O tigre azul romperá o mundo.
Outra terra, a que não tem mal, a que não tem morte, vai nascer da aniquilação desta terra. Ela pede que seja assim. Pede a morte, pede o nascimento, esta terra velha e ofendida, ela está cansadíssima e, de tanto chorar por dentro, ficou cega. Moribunda, atravessa os dias, lixo do tempo, e quando é noite inspira piedade às estrelas. Logo logo, o Pai Primeiro executará as súplicas do mundo, terra querendo ser outra, e então solçtará o tigre azul que dorme debaixo de sua rede.
Esperando esse momento, osd índios guaranis peregrinam pela terra condenada.
- Você tem alguma coisa que dizer para nós, colibri?
Dançam sem parar, cada vez mais leves, mais voadores, e cantam os cantos sagrados que celebram o próximo nascimento da outra terra.
Lança raios, lança raios, colibri!
Buscando o paraíso chegaram até as costas do mar e até o centro da América. Rodaram selvas e serras e rios, perseguindo a terra nova, a que será fundada sem velhice nem doença nem nada que interrompa a incessante festa de viver. Os cantos anunciam que o milho crescerá por sua conta e as flexas voarão sozinhas na floresta; e não serão necessários o castigo e o perdão, porque não haverá proibição nem culpa.
Clastres, Hèléne. La terre sans mal. Le prophétisme tupi-guarani. Paris, Seuil, 1975.
Memórias do Fogo II
Eduardo Galeano
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