domingo, 31 de outubro de 2010

O Mistério de uma Civilização

Vale do Indo
O Mistério de uma Civilização
Descobertos por acaso quando os britânicos construíam ferrovias, os homens de cidades como Mohenjo-daro pareciam ser bem letrados, embora tenham desaparecido sem motivo aparente e sua escrita continue indecifrada.

Por Eduardo Negrão

Obed Suhail
Poço e plataformas de banho em Harappa datados de 2200-1900 a. C.
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Esta civilização, que hipnotiza os trabalhos arqueológicos até hoje, surgiu quando os britânicos, que dominaram a Índia entre 1757 e 1947, começaram a construir ferrovias em seus, então, domínios. Quando inauguraram o primeiro trem, os construtores viram que seria difícil obter material para a sustentação dos trilhos. Quando escavaram trilhos para estabelecer as linhas entre as cidades de Karachi e Lahore, os trabalhadores encontraram tijolos de argila cozidos.
Os engenheiros encarregados da obra, os escoceses John e William Brunton, examinaram os tijolos encontrados e viram que se tratava de um substituto econômico para o cascalho. Assim, deram ordem para que seus subordinados continuassem a desenterrar. Aos poucos, outros objetos, incluindo estatuetas e selos com inscrições desconhecidas, foram sendo descobertos.
Porém, ninguém tomou providências para que o local fosse adequadamente preservado, e as construções continuaram. Dessa forma, os tijolos da então desconhecida cidade de Harappa acabaram por ser a base para a construção de pelo menos 160 quilômetros da ferrovia. Apenas 65 anos depois é que os arqueólogos chegaram à conclusão de que ali havia uma civilização que era da mesma época dos mesopotâmicos. Esta foi conhecida como Civilização do Vale do Indo ou Harappeana.
John Marshall era o diretor das pesquisas arqueo lógicas na Índia durante a década de 1920. Foi em 1924 que ele anunciou a descoberta de uma nova civilização, seus trabalhos haviam começado apenas dois anos antes no que era então o noroeste da Índia e hoje é conhecido como Paquistão. Selos estranhos foram encontrados, gravados numa escrita desconhecida. Entretanto, Marshall e sua equipe nem poderiam imaginar que eram apenas sinais de cidades inteiras.
Um pouco mais de trabalho e logo apareceram os primeiros traços do que hoje se sabe ser as ruínas de Mohenjo-daro e Harappa, que indicavam a existência de uma grande civilização da Idade do Bronze, datada de um período estimado entre 2600 e 1900 a.C. Hoje, essas ruínas são conhecidas como “Civilizações do Vale do Indo” e cobrem uma área enorme. Havia pelo menos cinco cidades grandes, bem como vilarejos e pequenos assentamentos agrícolas.

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Os Edifícios
Mohenjo-daro, uma das cidades grandes, é a mais explorada e estudada até hoje. Os trabalhos recentes nessa cidade sugerem que no geral cobria uma área extensa (aproximadamente 200.670 metros quadrados). Destes, apenas 10% foram escavados. A área central, um enorme monte na cidadela, foi construído numa plataforma e paira cerca de 9 metros acima do nível do chão. É cercado por um muro, possivelmente para proteger os habitantes de inundações.
Muitas das construções na cidade, como em outros locais de escavação no Vale do Indo, foram construídas com tijolos cozidos. Há outros fatores comuns, incluindo o fato de que medidas padrões parecem ter sido usadas por toda a região. Também há por lá algumas construções proeminentes, incluindo uma conhecida como O Grande Banho, que parece ter sido importante parte de um ritual de purificação. O Banho mede 9,75 por 7,01 metros e tem uma profundidade de 2,44 metros. Os tijolos usados habitualmente foram mergulhados em betume para tornar o local à prova de água; era cercado por uma colunata e um complexo de pequenas salas. Havia próximo dali um celeiro de cerca de 50 metros.
A parte baixa da cidade, que poderia conter 100 mil habitantes, também estava acima do nível das inundações, embora fosse fortificada. Era constituída em forma de grade e as causas eram construídas ao redor de seus próprios quintais, que eram alguns metros mais altos. O que mais chama a atenção nessas construções é o fato da maioria delas possuir banheiros e um poço próprio e que eram conectadas ao sistema de esgoto da cidade, composto por uma série de redes de drenagem.

Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área


Uniformidade
O nível de uniformidade nas escavações é considerado perfeito, especialmente numa área tão ampla. Muitos assumiram que tal situação seria o resultado do domínio de uma elite, provavelmente rígida, mas não há provas arqueológicas que confirmem isto.
Não há residências de elite no local nem sinais de nenhum tipo de concentração de riqueza. Também não há sinais de investimentos em grandes funerais. Apenas há alguns vestígios de uma espécie de autoridade sacerdotal, embora hoje os pesqui sadores acreditem que as civilizações que lá floresceram eram do tipo igualitário, especialmente quando em contraste com outras civilizações contemporâneas como a cidade suméria de Ur, com seus elaborados enterros reais e sacrifícios.
Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área. De fato, um deles já era objeto de estudo em 1873. Hoje se sabe de cerca de três mil selos que vêm não apenas do Vale do Indo, mas de regiões vizinhas que pertencem a outras civilizações. Há inscrições sobre todo o tipo de coisa, que prova serem aqueles grupos bem letrados. A escrita possui cerca de 220 sinais simples e 200 compostos, que até hoje permanecem desconhecidos.
Até hoje não foi descoberta nenhuma inscrição bilíngue para que se pudesse comparar a língua com alguma conhecida. Até que isso aconteça, os grupos do Vale do Indo continuarão a ser classificados como pré-históricos. Afinal, não se sabe o motivo pelo qual desapareceram. Secas, enxurradas e invasões dos povos arianos (tribos bárbaras vindas da Ásia Central pelas montanhas do Hindu Kush), muitos foram apontados como motivos sem haver uma prova concreta e deverá permanecer assim até que sua antiga linguagem possa ser lida e dar alguma pista.

