quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A verdadeira cidade de Platão (Parte 2)


Cláudio William Veloso
Professor de História da Filosofia Grega da Universidade Federal de Minas Gerais

Poder-se-ia objetar que na cidade verdadeira há já uma distinção entre possuidores de força física e possuidores de inteligência (cf. 371e 1-7)19 . Como diz Sócrates, os assalariados não seriam, pelas coisas próprias à inteligência (diánoia), muito dignos de fazer parte da comunidade. Mas é preciso notar três coisas: 1) deixa-se entender que os demais têm inteligência suficiente para serem dignos de participar da comunidade; 2) os assalariados não constituem uma classe produtora, mas vendem a própria força física aos produtores; 3) eles “enchem” a cidade, mas não se diz que sejam cidadãos da mesma. Em outras palavras, eles parecem constituir mais o corpo do que a alma da cidade.

Observo ainda que o discurso sobre a cidade verdadeira não é um mito, como tampouco um relato histórico (cf. Annas, p. 73). Trata-se, antes, de um raciocínio, de uma dedução20 . Ao contrário, é um mito, um mito duplo, o que de algum modo fundamenta a divisão em classes da segunda cidade: refiro-me naturalmente à “nobre mentira” sobre os três gêneros diferentes provenientes da terra (414b-415a). Além do mais, lembra muito essa segunda cidade a antiga Atenas do Crítias.

A cidade verdadeira remete, quando muito, ao mito de Prometeu e Epimeteu contado por Protágoras (!) no diálogo homônimo, a fim de mostrar que, para haver verdadeiramente cidade, a virtude política não pode ser privilégio de alguns (Prot. 320a -323a; cf. 326e s.). Por outro lado, na cidade verdadeira não há educadores especializados, mas são os pais que transmitem aos filhos os valores da cidade, exatamente como agradaria ao Ânito do Ménon (93a s.). Essas duas coincidências não deveriam levantar suspeitas sobre a adesão de Sócrates à cidade verdadeira? Não creio. Ao criticar Protágoras ou Ânito, Sócrates refere-se às (supostas) cidades de seu tempo, e não a cidades verdadeiras21 . Mas uma cidade em que todos são filósofos é uma cidade em que todos possuem a virtude política e em que todos seriam capazes de transmiti-la aos filhos.

Desmentido o parentesco da cidade verdadeira com o mito, uma outra dúvida ainda se poderia levantar, a concernente à impossibilidade da injustiça no seio da cidade verdadeira (cf. Annas, p. 78). A justiça ou a bondade seria inclusive uma característica das comunidades primordiais ou longínquas no tempo e no espaço (cf. Leg. III 679c)22 . Mas é preciso esclarecer que a cidade verdadeira, embora se apresente justa, não está isenta de injustiça.

Solicitado por Sócrates, Adimanto, um tanto titubeante, sugere que a justiça e a injustiça na cidade verdadeira residam de algum modo em alguma necessidade recíproca (khreía(i) tinì tê(i) pròs allélous) de seus cidadãos (Resp. II 372a). Igualmente hesitante, Sócrates concorda com a resposta, mas propõe que se investigue ulteriormente a questão. E é isso que Sócrates, ao investigar como viverão os cidadãos assim organizados, acredita estar fazendo, quando é interrompido por Gláucon. Só aparentemente, todavia, tal interrupção elide a abordagem da questão da justiça e da injustiça na cidade verdadeira, pace Centrone23 . Voltemos ao texto.

