Colheita do algodão, uma das raras matérias-primas renováveis em que os países africanos são competitivos no preço e na qualidade
A fraca diversificação das economias dos petro-Estados africanos teve consequências sociais dramáticas. Vitimou em primeiro lugar os seus próprios camponeses e comprometeu o futuro dos países vizinhos, não produtores, com prejuízo da sua segurança alimentar. Como «não consomem o que produzem e não produzem o que consomem » os países africanos tornaram-se dependentes das flutuações dos mercados mundiais e de factores conjunturais que perturbam o comércio regional.
Um dos casos mais paradigmáticos é o do algodão produzido pelos países da África ocidental e central, na retaguarda dos países do Golfo, com destaque para o Benim, Burkina Faso, Chade, Mali e Níger.
O algodão é uma das poucas matérias-primas renováveis em que os africanos são altamente competitivos em preço e qualidade. Pobres e pesadamente endividados, os países africanos produtores de algodão tiveram de se sujeitar às pressões do FMI e do Banco Mundial para privatizar e liberalizar o filão, desmantelando as empresas públicas que se encarregavam de comprar as colheitas a preços fixados pelo Governo e de fornecer sementes, adubos e apoios técnicos aos camponeses.
Tudo parecia correr de feição: a produção crescia e o ouro branco abria perspectivas de vida melhor para cerca de 20 milhões de camponeses e famílias. Não sabiam e não lhes explicaram que na economia globalizada são os maiores exportadores que fixam os preços para todos. No caso do algodão são os EUA, responsáveis por 37 por cento das exportações, à frente dos grandes produtores: Índia, Paquistão e Brasil.
Os produtores africanos de algodão puxaram o sinal de alarme e apresentaram uma queixa na Organização Mundial de Comércio (OMC) contra as (enormes) subvenções norte-americanas aos seus produtores e exportadores, responsáveis
pela queda dos preços. Na cimeira da OMC de Cancun reclamaram cláusulas de salvaguarda e mecanismos de compensação. Foram apoiados pela maioria dos países africanos membros da organização, mas «traídos » pelos grandes produtores do Sul, acérrimos defensores da liberalização e desregulação dos mercados agrícolas. A cimeira fracassou. Em 2005, o preço mundial do algodão tinha caído abaixo dos 55 cêntimos de dólar/libra; a este preço, os produtores africanos perdem dinheiro e são obrigados a reduzir as superfícies cultivadas. Os grandes produtores brasileiros e asiáticos ainda conseguem «aguentar» mesmo com margens reduzidas graças à economia de escala e à tecnologia biocrática.
Felizmente, há a China. É ela que absorve actualmente 60 por cento da produção africana. E com Pequim há sempre a possibilidade de negociar «esquemas» mutuamente vantajosos.
É evidente para a maioria dos analistas que a solução mais favorável para os países africanos passaria pela transformação in loco da matéria-prima em produtos acabados.
A indústria têxtil não requer grandes investimentos nem mão-de-obra altamente qualificada para gerar numerosos empregos. Contudo, os mercados nacionais africanos são demasiado exíguos e para sustentar uma indústria manufactureira economicamente viável seria necessário criar zonas de livre-câmbio e incentivar o comércio inter-regional. Alguns países africanos estavam a conseguir resultados encorajadores quando foram brutalmente interrompidos com a invasão dos mercados africanos pelos produtos chineses!
Como se disse, a China está aberta a todo o tipo de acordos mutuamente vantajosos. Poderia aceitar reduzir as suas exportações de têxteis para África em troca de contratos e concessões noutros sectores. Mas para tal era preciso que existisse uma indústria têxtil africana para proteger e isto depende em primeiro lugar da visão estratégica e da vontade política dos Governos e dos agentes económicos africanos.
Revista África 21
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