nas distintas representações utilizadas nos diferentes espaços constituintes do sepulcro[12]. Elas encontram-se, assim, distribuídas segundo um eixo vertical que sobe da base para a tampa, onde se pode encontrar ou não um jacente. A base do túmulo, onde se encontram, frequentemente, representações de animais que serão objecto deste estudo, marca a parte inferior. Segue-se depois, em ascensional dignidade iconográfica, a arca tumular propriamente dita, na qual se distinguem as partes da cabeceira, laterais e a secção dos pés, onde se ostentam imagens que marcam, ora a vivência terrena do defunto, ora a sua ligação familiar, ou mesmo, a sua aspiração de vir a participar do grupo dos eleitos, sobretudo no caso de aí figurarem representações iconográficas de entidades celestes, capazes de sancionar especiais protecções no momento da morte. Finalmente, após esta zona do túmulo orientada para o olhar dos vivos e dos vindouros, encontra-se a tampa virada para o Céu. Aí, é para a divindade a quem o defunto se apresenta e apela, seja por sinais codificados e figurações, ou, de uma forma mais clara, pela sua própria representação na figura do jacente.
De uma forma geral, é no quadro desta orientação da topografia simbólica do sepulcro que o nosso estudo sobre a representação e simbolismo dos animais na tumularia foi conduzido. Assim, sendo os animais concebidos como os mais próximos participantes do mundo terreno e envolvente do homem, verificaremos como as suas figurações nos túmulos se tornam mais proeminentes e significativas nos locais dedicados à iconografia de ligação do defunto com a Terra.
Começaremos, no entanto, por examinar a sua representação nas tampas, viradas para o Celeste, descendo depois até às secções orientadas para o olhar humano. Para além dos elementos presentes nos túmulos propriamente ditos, também iremos considerar duas outras manifestações a eles associados, ou seja, muito sumariamente, um arcossólio onde se encontram representados dois ginetes, e uma lâmina de bronze que assinala o sepulcro de D. Estêvão Vasques Pimentel, na capela de Nossa Senhora do Rosário do Mosteiro de Leça do Balio, sendo esta placa funerária a metálica que chegou aos nossos dias no Entre-Douro-e-Minho, embora se saiba que outras existiram na região, tendo-se centrado o seu maior núcleo, hoje desaparecido, na Sé do Porto onde se encontravam, pelo menos, cinco exemplares[13].
Iniciamos, então, o nosso estudo sobre a figuração de animais, com a representação de uma cabeça de serpente, patente num báculo de um abade, representado na já referida tampa de um túmulo que se encontra na igreja do Mosteiro de Paço de Sousa. A figura do abade, “tratada com um relevo quase-plano, mais gravado que esculpido”, encontra-se iconografado com as respectivas vestes litúrgicas[14]. Carlos Alberto F. de Almeida datou a tampa do século XIII, embora “o seu grafismo e aspecto tumular lhe dêem impressões de maior arcaicidade”[15]. Tal opinião foi partilhada por Mário Jorge Barroca e Manuel Luís Real que a dataram de finais do século XII ou inícios da centúria seguinte.
No entanto, estes dois autores discordam quanto ao facto de ela poder ou não constituir um ensaio ou protótipo de jacentes, perfilhando Manuel Luís Real a primeira hipótese, enquanto Mário Jorge Barroca defende a segunda[16], declarando estarmos perante uma manifestação independente desse tipo de pesquisas, e acentua que nela se manifesta “uma negação consciente de volumetria”, no sentido de “negar a tridimensionalidade”[17]. Este último autor considera, então, a tampa como obra de um escultor que se deslocou da zona de Coimbra para o Norte do país, e propõe a hipótese da figuração do abade se ter inspirado nas ilustrações do Apocalipse do Lorvão[18].
Vejamos alguns aspectos relativos à simbologia da serpente. Na cultura cristã, ela apresenta uma conotação dupla e oposta. Embora geralmente se apresente como uma figuração do mal, também pode, igualmente, remeter para um símbolismo cristológico, como é o caso da sua representação nos báculos. A esse respeito, Louis Charbonneau-Lassay, após referir a serpente como símbolo de Cristo, sublinha como “durante la segunda parte de la Edad Media, sobre todo del siglo XI al XIV, hay numerosos báculos de obispos e abades que terminan en una voluta en cuyo extremo hay una cabeza de serpiente”[19]. Por seu lado, Gerd Heinz-Mohr considera que “formas e figuras de serpentes em cajados lembram o aspecto positivo da serpente de bronze, o símbolo de Cristo”[20].
A sua origem encontra-se no Antigo Testamento, particularmente, no livro dos Números, onde se relata o pedido feito a Deus por Moisés para que ele salvasse o povo eleito das serpentes por ele enviadas para castigar os pecadores. Com tal objectivo, aí se conta, então, como Moisés, segundo o desígnio divino, fez uma serpente de bronze cuja contemplação garantia a vida a quem pelas serpentes fosse mordido(Nm 21,4-10). O Envangelho de S. João alude a este episódio quando atribui a Cristo a seguinte fala: “como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que seja levantado o Filho do Homem”(Jo 3,14). Sendo esta a explicação mais usual da conotação da serpente relacionada com Cristo, Marie Osterreicher-Mollwo refere que as serpentes figuradas “sur les crosses épiscopales” simbolizam “à la foi ce serpent d’airan et la prudence attaché à cette animal”[21].
Estamos, assim, perante a representação de um animal que podemos considerar como estereotipada. Remetendo para um símbolo cristológico, ela não surge com o intuito de figurar um animal bem presente no quotidiano rural. Antes reforça a sacralidade da imagem de um abade, recordado em vestes litúrgicas, escolhendo representar-se num momento e numa função evocativos da sua ligação entre o mundo terreno e o Celeste, tal como o acentuam as suas mãos, uma em sinal de bênção, a outra segurando o báculo, a insígnia onde a serpente, enquanto símbolo de Cristo, evoca o destino de um eleito.
Pensamos, assim, que a representação inscrita na tampa sepulcral do abade, remete para um túmulo onde a cobertura se destina a fornecer uma imagem orientada para o Além. Assim, se a opinião de Mário Jorge Barroca sobre uma voluntária ausência de tridimensionalidade na figuração do sepultado estiver correcta, torna-se ainda mais patente como ela não foi elaborada com o objectivo de representar o morto perante o mundo dos vivos.
Na igreja de Manhente, junto a um arcossólio, encontra-se o fragmento de uma outra tampa de sepultura, onde figura um cavalo. Mário Jorge Barroca descreve a imagem do seguinte modo: “decoram este curioso exemplar, uma cruz de braços curvos inserta num círculo, em cima, uma espada de lâmina larga e uma lança curta, no centro, e um cavalo com rédeas, em baixo”. Salientando o “sabor popular” das figurações, o investigador conclui, depois, que a tampa em questão deveria pertencer ao sepulcro de um nobre ou de um cavaleiro, sugerindo como sua datação o século XIII[22]. Na verdade, tanto a espada, como a lança e o cavalo guiado por rédeas, sugerem uma nítida relação do defunto ao grupo dos homens-de-armas, já que representam os principais atributos do cavaleiro.
De uma forma geral, o cavalo apresenta-se “como o símbolo da esfera animal no ser humano” não só o ligando às respectivas “forças” e “instintos”, como tornando-se “um símbolo do seu corpo”. Neste contexto, o cavaleiro é o “dominador, o “logos”, “o espírito que prevalece sobre a cavalgadura (a matéria)”[23]. Jean Chevalier e Alain Gheerbrant inscrevem esta simbologia “num complexo de combate e numa intenção” de o espiritualizar. “Esta espiritualização realiza-se, seja pela escolha de meios nobres, seja pela administração de uma sociedade de elite, seja pela procura de um chefe extraordinário, ao qual se deseja prestar juramento de obediência. O sonho do cavaleiro revela o desejo de participar de uma grande empresa, que se distingue por um carácter moralmente muito elevado e de alguma forma sagrado”[24], tal como sucedia na sociedade peninsular da Reconquista.