Apesar de sua “perfeição”, o regime alimentar da primeira cidade não é muito apreciado por Gláucon:

“E ele: “mas, ó Sócrates —disse— se tu organizasses uma cidade de porcos, de que outra coisa senão dessas os nutririas?”. “Mas —disse eu— como é preciso fazer, ó Gláucon?”. “Como se usa, —disse— acredito que os que não pretendem ficar incomodados deitarão em camas e farão refeição em cima de mesas com ópsa, exatamente como os que os [homens] de hoje têm, e sobremesas”.
“Assim seja —disse eu—, compreendo. Pelo visto, estamos observando como nasce (gígnetai) não apenas uma cidade, mas também uma cidade luxuosa (trúphosa). E isso provavelmente não é mal, pois, observando também uma tal [cidade], poderíamos, talvez, enxergar a justiça e a injustiça, isto é, como se engendram nas cidades. A cidade verdadeira parece-me que é a que relatamos, como uma [cidade] saudável. Mas, se, ao contrário, quiserem, contemplemos também uma cidade inchada (phleigmaínousan). Nada impede, pois aquelas coisas a alguns pelo menos, ao que parece, não bastarão, como tampouco aquele regime” (372d-373a).

Seja qual for a simbologia do porco aí em jogo24 , é preciso notar que é Gláucon a chamar de “cidade de porcos” aquela que seria, para Sócrates, a cidade de homens verdadeiros. Lembro, de resto, que no Teeteto Protágoras acredita ofender Sócrates, o filósofo por antonomásia, dizendo que este “dá uma de porco” (hueneîs) e que persuade seus ouvintes a fazer o mesmo (Theaet. 166c 7-8). O pedido de Gláucon não tem o mesmo caráter das precisões ou acréscimos anteriores. Aqui a conversa tomará um outro rumo. Sócrates aceita o pedido de Gláucon, mas está longe de partilhar os mesmos sentimentos de seu interlocutor. Annas (p. 77) engana-se ao afirmar que Sócrates reconhece que as pessoas vão sempre querer mais —o que representaria, segundo ela, uma “teoria realista da natureza humana antes que um impossível ideal”. Ora, Sócrates não diz que todos ficarão insatisfeitos, e sim que alguns ficarão.

Enfim, é a partir das exigências de Gláucon —e somente a partir delas— que surgirá uma nova cidade, onde, agora, sim, aparecem educadores, cozinheiros e poetas, e onde será necessária a presença de guardiães, já que na cidade de homens verdadeiros não havia necessidade de “guardadores de porcos”, subwvtai (373c) —Sócrates aí refere-se sem dúvida aos criadores de porcos (os cidadãos opulentos comerão carne de porco), mas pode ser que ele aluda também aos guardiães daqueles porcos que serão os pseudo-homens que constituirão a cidade luxuosa.

Não obstante, a cidade verdadeira está sujeita à injustiça, como disse. Um corpo saudável não é um corpo não passível de doença: uma coisa é não estar doente, outra é não poder ficar doente25 . Sócrates diz que tambémna cidade luxuosa é possível observar justiça e injustiça, o que subentende que a observação da cidade verdadeira proporciona o mesmo. Aparentemente nada se diz da injustiça na cidade verdadeira, contradizendo o plano inicial. Todavia, são exigências como as de Gláucon aquilo que determina a injustiça na cidade verdadeira, de modo que é o próprio comportamento de Gláucon a ilustrar o nascimento da injustiça. Trata-se justamente da “corrupção” da cidade verdadeira. Ora, a razão da corrupção estaria na presença de alguns cidadãos que, como Gláucon, não se contentarão com aquelas coisas simples. Contra isso a cidade verdadeira parece não ter defesa alguma. A transmissão do modo de vida dos pais aos filhos não garante que os filhos sejam efetivamente parecidos com os pais. Da cidade verdadeira pode justamente nascer a cidade luxuosa (cf. Annas, p. 78). E o fato de a cidade luxuosa representar um possível desenvolvimento da injustiça no seio da cidade verdadeira não impede que haja, por sua vez, uma injustiça da própria cidade luxuosa, que consistirá no não respeito da divisão de funções das três classes (cf. Resp. IV 443c-444a).

