sexta-feira, 6 de maio de 2011

Uma breve história das bibliotecas do passado

Daniel Tremel


669-630 a.C.
BIBLIOTECA DE NÍNIVE

As primeiras bibliotecas surgiram na Mesopotâmia e as obras eram feitas em argila. A biblioteca de Nínive chegou a possuir 25 mil placas de argila no reinado de Assurbanipal 2º

300 a.C.
BIBLIOTECA DE ALEXANDRIA

Fundada por Ptolomeu I, general de Alexandre, o Grande, seu objetivo era possuir ao menos uma cópia de toda a obra escrita no mundo


241-197 a.C.
PÉRGAMO

Rival de Alexandria, Pérgamo utilizava o couro de cabra como suporte para a escrita, o que ficou conhecido como "pergaminho"


39 a.C.
PRIMEIRA BIBLIOTECA PÚBLICA ROMANA

Idealizada por Júlio César, foi fundada por Assírio Polião durante o reinado de Augusto. Possuía obras em grego e latim e já organizava serviço de empréstimo

Séc. 6 d.C.
VIVARIUM

Logo antes da Idade Média, Cassiodoro, um nobre romano cristão, construiu um mosteiro em que se dedicou a preservar obras. O mosteiro se tornou modelo para toda a Idade Média e sua obra, "Institutiones Divinarum et Saecularium Litterarum", foi uma espécie de guia para os monges copistas da Idade Média

1444
BIBLIOTECA DE SÃO MARCOS

As bibliotecas públicas ressurgiram no Renascimento. A primeira biblioteca mantida por um mecenas foi a biblioteca de São Marcos, construída por Cosimo de Médici, em Florença


1456
Invenção da Prensa

Já conhecida no Oriente, Gutenberg "reinventa" a prensa para o Ocidente. A primeira obra que imprime é a Bíblia

Todo o conhecimento do mundo

Daniel Tremel

A versão mais difundida do fim da biblioteca é que ela teria sido incendiada a mando do califa Omar, quando Alexandria foi conquistada pelos mulçulmanos, em 640. Ao ser questionado sobre o que fazer com a biblioteca, o califa foi direto: se os livros estavam de acordo com o Corão, não eram necessários; se não estivessem, deveriam ser destruídos. O general Amr ibn al-As mandou que os rolos servissem de combustível para os cerca de 4 mil banhos públicos de Alexandria. Eles teriam alimentado os fornos durante seis meses.

Embora pitoresca, a história não parece real. O mais provável é que a biblioteca tenha sido destruída em grande parte durante a guerra com Zenóbia, rainha de Palmira, no século 3. O fato é que não restou nenhum vestígio das obras e nem se sabe onde ela ficava exatamente.

De fato, nenhuma biblioteca da Antiguidade - Pérgamo, Rodes e todas as bibliotecas públicas de Roma - sobreviveu. A reunião das obras em grande número ajudava, na verdade, mais a destruição que a preservação, e a maior parte das que sobreviveram pertenciam a pequenas coleções particulares.

Organização
A invenção da prensa por Gutenberg encerrou a fase copista da humanidade. Livre para produzir edições sem limites, os livros começaram a se multiplicar. Um problema inimaginável antes surgiu: como organizar o volume de informação que ia saindo das gráficas?

Já em 1550, um escritor italiano se queixava de que havia tantos livros que mal conseguia ler todos os títulos. Os homens letrados reclamavam da confusão que a "enxurrada" de novas edições estava trazendo.

Até a Idade Média, era raro uma biblioteca elaborar um catálogo das obras que possuía. A cópia era o trabalho principal e gastar tempo e papel fazendo listas não era lógico. Os poucos catálogos eram abreviados e relacionavam os volumes existentes, e não obras e autores. A Universidade de Sorbonne elaborou seu primeiro catálogo de obras em 1290, quando ultrapassou o marco de pouco mais de mil livros.