Ora, o presumível ideal de missão espiritual presente na tampa do sepulcro do cavaleiro de Manhente, encontra-se reforçado pela presença da cruz, ainda que a sua representação tumular estivesse então relativamente vulgarizada. Neste caso, portanto, estamos perante a figuração de um animal ligado ao quotidiano do grupo dos cavaleiros, por ele sugerindo a identidade social do defunto. Representado com as respectivas rédeas, o cavalo enquanto animal domado e montada do cavaleiro, constrói, assim, a memória visual de um guerreiro que espera no Além, o lugar devido à sua função de defensor do povo cristão.
Para além da serpente e do cavalo, também se encontram representações de animais nos brasões inscritos nas tampas das sepulturas. Assim, no Mosteiro de Vairão, existe hoje um túmulo em que se “ostenta um escudo de armas esquartelado onde nos 2º e 3º quadrantes se vêem leões”, sendo a “interpretação dos motivos dos 1º e 4º quadrantes(…)bastante problemática”[25]. Segundo Armando de Mattos, tratar-se-iam de castelos, imperfeitamente elaborados, pelo que o brasão em questão diria provavelmente respeito ao símbolo heráldico presente na tampa tumular da abadessa D. Violante Henriques, a qual, em 1426, desempenhou as funções de dirigente do cenóbio[26].
No Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde, a presença de animais na heráldica das tampas sepulcrais, também se encontra atestada para o túmulo de D. Berengária Fernandes Ferraz, “que assumiu o cargo de abadessa dessa instituição monástica em 1384 e que ocupou até 1406”, tratando-se, portanto, tal como no caso de Vairão de uma representação quatrocentista[27]. Assim, ladeando o escudo-de-armas dos de Ferraz, encontra-se inscrito um outro onde figura uma águia. A seu respeito, Armando de Mattos propôs duas hipóteses de identificação heráldica: ou se trataria da representação do escudo de armas dos de Refoios, ou o brasão em causa referir-se-ia a uma outra abadessa, dado que "acima da linha epigrafada transversal do túmulo parece existirem dois rostos humanos, cada um na mesma linha de cada um dos escudos". A ser este o caso, o heraldista levanta, então, a possibilidade de estarmos perante uma sepultura dupla, onde se encontrariam sepultadas a segunda e a terceira abadessas vitalícias do Mosteiro. O escudo-de-armas com a águia poderia, assim, pertencer à mais antiga das preladas[28]. Segundo, Mário Jorge Barroca, uma tal hipótese não consegue, no entanto, explicar de forma convincente a origem deste brasão[29].
Seja como for, tanto a águia como o leão, identificam dois animais com forte conteúdo simbólico e que se encontram bem presentes em variadas representações heráldicas no Ocidente medieval, sendo mesmo duas das mais comuns representações de animais nos brasões. Em ambos os casos estamos, assim, perante túmulos onde as abadessas sepultadas optaram por perpetuar a imagem do elevado estatuto social que detiveram em vida, relacionando-o com o prestígio da sua pertença linhagística, como tal se apresentando para a última morada. Não se conhecendo os arcazes dos dois túmulos, não sabemos se houve a mesma intenção de recordar as origens familiares nas partes do sepulcro ofertadas aos olhares dos vivos. Em todo o caso, os animais figurados nas tampas não remetem, mesmo simbolicamente, para os quotidianos da sociedade medieval do Entre-Douro-e-Minho.
As restantes representações dos animais patentes nas tampas dos túmulos, em consideração, são as dos cães que se encontram aos pés dos defuntos figuradas nos jacentes. Nos dezasseis casos referenciados por Mário Jorge Barroca, cinco deles ostentam esculturas de cães. Estes, situados em posição vertical, apoiando os pés da representação do defunto, ou seja, perpendiculares em relação ao corpo figurado no jacente, sobressaem de forma mais ou menos evidente, permitindo a sua visualização a quem observa o túmulo, já que a sua cabeça se encontra voltada para o olhar humano. Podemos, então, verificar como os cães surgem posicionados, tanto voltados para o Além, uma vez que se encontram na tampa da sepultura, como orientados de forma a serem visíveis pelos vivos, constituindo, por outro lado, um elemento escultório bastante frequente nos jacentes, dado se incluírem em cerca de um terço do total em consideração.
Os mais antigos datam do século XIV, encontrando-se nos jacentes dos túmulos de João Anes Gordo e de Júlio Geraldes. O primeiro dos sepulcros encontra-se situado na Sé de Porto, na capela de S. João Evangelista, mandada edificar pelo defunto, um antigo almoxarife de D. Dinis e cavaleiro do Hospital[30], o qual nele se fez representar com as vestes da Ordem, encontrando-se coberto com um manto em que figura a cruz de Malta. O segundo dos túmulos comporta um epitáfio onde se evoca para o morto a sua antiga condição de “vasalo” e “veratedor” do rei Fernando I[31].
Já de Quatrocentos, são os jacentes com figuração de canídeos existentes na já citada capela de S. Brás em Guimarães. Pertencem aos sepulcros de um casal fidalgo, o de Álvaro Gonçalves de Freitas, o qual instituíra a capela para receber o seu corpo e o dos seus descendentes, e o de sua mulher, provavelmente Teresa Novais. Por último, da mesma centúria, data também um túmulo com jacente duplo existente no Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde, onde foram sepultados D. Fernando de Meneses e sua mulher D. Brites de Andrade. No respectivo lateral esquerdo “foi incluída uma inscrição que se distribui por três “anéis” onde se lê uma das mais belas legendas tumulares portuguesas:”Pois que nõ teño poder/Senhora, de me partir/ De vos amar e querer/ Por vostro quero morir/E moiro de ma dama””[32]. Trata-se de um jacente duplo bastante influenciado pelo de D. João I e D. Filipe de Lencastre. Aí figura, então, aos pés do senhor, um cão, representando-se aos da sua esposa, segundo Dionísio M. M. David, uma cadela com a sua cria[33].
Na Idade Média o cão nem sempre se associou a uma simbologia positiva. No entanto, progressivamente ele tende a representar o símbolo, por excelência, da fidelidade, tal como, de resto, foi transmitido pelos autores da Antiguidade. Louis Charbonneau-Lassay refere, a tal propósito, que a arte cristã “le hizo justicia e hizo de él el símbolo de Fidelidad, de todas las fidelidades. En este sentido estaba echado al pie de las reinas y de las mujeres de bien, en sus monumentos funerarios, y también a los pies de los señores vasallos y de los escuderos fieles"[34]. Gerd Heinz-Mohr reitera esta simbologia, referindo que a Idade Média elevou o cão a símbolo “de fidelidade dos vassalos para com o Senhor das terras, da mulher para com o marido”[35]. Por sua vez Marie Osterreicher-Mollwo, acentua em tal animal o valor da fidelidade conjugal, evocando a sua representação tumular “um bom casamento”[36].
Ora, se no segundo dos túmulos mencionados o cão surge associado a um vassalo de D. Fernando, cujo epitáfio evoca precisamente essa condição de fiel servidor do rei, no primeiro, ele também se relaciona com um estreito colaborador da realeza, que havia sido almoxarife de D. Dinis e cavaleiro da Ordem de Malta. Parece, assim, claro estarmos perante uma figuração do cão enquanto símbolo de fidelidade vassálica dos dois nobres aos reis, podendo, igualmente, no segundo caso, também evocar a fidelidade do morto à Ordem a que pertenceu e, por extensão, à própria divindade. No que respeita ao senhor de Freitas, a simbologia não deve ser muito diferente, dado o facto de ele ter sido um fiel vassalo de D. João I, embora, neste caso, possa, igualmente, remeter para um valor de fidelidade conjugal, uma vez que no túmulo de sua mulher, presente na mesma capela, se encontra, igualmente, figurado um cão. Neste contexto, em todos estes túmulos o cão evoca a fidelidade vassálica, figurando um valor sócio-político escolhido pelos próprios sepultados para lembrar o significado último de sua terrena existência, já que os sepulcros em que estão foram por eles encomendados ainda em vida.
No que respeita ao túmulo com jacente duplo de D. Fernando de Meneses e de sua mulher, D. Beatriz de Andrade, a presença dos cães parece simbolizar mais especificamente a fidelidade conjugal, tal como, de resto, também seria o caso do canídeo figurado aos pés da mulher de Álvaro Gonçalves de Freitas. Com efeito, a simbologia do “bom casamento” evocada pelos cães do túmulo dos de Meneses, apresenta-se bem patente pelo facto de se tratar de um monumento funerário comum ao casal, em cujo epitáfio se refere expressamente uma mútua devoção amorosa, a ela também se podendo associar a circunstância da esposa se representar com o hábito de clarissa, o qual, segundo Mário Jorge Barroca, surgiria como um sinal de perpétuo luto por parte da viúva[37]. Para além disso, se os animais figurados aos pés de D. Brites de Andrade forem uma cadela e a sua cria, como defende Dionísio M. M. David, tal acentuaria de forma particular o objectivo de explicitar e de sobrevalorizar, através dos cães, "a apologia do matrimónio e da reciprocidade sentimental”[38].
É certo, porém, que a esta simbologia tumular dos cães, alia-se outra, que remete para o estatuto social dos defuntos. Na verdade, os lebreus representados nos monumentos funerários masculinos evocam a caça praticada pelos nobres, enquanto os pequenos cães figurados nos túmulos das damas remetem para a sua condição de fidalgas. Tendo sido a caça efectuada com cães e/ou com aves de rapina, uma das mais valorizadas actividades de lazer e de treino guerreiro dos nobres, eles acabam, igualmente, por remeter os tumulados para esta classe social.
Em suma, pela posição dada aos cães nas tampas dos túmulos, a memória de uma fidelidade vassálica ou conjugal transmitida pelos mortos, destinava-se a perpetuar a lembrança dessa virtude tanto entre os vivos, como entre os habitantes do Além. Enquanto animal do quotidiano, a simbologia do cão não implicava elaboradas interpretações bíblicas ou míticas, nem sequer resultava da utilização de sentidos baseados nas fontes da Antiguidade Clássica, como tantas vezes acontecia nos bestiários. Tratava-se, no fundo, de uma comprovada e reconhecida simbologia que radicava em características demonstráveis através da convivência do animal com os humanos, as quais se elevaram a um estatuto alegórico-simbólico. No entanto, mesmo assim, a representação dos cães não deixa de surgir como uma figuração codificada de marcado teor simbólico, tendo este factor sido determinante para o acolhimento da sua figuração tumular.
Com a referência aos cães terminamos a análise dos animais representados nas tampas dos túmulos, os que, segundo a topografia simbólica do sepulcro atrás mencionada, se voltam para o Céu, evocando os valores que os mortos escolheram para se apresentarem no Além e no seu tribunal. Vejamos, agora, a representação de animais presentes nos laterais, cabeceira e pés dos túmulos, ou seja, os que se orientam para as imagens que os defuntos oferecem ao mundo terreno.
Iniciaremos a nossa análise com os animais presentes nos brasões. Vejamos, então, o já referido túmulo de D. Júlio Geraldes, no qual se localizam dois escudos de armas, dispostos simetricamente no lateral esquerdo da arca sepulcral. Ambos ostentam a mesma representação: dois escudos esquartelados, em que no 1º figura um pé de milho, nos 2º e 3º, três rosas dispostas em barra, e no 4º, uma cabra. Todos os elementos representados pertencem ao mundo natural, encontrando-se vulgarmente presentes no espaço rural do Entre-Douro-e-Minho. O milho remete para a agricultura, ou seja, para a natureza “domesticada” ao serviço do homem, enquanto a cabra, embora se pudesse ainda encontrar em estado selvagem nas serras da região, sugere um animal normalmente associado à pecuária e aos rebanhos, sinalizando, portanto, um animal do quotidiano rural do território em consideração. Sendo o túmulo resultante de encomenda prévia feita pelo nobre nele sepultado, os elementos naturais expressam, no entanto, a sua vontade de assinalar as origens linhagísticas que personalizam o seu túmulo.
No Claustro Velho da Sé do Porto encontra-se um outro sarcófago elaborado nos finais do séc. XIV ou no início do séc. XV, onde também se figuram cabras heráldicas. Com efeito, na respectiva cabeceira surgem dois escudos-de-armas, visualizando-se no da esquerda dois desses animais. De resto, no lateral direito do túmulo, encontram-se repetidos os dois brasões por duas vezes, antes e depois de uma cena historiada, pelo que os escudos de armas são, significativamente, por três vezes figurados. Armando de Mattos sugeriu que o escudo de armas com as cabras podia remeter para o das famílias de apelido Cabral, Cabreira, Resende ou Baião[39]. Segundo Mário Jorge Barroca, o brasão em questão corresponde provavelmente ao utilizado pelos senhores de Resende[40]. Para os nossos propósitos as reflexões feitas sobre o túmulo de D. Júlio Geraldes também se aplicam a este.
Num túmulo hoje situado no exterior da igreja paroquial de Vila de Bispo figura, igualmente, um brasão de armas com representações de animais num dos seus laterais. O túmulo do séc. XIV possui uma epígrafe que permite identificá-lo como o monumento funerário de Dom Salvador Pires, um prior do antigo Mosteiro de Vila Boa do Bispo, indicando-se expressamente como se tratava de um religioso proveniente das famílias dos "Milhioes" e dos "Peixoes". No escudo de armas esquartelado, surgem, então, figurados nos 1º e 4º quadrantes, dois peixes, enquanto nos 2º e 3º quadrantes foi iconografado um pé de milho miúdo. Segundo Armando de Mattos estamos perante dois escudos-de-armas falantes[41], ou seja, dois brasões onde as figurações remetem para o nome das famílias dos armoriados. Assim, à família “Milhioes”, como surge na epígrafe, corresponde o pé de milho, enquanto que a linhagem dos “Peixoes” teria originado a representação dos peixes. Ora, se o intuito de representar os peixes e o milho foi o de marcar a memória da filiação linhagística do prior sepultado, as suas imagens não deixam de se associar a quotidianos e a realidades naturais onde se inspiraram as representações heráldicas.
Por fim, no já citado túmulo de Lopo Dias de Azevedo, encontra-se um brasão no lateral esquerdo onde se distinguem uma águia e leões, tratando-se igualmente, neste caso, de animais heráldicos, mas que remetem para uma longa tradição na representação heráldica de signos linhagísticos. Recorde-se, por exemplo, como em sete escudos heráldicos referidos, n’A Demanda do Santo Graal, cinco deles contêm representações de leões[42].
Já nos referimos à representação de um cavalo montado por um cavaleiro em posição de combate, a propósito da iconografia do lateral direito de um sarcófago situado na igreja do antigo Mosteiro de Pombeiro. Outro sarcófago existente no mesmo cenóbio, datando dos inícios do séc. XIV, identificado como o túmulo de D. João Afonso de Albuquerque, 1º conde de Barcelos, segundo Manuel Luís Real e Mário Jorge Barroca[43], também ostenta, nos dois laterais do arcaz, cavalos que suportam guerreiros de armas em riste.
De resto, também encontramos figurações de cavalos nos cenotáfios de Egas Moniz que se encontram na igreja do Mosteiro de Paço de Sousa. No que remonta à segunda metade do séc. XIII, ou seja, o mais recente, eles surgem integrados no lateral onde se representa a que tem sido identificada como a figuração da ida de Egas Moniz à corte de Toledo, ilustrando uma das sequências da chamada "gesta de Egas Moniz", a qual, segundo José Mattoso, foi forjada em meados do séc. XIII por um dos descendentes do suposto aio de D. Afonso Henriques[44]. Assim, nessa iconografada narrativa, um cavalo figura montado pelo personagem identificado com Egas Moniz, enquanto num outro, surge um segundo cavaleiro e um terceiro parece carregar um pesado fardo. O cavalo do Aio destaca-se claramente dos restantes pelo seu tamanho e por uma representação mais cuidadosamente trabalhada, sobretudo a cabeça, donde se destaca a crina, e os panejamentos que o cobrem[45].
Nos romances de cavalaria medievais utilizam-se, geralmente, três designações para as montadas, referindo-se os “cavalos”, a propósito dos cavaleiros e dos reis, os “palafréns” para estes e para as damas e os “rocins” em relação aos jovens que ainda não tinham entrado na sociedade cavaleiresca[46]. Segundo Michel Pastoureau, por seu lado, existiriam quatro designações para equídeos na França medieval, variando a sua utilização consoante a hierarquia social dos seus montadores, embora cavalos considerados de qualidade inferior fossem, igualmente, montados por nobres cavaleiros, nomeadamente, nas batalhas[47]. Neste contexto, podemos colocar a hipótese de a representação do cavalo do Aio se destacar dos restantes como forma de marcar a sua superior qualidade, valorizando a figura de Egas Moniz como a de um nobre que montava um cavalo de raça proeminente. Assim, o segundo cavalo, montado, presumivelmente, por um dos filhos do Aio, identificaria, segundo a terminologia proposta nos romances cavaleirescos medievos, um rocim, e o terceiro, um mero cavalo de carga.
Por sua vez, no primeiro cenotáfio de Egas Moniz, elaborado provavelmente cerca de um século antes do segundo, surge um enigmático cavalo montado por quatro (?) personagens. José Mattoso propôs tratar-se da “representação iconográfica do cavalo Bayart, uma das cenas mais conhecidas do romance Renaud de Montauban”[48]. Na verdade, tudo parece apontar para um animal “fabuloso”. Contudo, o mesmo autor, tendo em conta que tal hipótese "pareceu inverosímil a Ferreira de Almeida e improvável a Manuel Luís Real”, abandonou depois a sua primeira identificação. Segundo Manuel Luís Real o misterioso equídeo aponta para uma sequência não identificável da “primeira versão da gesta de Egas Moniz”[49].
Uma última representação de cavalos ainda se encontra num arcossólio funerário localizado na igreja paroquial de Mancelos. Com efeito, nele se ”ostenta ao lado de um medalhão figurativo três curiosos símbolos: uma cruz e dois ginetes"[50], sem que hoje seja possível avançar muito na respectiva representação simbólica. Seja como for, de uma forma geral, o cavalo remete para um animal do quotidiano medieval em grande parte associado à sociedade cavaleiresca e, por extensão, à própria, nobreza. Na topografia dos túmulos, ele oferece-se à visão dos vivos, permitindo-lhes recordar o defunto como alguém que esteve associado à classe nobiliárquica. Com efeito, o facto de a maior parte dos túmulos em análise associarem a iconografia do cavalo a símbolos heráldicos, sugere que a actividade guerreira evocada é sobretudo fidalga, não parecendo remeter para a que era própria dos cavaleiros vilãos.
Na parte dos túmulos susceptível de se visualizar pelos vivos, também tem grande relevo os animais que se associam à representação do Tetramorfo. Como refere Gérard de Champeaux e Dom Sébastien Sterckx, a figuração dos evangelistas através de três animais e de um homem resulta “puramente arbitrária”. Tendo sido inicialmente proposta por S. Irineu, nos finais do século segundo, foi depois adoptada pelos principais pensadores cristãos[51]. A origem de uma tal simbologia encontra-se no Livro do Apocalipse atribuído a S. João, inspirando-se numa visão veterotestamentária atribuída a Ezequiel. No Apocalipse, referem-se, com efeito, em torno do trono divino, quatro seres semelhantes a um leão, conotado com S. Marcos e com a Ressurreição de Cristo, um boi representando S. Lucas, o evangelista que começara o seu relato com a notícia do sacrifício de Zacarias, oferecendo um bovídeo à divindade e remetendo para o sacrifício do Salvador, uma águia simbolizando S. João e a Ascensão de Cristo após a Ressurreição, e, finalmente, um ser com a face de homem que simboliza S. Lucas, devido ao facto de o seu Evangelho começar com a genealogia de Cristo, acentuando-se, assim, a sua condição humana[52]. Na verdade, foi com base em tal simbologia que o leão se tornou durante a Idade Média no principal signo da Ressurreição de Cristo, enquanto a águia o foi relativamente à Ascensão e o boi simbolizou o seu sacrifício. No seu conjunto os quatro evangelistas, sendo os principais relatores da vida de Cristo, exprimiam simbolicamente a Palavra revelada ao homem. Por isso, no dizer de José Mattoso, a sua identificação com o Tetramorfo, “significa que Cristo Redentor não se isolou no Céu", antes comunicando com os homens por meio de uma Palavra que corresponde a um movimento ”por assim dizer descendente, do texto bíblico, do Céu para a Terra”[53]. Neste sentido, as imagens do Tetramorfo, através das figuras dos animais e de um homem, que foi sendo substituído por um anjo, foram profusamente utilizadas na Idade Média, surgindo como uma codificação de particular eficácia para a transmissão simbólica do credo cristão.
Encontramos o Tetramorfo representado em dois monumentos funerários do Entre-Douro-e-Minho medieval, o do túmulo com jacente de D. Gonçalo Pereira, situado na Sé de Braga, e o que corresponde à lâmina de bronze onde se assinala, no Mosteiro de Leça de Balio, a sepultura de um seu tio, D. Estevão Vasques Pimentel, um antigo prior da Ordem do Hospital. As representações presentes em ambos os casos sugerem uma provável afinidade temática, nomeadamente a evocação do Livro do Apocalipse, uma circunstância a que não terá sido alheia a ligação familiar que unia o prelado bracarense ao prior hospitalário.
O túmulo de D. Gonçalo Pereira encontra-se numa capela profusamente decorada, tendo resultado de uma encomenda prévia por parte do arcebispo. A elaboração do arcaz foi da responsabilidade de mestre Pêro, um artista de provável proveniência aragonesa que se instalara em Coimbra e que foi responsável por alguns dos mais notáveis monumentos funerários portugueses da centúria de Trezentos[54]. No lateral direito do túmulo encontram-se doze figuras de clérigos, enquanto no esquerdo se representam os doze apóstolos. Na cabeceira observa-se um facial tripartido localizando-se um Cristo crucificado ao centro, ladeado pela mãe e por S. João, o seu discípulo favorito e o presumível autor do Apocalipse. Nas edículas laterais foram, então, representados, o boi, remetendo para S. Lucas e o leão, simbolizando S. Marcos. A escolha, destes dois evangelistas encontra-se justificada pela representação central. Com efeito, como já referimos, o boi encontra-se conotado com a noção de sacrifício, como a que se representa na cruz de Cristo, e o leão com a da sua ressurreição após a morte.
