Na Colônia e no Império, a impunidade atordoava autoridades e impressionava estrangeiros
Luís Francisco Carvalho Filho
A sensação de impunidade sempre existiu no Brasil. O primeiro dicionário da língua portuguesa, Vocabulario Portuguez e Latino, escrito pelo padre Raphael Bluteau e publicado em Coimbra entre 1712 e 1728, já estampava um verbete com a sua definição: “falta de castigo”, “tolerância”.
Não há estudos estatísticos capazes de comprovar a adequação deste sentimento à realidade durante os períodos colonial e imperial. Mas a preocupação de autoridades, exposta em documentos oficiais, e o relato de viajantes estrangeiros revelam que o problema da impunidade sempre esteve no centro da vida política brasileira.
Com a divisão do território em capitanias hereditárias em 1534, os governadores e seus ouvidores tinham carta-branca para julgar escravos, “gentios” (índios), “peões e cristãos e homens livres” até em caso de pena de morte. Mas a necessidade de povoar a nova colônia era mais imperiosa do que a aplicação da Justiça. A política de perdão, da tradição portuguesa, como incentivo ao povoamento, fica clara na carta de privilégio assinada na época pelo rei de Portugal, D. João III, estabelecendo que – com exceção dos crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa – nenhuma pessoa poderia aqui, em virtude dos crimes antes cometidos, “ser presa, nem acusada, nem proibida, nem forçada, nem executada, de maneira alguma”.
Duarte Coelho (1485-1554), donatário e primeiro governador da mais próspera das capitanias, Pernambuco, foi o primeiro a se queixar da vinda de degredados: "o que Deus nem a natureza remediou, como eu posso remediar, Senhor, senão com cada dia os mandar enforcar...”. Em carta a D. João III, Duarte Coelho reclamava também do comportamento dos demais governadores, que se recusavam a cumprir pedidos de prisão de infratores que se refugiavam em outras capitanias. Em 1546, ele adverte o rei sobre o perigo desse comportamento: “Os delitos e malefícios aqui cometidos, aqui hão de ser punidos e castigados. Se de minhas terras fugirem alguns malfeitores para outras, com temor do castigo, ou de outras para a minha (...) em breve tempo se despovoará o povoado e irá tudo ao través”.
A instalação do governo-geral, em 1549, tentou corrigir esse desvio com a fixação de uma autoridade suprema, Tomé de Souza (1503-1579): seu corregedor tinha a atribuição de ingressar e fazer justiça em todas as capitanias. Mas os relatos de sua administração indicam que ele também exerceu seu poder de julgar conforme as conveniências do momento.
No mesmo ano em que toma posse, Tomé de Souza ordena, sem um julgamento formal, que um índio acusado de assassinar um colono em Salvador fosse amarrado à boca de um canhão e atirado “pelos ares, desfeito em pedaços”. O simbolismo do ato seria percebido pelo inglês Robert Southey (1774-1843), no seu livro História do Brasil: “Mais humano para o padecente, mais terrível para os espectadores, não há suplício imaginável. Encheu de terror os Tupinambás e foi útil lição aos colonos”. Já no ano seguinte, ao saber da prisão de dois franceses no Sul por contrabando de pau-brasil – atividade que a Coroa considerava intolerável¬ –, Tomé de Souza decide garantir-lhes um destino bem menos drástico. Em carta ao rei, justificou-se assim: “Não os mandei enforcar porque tenho necessidade de gente que não me custe dinheiro”.
É bem verdade que não faltam exemplos de punição criminal rigorosa no Brasil colonial. O navegador francês Pyrard de Laval (1570-1621), que passou pela Bahia em 1610 depois de atribulada viagem, naufrágio e prisão no Oriente, relata ter visto a forca onde teriam sido executados 13 franceses em Salvador. Alguns governantes se notabilizavam pelo empenho repressivo. Foi o caso de César de Menezes, de Pernambuco, que na segunda metade do século XVIII promoveu a captura e o enforcamento do cangaceiro José Gomes, o Cabeleira, considerado precursor de Lampião.