É inútil objetar ainda que a cidade verdadeira está baseada no mero “interesse próprio” de cada um (cf. 369c), como escreve Annas (p. 78). A constituição da cidade é interesse de todos, e por isso mesmo é algo racional. Com efeito, uma coisa é a necessidade de certos bens materiais, outra é a consciência da necessidade dos semelhantes para a satisfação daquela. Assim, não entendo por que a justiça na cidade verdadeira não derivaria de uma virtude política, como sustenta Canto-Sperber26 . Nesse sentido, tampouco cabe objetar que a cidade verdadeira estaria baseada no mero desejo das coisas necessárias, nisso não diferindo de uma cidade de bichos. Essa é a opinião de Gláucon, não de Sócrates —de resto, uma “cidade de porcos” é um oxímoro. Se é verdade que o desejo na cidade verdadeira será apenas de coisas ‘necessárias’, a cidade não por isso está baseada somente no desejo. Pode-se crer que a cidade verdadeira sirva para introduzir a futura classe dos produtores a ser, porém, integrada com a impetuosa classe dos auxiliares e a racional classe dos guardiães27 . Todavia, repito, é algo da racionalidade o reconhecimento do caráter solidário e complementar das técnicas que está na base da própria existência da cidade, assim como seu princípio de especialização. E não sei se Annas (p. 79) tem razão em notar que a especialização parece ser mantida com coerção (cf. 374b 6), já que, como observa Cambiano [1971] (p. 178-9) lembrando o mito de Er do livro X, o ofício é escolhido por cada um antes do nascimento. Em todo caso, isso não significa que haja algum tipo de guarda, ou seja, alguma especialização nisso.

Num certo sentido, não há efetivamente uma grande diferença entre a cidade verdadeira e a cidade luxuosa (cf. Annas, p. 78). Quero dizer que as atividades das três futuras classes, correspondentes às três partes da alma, já estariam presentes na cidade verdadeira. A diferença é que essas funções não estão especializadas. Pode ser, então, que em uma cidade verdadeira nem tudo deva ser especializado. Na cidade verdadeira todos desejam, têm ímpeto e raciocinam, sem que haja conflito no interior da alma de cada um. Por isso, esta é uma cidade onde não há discórdia. É preciso especializar tais atividades somente no caso de uma cidade luxuosa, onde o desejo de luxo —uma vez deixado sem freios, como na Atlântida do Crítias— põe em risco a vida da cidade.

Mas exatamente que risco corre a cidade ao se tornar luxuosa? Eu acredito que seja o da perda de sua unidade, como fica mais claro em seguida, o que está intimamente ligado ao princípio de especialização.

Annas (p. 99) manifesta uma certa surpresa ao constatar que, entre os novos ofícios introduzidos na cidade (luxuosa), estejam os imitadores (373b 5). Todavia, num certo sentido todas as novas ocupações são imitações, de modo que não haveria nenhuma real contribuição técnica por parte da cidade luxuosa. Explico-me:

1. Na cidade inicial não há poetas de profissão, mas os próprios cidadãos entoam hinos aos deuses (372b-373c). Ora, esses cantos são realmente preces dirigidas aos deuses (Leg. III 700b 1-2), e não imitação de preces, como podemos encontrar na épica ou na tragédia (cf. Resp. III 399b). Aliás, aos hinos a segunda cidade acrescentará os encômios dos valorosos (Resp. X 607a), ausentes da cidade verdadeira na medida em que aí todos desejam apenas o necessário, de modo que não há guerreiros28 .

2. Guerra e caça justamente só são introduzidas na cidade luxuosa. Ora, elas seriam técnicas de aquisição e como tais podem ser consideradas simulacros das técnicas produtivas: não é à toa que os sofistas, imitadores dos sábios, são caçadores de jovens ricos (Soph. 223b).

3. Os cozinheiros também só aparecem na cidade luxuosa. Não se deve esquecer, no entanto, que, segundo o Górgias, a culinária é um simulacro da medicina (Gorg. 463d-465c). Curiosamente, os médicos aqui são mencionados depois dos cozinheiros (Resp. III 373c). Senão introduzidos apenas agora, é só na cidade luxuosa que os médicos ganham um papel importante. E a razão está justamente na nova rica dieta (cf. 373d). Os médicos devem remediar os efeitos nefastos do trabalho dos cozinheiros. Supõe-se, de fato, que os cidadãos verdadeiros, dado o rigor de seu regime, não adoeçam com freqüência, de modo que precisam pouco de médicos. Mas o próprio médico só é necessário onde já se perdeu a saúde, onde é preciso restabelecê-la. Não é à toa que a cidade verdadeira é considerada por Sócrates uma cidade saudável (372e 7).