Revista Leituras da História

sábado, 30 de outubro de 2010

Ramsés II: O grande faraó

Ramsés II: O grande faraó
Tudo na vida de Ramsés II é opulento: viveu até os 90 anos (67 deles governando o Egito), venceu batalhas, construiu uma capital. E ainda manteve oito mulheres oficiais e uma centena de amantes
por Júlio Gralha*
O reinado de Ramsés II é, de certa forma, como as pirâmides – um símbolo da opulência egípcia. Chamado de Ramsés, o Grande, tudo na vida deste faraó é vultoso. Viveu 90 anos, dos quais 67 à frente do governo. No começo de seu reinado, partiu para Qadesh, cidade que demarcava o limite entre os impérios egípcio e hitita, enfrentou sozinho 2 500 bigas inimigas e saiu vivo – “com a ajuda de Amon-Rá”. Ramsés ainda fundou uma nova capital no norte do Egito, Pi-Ramsés, cobriu o seu país e a Núbia (atual Sudão) de monumentos aos deuses e estabeleceu uma paz no reino de cerca de 50 anos. O mais bem-sucedido faraó entre os deuses vivos teve tempo de ter oito rainhas – das quais Nefertari era a preferida –, mais de uma centena de esposas secundárias e concubinas e quase 200 filhos. Se não bastasse, a biografia de Ramsés II tem espaço também para controvérsias: é considerado por alguns pesquisadores como o faraó do Êxodo, a libertação dos hebreus relatada na Bíblia. Nesta entrevista, o faraó fala sobre seus feitos e polêmicas.
História - Existe algo que intriga os pesquisadores até hoje: o que aconteceu realmente na batalha de Qadesh, logo no início do seu reinado?
Ramsés - Ainda é difícil falar dessas coisas, mesmo 3 300 anos depois... Tudo aconteceu na primavera de 1274 a.C. Eu acreditava numa vitória fácil sobre os hititas. Assim, logo de início, consolidaria os feitos de meu pai, Sethi I. Mas não foi desse jeito. Estava perto do acampamento egípcio liderando a coluna de Amon, uma das quatro que levei, quando, de repente, uma nuvem de hititas furou a coluna e atacou o campo... Foi o terror! Invoquei Amon-Rá, meu deus. Com ele, enfrentamos sozinhos as milhares de bigas hititas.
Desculpe, Ramsés, mas realmente Amon-Rá interveio nesta batalha? Fala sério...
Tenho que confessar que uma tropa de elite surgiu, vinda de Amurru (atual Líbano), e manteve nossa posição até que outra coluna, a Seth, chegasse e nos salvasse. Não perdi e nem ganhei, e ainda consegui um tratado de paz duradouro com os hititas. E mais: uma nova esposa para o meu harém. Imagine para onde iria minha reputação se eu chegasse ao Egito dizendo que tomei uma coça dos hititas... Por isso sou um fiel devoto de Amon-Rá.
Mudando de assunto, você foi um dos faraós que conseguiu se tornar deus com culto ainda em vida. Como foi isso?
Antes de mim, Amenhetep III e Akhenaton tentaram, mas, cá entre nós, não tinham a minha competência. Se fosse nos dias de hoje, é como se o chefe do seu país – vocês chamam de presidente, né? – tivesse templos, santuários com suas estátuas. E, todos os dias, vocês fizessem preces e oferendas de pão, carne e cerveja para ele, pedindo trabalho, saúde, casamento, aumento, divórcio, essas coisas. Era assim que era feito comigo. Visite o templo de Abu Simbel no sul do Egito e você verá como fico bem entre os principais deuses no santuário. Ser deus é bom, ser rei também, mas ser ambos não tem preço. Vocês não sabem o prazer que dá.
Ouvimos sempre falar de suas centenas de mulheres e filhos. É tudo verdade?
Claro! E você tem dúvida? Tanto é verdade que construí uma tumba para os meus filhos, que aqueles seres horrendos, os tais egiptólogos, acabaram descobrindo e chamaram de KV5. Até agora eles descobriram 130 câmaras e acham que pode ter 200. Só que eu não vou dizer quantas eram. Agora que abriram a tumba, que trabalhem até encontrar.
Pelo jeito, você não gosta dos egiptólogos. Por quê? Foram eles que o transformaram num cara famoso hoje.
De fato, devo agradecê-los pelo que fizeram pela minha imagem nos últimos séculos. No entanto, tumba uma vez fechada não deve ser aberta. Eu sei que você vai dizer que havia ladrões de tumbas, blablablá. Mas já acordou com um monte de gente mexendo em você? Fazendo exames e exames? Mexendo no nariz, na boca? Pelo amor de Amon-Rá, isto não é nada agradável! Ah, como era bom o tempo em que eu podia visitar minha múmia na tumba sem ninguém por perto para perturbar...
Mas hoje sua múmia mora no Museu do Cairo e milhares de pessoas o visitam todos os anos. Isso não é incômodo?
Até era, mas agora as pessoas devem ficar em silêncio, não podem fazer movimentos bruscos – e, além disso, o ar purificado e condicionado é divino. E tem outra: tenho a companhia de outros como eu. Quando todos vão embora e fecham o museu, nós nos levantamos e vamos jogar sinete (antigo jogo egípcio) para passar o tempo.
Nefertari era mesmo sua rainha favorita?
Nefertari, Nefertari... Eu a amava profundamente. Construí um templo para ela próximo ao meu, em Abu Simbel. Só para ela fiz isso. Era meu braço direito. Você sabia que ela foi atuante nas relações diplomáticas entre o Egito e Hatti (o país dos hititas na Turquia)? Grande mulher.
Qual é o segredo da sua longevidade? Afinal, foram 90 anos numa época em que poucos chegavam aos 35.
Esse é um segredo que vai morrer comigo (risos). Talvez a opulenta e atlética vida que tive possa ter influenciado nisso. Talvez tenha sido uma dádiva do meu pai Amon-Rá. Talvez por eu ter uma família extremamente numerosa... Quem sabe?
E essa história do Êxodo dos hebreus? Foi mesmo no seu reinado?
Aprendi na internet no Museu do Cairo que não se discute religião, futebol e política. Posso dizer o que escuto nos corredores.
Não é a mesma coisa, mas gostaria de ouvir assim mesmo.
Os pesquisadores não acreditam nisso. Alguns acham que, se o Êxodo aconteceu mesmo, os hebreus atravessaram o mar de Juncos, que é bem rasinho, e não o mar Vermelho. No meu tempo não tínhamos nem um nome para os hebreus. Diversos grupos do Retennu (atual Palestina) eram chamados de apiru. Só por volta de 1100 a.C. meu filho Mer-en-Ptah escreveu pela primeira vez o nome Isr numa estela, quando conquistou a região. O nome foi traduzido como Israel depois.
* Júlio Gralha é historiador e mestre em Egito antigo pela Universidade Federal Fluminense

Saiba mais
Livros
Ramsés II Soberano dos Soberanos, Bernadeth Menu, Objetiva, 2002
A historiadora mostra como as qualidades de Ramsés faziam dele faraó por excelência
Deuses, Faraós e o Poder, Júlio Gralha, Barroso/Hemus, 2002
O livro aponta o papel de vários faraós na manutenção da teocracia do Egito
Site
www.kv5.com
Site que possibilita, entre outras coisas, um passeio por dentro das tumbas do Egito

Revista Aventuras na História

Átila, o único


Átila, o único
Famoso por desestabilizar o Império Romano e quase tomar Roma sozinho, o rei dos hunos lutou contra outros bárbaros e espalhou o terror pela Europa no século 5
por Isabelle Somma
O destino do maior e mais poderoso império sobre a terra estava em jogo naquele 20 de junho de 451, em Châlons, ao norte do que hoje é a França. Aecius, um respeitado general romano aguardava a chegada de seu inimigo. O poderoso exército romano já havia conhecido dias melhores, mas mesmo assim Aecius tinha sob seu comando 160 mil homens entre legionários de Roma e aliados bárbaros. Apesar de sua formação heterogênea e pouco confiável, da decadência da tropa, do atraso nos salários, não era a recordação de tempos melhores que afligia o general. Era seu oponente. Um homem cujo nome, em menos de 20 anos, tornara-se sinônimo de destruição e horror. O sujeito mais odiado de seu tempo já havia devastado boa parte da Europa e estava a caminho de seu coração: Roma. Era Átila, o rei dos hunos.
Em sua defesa, é bom que se diga que a má reputação dos hunos o precedia. “Eles ultrapassam todos os outros bárbaros em selvageria”, escreveu o historiador romano Amianus Marcelinus 60 anos antes do encontro em Châlons. “A expansão dos hunos não deve ser imputada a um só homem, nem tomada como um ato isolado desse líder”, diz Vânia Fróes, historiadora da Universidade Federal Fluminense. Segundo ela, a pressão dos hunos sobre a Europa é mais antiga que Átila. “Durante o século 3, sucessivas levas de hunos nômades partiram das estepes asiáticas, na Rússia central, em direção ao mar Negro, onde, por volta do ano 370, invadiram o território dos godos.” Talvez um dos povos mais avançados entre os bárbaros – como eram chamados os não romanos na Europa – os godos de origem germânica haviam migrado da Escandinávia durante o século 2 e, no final desse processo, dividido-se entre as regiões das atuais Romênia e Hungria (os visigodos, ou godos do oeste) e a Rússia (os ostrogodos, ou godos do leste). “Ambos foram empurrados Império Romano adentro: os ostrogodos vaguearam pela Macedônia, Croácia e Eslovênia, mas seus primos do leste foram mais longe e acabaram chegando a atual Espanha, onde reinaram até a invasão dos muçulmanos, em 711”, diz Jean Favier em seu Dictionnaire de la France Médiévale (“Dicionário da França Medieval”, inédito em português)
Tanto movimento acabou desalojando outros povos germânicos, como os vândalos, que rodaram a Europa, fugindo dos hunos e fazendo fugir os romanos. Os hunos eram realmente terríveis. Em oposição às tribos germânicas, que cultivavam a terra e que, em menor ou maior grau, já passavam por um processo de romanização (ou seja, conviviam numa boa com os romanos), eles permaneciam nômades, viviam de saques, dos resgates que exigiam daqueles que aprisionavam e da cobrança de ‘proteção’ de quem não queria ser atacado.
“Aos olhos dos romanos, eles eram os bárbaros que botavam os bárbaros para correr”, diz Favier. Concordemos que não era pouca coisa. Segundo o romano Marcelinus, eles lutavam como doidos e executavam qualquer um que não se rendesse. Por outro lado, valorizavam seus guerreiros mais corajosos e os mortos eram louvados como deuses. Eram exímios cavaleiros e, no início, utilizavam arco-e-flecha e lanças. Depois do contato com os romanos, porém, adotaram catapultas, escudos e capacetes.
Novo líder
Entre os chefes dessa turma estavam os irmãos Mundzuc, Octar e Rua, e foi no seio dessa família que surgiu um novo rei. Átila provavelmente nasceu no atual território da Hungria, às margens do rio Danúbio. Filho de Mundzuc, entre os anos de 435 e 440 ele herdou as terras de seu pai e de seus tios e ainda abocanhou o pedaço de seu irmão Bleda, depois de matá-lo. “O novo líder se mostrou desde o início, mesmo entre seu povo, muito mais agressivo e ambicioso que seus predecessores”, afirma Arther Ferrill, professor da Universidade de Washington, Estados Unidos, autor de Fall of the Roman Empire (“Queda do Império Romano”, inédito no Brasil).
Segundo Ferril, Átila ascendeu à liderança dos hunos num momento em que a principal potência do mundo antigo estava prestes a ruir e havia um certo vácuo de poder. “Desde a divisão entre Oriente e Ocidente, em 395, e depois da morte do imperador Teodósio, a queda do Império Romano passou a ser uma questão de tempo”, diz Ferrill. Teodósio dividiu o território entre seus dois filhos, Honório, que ficou com a parte ocidental, cuja capital permaneceu Roma, e Arcádio, com a porção oriental, com Constantinopla como sede.
“Na primeira metade do século 5, a parte ocidental do império sofreu um declínio em termos políticos e militares e quase foi substituída por reinos bárbaros”, diz Kenneth Dark, historiador da Universidade de Bristol, na Inglaterra. Ia longe os tempos dourados dos grandes imperadores e a invencibilidade das Legiões. Nos pontos mais remotos do Império, os soldados romanos – com salários atrasados e a estrutura de comando desorganizada – não ofereciam resistência aos invasores. E em regiões como a Bretanha e a Gália, precisavam da ajuda de ex-inimigos bárbaros para deter a invasão germânica. A coisa andava tão feia que 15 anos depois da morte de Teodósio, Roma foi saqueada pelos visigodos. Foi a primeira vez em 800 anos que a cidade foi atacada por bárbaros.
Poucos relatos sobre Átila sobreviveram à Idade Média. Todos o descrevem como um monstro que comia carne crua e que não descia do cavalo nem para dormir ou ir ao banheiro. Mas o único relato de alguém que conheceu Átila pessoalmente – e viveu para escrever a história – é do historiador romano Prisco. Ele foi um dos enviados do Império à corte de Átila, às margens do Danúbio, em 449. Prisco descreve o lugar como organizado, em que havia casas de madeira e até salas de banho.
“Uma refeição luxuosa em pratos de prata nos foi servida, mas Átila não comeu mais do que carne em um tabuleiro de madeira. Em tudo mais, ele também se mostrou contido. Seu copo era de madeira, enquanto que para os convidados foram dadas taças de ouro e prata. Suas roupas também eram bastante simples, se mostrando apenas limpas. A espada a seu lado, suas sandálias e as rédeas de seu cavalo não eram adornadas como as dos outros hunos, com ouro e pedras preciosas”, escreveu Prisco.
Mas no campo de batalha, Átila tinha fama de mau. Tanto que, quando ele invadiu a Trácia, no Império Romano do Oriente, quase não houve resistência. “Na época, Átila contava com um forte aliado: o medo que seus homens provocavam no inimigo. Com isso, ele conseguia altas somas em ouro simplesmente blefando”, diz Charles William King, da Universidade de Nebraska, nos Estados Unidos. Outra tática dos hunos era para lá de oportunista. Segundo King, como os conflitos com bárbaros eram cada vez mais comuns, Átila esperava ocorrer um ataque e, quando os romanos enviavam suas tropas, ele aparecia e as sitiava. Os romanos eram obrigados a escolher entre pagar e lutar contra dois exércitos ao mesmo tempo.
Em 447, eles decidiram lutar. Átila devastou a Trácia, pilhou monastérios e vilarejos e destruiu plantações. O imperador do lado Oriental, Teodósio II, aceitou pagar um tributo anual em ouro e terras para evitar o avanço dos hunos. O acordo incluiu a concessão a Átila do titulo de general honorário.
Às portas de Roma
Com o acordo garantido do lado oriental, Átila voltou suas flechas em direção oposta. Mesmo não precisando de nenhum motivo para invadir o Império Romano Ocidental, Átila conseguiu um. A irmã do imperador Valentiniano, Justa Grata Honoria, foi presa (o que para uma princesa significava ficar em seu palácio, isolada de visitas e festas) depois de engravidar de um funcionário da corte. Pensando em quem seria um rival a altura de seu irmão para salvá-la do martírio, Justa resolveu recorrer ao homem mais poderoso de que ouvira falar: ele mesmo, o rei dos hunos. E enviou a Átila uma carta pedindo ajuda. Em troca, lhe cederia uma fatia generosa do Império. “Átila teria interpretado o pedido como uma proposta de casamento e, segundo autores medievais, exigiu metade do Império Ocidental”, diz King. Mas será isso verdade? Não parece uma daquelas lendas medievais, com uma princesa raptada e um rude guerreiro bárbaro partindo em sua salvação?
Pode ser, mas o fato é que, por volta de 450, Átila começou a marchar em busca do que achava que era seu – seja Justa Honória, seja uma fatia do decadente Império Romano. Com ele, seguiram mais de 300 mil homens, entre eles os agora aliados ostrogodos, burgúndios e alanos, além de alguns francos. O enorme exército invadiu a região do vale do rio Reno e não poupou ninguém. Cidades como Reims, Mainz, Estrasburgo e Colônia viraram pó.

