quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O Mistério de uma Civilização
Descobertos por acaso quando os britânicos construíam ferrovias, os homens de cidades como Mohenjo-daro pareciam ser bem letrados, embora tenham desaparecido sem motivo aparente e sua escrita continue indecifrada.

Por Eduardo Negrão

Obed Suhail
Poço e plataformas de banho em Harappa datados de 2200-1900 a. C.
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Esta civilização, que hipnotiza os trabalhos arqueológicos até hoje, surgiu quando os britânicos, que dominaram a Índia entre 1757 e 1947, começaram a construir ferrovias em seus, então, domínios. Quando inauguraram o primeiro trem, os construtores viram que seria difícil obter material para a sustentação dos trilhos. Quando escavaram trilhos para estabelecer as linhas entre as cidades de Karachi e Lahore, os trabalhadores encontraram tijolos de argila cozidos.
Os engenheiros encarregados da obra, os escoceses John e William Brunton, examinaram os tijolos encontrados e viram que se tratava de um substituto econômico para o cascalho. Assim, deram ordem para que seus subordinados continuassem a desenterrar. Aos poucos, outros objetos, incluindo estatuetas e selos com inscrições desconhecidas, foram sendo descobertos.
Porém, ninguém tomou providências para que o local fosse adequadamente preservado, e as construções continuaram. Dessa forma, os tijolos da então desconhecida cidade de Harappa acabaram por ser a base para a construção de pelo menos 160 quilômetros da ferrovia. Apenas 65 anos depois é que os arqueólogos chegaram à conclusão de que ali havia uma civilização que era da mesma época dos mesopotâmicos. Esta foi conhecida como Civilização do Vale do Indo ou Harappeana.
John Marshall era o diretor das pesquisas arqueo lógicas na Índia durante a década de 1920. Foi em 1924 que ele anunciou a descoberta de uma nova civilização, seus trabalhos haviam começado apenas dois anos antes no que era então o noroeste da Índia e hoje é conhecido como Paquistão. Selos estranhos foram encontrados, gravados numa escrita desconhecida. Entretanto, Marshall e sua equipe nem poderiam imaginar que eram apenas sinais de cidades inteiras.
Um pouco mais de trabalho e logo apareceram os primeiros traços do que hoje se sabe ser as ruínas de Mohenjo-daro e Harappa, que indicavam a existência de uma grande civilização da Idade do Bronze, datada de um período estimado entre 2600 e 1900 a.C. Hoje, essas ruínas são conhecidas como “Civilizações do Vale do Indo” e cobrem uma área enorme. Havia pelo menos cinco cidades grandes, bem como vilarejos e pequenos assentamentos agrícolas.

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Os Edifícios
Mohenjo-daro, uma das cidades grandes, é a mais explorada e estudada até hoje. Os trabalhos recentes nessa cidade sugerem que no geral cobria uma área extensa (aproximadamente 200.670 metros quadrados). Destes, apenas 10% foram escavados. A área central, um enorme monte na cidadela, foi construído numa plataforma e paira cerca de 9 metros acima do nível do chão. É cercado por um muro, possivelmente para proteger os habitantes de inundações.
Muitas das construções na cidade, como em outros locais de escavação no Vale do Indo, foram construídas com tijolos cozidos. Há outros fatores comuns, incluindo o fato de que medidas padrões parecem ter sido usadas por toda a região. Também há por lá algumas construções proeminentes, incluindo uma conhecida como O Grande Banho, que parece ter sido importante parte de um ritual de purificação. O Banho mede 9,75 por 7,01 metros e tem uma profundidade de 2,44 metros. Os tijolos usados habitualmente foram mergulhados em betume para tornar o local à prova de água; era cercado por uma colunata e um complexo de pequenas salas. Havia próximo dali um celeiro de cerca de 50 metros.
A parte baixa da cidade, que poderia conter 100 mil habitantes, também estava acima do nível das inundações, embora fosse fortificada. Era constituída em forma de grade e as causas eram construídas ao redor de seus próprios quintais, que eram alguns metros mais altos. O que mais chama a atenção nessas construções é o fato da maioria delas possuir banheiros e um poço próprio e que eram conectadas ao sistema de esgoto da cidade, composto por uma série de redes de drenagem.

Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área

Uniformidade
O nível de uniformidade nas escavações é considerado perfeito, especialmente numa área tão ampla. Muitos assumiram que tal situação seria o resultado do domínio de uma elite, provavelmente rígida, mas não há provas arqueológicas que confirmem isto.
Não há residências de elite no local nem sinais de nenhum tipo de concentração de riqueza. Também não há sinais de investimentos em grandes funerais. Apenas há alguns vestígios de uma espécie de autoridade sacerdotal, embora hoje os pesqui sadores acreditem que as civilizações que lá floresceram eram do tipo igualitário, especialmente quando em contraste com outras civilizações contemporâneas como a cidade suméria de Ur, com seus elaborados enterros reais e sacrifícios.
Mesmo antes que Marshall fizesse o anúncio oficial da descoberta das cidades do Indo, os selos com a misteriosa escrita já haviam sido descobertos na área. De fato, um deles já era objeto de estudo em 1873. Hoje se sabe de cerca de três mil selos que vêm não apenas do Vale do Indo, mas de regiões vizinhas que pertencem a outras civilizações. Há inscrições sobre todo o tipo de coisa, que prova serem aqueles grupos bem letrados. A escrita possui cerca de 220 sinais simples e 200 compostos, que até hoje permanecem desconhecidos.
Até hoje não foi descoberta nenhuma inscrição bilíngue para que se pudesse comparar a língua com alguma conhecida. Até que isso aconteça, os grupos do Vale do Indo continuarão a ser classificados como pré-históricos. Afinal, não se sabe o motivo pelo qual desapareceram. Secas, enxurradas e invasões dos povos arianos (tribos bárbaras vindas da Ásia Central pelas montanhas do Hindu Kush), muitos foram apontados como motivos sem haver uma prova concreta e deverá permanecer assim até que sua antiga linguagem possa ser lida e dar alguma pista.

Revista Leituras da História

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