terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Império Romano - ADOLESCÊNCIA


ADOLESCÊNCIA

Aos doze anos o pequeno romano de boa família deixa o ensino elementar; aos catorze, abandona as vestes infantis e tem o direito de fazer tudo que um jovem gosta de fazer; aos dezesseis ou dezessete, pode optar pela carreira pública, entrar no Exército — como Stendhal, que aos dezesseis anos resolveu ser hussardo. Não existe "maioridade" legal nem idade de maioridade; não há menores, e sim impúberes, que não mais [pág. 32]
o são quando o pai ou o tutor considera que estão na idade de tomar as vestes de homem e cortar o primeiro bigode. Um filho de senador, por exemplo: aos dezesseis anos completos, torna-se cavaleiro; aos dezessete, ocupa seu primeiro cargo público: cuida da polícia de Roma, manda executar os condenados à morte, dirige a Moeda; sua carreira não se deterá mais, ele será general, juiz, senador. Onde aprendeu? No exercício de suas funções. Com os mais velhos? Com os subordinados, melhor dizendo: tem bastante arrogância nobiliária para dar a impressão de que decide quando o fazem decidir. Aos dezesseis anos esse jovem nobre era coronel, sacerdote do Estado e já estreara no tribunal.
À aprendizagem no exercício das coisas cívicas e profissionais, acrescenta-se o estudo escolar da cultura (o povo tem uma cultura, mas não a ambição de se tornar culto); a escola é o meio dessa apropriação e, ao mesmo tempo, modifica tal cultura: começa a haver escritores "clássicos", assim como com as "leis" do turismo haverá lugares que será necessário visitar, monumentos que não se poderá deixar de ver. A escola forçosamente ensinará a todos os notáveis atividades prestigiosas para todos, mas que interessam a pouca gente, mesmo entre aqueles que admiram de longe. E, como uma instituição logo se considera um fim em si mesma, ensinará principalmente, e dirá clássico, o que é mais facilmente ensinável; desde os tempos de Atenas clássica, a retórica soube elaborar uma doutrina mastigada e pronta para ler ensinada. Assim, os jovens romanos de doze a dezoito ou vinte anos aprendiam a ler seus clássicos, depois estudavam a retórica. E o que é a retórica?
Não uma coisa útil, que contribui com algo para a "sociedade". A eloquência da tribuna e também a do tribunal desempenharam um grande papel na República romana, porém seu prestígio provinha muito mais do brilho literário que da função cívica: Cícero, que não era filho de oligarca, terá a rara honra de ser admitido no Senado porque seu brilho literário de orador só podia aumentar o prestígio de tal assembleia. Ainda no Império, o público acompanhava os processos como hoje [pág. 33]
acompanhamos a vida literária, e a glória dos poetas não tinha a auréola de larga popularidade que cingia a fronte dos oradores de talento.
Essa popularidade da eloquência permitiu que a arte retórica — ou a eloquência com receitas — se tornasse a matéria única da escola romana, depois do estudo dos clássicos; todos os meninos aprendiam, pois, os planos-tipo de discursos judiciários ou políticos, desenvolvimentos-modelo, efeitos catalogados (são nossas "figuras de retórica"). Aprendiam, portanto, a arte da eloquência? Não, pois logo a retórica tal como era ensinada na escola se tornou uma arte à parte, com o conhecimento de suas regras. Assim, entre a eloquência e o ensino da retórica nas classes houve um abismo, que a Antiguidade não parava de lamentar, ao mesmo tempo que se deleitava. Os temas de discurso propostos aos pequenos romanos nada tinham a ver com o mundo real; ao contrário, quanto mais estapafúrdio fosse um tema, mais matéria fornecia à imaginação; a retórica tornava-se um jogo de sociedade. "Suponhamos que uma lei decide que uma mulher seduzida poderá escolher entre fazer seu sedutor ser condenado à morte e esposá-lo; então, na mesma noite, um homem violenta duas mulheres; uma pede sua morte; a outra quer esposá-lo": esse tema, dado como exercício de eloquência, propiciava livre curso ao virtuosismo, ao gosto pelo melodrama e pelo sexo, ao prazer do paradoxo e a uma cumplicidade de humor. Passada a idade escolar, os amadores muito adestrados continuavam a exercitar-se nesses jogos, em casa, diante de um auditório de connaisseurs. Essa foi a genealogia do ensino antigo: da cultura à vontade de cultura, desta à escola, e daí ao exercício escolar transformado num fim em si mesmo.

História da vida privada, 1: do Império Romano ao ano mil / organização Paul Veyne ; tradução Hildegard Feist; consultoria editorial Jonatas Batista Neto. — São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

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