Revista Aventuras na História

A sacerdotisa minoana


A sacerdotisa minoana
Os minoanos não tinham exército e todos os seus deuses eram mulheres.
por Giba Stam
Por 3 600 anos, essa jovem bonita de vinte e poucos anos foi uma desconhecida para a história. Para sair do anonimato, ela teve de esperar seus ossos serem desenterrados na ilha de Creta, na Grécia. Mas, quando entrou em cena, se tornou protagonista de uma das maiores descobertas arqueológicas de todos os tempos e acabou revolucionando o que se sabia sobre a avançada civilização minoana, que durou de 2600 a.C. a 1000 a.C. Jamais saberemos como foi sua vida ou mesmo qual era seu nome, mas isso não importa muito. Sua fama se deve às circunstâncias extraordinárias de sua morte.
A sacerdotisa morreu durante uma cerimônia, quando o templo onde estava foi derrubado por um terremoto. Ela foi esmagada ao lado de um homem, encontrado com as mãos para cima, numa tentativa de se proteger. Ambos estavam em frente a um altar, usado pelos minoanos para sacrificar touros. Outra pessoa foi encontrada no corredor, por onde carregava um vaso pintado com a figura de um touro, usado para oferecer aos deuses o sangue de animais sacrificados. O vaso deveria ser deixado na sala do fim do corredor. Não deu tempo. Antes de chegar lá, ele também foi atingido, deixando o vaso se espatifar e o sangue se misturar ao dele no chão. Em seguida, o templo foi tomado pelo fogo e coberto de cinzas.
Logo que o casal de arqueólogos gregos Yannis e Efi Sakellarakis começaram a escavar as ruínas do templo, em 1979, ficou claro que a cerimônia havia começado com os primeiros sinais do terremoto. O sacrifício animal era comum entre os minoanos para acalmar os deuses. Por isso, quando desenterraram os ossos que estavam sobre o altar, em frente à sacerdotisa, todos pensaram que encontrariam os restos de um touro. Surpresa. Era uma quarta ossada humana. A vítima era um jovem de 18 anos e 1,60 de altura. Ao seu lado estava uma faca de bronze de 40 centímetros, ainda afiada.
Até então, todos consideravam os minoanos um povo pacífico. Ao contrário dos gregos, pelos quais foram dominados, eles não tinham exército, preferindo gastar o tempo com pinturas, esculturas e joalheria sofisticada. Construíram cidades que tinham até sistema de esgoto e adoravam apenas deusas – não havia nenhuma divindade masculina. Suas mulheres andavam de peitos de fora.
Os minoanos foram eternizados pela mitologia grega com a lenda do Minotauro, pela qual o rei Minos atirou a um monstro com cabeça de touro sete rapazes e sete moças virgens de Atenas. Até essa descoberta arqueológica, os historiadores achavam que a história do Minotauro era pura ficção e que não havia sacrifícios humanos na ilha.
Graças às técnicas atuais de reconstituição facial, sabemos hoje como era a sacerdotisa. Dona de belas feições, ela tinha entre 20 e 25 anos quando morreu. Provavelmente vestia vestidos longos e coloridos, passava ruge no rosto, usava brincos, colares, braceletes e tornozeleiras. Tudo indica que teve um papel religioso importante e que, como outras mulheres minoanas, participou ativamente da vida social de Creta. Para compensar o azar de ser atingida por um desabamento, teve a sorte de habitar uma ilha idílica, cercada por águas cristalinas, repleta de palácios e de manifestações artísticas sofisticadas.
Mas ela também teve suas dificuldades. Apesar de ser jovem, tinha osteoporose e anemia, o que tornava sua pele mais clara e fazia com que ficasse cansada facilmente. E, nos dentes, acumulou uma grande quantidade de tártaro, o que a deixava com mau hálito. Ninguém é perfeito.

