Autora percorre escombros com “instantâneos” do movimento contra Bernardes
por Alfio Beccari
DIVULGAÇÃO
Marcas dos tiros de fuzis em prédios do Alto da Mooca
O livro Bombas sobre São Paulo – a Revolução de 1924, da historiadora Ilka Stern Cohen, tem, além de outras virtudes, o condão de lançar mais uma pá de terra sobre os velhos, enfadonhos livros de história que tivemos de deglutir nos bancos escolares. Bombas é uma obra que alia o rigor científico a uma saudável e bem-vinda preocupação com o prazer de ler. Para conseguir isso, a autora utiliza técnicas que ultrapassam aquelas corriqueiramente utilizadas pelos historiadores. Com suave competência, ela navega nas águas do jornalismo, da crônica de costumes, da iconografia, da reportagem. Em alguns momentos, tem-se a impressão de ver Ilka, caderninho e caneta em punho, caminhando entre os escombros da cidade bombardeada, a entrevistar paulistanos espantados, colhidos entre os fogos de uma briga que não era deles.
Mais do que escrever sobre um terrível episódio da história da cidade, ela “mostra” o que aconteceu, usando para isso um artifício imbatível: fotos. O livro Bombas tem mais fotos do que texto. Os “instantâneos”, no dizer da época, levam o leitor a percorrer uma São Paulo maltratada, ferida, violentada.
Não satisfeita com esse festival visual, a autora ainda caprichou na descrição da cidade de então, desde os aspectos urbanos até a maneira de falar dos ricos habitantes de bairros chiques como Higienópolis, que não se cansavam de repetir, misturando no português expressões importadas, elogios desmedidos a tudo que vinha do “estrangeiro”. Inclua-se aí um curioso cardápio, todo em francês, do elegante restaurante Trianon.
Assim, conduzindo o leitor pela mão, a historiadora conta o que foi essa revolta que teve início na madrugada de 5 de julho, quando 4 mil soldados do exército, comandados pelo general Isidoro Dias Lopes, marcharam sobre São Paulo, depondo o governador Carlos de Campos e exigindo a renúncia do então presidente da República Arthur Bernardes. A resposta do governo federal não demorou. Nos dias que se seguiram, aviões do exército bombardearam a cidade, atingindo bairros operários, como Brás e Mooca, e de classe média, como Perdizes. Nada menos que 1.800 prédios foram destruídos. Ao mesmo tempo, tropas enviadas do Rio de Janeiro entravam em choque com os revoltosos. Depois de 23 dias, 503 mortos e 4.876 feridos, a paz voltou a São Paulo, com a vitória das forças legalistas e a fuga dos revoltosos para o interior do Estado.
Curiosamente, a Revolução de 1924 é pouco lembrada em São Paulo e negligenciada pela maioria dos historiadores. Mais uma razão para dar as boas-vindas a este livro.
Alfio Beccari É jornalista
Revista História Viva
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