CASTRO ALVES
O poeta dos escravos
Responsável pela incorporação definitiva do negro à literatura brasileira,
Castro Alves viveu intensamente. Morreu jovem, mas a tempo de transformar o coração machucado em criação lírica e ocupar lugar importante na literatura brasileira.
Manhã ensolarada. Domingo, 14 de março de 1847. Aniversário de Clélia Brasília da Silva Castro, que faz 21 anos. Mas a alegria maior é outra. Clélia acaba de dar à luz o segundo filho, Antônio Frederico. Quem conduz o parto é o próprio pai, o médico Antônio José Alves.
Antônio passou os primeiros cinco anos na Fazenda Cabaceiras, hoje Muritiba, Bahia. A família muda-se para Salvador e Cecéu, em vez das aulas de matemática, prefere desenhar ou escrever e ler poesia. Aos treze anos, presencia cena que o marcaria: um escravo castigado no tronco.
A seara vermelha
Em 24 de janeiro de 1862, parte com o irmão para o Recife, a fim de cursar Direito. Antônio sai, José fica trancado em casa lendo, fumando e bebendo conhaque. Deprimido, suicida-se em 9 de fevereiro de 1864.
Reprovado duas vezes, Castro Alves freqüenta teatros e, num deles, encontra sua maior paixão: a atriz Eugênia Câmara. Ele está com 16 anos, ela com 26. Meses depois, escrevendo um poema para Eugênia, cospe sangue. O novo golpe o abala, mas é aprovado na Faculdade. Vem a crise. Dor no peito, tosse, sangue na boca. Vai para Salvador e, recuperado, retorna ao Recife. Escreve poesias que formariam o livro Os Escravos:
Cai, orvalho de sangue do escravo, /Cai, orvalho, na face do algoz. /Cresce, cresce, seara vermelha, /Cresce, cresce, vingança feroz.
O ciúme mata o amor
Eugênia cede aos encantos do poeta. Vão morar juntos e ele escreve a peça Gonzaga, ou A Revolução de Minas. Ao lado da luta pela Independência, coloca o que mais lhe interessa: a abolição da escravatura. O texto não agrada ao empresário de Eugênia.
Em 1867, Gonzaga estréia com êxito em Salvador. Ele sofre de ciúmes ao ver Eugênia cercada por admiradores. Segue para o Rio com carta de apresentação para José de Alencar, que o leva a Machado de Assis. Mas não consegue encenar a peça, e o casal segue para São Paulo. Ele continua os estudos na Faculdade de Direito paulista e fica amigo dos colegas Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. Os dois moram numa república e para lá se transfere Castro Alves. Cansada dos ciúmes, Eugênia o dispensa. É o fim do romance.
Navio Negreiro
Sete de setembro de 1868. Diante da aristocracia paulistana, o poeta declama O Navio Negreiro, em que se dirige ao pavilhão brasileiro hasteado pelos traficantes de escravos em seus navios:
Antes te houvessem roto na batalha / Que servires a um povo de mortalha! (…) Andrada! Arranca esse pendão dos ares!…
Os colegas carregam Castro Alves pelas ruas. O Gonzaga repete o êxito de Salvador. Mas o poeta se abate. Sai para caçar nas matas do futuro bairro do Brás. Ao saltar um riacho, a espingarda dispara e lhe atinge o calcanhar. O ferimento à-toa piora devido à tuberculose.
Os médicos o transferem para o Rio e, lá, amputam-lhe o pé. Convalesce escrevendo e ruma para a Bahia. Organiza Espumas Flutuantes. Conhece a segunda musa, a cantora Agnese Trinci Murri. Ela, porém, abandonada pelo marido, recusa toda aproximação.
No fim de junho de 1871, piora. Pede que ponham a cama perto da janela, para ver o sol. Delira. Num momento de lucidez, ora:
“Dai-me, meu Deus, mais dois anos para escrever tudo o que eu tenho na cabeça.”
Que pena, não deu tempo. Morreu em 6 de julho de 1871.
“As pessoas não morrem, ficam encantadas.”
Guimarães Rosa
Almanaque Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário