A comemoração dos 50 anos da capital do Brasil abre espaço para estudar como os centros urbanos se desenvolvem
Rita Trevisan
O TRAÇADO DA CIDADE A capital, desenhada por Lucio Costa, fugiu ao plano original antes mesmo da inauguração. Foto: Acervo/Arquivo público do Distrito Federal
Ela é uma cidade planejada, título que caracteriza poucos centros urbanos no Brasil (Palmas, Belo Horizonte, Goiânia, Londrina e Maringá) e no mundo (Washington, Filadélfia e Boston, nos Estados Unidos, Buenos Aires, na Argentina, Canberra, na Austrália, Alexandria, no Egito, e Nova Délhi, na Índia). E, embora 2010 seja o ano de seu cinquentenário, Brasília é bem mais antiga simbolicamente. Em 1823, José Bonifácio de Andrade e Silva (1763-1838), um dos articuladores da independência, propôs que a capital brasileira saísse do Rio de Janeiro e fosse para o interior, longe dos portos litorâneos. Quase 70 anos depois, foi instaurada uma comissão, composta de médicos, geólogos, astrônomos, botânicos e outros especialistas, para estudar a topografia e outras características da região do Planalto Central e apresentar um relatório ao governo sobre a ideia. Mas a cidade somente começou a ser de fato concretizada em 1955, quando o perímetro foi traçado para que, no ano seguinte, as obras tivessem início.
Essas informações revelam que Brasília é mais do que a sede dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Ela oferece vários aspectos para abordar em aula, para ir além do que os livros didáticos tradicionalmente propõem estudar (por exemplo, o funcionamento das estruturas políticas e o que a construção da cidade representou para o país).
Como as cidades são organizadas? De que maneira os cidadãos se relacionam e modificam o espaço do entorno? Essas são questões interessantes para debater com a garotada tendo nossa capital como pano de fundo (leia a sequência didática).
A dinâmica humana alterou a cidade planejada
Enquanto na maioria das cidades os bairros se desenvolvem ao redor e na vizinhança do centro, no Plano Piloto de Brasília, concebido pelo arquiteto Lucio Costa (1902-1976), eles foram implantados distantes do coração da metrópole. O objetivo era permitir que trabalho, casa e espaços coletivos estivessem próximos uns dos outros e os bairros fossem independentes. "A ambição de Costa era muito maior do que criar uma localidade funcional. Ele desejava instituir um espaço capaz de oferecer os benefícios da modernidade a todos os cidadãos de maneira equitativa", afirma Aldo Paviani, professor titular da Universidade de Brasília (UnB), pesquisador associado do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais (Neur) e organizador de diversas obras sobre a capital. Costa propôs também que ela tivesse uma dimensão monumental, além de um grande número de superfícies arborizadas. Todas essas ideias são resultado da forte influência do suíço Charles Edouard Jeanneret-Gris (1887-1965), dito Le Corbusier, que ao lado de Oscar Niemeyer é considerado um dos grandes arquitetos do século 20.
TRABALHO ÁRDUO O canteiro de obras para construir a capital atraiu migrantes de todo o país em busca de emprego
Foto: Acervo/Arquivo público do Distrito Federal
Porém, do papel à realidade, muita coisa mudou. É importante que os alunos compreendam que a cidade foi pensada para reunir, no máximo, 600 mil habitantes, mas a explosão demográfica já conturbava o traçado de Costa antes mesmo da inauguração. O grande número de migrantes, atraídos pela promessa de muitas ofertas de empregos e uma vida melhor, provocou um movimento de exclusão socioespacial, que acabou por marcar Brasília, tal como ocorre em outros espaços urbanos. "A migração intensa em 1958 exigiu que fosse criado o primeiro núcleo periférico, Taguatinga. Para lá foram transferidos milhares de trabalhadores que ocupavam as favelas próximas ao Núcleo Bandeirante, construído para abrigar os operários que construíram a capital. Com a chegada de mais migrantes, outras 28 regiões administrativas foram estabelecidas ao redor do centro", explica Paviani. Hoje, a despeito da modernização da cidade, esses núcleos revelam pobreza, carência da população em diversas áreas e falta de postos de trabalho.
Os efeitos provocados por 2,5 milhões de pessoas que residem em Brasília atualmente também precisam ser enfocados em sala. Definitivamente, a cidade escapou do modelo de urbanismo inicial e o que se vê num passeio pelas ruas é a repetição de alguns dos problemas que afligem outras localidades: centro lotado, trânsito pesado etc.
Pesquisando todos esses aspectos em fontes históricas e registros de fatos recentes, os estudantes vão entrar em contato com a dinâmica das cidades e relacionar esse processo com o histórico das ações humanas, do qual eles próprios fazem parte.
Revista Nova Escola
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