Na secção dos pés, por sua vez, representa-se a Virgem com o Menino ao colo, enquadrada por dois anjos erguendo círios, ladeados pela águia, o símbolo de S. João, um personagem que assim surge triplamente presente na iconografia do túmulo, e pelo anjo que remete para S. Mateus. De resto, sendo a figuração deste último associada à humanidade de Cristo, reforça o sentido da imagem humanizada de Deus menino ao colo de sua mãe. No entanto, Francisco Pato de Macedo, prefere filiar a figuração de S. Mateus no facto de ele remeter para o evangelista “que se ocupou da linhagem da Virgem”, aludindo, assim, a uma particular devoção de D. Gonçalo Pereira ao culto desta última[55]. Contudo, uma tal leitura não explica a repetida representação de S. João, o apóstolo que na cena da crucificação ocupa o lugar tradicionalmente atribuído a Nossa Senhora, parecendo mesmo contrariá-la.
Como vemos, todo o arcaz apresenta uma figuração marcadamente religiosa, com a particularidade de remeter para a figura de Cristo, o Deus tornado homem e o símbolo da Palavra Revelada. Neste sentido, os evangelistas representam os relatores de sua vida, enquanto os apóstolos remetem para os companheiros da sua vivência terrena, surgindo os clérigos como os representantes de Deus na terra e os mediadores entre os homens e a divindade. Assim, toda esta iconografia sugere a representação de um momento de intercessão entre o Além e o terreno, apontando o Tetraformo para uma mensagem divina descida do Céu, tal como referiu José Mattoso, a que “corresponde um movimento ascendente, evocado pela Liturgia”[56], da Terra para o Céu, sendo este sugerido pela presença dos homens que a celebram, ou sejam, os clérigos. Em suma, as personagens representadas no arcaz orientam a visão humana, de acordo com a topografia tumulária, para o lugar intermédio entre o jacente (que representa D. Gonçalo Pereira, tendo a cabeça ladeada por dois anjos, membros da Corte Celestial) voltado para o Céu, e a base do túmulo assente na Terra, repousando sobre os leões que suportam o túmulo.
Como referimos, no Mosteiro de Leça do Balio, o Tetramorfo encontra-se também representado na lâmina de bronze que assinala a sepultura em campa rasa de D. Estevão Vasques Pimentel. Trata-se de uma lápide funerária de grandes dimensões, medindo cerca de 1,80m x 0,5m, elaborada em bronze e denotando origem flamenga. Para além do Tetramorfo surgem representados quatro animais míticos, os três primeiros (da esquerda para a direita) montados por músicos com os seus instrumentos, e o quarto por um guerreiro.
Vejamos a descrição que dela fizeram Luís Krus e Bernardo Vasconcelos e Sousa: “Ao centro, num desenvolvido campo epigráfico, continha-se um relativamente extenso elogio da vida e feitos do antigo prior" que "insistia na prodigalidade senhorial que caracterizara o priorado de Estevão Vasques Pimentel: ”forte”,“generoso” e “constante” soubera redistribuir as riquezas que acumulara e administrara pelos seus ”consociis”… Por isso a inscrição o considerava como exemplo - prior de priores, tal como rosa entre flores. Enquadrando a inscrição encontravam-se várias imagens. Acima do campo epigráfico figuravam representações alusivas à corte celestial: os doze apóstolos, anjos, uma Anunciação e uma Santíssima Trindade. Correspondiam-lhe na base do letreiro, para além do Tetramorfo, vários escudos ostentando, quer as armas dos Pimentéis, quer as da Ordem do Hospital ou as do reino de Portugal. Encontravam-se intercaladas por imagens de músicos e guerreiros cavalgando animais míticos. Entre as duas séries, entre a Terra e o Céu, os versos leoninos relativos à vida de Estevão Vasques estabeleciam como que uma ponte ou elo de ligação. Remetiam para o protagonismo de uma passagem messiânica. Em suma, tanto o teor da inscrição epigráfica como a iconografia que a acompanha apontam para um específico modelo de prior. Aquele que pela sua condição de guerreiro nobre sabia encontrar o fim último da Ordem: o da mutação dos bellatores profanos em cavaleiros das milícias de Cristo”[57].
A lâmina foi mandada fazer pelo sobrinho-neto do prior, Álvaro Gonçalves Pereira, o qual lhe sucedera no priorado da Ordem do Hospital. Os dois autores citados põem a hipótese da lápide funerária ter sido encomendada após a batalha do Salado, onde “Álvaro Gonçalves Pereira adquiriu notoriedade, uma vez que a vitória cristã então obtida se atribuía a um milagre produzido por intermédio de uma relíquia do Santo Lenho custodiada num dos conventos hospitalários, o de Marmelar, crença essa que prestigiara sobremaneira os freires do Hospital combatentes no Salado e, com maior razão, o seu jovem e recente prior”[58]. Surgem, assim, os dois priores dos hospitalários como cavaleiros eleitos e dirigentes da milícia de Cristo na Terra, conduzindo-a segundo os Seus desígnios, numa imagem providencialista da sua missão enquanto priores que Luís Krus filia nos ideais de cavalaria transmitidos pelos romances arturianos[59].
A colocação do Tetramorfo no “plano terreno” é perfeitamente justificável pelo seu simbolismo de via “descendente” da Palavra Revelada aos homens. Para além disso, S. João Evangelista surge ainda representado no lateral direito da lâmina, conjuntamente com outros santos que ladeiam o epitáfio do prior, figurando, portanto, o apóstolo, por três vezes, alcançando uma particular proeminência, tal como no túmulo de D. Gonçalo Pereira. Ora, o Apocalipse, atribuído a S. João, foi entendido como o Livro anunciador da milícia divina comandada pelo "cavaleiro do cavalo branco”, Cristo, que no final dos tempos resgataria definitivamente os eleitos. Assim, a representação de personagens ligados ao Apocalipse, como o Tetramorfo e, em particular, S. João, poderá acentuar o carácter providencialista que os de Pereiras tentaram transmitir à sua linhagem, nomeadamente no processo de refundição do Livro de Linhagens do Conde D. Pedro que filiou esta família (por sua vez, ligada aos Pimentéis) aos da Maias, “uma das famílias que o Livro Velho de Linhagens dos finais do séc. XIII considerava fundadora da nobreza portuguesa e artífice da formação do reino”[60].
Quanto aos animais míticos que surgem como montadas, destacam, pelo seu carácter sobrenatural, os seus montadores para um plano do transcendente, para um mundo inacessível ao comum dos mortais. Manuel Luís Real refere o facto de trovadores surgirem em figurações escultóricas perto de cenas que representam efabulações históricas ou moralizantes[61]. Quanto ao cavaleiro, ao “cavalgar” um animal mítico, ele ultrapassa, pela sua montada prodigiosa, o cavaleiro terreno para se transformar no de um mundo-outro, magnífico, sobrenatural, feérico. Podemos, assim, colocar a hipótese do cavaleiro ser a figura central da representação no “plano terreno” da lâmina, surgindo os músicos como os seus anunciadores e celebradores (eles encontram-se à esquerda do cavaleiro, ou seja, antes deste no movimento natural de leitura). Destacado das funções terrenas, o cavaleiro poderá surgir como um eleito, tal como os heróis enaltecidos nos romances medievos, numa alusão à imagem mitificada que Álvaro Gonçalves Pereira tentou transmitir de seu tio e de si próprio.
