quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA REVOLUÇÃO

Charlotte Corday, o assassinato de Marat - Jean Joseph WeertzImage from Art Renewal Center
Itamar de Souza
Vista somente a partir das obras gerais, a Revolução Francesa parece ter sido uma obra realizada exclusivamente por homens. Nesta literatura geral, aparecem praticamente duas mulheres: Charlote Corday, que assassinou Marat aos 13 de julho de 1793, e a rainha Maria Antonieta, que foi guilhotinada aos 16 de outubro de 1793. No entanto, a participação das mulheres nesse grande acontecimento histórico data dos seus primórdios. Na opinião da historiadora Dominique Godineau, a participação das mulheres "não é pontual, mas estrutural, embora sendo realizada em posição secundária" (GODINEAU, 2003, p. 196).
Sendo vítimas da crise de abastecimento, da inflação e da desordem fiscal, as mulheres das camadas inferiores da sociedade participaram de sublevações e protestos em várias cidades, desde os meados do século XVIII. Assim, quando o rei convocou os Estados Gerais em agosto de 1788, elas se fizeram presentes, lutando ao lado dos homens e mobilizando a população para escolher bons representantes para a Assembléia Nacional Constituinte. Nessa eleição, nenhuma mulher foi eleita para representar o povo no Congresso Nacional. Não havia esse direito político para elas. Mesmo assim, elas estavam sempre presentes nas galerias, ora aplaudindo, ora apupando os deputados ali reunidos. A pressão que elas exerciam era tão grande e constante que, em 1793, foram impedidas de assistir às sessões do parlamento. Diante desta proibição, as mulheres continuaram agindo nos cafés, nos salões, na imprensa e em outros lugares onde pudessem. Além disso, as engajadas criaram, em toda a França, mais de sessenta organizações, onde eram debatidas as questões políticas do momento e as decisões tomadas pelo Congresso Nacional.
Em 1792, as Monnaidières de Aries participaram de expedições punitivas contra aldeias vizinhas. (GODINEAU, 2003, p. 212). Por outro lado, as mulheres mais ardorosas e patrióticas tentaram várias vezes formar uma milícia para defender a Revolução. Para ilustrar, lembremos algumas destas iniciativas. Em março de 1792, uma delegação de mulheres foi a Paris solicitar armas a Assembléia Nacional.
Esta delegação trazia uma petição assinada por 315 militantes da Sociedade Fraterna das Minimes (MARAND - FOUQUET, 1993, p. 136). Não conseguiram o que desejavam.
Disfarçadas de homem, algumas "combateram nos exércitos da Revolução.[...]. A maioria dessas mulheres-soldados era de jovens: quase todas tinham menos de 35 anos. Em geral,acompanhavam o marido, muitas vezes, o pai ou irmãos" (MARAND-FOUQUET, 1993, p. 138). Todavia, devido aos problemas causados nos acampamentos, a presença feminina foi proibida nos campos de batalha, com exceção das lavadeiras e cantineiras (MARAND-FOUQUET, 1993, p.140).
Por outro lado, aquelas que não aceitavam as decisões revolucionárias foram severamente reprimidas, inclusive as religiosas que viviam nos conventos e mosteiros. Segundo Marand-Fouquet(1993, P. 156), "o espancamento público para fazer calar uma mulher era um procedimento vulgarmente utilizado". Além disso, muitas que desenvolveram ações contra-revolucionárias foram levadas às barras dos tribunais, presas e guilhotinadas.
Pelo que acabamos de ver, as mulheres participaram intensamente da Revolução Francesa, rompendo com uma filosofia e com os costumes de uma sociedade que as queriam reclusas ao lar, longe, portanto, do cenário dos acontecimentos públicos. No entanto, não pensemos que, quantitativamente, a sua participação se igualasse à dos homens. Longe disso! Segundo cálculos feitos por Dominique Godineau, a participação feminina na vida política da época revolucionária variou:
De um décimo a um quarto dos participantes - 15 a 25% dos membros das sociedades populares mistas; 14% dos suspeitos presos em Paris, de 1792 a 1794; 12 a 15 % dos sans-culotes presos em 1795. Com prudência, se poderia avançar que sobre dez revolucionários ou contrarevolucionários engajados, de um a dois são mulheres. (GODINEAU, 2003, p. 220).


Parte integrante do artigo
A MULHER E A REVOLUÇÃO FRANCESA:
participação e frustração
Itamar de Souza é Sociólogo, Historiador, Bacharel em Filosofia, em Teologia e Mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Professor de Filosofia Política da FARN.
Revista da FARN

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