domingo, 30 de dezembro de 2012

Castelo de Drácula

Na Transilvânia


Paula Vares Valentim

Das ruas estreitas e becos escuros com esquinas vazias durante os dias e extremamente movimentadas à noite, Brasov ganhou notoriedade histórica por servir como morada de Vlad III, o Empalador, principal influência de Bram Stoker no romance de Drácula. “Tudo lá é diferente. Você não sabe se faz parte de uma obra literária ou da própria realidade. Fica mesmo a dúvida, nesse sentido. Mas se não fosse por isso a região seria apenas mais uma, como qualquer outra. Entretanto, a Transilvânia tem o seu mistério, a sua alma, o seu encanto. Isso é o que a faz tão especial”. Relativamente pequena, Brasov possui uma população de aproximadamente 300 mil habitantes e está situada na cordilheira dos Carpatos. “Gosto muito de montanhas. Na América do Sul tive a oportunidade de cruzar por terra toda a extensão da Cordilheira dos Andes desde a Venezuela até o Aconcágua, na Argentina. Na África do Sul estive na Table Mountain. Na Europa, percorri os Carpatos, que se estendem por 1500 km pelas fronteiras da Romênia, Ucrânia, Polônia, Eslováquia e República Tcheca. Coincidência ou não, geograficamente no Planalto da Transilvânia, a cadeia rochosa tem a sua largura máxima com cerca de 500 km de extensão, cujo ápice pode ser visto a 2655 metros de altitude no Monte Gerlachovsky.” Por trás das pegadas que marcam a história, ainda em tempos atuais, o ar sombrio e misterioso do vale do Carpato segue impulsionando o turismo local. “Existe uma preocupação muito grande com o turista. Há um cuidado especial com o que a cidade vai oferecer aos visitantes que procuram o lugar afim de viver um pouco do que Bram Stoker imortalizou em seu livro. Essa é a grande atração da Transilvânia.” Seja em um jantar à luz de velas dentro de um restaurante gótico ou diante do requinte medieval, a sensação que fica é de que na Transilvânia o conto de vampiros está muito além das páginas de Bram Stoker. “Você sai do hotel e de repente dá de cara com as noivas do Conde Drácula. Elas são vistas durante toda a madrugada com seus trajes brancos, decotados e absolutamente sensuais. Fazem da arte, o ganha pão. Se vestem como se fosse a personagem Lucy. Mais ou menos como as estátuas humanas que ficam paradas na Avenida Paulista, em São Paulo. Em Brasov a maneira natural para faturar um trocado é encenar a vida Então, essas mulheres, completamente maquiadas, provocantes, com rostos pálidos, mãos delicadas e vestidos semi transparentes fazem da exploração do turismo uma ótima oportunidade de faturar alguns euros. Elas posam para fotos e vivem literalmente o contexto do livro. Tudo muito bem organizado e adaptado à rotina da cidade.” 

Historicamente, Brasov ficou conhecida como um dos maiores palcos de atrocidade de Vlad Tepes III. Foi lá que o príncipe da Valáquia sacrificou em um dos seus muitos atos de barbárie humana, cerca de 30 mil prisioneiros turcos na noite de São Bartolomeu, em 1459. “Os romenos contam que ele gostava de empalar as pessoas, sobretudo os seus inimigos. Um dos seus grandes atos de covardia aconteceu justamente na noite de São Bartolomeu, coincidentemente, o santo seguidor de Cristo, pintado na Capela Sistina no Juízo Final de Michelangelo, que teve o seu dia associado a outra tragédia, em 23 de agosto de 1572, quando a Casa Real Francesa ordenou o massacre de 30 a 100 mil protestantes em Paris. Mas enquanto na França as questões religiosas se tornaram o motivo principal do ataque dos cristãos, na Romênia, mesmo diante da histórica briga religiosa que influenciou a própria obra de Drácula, conta-se que a crueldade de Vlad Tepes servia como proteção ao povo da Valáquia. Em 1461, por exemplo, Mehmet II, do Império Otomano, desistiu de invadir a Transilvânia depois de ver e sentir o odor de outros 20 mil prisioneiros turcos mortos na floresta de Torgoviste.”

Evidentemente, um dos lugares mais visitados da região, é o Castelo de Bram, descrito pelo escritor irlandês, como a morada de Drácula. Localizado entre a fronteira da Transilvânia e a Valáquia, há poucos quilômetros de Brasov, pela autoestrada 73, o local foi erguido ainda no século XIV e serviu como importante ponto estratégico na luta do exército romeno contra o Império Otomano. “O Castelo de Drácula, como é conhecido mundialmente, pode ser visto de longe através da penugem da sua arquitetura medieval: É o principal ponto turístico da Transilvânia. Um lugar frio, alto e carregado de lendas. Apesar disso, a verdade é que Vlad Tapes III não morou em nenhum de seus aposentos. Apenas esteve lá por um período. As pessoas chamam de Castelo de Drácula porque foi dele que Bram Stoker adaptou o seu livro”.

Do lado de fora, um enorme jardim, interligado aos bosques dos Monte Cárpatos, com algumas passarelas estreitas e pontes antigas, dá as boas vindas aos visitantes. O tom assombroso ganha evidência com o lago profundo encoberto por lodo. Placas de aviso sinalizam aos turistas o perigo de afogamento. Cruzes por todos os lados e em vários ângulos também aumentam a sensação de terror. Mas quem entra no palácio e espera encontrar algo assombroso se depara com um ambiente extremamente luxuoso, com salas grandes, corredores largos e muitas passagens secretas: “Algumas pessoas pensam que o castelo, por ter inspirado o livro de Drácula, é escuro e mofado, com as paredes caindo e mal conservado. Ao contrário disso, o que se pode ver é um lugar muito bem cuidado e luxuoso. Basta dizer que foi a sede da monarca Maria Vitória, rainha da Romênia entre o final do século XIX e início do Século XX. Parte da mobília utilizada pela nobreza ainda permanece intacta. Em seus recintos, que atualmente fazem parte de um museu aberto ao público, são encontradas mesas com madeiramento trabalhado, camas imperiais, lustres de prata e até a famosa coroa utilizada por Drácula. 

A peça de ouro maciço, protegida por uma redoma de vidro, se contrasta com um piano velho encostado na parede. Documentos históricos mostram ainda a árvore genealógica da família de Vlad Tepes e a maneira como ele empalava as pessoas. São desenhos antigos e caricaturas do príncipe que imortalizam o Conde da Valáquia. “Ele matava as pessoas com lanças que transpassavam o corpo inteiro. Por isso o apelido de ‘O Empalador’. A bem da verdade, Vlad Tapes chegou a ser prisioneiro de sua própria obra. Dentro do castelo de Bram, ficou preso por alguns meses. Diferentemente do que Stoker contra em seu livro.”

A visita pela morada de Drácula termina com uma cena curiosa. Do lado de fora, na área de trabalho utilizado pelos escravos e serviçais do castelo, um poço de água, secado pelo tempo, serve para alimentar o mito e a esperança. A exemplo do que acontece na Fontana di Trevi, em Roma, quem vai ao Castelo de Bram não sai sem deixar uma moeda. Uma regra que mantém viva a tradição de umas mais importantes relíquias da Romênia. “Um lugar místico, simplesmente, mágico. Para quem aprecia os livros e gosta da história, o Castelo de Drácula é um local obrigatório. Imperdível. Principalmente pelo que oferece à Transilvânia, uma das regiões mais incríveis que já visitei na Europa.”
http://terceirotempo.bol.uol.com.br

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