O Estado na América Latina
Já faz alguns anos, muitos, que o coronel Amen me contou. Acontece que um soldado recebeu a ordem de mudar de quartel. Por um ano, foi mandado a outro destino, em algum lugar de fronteira, porque o Superior Governo do Uruguai tinha contraído uma de suas periódicas febres de guerra ao contrabando.
Ao ir embora, o soldado deixou sua mulher e outros pertences ao melhor amigo, para que tivesse tudo sob custódia.
Passado um ano, voltou. E encontrou seu melhor amigo, também soldado, sem querer devolver a mulher. Não tinha nenhum problema em relação ao resto das coisas; mas a mulher, não. O litígio ia ser resolvido através do veredicto do punhal, em duelo, quando o coronel Amen resolveu parar com a brincadeira:
— Que se expliquem — exigiu.
— Esta mulher é minha — disse o ausentado.
— Dele? Terá sido. Mas já não é — disse o outro. — Razões — disse o coronel. Quero explicações. E o usurpador explicou:
— Mas coronel, como vou devolvê-la? Depois do que a coitada sofreu! Se o senhor visse como este animal a tratava... A tratava, coronel... como se ela fosse do Estado!
O Livro dos Abraços - Eduardo Galeano
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