Mas, em geral, o rigor extremo das Ordenações do Reino de Portugal – conjunto de leis que vigorou até 1830, quando foi editado o Código Criminal do Império no Brasil – era, na prática, pouco eficaz. Essa falta de efetividade decorre de uma série de fatores, como as sistemáticas políticas de perdão, a vastidão territorial, a ausência de autoridade nas vilas, os favorecimentos pessoais. O Tribunal da Relação, instalado no século XVII na Bahia, lento e distante das outras capitanias, também foi incapaz de atender às demandas por Justiça.
As queixas a respeito da impunidade eram comuns. Em 1745, uma carta régia de D. João V explicita a falta de efetividade das Ordenações e resume o sentimento da época: “... as leis costumam ser feitas com muito vagar e sossego, e nunca devem ser executadas com aceleração, e... nos casos crimes sempre ameaçam mais do que na realidade mandam”.
Em 1721, Rodrigo César de Menezes, governador de São Paulo, afirma ao vice-rei que matar gente é “um vício muito antigo em os naturais desta cidade”, e que mandou levantar a forca “na mesma parte em que antigamente estava”, para que, à vista dela, como um recurso de propaganda, “se pudessem abster de continuarem semelhantes delitos”.
Para pôr fim à impunidade, sobretudo nas camadas inferiores da população, Juntas de Justiça foram paulatinamente sendo criadas nas diversas capitanias, com o poder de aplicar a pena de morte. Sem direito a recurso ao Tribunal da Relação. A carta régia que instituiu a Junta de Justiça em Minas Gerais justificava-se pelos “muitos e continuados delitos que se estão fazendo (...) bastardos, carijós, mulatos e negros” porque “não viam o exemplo de serem enforcados”.
Já com a presença de D. João VI no Brasil, é criada em 1816 a Junta de Justiça do Rio Grande de São Pedro do Sul, atendendo a uma reivindicação do governador: “Nessa capitania se cometem muitos e atrozes delitos com dano dos meus fiéis vassalos... O motivo desta freqüência e multiplicidade e atrocidade de crimes é, além da ferocidade e falta de civilização de muitos dos habitantes desse vasto e ainda pouco povoado território, a impunidade dos delitos que, ou ficam de todo por punir, ou se lhes impõe as penas muito tempo depois e muito longe do lugar em que aconteceram”.
À medida que se consolidava o processo de colonização, formavam-se, principalmente nas regiões periféricas, núcleos de mandonismo local e redes de proteção. Na prática, as elites regionais conseguiam inviabilizar a aplicação da lei. Um indicador desse fenômeno é o reduzido número de execuções de pessoas integrantes da chamada “nobreza da terra”. E quando isso acontecia, eram degolados – a forca, considerada infamante, era reservada para a população comum.
A desigualdade perante a lei impressionaria viajantes estrangeiros no período imperial. O suíço Johann Jakob von Tschudi, que visitou o país na década de 1860, se pergunta: “Quantas vezes aconteceu no Brasil que um homem rico e influente tivesse sentado no banco dos réus a fim de se justificar de seus crimes?” A descrição do Poder Judiciário que faz Hermann Burmeister, naturalista alemão que viajou pelo Brasil de 1850 a 1852, também é severa: “Ninguém se peja de absolver ladrões conhecidos, assassinos notórios e defraudadores, quando o promotor os acusa, e tanto menos quando os acusados são ricos ou membros de alguma família influente”.
É que a Independência do Brasil, em 1822 e a edição dos nossos códigos, na década de 1830, não haviam mudado a situação. Em 1836, como aponta o pesquisador João Luiz Ribeiro, o Correio Oficial, que circulava no Rio de Janeiro, clamava contra a “doçura” da legislação e contra a impunidade, “tornada habitual”.
Em seu discurso de posse, Diogo Feijó, eleito regente do Império em 1835, frisava: “A impunidade deve cessar... O governo será infatigável em promover a execução das leis penais, cumpre que o cidadão pacífico, o homem honesto, não esteja a discrição do turbulento e do perverso”.
