Livros malditos: códigos secretos
Ao longo da história, alguns livros - que ninguém sabe se realmente existiram - ganharam a fama de obras secretas e até hoje exercem fascínio em muita gente
por Mariana Sgarioni
A partir de agora, caro leitor, sinta-se num túnel do tempo. Estamos voltando para o passado, para uma época bem distante. Nosso objetivo é chegar a um lugar onde os meios de comunicação são muito raros – não há televisão, rádio, cinema, muito menos computadores com internet e telefones celulares. Nada de jornais nem revistas. Estamos falando de muito, mas muito tempo atrás. Algo como centenas de anos antes de Cristo. Imagine como você estaria por lá, lendo esta revista que tem em mãos – certamente ela não seria uma revista, mas um livro. Pois era assim que a informação se transmitia: por meio dos livros.
O problema é que cada um escreve o que bem entende – e é bem provável que este livro aqui, sobre conspirações e versões alternativas da história, não seria muito aceito pelos poderosos, já que fala dos bastidores da história, aquilo que não foi dito, que ficou nas entrelinhas. Por muito tempo, toda publicação que fugisse da concordância dos governantes, sobretudo dos totalitários, era sumariamente destruída.
Os livros malditos, ou livros proibidos, como são chamados, em geral tinham um toque de fantástico, de sobrenatural. Pouco ou nada restou deles, apenas a tradição oral que passou de geração para geração cultuando seus segredos – há quem diga, inclusive, que alguns deles conferiam até poderes especiais a quem os manejasse.
Mistérios de Alexandria
Desde o início das civilizações, diversas publicações foram escamoteadas do grande público, criando um enorme mistério acerca de seu conteúdo. O caso mais emblemático talvez tenha sido o da biblioteca de Alexandria, que foi totalmente destruída por conter exemplares de alquimia, magia negra e relatos de encontros com extraterrestres.
Fundada em 297 antes de Cristo pelo ateniense Demétrios de Phalére, a biblioteca da cidade de Alexandria, no Egito, tinha dimensões faraônicas: eram cerca de dez grandes salas e mais de 700 mil obras, entre pergaminhos, papiros e outros materiais. A lei do Egito na época ordenava que todo livro que entrasse no país fosse direto para a biblioteca de Alexandria – o proprietário ficava apenas com uma cópia.
A coleção de obras ali era um tanto diversa e polêmica. Era possível encontrar desde os mais variados textos água-com-açúcar até livros considerados perigosos por supostamente conferir poderes ilimitados aos seus leitores. Na verdade, a maioria eram escritos hindus sobre medicina, chineses sobre alquimia, gregos sobre mecânica, entre outros. Um dos livros que mais deram o que falar era de autoria do próprio Demétrios, um curioso sujeito que já naquela época gostava de descolorir os cabelos. Sobre o Feixe de Luz no Céu era o título do livro, provavelmente a primeira obra sobre discos voadores de que se tem notícia.
Ainda no domínio alienígena, a biblioteca guardava a obra de Bérose, um sacerdote babilônio que viveu na época de Alexandre, o Grande (356-323 a.C.). Em seu livro mais famoso, A História do Mundo, Bérose narrava seus encontros com uns seres semelhantes a peixes chamados Apkallus, que viviam em escafandros e teriam transmitido aos homens os primeiros conhecimentos científicos.
Com esse tipo de acervo, não era à toa que a biblioteca de Alexandria incomodasse. Por isso, durante muitos anos ela foi alvo de ataques. Quem começou a destruição foi o imperador romano Júlio César, em 47 a.C. O também romano Diocleciano (284-305) mandou tocar fogo em todas as obras que revelariam os segredos de fabricação do ouro e da prata. Isto é, todas as obras de alquimia.
Mas a pior e derradeira ofensiva ficou por conta dos árabes, no ano 646, quando tomaram a cidade. Eles achavam que não havia necessidade de nenhum outro livro no mundo que não fosse o Alcorão. Assim, todo o mistério de Alexandria se foi. Segundo escreveu o historiador muçulmano Abd al-Latif (1160-1231): “A biblioteca de Alexandria foi aniquilada pelas chamas por Amr ibn-el-As, agindo sob as ordens de Omar, o vencedor”.