Revista Superinteressante

Os senhores de Roma


Os senhores de Roma
Roma surgiu da união de tribos que viviam de modo rudimentar perto do rio Tibre. A lenda diz que tudo começou com dois irmãos adotados por uma loba. Em 1 200 anos, seus mais de mil líderes estiveram entre os homens mais poderosos do mundo.
por Paulo D·Amaro
I MONARQUIA / 753 - 509 A.C.
Roma passou de uma pequena cidade-estado a um reino poderoso. Apesar da estabilidade havia tensões, pois ali conviviam três povos de costumes diferentes. Sabinos e latinos eram dados à agricultura e ao pastoreio. Etruscos privilegiavam o comércio, o artesanato e a guerra
PATRÍCIOS
O rei era eleito por um conselho de aristocratas - os patrícios - entre os indicados pelo Senado. As guerras derem popularidade inédita aos reis, o que gerou ciúme entre os senadores
RÔMULO / 753 - 715 A.C.
Se ele é irmão gêmeo de Remo, que segundo a lenda foi salvo por uma loba, ninguém sabe. O fato é que o primeiro monarca de Roma foi mesmo um certo rei chamado Rômulo
II REPÚBLICA / 509 - 27 A.C.
Para muitos especialistas, a República foi a forma encontrada pelo Senado para manter o poder diante da crescente popularidade dos reis guerreiros junto aos mais pobres - os plebeus
TRAMAS E GOLPES
Um complicado sistema de governo baseado na eleição de duplas de cônsules escondia o fato de que os 300 senadores eleitos pelos patrícios é que mandavam. O povo conseguiu seus representantes, como os irmãos Caio e Tibério Graco - responsáveis por uma tentativa de reforma agrária e pela distribuição gratuita de pão. Mas a insatisfação geral, aliada ao fortalecimento dos generais, que expandiam os limites e o poder de Roma e traziam escravos e produtos para o consumo dos patrícios, colocou em xeque, mais uma vez, o poder do Senado. Uma série de golpes de Estado colocou fim ao sistema republicano
JÚLIO CÉSAR / 45 - 44 A.C.
Militar de família nobre, liderou as conquistas da Ibéria e da Bretanha. Escrevia sobre suas batalhas e enviava relatos a Roma, o que fez dele um ídolo popular. Foi feito cônsul do primeiro triunvirato (60 a.C.), mas tornou-se tão poderoso que iniciou uma guerra civil e destituiu os outros dois, proclamando-se ditador. Aos 56 anos de idade foi apunhalado num complô nas escadarias do Senado romano. Acabou emprestando seu nome aos imperadores que viriam e virou sinônimo de líder poderoso e absoluto, dando origem aos termos "czar" na Rússia e "kaiser" na região onde hoje fica a Alemanha
III IMPÉRIO / 27 A.C. - 476 D.C.
A expansão territorial e crises internas abriram caminho para os usurpadores, motivo pelo qual houve períodos com mais de um imperador declarado (veja as listas ao lado). O Império ruiu com a invasão dos bárbaros, no século 5
OTÁVIO AUGUSTO / 27 A.C. - 14 D.C.
Pacificou Roma com "pão e circo". Fez a maioria das obras vistas hoje em ruínas. Seu exercito chegou a ter 300 mil homens. Morreu doente aos 77 anos
CALÍGULA / 37 - 41
Destruiu a confiança na figura do imperador conseguida por Augusto. Nomeou seu cavalo cônsul e substituiu as estátuas dos deuses por imagens de seu próprio rosto. Foi assassinado aos 28 anos
NERO / 54 - 68
Incendiou Roma para reconstruí-la ao seu gosto. Exilou a mulher e tramou a morte da mãe. Suicidou-se aos 30 anos de idade
TRAJANO / 98 - 117
Estendeu os limites do Império ao máximo. Construiu estradas e modernizou portos. Criou a figura do "curador" uma espécie de prefeito. Morreu aos 65 anos de idade
ADRIANO / 117 - 138
Culto e mais inclinado às palavras do que às armas, deu aos romanos 20 anos de paz. Realçou as belezas da cidade e promulgou leis que regeram Roma por dois séculos. Morreu doente aos 62 anos
MARCO AURÉLIO / 161 - 180
Filósofo, promoveu o reerguimento cultural de Roma. Aos 59 anos, morreu doente (e não assassinado pelo filho Comôdo, como no filme O Gladiador)
CONSTANTINO / 306 - 337
Determinou o fim da perseguição aos cristãos, permitindo-lhes o culto e a abertura de templos. Mudou a capital do Império para Bizâncio (futura Constantinopla). Morreu doente em 337
TEODÓSIO / 378 - 395
Oficializou o cristianismo. Separou o Império em dois: o do Oriente e o do Ocidente. Morreu aos 50 anos de idade
ROMA: DO NASCIMENTO À MORTE
MONARQUIA
753-715 a.C. Rômulo
715-673 a.C. Numa Pompílio
673-642 a.C. Túlio Hostílio
642-617 a.C. Ancus Márcio
616-579 a.C. Tarquínio Prisco
578-535 a.C. Sérvio Túlio
534-510 a.C. Tarquínio Soberbo
REPÚBLICA
509-31 a.C. Cerca de mil cônsules governaram
60 a.C. Crasso, Pompeu e Júlio César
45-44 a.C. Júlio César
44-31 a.C. Otávio Augusto, Marco Antônio e Lépido
31-27 a.C. Otávio Augusto
IMPéRIO
27 a.C.-14 d.C.Otávio Augusto
14-37 Tibério
37-41Calígula
41-54Cláudio
54-68 Nero
68-69Galba
69Oton e Vitélio
69-79Vespasiano
79-81Tito
81-96Domiciano
89Saturnino
96-98Nerva
98-117Trajano
117-138Adriano
138-161Antônio Pio
161-166 L. Verus
161-180Marco Aurélio
180-192Cômodo
192-193Pertinas
193Dídio Juliano
193-211Sétimo Severo
211Geta
211-217Caracala
217-218Macrínio
218-222Elagabalo,Seleuco, Urânio, Gelo Máximo e Vero
222-235Severo Alessandro e Tauríneo
235-238Maximínio Tras, Magno e Quartinus
238Gordiano I, Gordiano II, Pupieno e Balbino
238-244Gordiano III
244-249Filipe I
247-249Filipe II
248Pacaciano, Iotapiano, Silbanco,Esponsiano
249-251Trajano Décio
250Júlio Prisco eLiciniano
251Erênio Etrusco,Hostiliano
251-253Treboniano Galo e Volusiano
253Urânio Antonino, Emílio e Emiliano
253-268Valeriano I, Maredes, Valeriano II e Galieno
268-269Ingeno, Regaliano, Macriano I, Macriano II, Quieto, Piso, Valens, Balista, Múcio, Emiliano, Memor, Celso, Auréolo, Saturnino, Censorino, Póstumo, Laeliano e Mário
269-270Cláudio II
270-273Quintílio, Felicíssimo, Tétrico I, Tácito e Aureliano
271-272Domiciano, Urbano, Setímio e Vabalato
273-274Tétrico II e Firmo
274-282Floriano e Probo
280-281Bonoso, Saturnino e Proculo
282-284Caro, Numeriano e Carino
284-305Diocleciano e Tetrarco
284-305Caráusio, Aleto, Domício, Maximiniano Hercúleo, Constâncio I, Cloro Galério, Maximino Daia e Severo II
306-312Maxêncio
306-313 Constantino e Tetrarco
313-324Constantino e Licínio
308-309Domício Alessandro
306-313Constantino e Tetrarco
313-324Constantino e Licínio
314Valens
324Martiniano
333-334Calocaero
337-340Constantino II
337-350Constâncio I
350-361Constâncio II
350-355Magnêncio, Vetrânio Nepociano e Silvano
361-363Juliano II
363-378Joviano, Valenciano I, Firmo Procópio, Marcelo Graciano e Valens
375-392Valentiniano II
378-395Teodósio I
383-388Magno Máximo e Flávio Vitor
392-394Eugênio
393-423Honório
407-411Constantino III, Prisco, Constâncio Máximo
411-415Jovino, Prisco Atalo e Sebastiano
421Constâncio III
423-425Johannes
425-455Valentiniano III
455Petrônio Máximo
455-456Ávito
457-461Majoriano
461-465Líbio Severo
467-472Antemo
468-472Arvando, Romano e Olívio
473-474Glicério
474-475Júlio Nepos
475-76Rômulo Augusto