Anos mais tarde, Nabuco de Araújo, ministro da Justiça do imperador Pedro II entre 1853 e 1857, empreendeu uma cruzada sem precedentes contra a impunidade. Em dois anos foram executados pelo menos 17 homens livres pela prática de homicídios. Em Um Estadista do Império (1896), Joaquim Nabuco explica a atitude do pai: “Quando a sociedade fica assim paralisada, dominada pelo poder do crime, desmoralizada por efeito da impunidade, é preciso a autoridade, de qualquer modo, quebrar o prestígio dos facínoras”.
Nabuco, conforme o relato de seu filho e biógrafo, “incitava os presidentes (das províncias) a preocuparem-se sobretudo dos resultados, a não terem escrúpulo de algum excesso que pudessem cometer”.
É a outra face da moeda da impunidade. A repressão a todo custo. Sem escrúpulos de consciência, os fins justificam os meios. Em 1877, ao falar dos métodos adotados para a extinção de um quilombo em Iguaçu, no Rio de Janeiro, o ministro da Justiça, Francisco Januário da Gama Cerqueira, explica que “na esfera da atividade da polícia nem sempre é possível proceder de modo irrepreensível perante a lei”, e que os meios empregados “não são dos mais confessáveis, mas surtiram excelente efeito”.
O sentimento de impunidade dos crimes e o arbítrio da ação policial, como mecanismo tolerado de resolução desse problema político, formam no Brasil um círculo vicioso que ainda não se desfez.
LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO É ADVOGADO E ARTICULISTA DA FOLHA DE S. PAULO.
Saiba Mais:
BLUTEAU, Raphael. Vocabulario Portuguez e Latino. Coimbra, 1712-1728. Versão fac-similar no site do IEB/USP: http//www.ieb.usp.br/online/índex.asp
NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil a partir da Independência. I – Império. Porto Alegre: Livraria Sulina Editora, 1972.
NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil: Crônica dos tempos coloniais. Porto Alegre: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 1975.
Memória da Justiça Brasileira: Do condado portucalense a D. João de Bragança (Vol. 1); Da restauração portuguesa ao grito do Ipiranga (Vol. 2); Independência e constitucionalismo (Vol. 3). Salvador: Tribunal de Justiça da Bahia. Versão on-line: http://www.tjba.jus.
Revista de História da Biblioteca Nacional
Luís Francisco Carvalho Filho
A sensação de impunidade sempre existiu no Brasil. O primeiro dicionário da língua portuguesa, Vocabulario Portuguez e Latino, escrito pelo padre Raphael Bluteau e publicado em Coimbra entre 1712 e 1728, já estampava um verbete com a sua definição: “falta de castigo”, “tolerância”.
Não há estudos estatísticos capazes de comprovar a adequação deste sentimento à realidade durante os períodos colonial e imperial. Mas a preocupação de autoridades, exposta em documentos oficiais, e o relato de viajantes estrangeiros revelam que o problema da impunidade sempre esteve no centro da vida política brasileira.
Com a divisão do território em capitanias hereditárias em 1534, os governadores e seus ouvidores tinham carta-branca para julgar escravos, “gentios” (índios), “peões e cristãos e homens livres” até em caso de pena de morte. Mas a necessidade de povoar a nova colônia era mais imperiosa do que a aplicação da Justiça. A política de perdão, da tradição portuguesa, como incentivo ao povoamento, fica clara na carta de privilégio assinada na época pelo rei de Portugal, D. João III, estabelecendo que – com exceção dos crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa – nenhuma pessoa poderia aqui, em virtude dos crimes antes cometidos, “ser presa, nem acusada, nem proibida, nem forçada, nem executada, de maneira alguma”.
Duarte Coelho (1485-1554), donatário e primeiro governador da mais próspera das capitanias, Pernambuco, foi o primeiro a se queixar da vinda de degredados: "o que Deus nem a natureza remediou, como eu posso remediar, Senhor, senão com cada dia os mandar enforcar...”. Em carta a D. João III, Duarte Coelho reclamava também do comportamento dos demais governadores, que se recusavam a cumprir pedidos de prisão de infratores que se refugiavam em outras capitanias. Em 1546, ele adverte o rei sobre o perigo desse comportamento: “Os delitos e malefícios aqui cometidos, aqui hão de ser punidos e castigados. Se de minhas terras fugirem alguns malfeitores para outras, com temor do castigo, ou de outras para a minha (...) em breve tempo se despovoará o povoado e irá tudo ao través”.