O Livro de Toth
Estava também em Alexandria a obra completa do sacerdote e historiador egípcio Menethon. Considerado um sábio, teria escrito oito livros com todos os enigmas do Egito antigo decifrados, incluindo o misterioso Livro de Toth, considerado o “pai” dos livros malditos. Escrito há cerca de 10 mil anos antes de Cristo, sua autoria é atribuída a Toth, o deus da sabedoria, da escrita, da aprendizagem, da magia e da medição do tempo, entre outros atributos. Segundo o francês Jacques Bergier, pesquisador e autor de Os Livros Malditos, a primeira alusão ao Livro de Toth apareceu no papiro de Túnis, decifrado em 1868, em Paris, no qual é relatada uma conspiração para destruir o faraó por feitiçarias evocadas no começo do mundo. “O Livro de Toth dava o poder sobre a Terra, o oceano, os corpos celestes. Dava o poder de interpretar os meios secretos usados pelos animais para se comunicarem entre si, o poder de ressuscitar os mortos e de agir a distância”, afirma Bergier. “Seguramente, um livro como esse é um perigo insuportável.”
Há quem garanta que o Livro de Toth realmente ainda exista. E que esteja muitíssimo bem guardado, circulando em mãos nefastas que fariam parte de uma grande confraria conspiratória para ocultar todos os conhecimentos tidos como sobrenaturais: os Homens de Preto – sim, aqueles iguaizinhos ao filme, mas menos engraçados e mais sinistros. “Penso que esses homens vestidos de negro são tão antigos como a civilização. A meu ver, seu papel é impedir a difusão mais rápida do saber, difusão que conduziu à destruição de civilizações passadas”, diz.
Não é preciso ter uma mente tão elaborada para teorias conspiratórias como a de Bergier para notar que os livros, independentemente de seu conteúdo, são capazes de influenciar muita gente. Tanto é que, ao longo da história, eles continuaram a ser destruídos, seja na Inquisição ou nas Cruzadas, por razões religiosas, seja até recentemente nos regimes militares, por motivos políticos. Mas, sem dúvida, aqueles que contêm enigmas sobre a criação do mundo, evocações sobrenaturais ou demoníacas chegam mais rápido à fogueira – eles fazem a mente humana viajar para muito longe, talvez num túnel do tempo onde não haja controle. E isso apavora muita gente. Como disse certa vez o astrônomo britânico Fred Hoyle: “Estou convencido de que bastam apenas cinco linhas, não mais que isso, para destruir toda uma civilização”.
HP Lovecraft e seus livros execrados
Quando se fala em livros malditos, difícil não pensar no escritor americano Howard Phillips Lovecraft, que passou boa parte da vida se dedicando a livros de terror. De tanto evocar o misticismo sombrio, suas obras foram constantemente proibidas em diversas bibliotecas do mundo. Nascido em 1890, Lovecraft teve uma infância um tanto particular. Ele sofria de poiquilotermia, uma raríssima doença que fazia com que sua pele ficasse sempre gelada ao toque.
Muitos dos trabalhos de Lovecraft foram inspirados em seus constantes pesadelos. Seu livro mais famoso, Necronomicon, causa discussões acaloradas até hoje a respeito de sua autenticidade – há quem diga que o livro nunca foi escrito por Lovecraft. De toda forma, trata-se de uma obra soturna. O título original era Al-Azif – “azif” seria a palavra utilizada pelos árabes antigos para designar o som noturno (produzido pelos insetos) que, se supunha, ser o uivo dos demônios. É inteiro narrado pelo autor fictício Abdul Alhazared, um poeta louco que viveu em Sanná, no Iêmen, por volta de 700 a.C. Com sete volumes no original, chegou a cerca de 900 páginas na edição latina e seu conteúdo dizia respeito a supostas civilizações anteriores à raça humana.
Lovecraft morreu em 1937, de causas bastante terrestres: foi vítima de um câncer fulminante no intestino. Enterrado em Providence, nos Estados Unidos, sua lápide guarda a seguinte frase, retirada de um de seus contos mais populares, The Call of Cthulhu: “Não está morto o que pode eternamente jazer. E com estranhas eras pode até a morte morrer”.
Saiba mais
Livro
Os Livros Malditos, Jacques Bergier, Hemus, 1972
O autor aponta como tem havido uma destruição sistemática de livros e documentos contendo descobertas perigosas ao longo da história da humanidade até os dias atuais.
Revista Aventuras na Historia
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