Resta-nos referir a representação na lâmina de dois outros animais, uma pomba e um boi ou touro. A primeira, encontra-se “na margem superior à esquerda” da lâmina, e, “saindo da boca de Deus(…)toca com o bico na cabeça de Cristo”, simbolizando o Espírito Santo[62]. A ave assume, assim, a conotação tradicional que o cristianismo lhe consagrou.
Quanto ao boi/touro, ele surge figurado à direita da representação da Santíssima Trindade, depois de um anjo, e antecedendo a figuração dos apóstolos (tratam-se de treze figuras, referindo Mário Jorge Barroca serem os doze apóstolos mais um discípulo de Cristo). Segundo o mesmo autor, o bovídeo simbolizaria S. Lucas, remetendo, assim, para a tradicional figuração do evangelista no Tetramorfo[63]. Ora, esta interpretação levanta duas questões. A primeira reside na contextualização da representação repetida de Lucas no conjunto figurativo da lâmina. Mário Jorge Barroca não explicita a razão para ela aí se encontrar e, tendo em conta o simbolismo iconográfico dos elementos presentes na metálica, não encontramos explicação que a justifique. Se a intenção fosse representar duplamente os evangelistas, estando já S. João e S. Mateus figurados como apóstolos, faltaria a representação de S. Marcos, que, logicamente, dever-se-ia encontrar figurado segundo a tradição do Tetramorfo, tal como estaria Lucas, ou seja, com a forma de um leão, o que não acontece. Por outro lado, a iconografia do boi/touro não obedece à que tradicionalmente se associa ao evangelista. Na verdade, os animais do Tetramorfo surgem, normalmente, ora como seres híbridos com características antropomórficas, ora com asas, como se visualiza na parte inferior da lâmina, remetendo para a visão dos Viventes do Apocalipse. Em vez disso, surge-nos uma figura de bovídeo de frente, em corpo inteiro, destacado da figuração em círculos dos apóstolos.
Podemos, assim, colocar duas hipóteses para a representação do animal na lâmina. Neste sentido, sugerimos que possa assumir um carácter apotropaico, “sustentando” as figurações que se seguem, dos apóstolos, surgindo, assim, como uma solução de preenchimento de espaço com conteúdo simbólico, tal como sucede em representações de animais na iluminura e na escultura arquitectónica românicas. Outra hipótese reporta-se ao facto de Manuel Luís Real, no seu estudo sobre a arte figurativa românica portuguesa, referir a representação de cabeças de boi, em várias igrejas, no primeiro modilhão das cornijas do lado oriental destas. Sobre a sua presença, afirma que ”tais cabeças devem ter possuído certas faculdades propiciatórias, pois só assim se entende que figurem aos pares ou aliadas ao leão, a servir de consolas aos tímpanos na entrada das igrejas”[64]. No caso da lâmina de Leça do Balio apenas surge uma figura de bovídeo, não se encontrando esta acompanhada de outro animal, mas não poderá ter a mesma enigmática função, dada a sua representação anteceder a figuração dos apóstolos, surgindo, assim, esta hipótese alicerçada numa tradição figurativa que remonta ao românico?
Tratam-se de duas sugestões que avançamos com a pretensão de que venham a suscitar novos estudos e análises sobre a representação do animal, uma vez que, pelas razões atrás expressas, a associação do boi/touro ao evangelista levanta pertinentes reservas, enquanto que, tendo em conta o carácter fortemente simbólico do conjunto das representações da lápide, não nos parece plausível que o animal surja nesta representado com uma mera função figurativa[65].
Por fim, no que respeita à décima terceira figura representada em círculo, ela poder-se-á reportar a S. Paulo, uma vez que o santo é tradicionalmente considerado como o décimo terceiro apóstolo(At 22,21). Neste caso, no entanto, trata-se de uma hipótese não alicerçada na observação da figuração ampliada do santo que aí se encontra, pois a ela não tivemos acesso, ao contrário do que sucedeu com a representação do bovídeo. Assim, a nossa hipótese é expressa com naturais reservas.
Analisámos neste local a lâmina de bronze de Leça do Balio, dado o facto de, ao estar embutida na parede, ela se encontrar num plano de leitura e observação semelhante à dos laterais dos túmulos, ou seja, orientada para o olhar humano.
Em suma, notamos que as representações de animais viradas para o mundo dos vivos é mais variada do que na tampa, assim como - exceptuando a representação dos cães que, embora presentes nesta secção do túmulo, “erguem-se” para a visão dos homens - é, igualmente, superior em número.
Resta-nos abordar a representação de animais na base dos túmulos. Estas restringem-se a figurações de leões que os “suportam”. Trata-se da representação mais frequente em Portugal de animais nesta posição, encontrando-se em mais de metade dos túmulos que possuem suportes individualizados no século XIV[66]. A sua existência tem sido explicada de diversas formas, sendo a de maior conteúdo simbólico a conotação do leão como símbolo da ressurreição. Gérard de Champeaux e Dom Sébastien Sterckx escrevem: “No hay por qué asombrarse de ver las tumbas cristianas adornadas con leones. Por sí solo, el león es un símbolo de resurrección”[67]. Assim, os leões surgem nos túmulos conotados com a esperança na ressurreição dos mortos após o Juízo Final.
Igualmente de forte conotação simbólica, é a do leão andrófago. O leão que devora o homem fá-lo “passar” para um estado novo da sua vivência, permitindo o acesso dos eleitos ao Além, mas também envia os pecadores para os tormentos do Inferno[68]. A este duplo aspecto de salvação/ condenação evocada pelo leão deglutinador, não deverá ser estranha a conotação do leão como símbolo de justiça, em particular, divina. No túmulo com jacente duplo de D. Fernando de Meneses e de sua mulher, vêem-se corpos humanos mutilados na boca dos leões[69], aludindo à simbologia do animal deglutinador.
Os bestiários medievais sublinham, em particular, a simbologia da ressurreição atribuída ao leão, mas, surge, igualmente, referido, que este animal apresenta a parte anterior do seu corpo, forte, como símbolo da sua natureza divina, que contrasta com a parte posterior, fraca, simbolicamente ligada à natureza animal/bestial do leão. Tal levou Jorge Rodrigues a escrever: ”Símbolo de Cristo-Juiz, justo, sábio e poderoso -associado à “nobreza” do grande felino -, não deixa por isso de ter uma significação ambígua: a representação apenas da parte anterior do corpo significa, na iconografia medieval, a natureza divina, sendo a parte posterior absorvida (logo neutralizada) pelo edifício sagrado; e isto porque esta parte posterior encerra em si a natureza animal/bestial das criaturas, sujeitas a pulsões de difícil controlo que só podiam ser neutralizadas pela "tirania" da sujeição ao suporte sagrado. Reflexão que é válida para as figurações de leões em corpo inteiro, nomeadamente suportando túmulos, que assim assumem toda a sua ambiguidade de signo de Cristo - logos de salvação - mas também de pesos terríveis, cujo carácter apotropaico deverá afastar os maus espíritos"[70].
Manuel Luís Real acentua o papel de guardião do leão na escultura portuguesa românica, assim como, enquanto símbolo cristológico, de justiceiro assume o papel de castigador quando "lança as suas goelas sobre figuras humanas"[71].
É provável que o elevado número de representações de leões tenha levado a uma estereotipização da sua representação, o que originou que às suas primitivas simbologias se tenham aliado os atributos de nobreza e majestade que ele evoca, associando-se, assim, à sua particular escolha como símbolo heráldico. Para o período que considerámos, ele surge como suporte de túmulos régios, como os de D. Pedro I, D. Fernando, D. João I e de D. Filipa e no túmulo de D. Dinis conjuntamente com outras representações.