A instalação do governo-geral, em 1549, tentou corrigir esse desvio com a fixação de uma autoridade suprema, Tomé de Souza (1503-1579): seu corregedor tinha a atribuição de ingressar e fazer justiça em todas as capitanias. Mas os relatos de sua administração indicam que ele também exerceu seu poder de julgar conforme as conveniências do momento.
No mesmo ano em que toma posse, Tomé de Souza ordena, sem um julgamento formal, que um índio acusado de assassinar um colono em Salvador fosse amarrado à boca de um canhão e atirado “pelos ares, desfeito em pedaços”. O simbolismo do ato seria percebido pelo inglês Robert Southey (1774-1843), no seu livro História do Brasil: “Mais humano para o padecente, mais terrível para os espectadores, não há suplício imaginável. Encheu de terror os Tupinambás e foi útil lição aos colonos”. Já no ano seguinte, ao saber da prisão de dois franceses no Sul por contrabando de pau-brasil – atividade que a Coroa considerava intolerável¬ –, Tomé de Souza decide garantir-lhes um destino bem menos drástico. Em carta ao rei, justificou-se assim: “Não os mandei enforcar porque tenho necessidade de gente que não me custe dinheiro”.
É bem verdade que não faltam exemplos de punição criminal rigorosa no Brasil colonial. O navegador francês Pyrard de Laval (1570-1621), que passou pela Bahia em 1610 depois de atribulada viagem, naufrágio e prisão no Oriente, relata ter visto a forca onde teriam sido executados 13 franceses em Salvador. Alguns governantes se notabilizavam pelo empenho repressivo. Foi o caso de César de Menezes, de Pernambuco, que na segunda metade do século XVIII promoveu a captura e o enforcamento do cangaceiro José Gomes, o Cabeleira, considerado precursor de Lampião.
Mas, em geral, o rigor extremo das Ordenações do Reino de Portugal – conjunto de leis que vigorou até 1830, quando foi editado o Código Criminal do Império no Brasil – era, na prática, pouco eficaz. Essa falta de efetividade decorre de uma série de fatores, como as sistemáticas políticas de perdão, a vastidão territorial, a ausência de autoridade nas vilas, os favorecimentos pessoais. O Tribunal da Relação, instalado no século XVII na Bahia, lento e distante das outras capitanias, também foi incapaz de atender às demandas por Justiça.
As queixas a respeito da impunidade eram comuns. Em 1745, uma carta régia de D. João V explicita a falta de efetividade das Ordenações e resume o sentimento da época: “... as leis costumam ser feitas com muito vagar e sossego, e nunca devem ser executadas com aceleração, e... nos casos crimes sempre ameaçam mais do que na realidade mandam”.
Em 1721, Rodrigo César de Menezes, governador de São Paulo, afirma ao vice-rei que matar gente é “um vício muito antigo em os naturais desta cidade”, e que mandou levantar a forca “na mesma parte em que antigamente estava”, para que, à vista dela, como um recurso de propaganda, “se pudessem abster de continuarem semelhantes delitos”.
Para pôr fim à impunidade, sobretudo nas camadas inferiores da população, Juntas de Justiça foram paulatinamente sendo criadas nas diversas capitanias, com o poder de aplicar a pena de morte. Sem direito a recurso ao Tribunal da Relação. A carta régia que instituiu a Junta de Justiça em Minas Gerais justificava-se pelos “muitos e continuados delitos que se estão fazendo (...) bastardos, carijós, mulatos e negros” porque “não viam o exemplo de serem enforcados”.
Já com a presença de D. João VI no Brasil, é criada em 1816 a Junta de Justiça do Rio Grande de São Pedro do Sul, atendendo a uma reivindicação do governador: “Nessa capitania se cometem muitos e atrozes delitos com dano dos meus fiéis vassalos... O motivo desta freqüência e multiplicidade e atrocidade de crimes é, além da ferocidade e falta de civilização de muitos dos habitantes desse vasto e ainda pouco povoado território, a impunidade dos delitos que, ou ficam de todo por punir, ou se lhes impõe as penas muito tempo depois e muito longe do lugar em que aconteceram”.
