Aquele era um país que ia "pra frente"
O Brasil já foi o país do futuro. Aconteceu entre 1969 e 1973 na imaginação dos próprios militares, dos empresários, da classe média e da maioria de trabalhadores e estudantes. Era um país que ia pra frente, como pregava o presidente Médici. A seleção conquistava o tricampeonato, Emerson Fittipaldi era campeão de Fórmula 1, o Produto Interno Bruto saltava 10% ao ano e a Transamazônica aumentava ainda mais o país. "O povo vive em ordem. O povo ajuda o país. Todos devem ajudar", ensinava uma cartilha do Mobral (Movimento Brasileiro de Alfabetização) dos anos 70.
O diabo é que havia os que não queriam ajudar, segundo a lógica dos militares. Eram os que pediam eleições, fim da tortura, fim da censura e a volta dos direitos cassados pela Constituição de 1967 e atos institucionais. Foi contra esses que o Estado montou sua máquina de propaganda em 1969, para vender patriotismo e tentar "curar" a doença do subdesenvolvimento.
A vitória do patriotismo foi parcial. O consumo, estimulado pelo próprio regime, entrava na era do sexo, drogas e rock'n'roll. Coisas como minissaia, cabelos compridos e líderes comunistas como Che Guevara e Mao Tsé-tung disputando o estrelato pop com John Lennon e Mick Jagger não estavam nos gibis dos militares.
E havia a anarquia atávica. Enquanto Os Incríveis cantavam "as praias do Brasil ensolaradas, lá, lá, lá, lá", uma paródia debochava: "maconha no Brasil foi liberada...". Enquanto Sugismundo, um personagem encomendado pelo governo, dizia em 1971 na TV que "povo desenvolvido é povo limpo", 41% dos municípios nem tinham água encanada. Revista de mulher nua estava liberada, mas a foto só podia mostrar um seio, nunca o par.
O "Brasil Grande" nasceu desse zigue-zague. Para o bem e para o mal, foi a última vez que o Brasil gostou do Brasil.
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