No Entre-Douro-e-Minho encontramos leões nas bases dos seguintes túmulos: no de D. Gonçalo Pereira (seis leões); no de D. Fernando de Meneses e de sua mulher (presentemente encontram-se cinco leões, referindo Emídio M. Ferreira que originalmente deveriam ser oito[72]), no de João Anes Gordo (quatro leões), no de Álvaro Gonçalves de Freitas (três leões) e no de sua mulher (dois leões, referindo Mário Jorge Barroca, que falta o central afrontado[73]), e, finalmente, no túmulo de Fr. Garcia Martins que foi prior de Leça de Balio e mais tarde Grão Mestre da Ordem do Hospital, encontrando-se o seu monumento funerário, elaborado no séc. XIV, na igreja paroquial de Leça de Balio (três leões). Podemos constatar que a representação de leões na base dos túmulos foi particularmente utilizada na tumulária do Entre-Douro-e-Minho. Não estamos, portanto, perante a representação de um animal do quotidiano, estando na origem da sua presença em túmulos o seu forte conteúdo simbólico, nomeadamente religioso.
Ao longo do nosso estudo observámos que a representação de animais aumenta e diversifica-se à medida que "descemos" da tampa, local privilegiado para o homem se mostrar a Deus, para os laterais, cabeceira e secção dos pés do túmulo onde os animais se encontram num plano dirigido para a visão humana, com uma ligação simbólica ao defunto que remete, no caso dos cavalos, para a sua função terrena, e para a sua integração linhagística, no caso dos brasões, embora os escudos de armas também possam surgir, mas em menor número, nas tampas. Encontramos, igualmente, presentes nos arcazes representações que remetem para figurações alegórico-simbólicas de marcado conteúdo religioso.
Como animais do quotidiano encontramos representados na tumulária do Entre-Douro-e-Minho, para o período considerado, os cães, mas com uma conotação marcadamente simbólica que remete para a fidelidade vassálica e conjugal, qualidades particularmente valorizadas na sociedade feudal, assim como evocam a condição social do defunto, encontrando-se figurados tanto para o divino como para o "julgamento" dos vindouros. Os cavalos encontram-se conotados com o universo dos cavaleiros, grupo portador dos valores mais nobres de uma sociedade medieval idealizada, nomeadamente quando enquadrados na ideologia da sociedade trifuncionária, surgindo a missão providencial dos cavaleiros acentuada em dois casos, com a representação da cruz. Só num caso detectámos a presença de um cavalo na tampa, pelo que a representação de equídeos é dirigida essencialmente para o mundo dos vivos. Mas, teremos de ter em conta a representação de espadas e esporas nos jacentes que, tal como os cavalos, remetem os defuntos para a sociedade cavaleiresca, num local especificamente orientado para o Além.
Nos escudos de armas, além de surgirem leões e águias que, como acentuámos, foram dois animais particularmente escolhidos como símbolos heráldicos no Ocidente medieval, encontramos, igualmente, dois animais do quotidiano rural e das populações costeiras e ribeirinhas, as cabras e os peixes, que acentuam a ligação do homem à terra, surgindo uma vez os caprinos significativamente associados a elementos vegetais, o milho e a flor, representativos de uma natureza "domesticada". As cabras e os peixes encontram-se nos brasões que ocupam espaços topograficamente orientados para o olhar humano.
Os restantes animais apresentam um forte conteúdo simbólico religioso. É o caso da serpente, símbolo cristológico, no báculo do bispo representado na tampa de Paço de Sousa, e da pomba que representa o Espírito Santo na lâmina de bronze de Leça do Balio. O Tetramorfo remete, essencialmente, para uma ligação Céu-Terra exprimindo o movimento "descendente" da Palavra Revelada que redimiu a Humanidade, originando a possibilidade de salvação do homem, representando, assim, um simbólico movimento "ascendente" que transmite a aspiração do sepultado em alcançar a Corte Celestial. Os animais e o anjo que representam os Evangelistas encontram-se representados numa zona do túmulo voltado para o mundo dos homens no monumento funerário de D. Gonçalo Pereira. Igualmente dirigido para o olhar humano encontra-se o Tetramorfo na lâmina de bronze que assinala o sepulcro de D. Estevão Vasques Pimentel na sua secção terrena. Como observámos, ao Tetramorfo surgem associadas figurações de apóstolos, santos e clérigos (estes últimos no túmulo de D. Gonçalo Pereira) que são, por excelência, os intercessores dos homens para o mundo do Além. Quanto ao boi, presente na lâmina de Leça do Balio, ele surge, igualmente, com uma conotação simbólica, não obstante tratar-se de um animal do quotidiano rural. A explicação da sua presença revela-se, no entanto, problemática.
Por fim, os leões encontram-se representados como suportes dos túmulos com uma marcada função simbólica que remete para a fé na salvação final das almas e na justiça divina, enquanto que "afastam" as forças e espíritos malignos.
Podemos assim constatar que à profunda ligação do homem medieval à terra, associa-se o seu desejo de preservar na "última morada" animais simbolicamente conotados com a esfera do divino, surgindo como intercessores do seu desejo de participar da vivência dos eleitos, em representações que podemos considerar estereotipadas, dada a frequência da sua figuração na arte funerária medieval. Encontramos ainda animais representados com a intenção de perpetuar aquele que foi o estatuto social do defunto em vida e a sua integração familiar, pelo que o túmulo se constitui como um "monumento/documento" onde se preservam "sinais" individualizadores que os homens transmitiram de si próprios, tendo em vista, tanto o julgamento terreno, como o divino. Como tal, as representações dos animais, embora alguns deles sejam próprios do quotidiano, não surgem maioritariamente, como figurações deste, sobressaindo, antes, como codificações simbólicas que remetem os animais para as funções referidas.
Estamos, assim, perante uma visão da Natureza em que os seus elementos eram entendidos como "sinais" simbólico-alegóricos e que predominou na Idade Média nomeadamente até ao século XIII, prolongando-se, no entanto, ao longo desta, vindo a conviver, posteriormente, com propostas mais racionais de encarar o mundo terreno.
Por fim, resta-nos agradecer ao Professor Doutor Luís Krus as sugestões de trabalho que, amavelmente, nos transmitiu. ■
[1] M. do R. Bastos, “Prescrições Sinodais Sobre o Culto dos Mortos nos Séculos XIII a XV” in J. Mattoso, (dir.), O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1996, p.13.
[2] J. LeGoff, “Documento-Monumento” in R. Romano (dir.), Enciclopédia Einaudi, Vol.1, Memória-História, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1984, pp.95-106.
[3] M. J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), Trabalho Apresentado no Âmbito das Provas Públicas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica na Facaculdade de Letras da Universidade do Poto, Porto, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 1987, pp.387,388.
[4] Idem, p.392.
[5] Idem, p.389.
[6] A. F. do Amaral, Iniciação à Heráldica Portuguesa, Lisboa, ed. policopiada, 1988, p.11.
[7] M. J. Barroca, Op. Cit., p.417. As descrições dos monumentos funerários apresentados no nosso estudo foram retiradas, na sua maioria, desta obra. Quando tal não for o caso, ou às informações de M. J. Barroca adicionarmos outras, estas serão assinaladas em nota,
[8] Idem, pp.395,396.
[9] Idem, p.401.
[10] Idem, p.402
[11] Isabel Castro Pina salienta o facto dos membros da nobreza, nos séculos XIV e XV, elegerem, maioritariamente, os conventos mendicantes para neles instalarem as suas sepulturas, “como se lhes (franciscanos e dominicanos) estivesse atribuído um papel especial na intercessão pelos defuntos”. I. C. Pina, “Ritos e Imaginários da Morte em Testamentos dos Séculos XIV e XV” in J. Mattoso, (dir.), Op. Cit., pp.130,131.
[12] José Mattoso sugere esta topografia simbólica no seu estudo, “O Culto dos Mortos no Fim do Século XI”, in J. Mattoso, (dir.), Op. Cit., p.85.
[13] M. J. Barroca, Op. Cit., P.406.
[14] Idem, p.428.
[15] Citado por M. J. Barroca, Ibidem.
[16] Idem, pp.428-430
[17] Idem, p.430.
[18] Ibidem.
[19] L. Charbonneau-Lassay, El Bestiário de Cristo - El Simbolismo Animal en la Antigüedad y la Edad Media, vol. II, Palma de Mallorca, Sophia Perennis, p.775.
[20] G. Heinz-Mohr, Dicionário dos Símbolos - Imagens e Sinais da Arte Cristã, S.Paulo, Paulus, 1984, p.326.
[21] M. Osterreicher-Molwo, (red), Dictionnaire des Symboles, s.l., Brepols, 1992, p.281.
[22] M. J. Barroca, Op. Cit., p.413
[23] J.-E. Cirlot, Dicionário de Símbolos, São Paulo, Editora Moraes, 1984, p.144.
[24] J. Chevalier, A. Gheerbrant, Dicionário dos Símbolos, Lisboa, Editorial Teorema, s. d., p.170.
[25] M. J. Barroca, Op. Cit., p.441
[26] Referido por M. J. Barroca, Ibidem.
[27] Ibidem.
[28] A. De Mattos, “Uma Abadessa Clarista de Vila do Conde” in O Tripeiro, Vª Série, Ano I, nº 3, Porto, Junho de 1945, pp.57,58.
[29] M. J. Barroca, Op. Cit., p.442
[30] Idem, p.465.
[31] Idem, p.462.
[32] Idem, p.468.
[33] D. M. M. David, Escultura Funerária Portuguesa do Século XV, Dissertação de Mestrado, Lisboa, F.C.S.H. da Universidade Nova de Lisboa, 1989, p.130. Esta interpretação resulta, no entanto, problemática pois M. J, Barroca não referencia a cria na obra até agora citada, e mais tarde, em a “Escultura Gótica” in C. A. F. de Almeida, M. J. Barroca, O Gótico, Lisboa, Editorial Presença, 2002, p.243, afirma encontrarem-se dois leões aos pés dos jacentes. De resto, já neste sentido, Emídio Maximiano Ferreira tinha assinalado a presença de um pequeno leão aos pés do jacente de D. Brites de Andrade. E. M. Ferreira, A Arte Tumular Medieval Portuguesa-Séculos XIII-XV, Dissertação de Mestrado, Lisboa, F.C.S.H. da Universidade Nova de Lisboa, 1986, Inventário-ficha nº180.
[34] L. Charbonneau-Lassay, Op.Cit., vol. I, p.294.
[35] G. Heinz-Mohr, Op. Cit., p.67.
[36] M. Osterreicher-Molwo, (red), Op. Cit., p.129.
[37] M. J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), p.468.
[38] D. M. M. David, Op. Cit., p.129.
[39] Referido por M. J. Barroca. M J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), p.439.
[40] Ibidem.
[41] Referido por M. J. Barroca. Idem, p.426.
[42] P. Chambel, A Simbologia dos Animais n’”A Demanda do Santo Graal”, Cascais, Patrimonia, 2000, p.18.
[43] M J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), pp.460,461
[44] J. Mattoso, “João Soares Coelho e a Gesta de Egas Moniz” in J. Mattoso, Portugal Medieval – Novas Interpretações, Lisboa, imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1985, pp.409-435.
[45] Baseámo-nos nas representações dos cenotáfios de Egas Moniz reproduzidas em J. Mattoso, Portugal Medieval – Novas Interpretações, assim como na História da Arte em Portugal, vols.3 e 4, Lisboa, Publicações Alfa, 1986.
[46] P. Chambel, Op. Cit., pp.104-119.
[47] M. Pastoureau, La Vie Quotidienne en France et en Angleterre au Temps des Chevaliers de la Table Ronde, s.l., Hachette, 1991, pp.122-124.
[48] J. Mattoso, “João Soares Coelho e a Gesta de Egas Moniz” in J. Mattoso, Op .Cit., p.429.
[49] Ibidem. Um estudo detalhado sobre os dois cenotáfios de Egas Moniz, encontra-se em Manuel Luís Real, A Escultura Românica Portuguesa; ed. policopiada, pp.146-155.
[50] Guia de Portugal. Entre-Douro-e-Minho I. Douro Litoral, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1985, p.595. Citado em M. J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), p.446.
[51] G. de Champeaux, Dom S. Sterckx, Introducción a los Símbolos; Madrid, Ediciones Encuentro, 1992, 3ªed., p.510.
[52] G. Heinz-Mohr, Op. Cit., pp.366,367.
[53] José Mattoso, “O Culto dos Mortos no Fim do Século XI”, in J. Mattoso, (dir.), Op. Cit., p.85.
[54] P. Dias, História da Arte em Portugal – O Gótico, vol. 4, Lisboa, Publicações Alfa, 1986, pp.116-120.
[55] F. P. Macedo, “O Descanso Eterno. A Tumularia” in P. Pereira, (dir), História da Arte Portuguesa, vol. 1, Lisboa, Círculo de Leitores, 1995, p.439. Baseámo-nos nesta obra para a descrição do túmulo de D. Gonçalo Pereira.
[56] José Mattoso, “O Culto dos Mortos no Fim do Século XI”, in J. Mattoso, (dir.), Op. Cit., p.85.
[57] L. Krus, B. V. e Sousa, “ A Construção do Passado de uma Nobreza de Serviço – As Origens dos Pimentéis” in Y. Centeno, (coord.), Utopia – Mitos e Formas, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian – ACARTE, 1993, pp.105,106.
[58] Idem, p.106.
[59] L. Krus, “Pereira, Álvaro Gonçalves” in J. C. Pereira, (coord.), Dicionário Ilustrado da História de Portugal, vol. 2, Lisboa, Publicações Alfa, 1993, p.100.
[60] L. Krus, B. V. e Sousa, Op. Cit., p.112.
[61] M. L. Real, Op. Cit., p.109.
[62] P. P. Costa, L. Rosas, Leça do Balio no Tempo dos Cavaleiros do Hospital, Lisboa, Edições Inapa, 2001, p.104.
[63] M J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), p.473.
[64]M. L. Real, Op. Cit., p.122.
[65] Para o nosso estudo baseámo-nos nas representações da lâmina de Leça do Balio presentes em P. P. Costa, L. Rosas, Op. Cit., tendo destas sido efectuado ampliações que nos permitiram chegar às conclusões e hipóteses expostas.
[66] E. M. Ferreira, Op. Cit., p.82.
[67] G. de Champeaux, Dom S. Sterckx, Op. Cit., p.339.
[68] Idem, pp.339,340.
[69] D. M. M. David, Op. Cit., p.144
[70] J. Rodrigues, “A Escultura Românica” in P. Pereira, (dir), Op. Cit., pp.292,293.
[71] M. L. Real, Op. Cit., pp.118,119.
[72] E. M. Ferreira, Op. Cit., Inventário-ficha nº180.
[73] M J. Barroca, Necrópoles e Sepulturas Medievais de Entre-Douro-e-Minho (Séculos V a XV), p.458.
Revista Medievalista - FCSH-UNL
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