À medida que se consolidava o processo de colonização, formavam-se, principalmente nas regiões periféricas, núcleos de mandonismo local e redes de proteção. Na prática, as elites regionais conseguiam inviabilizar a aplicação da lei. Um indicador desse fenômeno é o reduzido número de execuções de pessoas integrantes da chamada “nobreza da terra”. E quando isso acontecia, eram degolados – a forca, considerada infamante, era reservada para a população comum.
A desigualdade perante a lei impressionaria viajantes estrangeiros no período imperial. O suíço Johann Jakob von Tschudi, que visitou o país na década de 1860, se pergunta: “Quantas vezes aconteceu no Brasil que um homem rico e influente tivesse sentado no banco dos réus a fim de se justificar de seus crimes?” A descrição do Poder Judiciário que faz Hermann Burmeister, naturalista alemão que viajou pelo Brasil de 1850 a 1852, também é severa: “Ninguém se peja de absolver ladrões conhecidos, assassinos notórios e defraudadores, quando o promotor os acusa, e tanto menos quando os acusados são ricos ou membros de alguma família influente”.
É que a Independência do Brasil, em 1822 e a edição dos nossos códigos, na década de 1830, não haviam mudado a situação. Em 1836, como aponta o pesquisador João Luiz Ribeiro, o Correio Oficial, que circulava no Rio de Janeiro, clamava contra a “doçura” da legislação e contra a impunidade, “tornada habitual”.
Em seu discurso de posse, Diogo Feijó, eleito regente do Império em 1835, frisava: “A impunidade deve cessar... O governo será infatigável em promover a execução das leis penais, cumpre que o cidadão pacífico, o homem honesto, não esteja a discrição do turbulento e do perverso”.
Anos mais tarde, Nabuco de Araújo, ministro da Justiça do imperador Pedro II entre 1853 e 1857, empreendeu uma cruzada sem precedentes contra a impunidade. Em dois anos foram executados pelo menos 17 homens livres pela prática de homicídios. Em Um Estadista do Império (1896), Joaquim Nabuco explica a atitude do pai: “Quando a sociedade fica assim paralisada, dominada pelo poder do crime, desmoralizada por efeito da impunidade, é preciso a autoridade, de qualquer modo, quebrar o prestígio dos facínoras”.
Nabuco, conforme o relato de seu filho e biógrafo, “incitava os presidentes (das províncias) a preocuparem-se sobretudo dos resultados, a não terem escrúpulo de algum excesso que pudessem cometer”.
É a outra face da moeda da impunidade. A repressão a todo custo. Sem escrúpulos de consciência, os fins justificam os meios. Em 1877, ao falar dos métodos adotados para a extinção de um quilombo em Iguaçu, no Rio de Janeiro, o ministro da Justiça, Francisco Januário da Gama Cerqueira, explica que “na esfera da atividade da polícia nem sempre é possível proceder de modo irrepreensível perante a lei”, e que os meios empregados “não são dos mais confessáveis, mas surtiram excelente efeito”.
O sentimento de impunidade dos crimes e o arbítrio da ação policial, como mecanismo tolerado de resolução desse problema político, formam no Brasil um círculo vicioso que ainda não se desfez.
LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO É ADVOGADO E ARTICULISTA DA FOLHA DE S. PAULO.
Saiba Mais:
BLUTEAU, Raphael. Vocabulario Portuguez e Latino. Coimbra, 1712-1728. Versão fac-similar no site do IEB/USP: http//www.ieb.usp.br/online/índex.asp
NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil a partir da Independência. I – Império. Porto Alegre: Livraria Sulina Editora, 1972.
NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil: Crônica dos tempos coloniais. Porto Alegre: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 1975.
Memória da Justiça Brasileira: Do condado portucalense a D. João de Bragança (Vol. 1); Da restauração portuguesa ao grito do Ipiranga (Vol. 2); Independência e constitucionalismo (Vol. 3). Salvador: Tribunal de Justiça da Bahia. Versão on-line: http://www.tjba.jus.
Revista de História da Biblioteca Nacional
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