Regime militar de 64 modernizou economia e esmagou liberdades
Autor: Mario Vitor Santos
Em 21 anos, o Produto Interno Bruto subiu de US$ 78 bilhões para US$ 270 bilhões, mas há quem defenda que a riqueza poderia ser melhor distribuída se tivesse havido uma sucessão pacífica de governos democráticos
Há trinta anos, tropas do Exército saíam às ruas para depor o presidente João Goulart e instaurar o regime militar que durante 21 anos (1964-1985) governou o país.
Hoje, mais distantes de paixões que naquele período cindiram o Brasil em lados inconciliáveis, pode-se ter uma idéia mais completa do que foi o período.
O debate promovido pela Folha entre o ministro-chefe da Secretaria do Planejamento no governo Geisel, João Paulo dos Reis Velloso, e o economista Francisco de Oliveira, do Cebrap, reproduzido nas páginas centrais deste caderno, mostra que há crescentes pontos de convergência entre forças antes antagônicas.
Um dos riscos, porém, de uma abordagem já distanciada no tempo é o de que, no papel, as arbitrariedades havidas durante o regime militar surjam tênues, difusas, aceitáveis, "males necessários" até.
Os 21 anos de governo militar podem ser divididos em três fases. A primeira, que corresponde aos governos de Castello Branco e Costa e Silva, compreende o período de implantação das chamadas "reformas de base" do ciclo militar. O combate à inflação começou a dar resultados. A repressão era, diga-se assim, limitada.
A segunda fase, iniciada com o AI-5 em dezembro de 1968 e encerrada com a posse de Ernesto Geisel, caracterizou-se pelo estrangulamento do espaço político, ação da censura e desmantelamento da guerrilha, ao lado de baixa inflação e desenvolvimento econômico recorde. O próprio presidente Médici -principal representante do período- anunciou a face perversa desse chamado milagre brasileiro ao dizer que o país ia bem, mas o povo ia mal.
A terceira e última fase -de Geisel e Figueiredo- foi de crise econômica, ascensão inflacionária, escândalos administrativos e crescimento da oposição. Os sucessos anteriores transmudaram-se em fracassos. O monolitismo político precedente esfacelou-se, até a completa perda de hegemonia para o bloco oposicionista.
Em 63, o Brasil tinha 76 milhões de habitantes, o Produto Interno Bruto (PIB) era de US$ 78 bilhões e a renda per capita passava um pouco de US$ 1.000. Em 1985, os brasileiros eram 130 milhões, o PIB, que é a soma de todos os bens e serviços produzidos durante o ano, saltara para US$ 270 bilhões e a renda per capita chegava a mais de US$ 2.000.
A capacidade de geração de energia subira de 6 MW para mais de 40 MW em 84; a rede rodoviária federal pavimentada se elevara de pouco mais de 11 mil km para cerca de 53 mil km; os telefones instalados, que eram, em 63, 1,2 milhão, chegaram a mais de 10 milhões.
Há quem defenda que esses números poderiam também ter sido obtidos -e até superados- pela sucessão pacífica de governos democráticos e civis, caso não houvesse a ruptura de 1964. Acrescentam que, nesse caso, o desenvolvimento ter-se-ia operado sem tanta concentração de renda e sem que se tivesse que fechar partidos, cassar mandatos, intervir em sindicatos, exilar, sequestrar, torturar e matar.
É impossível saber ao certo. Importa mais agora não deixar de refletir sobre esse período. Não para remoer ódios, mas para evitar que se repita a situação que os gerou.
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