Revista Superinteressante

A Praga de Atenas

Fim do mistério: foi uma epidemia de febre tifoide, e não o poder de Esparta, que derrubou o império grego
Luciana Sgarbi
DERROTA O quadro A peste de Atenas, do pintor belga Michiel Sweerts,retrata o drama dos doentes

Foi no período de maior esplendor da Grécia, a chamada Era de Ouro de Atenas (429 a.C), que um bravo guerreiro tremeu pela primeira vez. Péricles, líder militar e maior personalidade política de seu tempo, estava preparado para vencer qualquer guerra – seus inimigos o temiam sobretudo por sua habilidade como estrategista. Mas dessa vez Péricles tremeu diante de um adversário letal, invisível e com estranho poder de destruição. Atenienses e espartanos disputavam a hegemonia no início das guerras do Peloponeso, quando uma doença misteriosa, o tal do inimigo invisível, infestou Atenas. “(...) Os curadores nada podiam fazer, pois desconheciam a natureza da enfermidade e, além disso, foram os pioneiros no contato com os doentes e morreram em primeiro lugar. O conhecimento humano mostrou-se incapaz. Em vão se elevavam orações nos templos e se dirigiam preces aos oráculos. Finalmente, tudo foi renunciado ante a força da epidemia”, diz um trecho do antiquíssimo relato original do historiador grego Tucídides, contemporâneo da tragédia que ficou conhecida como a “Praga de Atenas”. Essa praga vem sendo estudada durante décadas pelos principais centros de epidemiologia e já se suspeitou de peste bubônica, varíola, tifo transmitido por piolhos (comum em épocas de guerra devido aos aglomerados humanos em lugares de péssima higiene) e até de surto de infecção pelo vírus Ebola. Na semana passada, finalmente a ciência comemorou o fim do mistério com artigos publicados nas mais conceituadas revistas especializadas do planeta.

RELATO
O historiador grego Tucídides
sobreviveu e deixou registros sobre a doença

O infectologista grego Manolis Papagrigorakis, da Universidade de Atenas, valeu-se de testes genéticos em restos mortais (cavidade de dentes) de atenienses da época da guerra do Peloponeso. Descobriu que Atenas ajoelhou-se diante de Esparta não pela força do exército adversário, mas, isso sim, porque era impossível resistir ao micro-organismo Salmonella typhi, causador da chamada febre tifoide. Transmitida por água ou alimentos contaminados com resíduos humanos (comum em situações de higiene precária), a enfermidade provoca problemas cardíacos, gastrointestinais, complicações neurológicos e profunda e inevitável prostração – inimiga maior de um combatente. “Descobrimos uma sepultura coletiva com restos de vítimas da epidemia. Tive certeza de que o enigma estava resolvido”, diz Papagrigorakis. Os pesquisadores conseguiram recolher material suficiente para a identificação do micróbio que causou o surto. Utilizando técnicas de recombinação de genes, fragmentos do material genético de uma bactéria semelhante à atual Salmonella typhi foram recuperados no interior da polpa de dentes ainda existentes em ossadas. A epidemia matou uma a cada quatro pessoas, provocando a derrocada de Atenas. A maioria dos soldados morria nove dias após adoecer. “Naquela época o homem se preparava para uma guerra com grandes armaduras. Atenas jamais imaginou que perderia para um inimigo de menos de um milímetro”, diz Papagrigorakis.


Revista Istoé

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Bactéria da febre tifóide pode ter causado praga na Grécia Antiga

Bactéria da febre tifóide pode ter causado praga na Grécia Antiga
Doença dizimou a população de Atenas no fim do século V a.C.
Análise isolou DNA do micróbio em polpa dentária das vítimas.

Luis Fernando Correia
Especial para o G1

As doenças infecciosas em surtos ou epidemias sempre foram capazes de alterar o curso da história. Um dos mistérios da história da medicina é a chamada “Praga de Atenas”, que dizimou dois terços da população dessa cidade grega na Antiguidade durante a guerra contra Esparta.

Os médicos sempre debateram o que poderia ter causado a epidemia, mas só dispunham do relato de um historiador da época, Tucídides, que deixou relatos minuciosos da doença, da qual ele mesmo foi uma das vítimas, embora tenha se recuperado. Um grupo de pesquisadores gregos parece ter conseguido esclarecer agora o que aconteceu naquela época.

A descrição histórica fala em uma doença que avançou sobre a cidade vinda do norte da África. A população ateniense, envolvida em uma guerra contra Esparta, encontrava-se entrincheirada dentro de seus muros, vivendo em situação pouco higiênica. A partir da descoberta de uma sepultura coletiva com restos das vítimas da epidemia, os pesquisadores conseguiram recolher material suficiente para a identificação do micróbio que causou o surto.

Utilizando técnicas de recombinação genética, fragmentos de material genético de uma bactéria semelhante à atual Salmonella typhi foram recuperados de dentro da polpa de dentes preservados. A infecção em Atenas já havia sido identificada anteriormente como peste bubônica, varíola e até mesmo como um surto precoce da infecção pelo vírus Ebola.

Luis Fernando Correia é médico e apresentador do "Saúde em Foco", da CBN.

Portal G1

A Última Semana. Um relato detalhado dos dias finais de Jesus

Marcus J. Borg e John Dominic Crossan, A Última Semana. Um relato detalhado dos dias finais de Jesus. Rio de Janeiro, Ediouro, 2010, tradução de Alves Calado, 268 pp., ISBN 9788561706999.
Pedro Paulo A. Funari
Professor Titular do Departamento de História, IFCH/Unicamp, C. Postal 6610, Campinas, 13081-970,
SP, ppfunari@uol.com.br.