Em resumo, o que há na cidade luxuosa —imitação da cidade verdadeira— é uma verdadeira proliferação da imitação, o que põe em risco o princípio de especialização, na medida em que o imitador seria por definição um homem duplo ou até mesmo múltiplo (cf. III 397e). A imitação de vários ofícios pode, aliás, gerar no indivíduo a ilusão da auto-suficiência, o que é a própria negação da necessidade da vida em comum.

Se a cidade luxuosa é o lugar onde a imitação prolifera, ela não é, contudo, o lugar onde a imitação surge pela primeira vez. Com efeito, diz Sócrates no final do livro II:

“Poder-se-ia, então, decerto chamá-la, esse que eu dizia, corretissimamente de verdadeiramente falsidade (alethôs pseûdos), já que a falsidade falso [ou ‘o que acontece’] nos discursos (lógois) é uma certa imitação (mímemá ti) do que acontece na alma (toû en tê(i) psukhê(i) … pathématos) e um simulacro nascido sucessivamente (hústeron gegonòs eídolon), não uma falsidade totalmente não misturada (pánu ákraston pseûdos)” (Resp. II 382b-c).

O discurso como tal já é um mímema do que acontece na alma, o que deve redimensionar a abordagem da imitação do livro III. Por conseguinte, mesmo o homem verdadeiro, cidadão da cidade verdadeira, já se serve da imitação.

De qualquer forma, se a segunda cidade não passa de um mímema da primeira como sustento, alguém poderia perguntar-me que sentido tem dedicar a maior parte da República a tal simulacro e, em particular, à questão da tripartição.

Bom, a cidade luxuosa é descrita como uma cidade inchada. Contudo, mais adiante, uma vez estabelecido o papel dos guardiães, Sócrates diz:

“Mas, pelo cão, decerto nos passou desapercebido que purificamos de novo uma cidade que há pouco sustentávamos viver na opulência (truphân)” (399e 5-6).

Entende-se agora a função dos guardiães e seus auxiliares: purificar ou purgar a cidade inchada, isto é, dar um freio a um desejo ilimitado, que implica proliferação da imitação, logo, perda da unidade política, impedindo, assim, que a cidade se transforme em uma espécie de Atlântida. Temos aí então a costumeira política-medicina de Platão29 . Mas podemos dizer que uma cidade purgada, ou seja, bem governada por guardiães e auxiliares, seja equivalente à cidade saudável? Não creio.

Uma passagem do livro I das Leis pode ajudar a esclarecer o papel purgativo dos guardiães na República. Ao discutir sobre como lidar com os conflitos entre os irmãos de uma família (leia-se, cidadãos de uma mesma cidade), o Ateniense sugere a presença de um juiz (627c s.). Mas ele considera três juízes diferentes, correspondentes, talvez, ao comportamento segundo cada uma das três partes da alma da República30 . O primeiro mataria os irmãos maus, fazendo que os melhores mandem. O segundo, deixando vivos os piores, faria que todos obedecessem voluntariamente aos melhores. O terceiro não mataria ninguém, mas, reconciliando a família e dando-lhe leis, seria capaz de fazer que todos fossem amigos. O Ateniense finalmente diz:

“O melhor, então, decerto [não é] nem a guerra nem a sedição, [sendo] abominável o carecer destas, mas uma paz e, juntamente, uma amabilidade entre eles —inclusive, o fato também de a própria cidade vencer a si mesma não estava, ao que parece, entre as coisas melhores, e sim entre as necessárias. É como se alguém achasse que um corpo doente que recebeu uma purificação médica estivesse então otimamente, mas não dirigisse a mente ao corpo que não careceu absolutamente [de purificação médica] do mesmo modo, em relação à felicidade de uma cidade ou de um [cidadão] privado também, pensando desse modo, não se tornaria corretamente nem um homem de estado, olhando somente ou em primeiro lugar para as coisas relativas à guerra externa, nem um legislador competente, se não legislasse em virtude da paz as coisas da guerra, antes que em vista das coisas relativas à guerra as coisas da paz” (Leg. I 628c 9-e).

