quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Para acabar com o mito da 'Idade das Trevas'


Para acabar com o mito da 'Idade das Trevas'
Efervescência cultural medieval fincou alicerces da ciência moderna, mostra livro

Bernardo Esteves

Se você considera os dez séculos da Idade Média um período de estagnação do conhecimento, a leitura do primeiro volume da coleção Breve história da ciência moderna deve lhe surpreender. O livro aponta justamente os avanços das ciências nesse momento histórico e mostra como eles foram cruciais para a revolução científica dos séculos seguintes.

Para entender como os alicerces da ciência moderna se fincaram na Idade Média, no entanto, é preciso voltar alguns séculos no tempo e entender a filosofia natural estabelecida na Grécia antiga por pensadores como Platão e Aristóteles. Por isso, o livro dedica um capítulo ao pensamento grego e mostra como ele inaugura a reflexão sobre temas que seriam o objeto da ciência moderna.

O saber grego chegou à Europa medieval trazido pelos árabes, que constituíram nos séculos 7 e 8 um império que abrangia o norte da África, a Península Ibérica e toda a região do Oriente Médio até a fronteira com China e Índia. Esse império foi o palco de uma intensa efervescência intelectual: estavam localizadas ali a cidade de Alexandria, centro de conhecimento do Egito antigo, a Síria e a Pérsia, que tinham centros de investigação importantes em campos como astronomia ou medicina, e a capital Bagdá, um grande pólo cultural.

O livro mostra como os árabes foram muito mais que simples mediadores do conhecimento helênico, como se apontou durante muito tempo. Além de comentar e expandir os textos que traduziram, eles contribuíram com estudos originais em campos como álgebra ou astronomia, além de terem levado à Europa inovações técnicas na engenharia e novos campos do conhecimento, como a alquimia.

A obra ajuda a desmontar ainda o mito da 'Idade das Trevas' ao mostrar que esse período conheceu avanços técnicos consideráveis em campos como a produção de relógios, a engenharia das catedrais ou a compreensão do movimento. "Esse longo período da história produziu uma grande diversidade de visões de natureza que se confrontaram em múltiplas discussões e embates", afirma o livro.

Os autores -- Marco Braga, Andreia Guerra e José Claudio Reis -- são todos físicos com formação em história e filosofia da ciência e membros do Grupo Teknê, projeto educacional que tem entre seus objetivos a reflexão sobre o fazer científico e a divulgação desse conhecimento.

Convergência de saberes é apenas o primeiro volume de uma coleção que pretende, em cinco livros, abordar a evolução da ciência até os dias de hoje. Os próximos volumes estão em fase de preparação pelos autores: o segundo deve contemplar a consolidação da ciência moderna (séculos 15 a 17), e os demais vão tratar respectivamente dos séculos 18, 19 e 20.

O primeiro livro foi escrito em linguagem ágil e instigante. Conciso e ilustrado, ele deve agradar ao público leigo jovem interessado por história da ciência. E quem quiser ir além das cerca de cem páginas do livro leva, de brinde, uma bibliografia comentada para maior aprofundamento e dicas de livros de ficção, filmes e quadros que dialogam com os temas apresentados.

Breve história da ciência moderna
Volume 1: Convergência de saberes (Idade Média)
Marco Braga, Andreia Guerra e José Claudio Reis
Rio de Janeiro, 2003, Jorge Zahar Editor
101 páginas


Revista Ciência Hoje

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