A Semana Santa é o ápice do calendário cristão, toda a fé está fundada nos dias finais de Jesus, que culminam no Domingo de Páscoa. Como disse Paulo de Tarso, se Jesus não ressuscitou, não há salvação cristã (I Cor. 15:14: “Se Cristo não ressuscitou, nossa proclamação e a fé de vocês foram em vão”). Os estudiosos do cristianismo inicial Borg e Crossan procuram, neste belo volume, explicar o caráter simbólico do relato da vida de Jesus e, em particular, dos seus últimos dias, como sumário de sua trajetória terrena. Não estão nem um pouco interessados em estabelecer, restabelecer, o que efetivamente aconteceu, buscar distinguir fato de ficção. Ao contrário, mostram, de maneira magistral, como apenas uma leitura alegórica, ou parabólica, como eles preferem designar, permite entender a lógica e profundidade do relato de Marcos sobre os dias finais de Jesus. Convém explicar o que eles entendem por parábola e como ela se diferencia da concepção moderna de verdade. Contrapõem a verdade positivista de algo que ocorreu e todos podem constatar de forma objetiva à subjetividade que está subjacente a uma narrativa verossímil, possível. A parábola do filho pródigo é, nesta perspectiva, prenhe de verdade, por conter uma lição: o filho gastador se afasta, gasta tudo e, quando volta para casa, é recebido pelo pai com júbilo. Ninguém se pergunta se existiu um filho chamado tal, que tenha vivido em tal cidade, em tal época: o que importa é seu caráter universal. O mesmo é aplicado pelos autores a todos os relatos do Evangelho de Marcos e, em particular, no que se refere à sua entrada em Jerusalém, no Domingo de Ramos, até sua ressurreição no Domingo de Páscoa.
Seus argumentos são simples e claros. O relato de Marcos é grande parábola, não precisa ter nenhuma relação muito direta com os acontecimentos que uma câmera de gravação teria podido captar, se isso fosse possível àquela época. Interpretam toda a semana como uma contraposição de dois mundos, ou de duas concepções de mundo: a imperialista romana, baseada na força, e a messiânica hebraica, fundada no amor, na paz e na justiça na terra. A primeira representa a sociedade de classes, opressora, por oposição à visão camponesa da comunidade que tudo compartilha. Jesus entra montado num burrico, numa contra-parada, em relação à entrada de Pilatos e suas tropas, no Domingo de Ramos. Há dois reinos de deus em disputa: o de Roma, do imperador, aclamado como deus e filho de deus, fundado na paz resultante da violência e da dominação. E há outro reino de Deus, também nesta terra, com Jesus como Deus e filho de Deus, um caminho para a paz resultante do amor pelo próximo.
Em Marcos, nada busca descrever o que aconteceu. Tudo que se menciona tem um propósito simbólico. Assim, na terça-feira santa, Jesus, perguntado sobre o primeiro dos mandamentos, responde que “amarás o teu próximo como a ti mesmo” está junto com o amor a Deus, na frente de todos. Borg e Crossan não dizem que Jesus disse isso na terça: pouco importa. Ressoa o ensinamento de Jesus, de toda sua vida, tal como entendida por volta de 70 d.C., quando da redação do Evangelho de Marcos. E acrescentam: “amar o próximo significa recusar-se a aceitar as divisões entre respeitados e marginalizados, justos e pecadores, ricos e pobres, amigos e inimigos, judeus e gentios”.
A Páscoa, nesta leitura simbólica, representa que Jesus vive: não está entre os mortos, e sim entre os vivos. Jesus é o Senhor deste mundo e, portanto, os senhores deste mundo não o são. A Páscoa mostra que os sistemas de dominação deste mundo, como o romano e o americano, nos dias de hoje, não são obras de Deus e não persistirão. Nem todos os leitores compartilharão dessa perspectiva geral do volume, que interpreta as narrativas do Evangelho de Marcos e a vida de Jesus como entendida por seus seguidores iniciais como uma contestação da dominação de classe. No entanto, há um aspecto muito importante, bem explorado pelos autores: as diferenças de concepção do mundo dos antigos, sempre atentos à magia do mundo e alheios à noção moderna de fatos empíricos e de verdades objetivas que não dependam do observador.
Os antigos, tanto gregos, romanos com hebreus, consideravam o mundo embebido em espiritualidade. O Salvador do mundo, com poderes divinos, podia ser o imperador ou Jesus, mas ambas as concepções eram religiosas e simbólicas. Por isso mesmo, a ressurreição de Jesus era tão crível quanto a ascensão do imperador morto ao mundo dos deuses. Por outro lado, a mensagem dos autores vai contra a leitura literal da Bíblia por fundamentalistas, uma leitura positivista, como eles afirmam, que busca apenas comprovar que tudo ocorreu como descrito, a despeito das contradições e divergências nos próprios textos antigos. A grande mensagem do volume consiste em mostrar o relato da Páscoa em todo seu rico simbolismo.

Revista Alétheia

Semana História Antiga

Ritos funerarios da Antiga Grécia

Urnas funerarias, Atica, s. VII a. C.

O uso mais antigo entre os gregos para com seus mortos foi o do enterro. Pausanias que nos deixou uma enumeración exacta do sepulcros mais distintos daqueles nos diz que os tinham nos campos, nas orlas do mar, ao pé ou na cimeira das montanhas.

Então, punham as urnas que continham as cinzas em casas particulares e às vezes nos mesmos templos mas estes exemplos ao princípio foram raros não se concedendo esta distinción senão aos chefes da administração e aos generais que tinham defendido à pátria. O enterro na Grécia sempre esteve em uso mais que em toda outra parte tendo aquelas gentes particular cuidado de levar os cadáveres fora das populações. Os povos de Sicinio, de Delos e de Megara, os tebaicos, osmacedonios, os moradores do Quersoneso e de quase toda a Grécia observaram a mesma prática.

Lápida funeraria grega, 100 a. C.[[]]Licurgo

foi o único que permitiu as sepulturas dentro das cidades nos templos e nos lugares públicos em que o povo se congregaba. Mas os legisladores mais famosos fizeram daquela prática um ponto interessante em seus códigos. Cecrops quis que os mortos fossem levados fora de Atenas.Solón adoptou e restabeleceu em todo seu vigor este prudente regulamento de maneira que até no final desta república não se achou em Atenas mais que um curto número de pessoas enterradas dentro da cidade cuja honorífica disitnción somente foi concedida a alguns heróis e ainda nestes últimos tempos do governo ateniense Sófocles não encontrou sepulcros em dita cidade. Sulpicio em tempo menos remoto não pôde conseguir que fosse enterrado nela Marcelo. Platón em seuRepública não permite que se detinen para sepultura as terras aptas para o cultivo senão as arenosas, áridas e inúteis.