Em outras palavras, o modelo que o legislador deve perseguir é a cidade sem conflito. Do mesmo modo, os guardiães servem para desinchar a cidade luxuosa, mas o modelo não deve ser a cidade purgada por sua parte melhor, e sim aquela cidade saudável que é a cidade verdadeira. É cidade apenas aquela em que não há conflito. Toda cidade onde há conflito não é verdadeiramente uma cidade, não constituindo realmente uma unidade. Nós identificamos a política (talvez já entendendo indevidamente por isso a democracia) com a administração do conflito, mas em Platão a verdadeira política seria uma total ausência de conflito, o que só acontece em uma cidade verdadeira.

É verdade que o ideal platônico de cidade pode ser a cidade sem conflito, mas que nem por isso a tripartição deixaria de existir31 . De fato, a tripartição da alma serve a Platão para explicar a possibilidade do conflito no interior de um homem (Resp. IV 436a s.), mas a tripartição por si só não implica conflito. Em outros termos, a tripartição seria uma condição necessária para o conflito, mas não suficiente. Nesse caso, a cidade verdadeira ou o homem verdadeiro podem ser igualmente tripartidos sem que, por isso, haja conflito entre suas partes32 . E a importância da abordagem da cidade luxuosa consistiria então em evidenciar a tripartição, que justamente só se torna perceptível com o conflito.

De qualquer forma, entende-se melhor agora a diferença entre Platão e Protágoras. Uma cidade inchada carece de uma política-medicina, que justamente se apresenta como uma técnica que não pode pertencer a todos33 . Não se pode pretender que o próprio doente, enquanto doente, seja médico de si mesmo. Entretanto, uma cidade saudável como é a cidade verdadeira não precisa ou precisa muito pouco dessa política-medicina (cf. Gorg. 464b). Ela pode precisar, não obstante, da política-ginástica —a qual garante o bem-estar e previne os males—, ou seja, da política que, segundo o Górgias, é a ‘legislativa’. Mas a ginástica pode e deve ser praticada por todos os indivíduos saudáveis34 , sendo condição para o bom desempenho de toda outra atividade física. Assim, a técnica política legislativa é condição prévia para o bom exercício de toda técnica de competência específica no interior da cidade.

Entende-se, em todo caso, que uma cidade purgada é apenas um simulacro mais semelhante à cidade verdadeira do que uma cidade luxuosa não purgada. Mas sempre de simulacro se trata. No final do livro IX, onde se afirma o caráter utópico da cidade que se acabou de contemplar, a qual justamente não existiria senão nos discursos tidos, Sócrates diz:

“Mas —disse eu, todavia— no céu provavelmente está erguido um modelo (parádeigma) para quem quer ver e, vendo, [nela] estabelecer si mesmo” (592b 2-3).

Nada nos diz que o modelo de cidade que está exposto no céu seja a cidade luxuosa purgada. Esse modelo, acredito eu, corresponde, antes, à cidade verdadeira de Resp. II.

Na retomada da questão da imitação em Resp. X, diz-se que teríamos, por exemplo, três camas: a cama do produtor da natureza, a cama do artesão e a cama pintada do pintor. Curiosamente, na cidade verdadeira os seus cidadãos não dormem em camas, e sim no chão. Ora, a cama do produtor da natureza pode muito bem assemelhar-se mais a um jazigo do que propriamente a uma cama, do mesmo modo que uma cama é algo bem distante de uma cama pintada.


Kriterion: Revista de Filosofia

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