As soluções variavam de local para local. Na mesma Sorbonne, experimentou-se usar a ordem alfabética. Em Oxford, os livros foram ordenados com os números arábicos, ainda pouco usados na Europa. A Biblioteca do Vaticano usou a divisão medieval entre livros sagrados e seculares.

Esses sistemas não resistiram conforme as coleções cresciam e foram surgindo sistemas de classificação. O mais bem-sucedido foi o de Francis Bacon, que dividiu o conhecimento em três áreas, História, Poesia e Filosofia. Esse foi o primeiro sistema adotado pela Biblioteca do Congresso de Washington e serviu de base para a Enciclopédia organizada por Diderot.

A revolução industrial e a mecanização das gráficas foi mais um golpe nesse mundo conturbado: os livros multiplicaram-se em proporções ainda maiores.

A solução veio apenas com a invenção do sistema de Classificação Decimal de Dewey, em 1876. O sistema dividia todo o conhecimento humano em dez categorias e depois em subcategorias, dividindo cada área várias vezes. A grande vantagem é que ele classificava não apenas os livros existentes, mas qualquer um que viesse a existir.

A obsessão de Dewey pela organização e eficiência não se limitou à organização das bibliotecas. Ele também fundou uma empresa que projetava e vendia móveis e instrumentos para bibliotecas, pensando na sua praticidade. Ele organizou também o primeiro curso de biblioteconomia e desde o início permitiu o acesso às mulheres. Isso não tinha nada a ver com a defesa dos direitos femininos. Dewey acreditava que a função do bibliotecário era apenas classificar os livros e não devia se intrometer em discussões teóricas. Ele preferia mulheres justamente porque elas não tinham acesso ao estudo.

A Classificação Decimal de Dewey e algumas variantes se espalharam pelo mundo e hoje estão praticamente em todas as bibliotecas do planeta. A eficiência absoluta do método virou padrão global. Até que surgiu a internet.

A internet reinventou o caos, arduamente debatido e combatido por gerações de homens letrados e bibliotecários. A informação, enfim organizada nas estantes, se dispersou novamente pelo mundo virtual sem ordem e lógica aparente. E promete alcançar um volume ainda maior que o do passado.

Nos últimos anos, a atividade mais lucrativa surgida no mundo da internet foi justamente o desenvolvimento de ferramentas de busca, que auxiliam o internauta a encontrar o que deseja. O Google saiu na frente e hoje pesquisa quase 8 bilhões de páginas na rede. Uma pesquisa recente calcula que, mesmo assim, o site de busca não lê nem 1% de todas as páginas existentes. A nova biblioteca ainda não encontrou seu bibliotecário.


Para ler
"A Biblioteca Desaparecida - Histórias da Biblioteca de Alexandria". Luciano Canfora. Cia. das Letras
"A Conturbada História das Bibliotecas", Matthew Battles. Ed. Planeta
"História Social do Conhecimento", Peter Burke. Jorge Zahar Editor

Uma nova maneira de ler

Daniel Tremel


O crescimento do volume de informação na Idade Moderna moldou duas formas de organização das bibliotecas: a indexação e a classificação.

A indexação funciona como um "dicionário especializado", em que os principais termos de um texto são retirados e se tornam "chaves" para que ele seja encontrado depois. A classificação divide o saber em classes e subclasses e cria um catálogo de referência. Os números nas lombadas dos livros nas bibliotecas são essa divisão.

Os dois sistemas foram adaptados da Filosofia. Descobrir a essência do mundo sempre foi um problema filosófico, mas foi Aristóteles quem se preocupou em criar um modelo para formular conceitos. Sua idéia era simples: qualquer termo poderia ser definido pela atribuição de uma diferença específica à sua substância. A definição para "ser humano", assim, seria "animal racional".

No meio virtual esse sistema filosófico já não é preciso. A novidade é que é possível "ler" não só um texto, mas toda uma biblioteca em um tempo curtíssimo. É como se o leitor tivesse a capacidade de passar os olhos por toda a biblioteca para encontrar o que quer. O homem ainda não consegue ler todos os livros do mundo, mas já inventou uma máquina que consegue.

http://revistagalileu.globo.com

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