As mesmas leis estiveram no maior vigor na magna Grécia. Os cartagineses acharam fora deSiracusa sepulcros construídos pelos moradores desta cidade. O mesmo sucedeu em Girgenti. Os tarentinos seguiram os mesmos estilos mas tendo uen uma ocasião consultado o oráculo, este lhes respondeu que seriam bem mais felizes se cum publibus habitarent. O sentido verdadeiro era que activassem os meios de aumentar a população mas eles acharam que interpretavam bem o sentido do oráculo permitindo enterrar os cadáveres dentro da cidade. No entanto, toda a doutrina religiosa e a mitología grega se dirigiam a observar as leis que ordenavam levar os cadáveres longe das habitações. Assim foi que até os generais que tinham defendido a pátria, os soldados que tinham sacrificado sua vida par o mesmo nobre fim, tiveram seus sepulcros nos mesmos campos em que tinham morrido cobertos de glória:

  • Lisandro que assegurou a superioridad de Lacedemonia sobre Atenas, seu rival, foi enterrado em um campo cerca de Aliate.
  • Arístides, o mais justo dos atenienses, foi-o no campo Fhalereo.
  • Homero, primeiro poeta épico, em um picadero.
  • Arquímedes, terror dos romanos e defensor de Siracusa, em uma campiña cerca de sua pátria.
  • Aquiles em um promontório Sigeo.
  • Etc.

Quando os cadáveres dos heróis e dos grandes homens não eram enterrados dentro das populações não é de achar que conseguisse esta distinción a gente menos respetable. Nem serve dizer que naquelas remotas cidades se fazia pouco caso dos sepulcros porque em nenhum outro tempo os homens têm tido tanto cuidado sobre este particular nem tem brilhado tanto o luxo como então. Cicerónconheceu o sepulcro de Arquímedes pelos vários adornos que tinha nele. O luxo, o bom gosto e a magnificencia dos sepulcros eram tão grandes entre os gregos e romanos que as leis tiveram que reprimir várias vezes semelhantes exceos. Platón prohibe a construção dos sepulcros cujo trabalho não pudan concluir cinco homres no espaço de cinco dias. Solón quis que os dos atenienses fossem construídos dentro de três dias por dez homens. Demetri Falereo proscreveu o luxo das colunas e determinou a capacidade dos sepulcros. A lei das XII Tabelas dos romanos ordenando que as hogeras e os sepulcros fuersen levados fora das cidades, prevenia por médio de prudentes regulamentos o luxo que teria podido se introduzir nestes.

Referências

Este artigo contém material do dicionário enciclopédico popular ilustrado Salvat dos anos 1906 a 1914 que se encontra no domínio público.http://pt.wikilingue.com/es/Ritos_funerarios_da_Antiga_Gr%C3%A9cia

Semana História Antiga

Ritos funerarios da Antiga Grécia

Urnas funerarias, Atica, s. VII a. C.

O uso mais antigo entre os gregos para com seus mortos foi o do enterro. Pausanias que nos deixou uma enumeración exacta do sepulcros mais distintos daqueles nos diz que os tinham nos campos, nas orlas do mar, ao pé ou na cimeira das montanhas.

Então, punham as urnas que continham as cinzas em casas particulares e às vezes nos mesmos templos mas estes exemplos ao princípio foram raros não se concedendo esta distinción senão aos chefes da administração e aos generais que tinham defendido à pátria. O enterro na Grécia sempre esteve em uso mais que em toda outra parte tendo aquelas gentes particular cuidado de levar os cadáveres fora das populações. Os povos de Sicinio, de Delos e de Megara, os tebaicos, osmacedonios, os moradores do Quersoneso e de quase toda a Grécia observaram a mesma prática.

Lápida funeraria grega, 100 a. C.[[]]Licurgo

foi o único que permitiu as sepulturas dentro das cidades nos templos e nos lugares públicos em que o povo se congregaba. Mas os legisladores mais famosos fizeram daquela prática um ponto interessante em seus códigos. Cecrops quis que os mortos fossem levados fora de Atenas.Solón adoptou e restabeleceu em todo seu vigor este prudente regulamento de maneira que até no final desta república não se achou em Atenas mais que um curto número de pessoas enterradas dentro da cidade cuja honorífica disitnción somente foi concedida a alguns heróis e ainda nestes últimos tempos do governo ateniense Sófocles não encontrou sepulcros em dita cidade. Sulpicio em tempo menos remoto não pôde conseguir que fosse enterrado nela Marcelo. Platón em seuRepública não permite que se detinen para sepultura as terras aptas para o cultivo senão as arenosas, áridas e inúteis.

As mesmas leis estiveram no maior vigor na magna Grécia. Os cartagineses acharam fora deSiracusa sepulcros construídos pelos moradores desta cidade. O mesmo sucedeu em Girgenti. Os tarentinos seguiram os mesmos estilos mas tendo uen uma ocasião consultado o oráculo, este lhes respondeu que seriam bem mais felizes se cum publibus habitarent. O sentido verdadeiro era que activassem os meios de aumentar a população mas eles acharam que interpretavam bem o sentido do oráculo permitindo enterrar os cadáveres dentro da cidade. No entanto, toda a doutrina religiosa e a mitología grega se dirigiam a observar as leis que ordenavam levar os cadáveres longe das habitações. Assim foi que até os generais que tinham defendido a pátria, os soldados que tinham sacrificado sua vida par o mesmo nobre fim, tiveram seus sepulcros nos mesmos campos em que tinham morrido cobertos de glória:

  • Lisandro que assegurou a superioridad de Lacedemonia sobre Atenas, seu rival, foi enterrado em um campo cerca de Aliate.
  • Arístides, o mais justo dos atenienses, foi-o no campo Fhalereo.
  • Homero, primeiro poeta épico, em um picadero.
  • Arquímedes, terror dos romanos e defensor de Siracusa, em uma campiña cerca de sua pátria.
  • Aquiles em um promontório Sigeo.
  • Etc.

Quando os cadáveres dos heróis e dos grandes homens não eram enterrados dentro das populações não é de achar que conseguisse esta distinción a gente menos respetable. Nem serve dizer que naquelas remotas cidades se fazia pouco caso dos sepulcros porque em nenhum outro tempo os homens têm tido tanto cuidado sobre este particular nem tem brilhado tanto o luxo como então. Cicerónconheceu o sepulcro de Arquímedes pelos vários adornos que tinha nele. O luxo, o bom gosto e a magnificencia dos sepulcros eram tão grandes entre os gregos e romanos que as leis tiveram que reprimir várias vezes semelhantes exceos. Platón prohibe a construção dos sepulcros cujo trabalho não pudan concluir cinco homres no espaço de cinco dias. Solón quis que os dos atenienses fossem construídos dentro de três dias por dez homens. Demetri Falereo proscreveu o luxo das colunas e determinou a capacidade dos sepulcros. A lei das XII Tabelas dos romanos ordenando que as hogeras e os sepulcros fuersen levados fora das cidades, prevenia por médio de prudentes regulamentos o luxo que teria podido se introduzir nestes.

Referências

Este artigo contém material do dicionário enciclopédico popular ilustrado Salvat dos anos 1906 a 1914 que se encontra no domínio público.http://pt.wikilingue.com/es/Ritos_funerarios_da_Antiga_Gr%C3%A9cia