Revelações do mais antigo naufrágio no oceano Indico
O navio de dois mil anos de idade pode ter indícios do comércio entre sociedades romanas e asiáticas
cortesia do Departamento de Arqueologia do Sri Lanka
O navio de dois mil anos de idade pode ter indícios do comércio entre sociedades romanas e asiáticas
cortesia do Departamento de Arqueologia do Sri Lanka
LEGENDA: Um exemplo de vaso de cerâmica encontrado no naufrágio de Godavaya.
Megan Gannon e LiveScience
O mais antigo naufrágio conhecido do Oceano Índico está no fundo do litoral sul do Sri Lanka há cerca de dois mil anos. Dentro de algumas semanas, arqueólogos mergulhadores iniciarão uma escavação que deve durar meses no local, procurando indícios sobre o comércio entre Roma e Ásia na antiguidade.
O local fica 33 metros abaixo da superfície do oceano, nas proximidades da vila de pescadores Godavaya, onde na década de 90 arqueólogos alemães encontraram um porto importante para a Rota da Seda durante o segundo século depois de Cristo.
O navio naufragado, descoberto há apenas 10 anos, não se parece em nada com o casco esquelético tradicional. Em vez disso, arqueólogos estão lidando com um monte de barras de metal corroído e uma variedade de cargas antigas espalhadas, incluindo lingotes de vidro e vasos de cerâmica, que ficaram rolando pelo fundo do mar durante centenas de anos em meio a fortes correntezas e talvez até um ou outro tsunami.
“Está tudo muito quebrado”, declara Deborah Carlson, presidente do Instituto de Arqueologia Náutica da Texas A&M University, que está conduzindo a expedição até o naufrágio de Godavaya, com colegas dos Estados Unidos, Sri Lanka e França. Por mais confuso que esteja, o local poderia preencher uma lacuna nas evidências existentes sobre o comércio que levou metais e produtos exóticos, como a seda, da Ásia até o mundo romano.
Elo Perdido
Acadêmicos acreditam que o comércio entre o Leste e o Oeste se intensificou após Roma anexar o Egito no primeiro século antes de Cristo, ganhando acesso ao Mar Vermelho, uma passagem para o Oceano Índico. Carlson observa que rotas de comércio estão documentadas em fontes literárias e históricas, como no “Périplo do Mar Vermelho”, um manual do primeiro século D.C., escrito em grego, que explica a marinheiros saindo dos Mares Mediterrâneo e Vermelho aonde ir no Oceano Índico e o que levar, vender e comprar.
“Nós só não temos os navios que realmente faziam parte desse comércio”, contou Carlson à Live Science em uma entrevista por telefone.
Carlson declarou que eles provavelmente não encontrarão algo que prove definitvamente que o navio estava indo para Roma. (De maneira semelhante, os arqueólogos provavelmente não conseguirão saber como o navio afundou, ainda que Carlson – que descreveu as “terríveis correntes” que frustraram muitas das tentativas de mergulho da equipe no ano passado – suspeite que os mares bravios possam ter tido seu papel). Mas Carlson explica que descobertas no navio afundado podem pelo menos ajudar a ilustrar que o Sri Lanka era um “pivô” nesse comércio, já que muitas das mercadorias que passavam pela ilha chegavam ao Mediterrâneo.
O que tem lá embaixo?
Os primeiros traços do naufrágio de Godavaya foram descobertos em 2003 quando pescadores locais mergulharam até o local e voltaram com artefatos antigos, incluindo uma pedra de moagem com a forma de um pequeno banco ou de uma mesa com pernas. De acordo com Carlson, pedras semelhantes já foram encontradas em monumentos budistas ricos em relíquias, conhecidos como stupas.
Carlson viu o local pela primeira em 2010. Ela e seus colegas documentaram parcialmente o naufrágio durante três campanhas exploratórias subsequentes, entre 2011 e 2013. A maior parte dos objetos encontrados ao redor do navio afundado até agora se parecem com produtos locais, e muitos deles ainda estão em sua forma bruta. Existem mais pedrasde moagem com aparência budista; lingotes de ferro e cobre (ou o que sobrou deles após a corrosão); e lingotes de vidro negro e azul-esverdeado que se originaram ao longo do litoral de Tamil Nadu, no sul da Índia, e que talvez fossem derretidos para criar vasos ou contas.
Para determinar a idade do naufrágio, Carlson e seus colegas coletaram três amostras de uma madeira delicadapresa ao navio e as enviaram para serem testadas por dois laboratórios diferentes. Os fragmentos de madeira, que provavelmente são restos do navio, são pelo menos do primeiro século antes de Cristo, ou do primeiro século depois de Cristo.
“Eu fiquei bem cética quando vi esse naufrágio em 2010. Eu pensei ‘não tem como essa coisa ser antiga”, confessou Carlson. “Mas nós coletamos essas amostras de madeira e eu fiquei chocada quando recebemos os resultados.
O local cobre uma área de aproximadamente 6x6 metros, ainda que a equipe não tenha conseguido determinar exatamente onde o navio começa e termina durante suas curtas explorações do local. Neste ano eles terão mais tempo para investigar; se o clima permitir, a equipe espera começar a mergulhar em meados de fevereiro, e continuar trabalhando até maio.
Além de determinar um limite sólido para o naufrágio, Carlson espera que ela e seus colegas consigam separar uma parte do navio submerso, levá-lo até a superfície e peneirar seu conteúdo em uma piscina, procurando moedas, objetos pessoais e tudo mais que estiver preso no sedimento. De jarros lacrados de cerâmica, a equipe pode até mesmo conseguir recuperar materiais botânicos antigos, como pólen, que poderiam até mesmo indicar em que momento do ano o navio estava viajando.
O projeto recebeu financiamento do Fundo Nacional para as Ciências Humanas. Além dos colegas do Instituto de Arqueologia Náutica, Carlson está trabalhando com pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Científica, da França, da University of California, Berkeley, e do Departamento de Arqueologia do Sri Lanka.
Scientific American Brasil
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