terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Império Romano - Adoção


ADOÇÃO

Nosso professor tinha mais uma razão para chorar seu filho bem-amado: um alto personagem, um cônsul, acabara de adotá-lo, o que prometia ao menino uma fulgurante carreira pública. Na verdade, a frequência de adoções constitui outro exemplo do pouco naturalismo da "família" romana. Visivelmente dava-se uma criança em adoção como se dava uma filha em casamento, sobretudo em se tratando de um bom casamento. Há dois meios de se ter filhos: gerando-os ou adotando-os; este podia ser um modo de impedir a extinção de uma estirpe e também de adquirir a condição de pai de família exigida por lei dos candidatos a honras públicas e aos governos das províncias: tudo que o casamento propicia é propiciado igualmente pela adoção. Assim como um testador tornava seu continuador aquele a quem instituía herdeiro, assim também, ao adotar um jovem bem escolhido, elegia-se um sucessor digno de si. O futuro imperador Galba é viúvo e seus dois filhos morreram; desde algum tempo ele percebeu os méritos de um jovem nobre chamado Pisão; redige seu testamento, instituindo-o herdeiro, e acaba por adotá-lo. Também se podia adotar [pág. 28]
mesmo tendo filhos vivos, como fez Herodes Atico. Os textos históricos falam da existência de uma adoção por testamento, da qual não há vestígio nos textos jurídicos. O mais belo caso de herança combinada com adoção é o de um certo Otávio, que, transformado em filho e herdeiro de César, um dia se tornará, por esse meio, o imperador Otávio Augusto. Outras vezes, a adoção, como as bodas, constituía um meio de controlar o movimento dos patrimônios; um sogro que aprecia a deferência com que o genro o trata adota tal genro quando este, ficando órfão, recebe uma herança: eis que o sogro se torna dono dessa herança, pois colocou sob seu poder o genro transformado em filho. Em troca, propiciará ao filho adotivo uma bela carreira no Senado: a adoção regula também a carreira.
Essas crianças deslocadas como peões no tabuleiro de xadrez da riqueza e do poder não são criaturinhas amadas e mimadas: tais cuidados competem à criadagem. A criança aprendeu a falar com a nutriz; nas casas ricas, a nutriz era grega, para que a criança aprendesse no berço essa língua da cultura. Ao pedagogo cabia ensiná-la a ler.

História da vida privada, 1: do Império Romano ao ano mil / organização Paul Veyne ; tradução Hildegard Feist; consultoria editorial Jonatas Batista Neto. — São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário