terça-feira, 17 de agosto de 2010

A Comuna de Paris (1871) - A COMUNA


Robert Ponge

A COMUNA

O Comitê Central começa por abolir o estado de sítio na cidade, suprimir os tribunais militares, decretar a anistia geral dos delitos políticos e a imediata libertação dos presos, restabelecer a liberdade de imprensa, nomear responsáveis pelos ministérios e pelos serviços administrativos e militares essenciais. No dia 19, fixa para o dia 22 as eleições para a Comuna, depois postergadas para o dia 26, por pressão dos prefeitos.

Por sua vez, o governo de Versalhes delega, provisoriamente, a administração de Paris à assembléia dos prefeitos das regiões administrativas: junto com os deputados eleitos por Paris (para a Assembléia Nacional, em 8 de fevereiro), condenam o Comitê Central, depois tentam funcionar como mediadores junto a Versalhes, no sentido de uma volta negociada à normalidade. No dia 21 de março, a Assembléia Nacional condena o "governo faccioso" de Paris.

No dia 22, acontece, em Paris, uma pequena manifestação contra o Comitê Central; também os batalhões da Guarda Nacional dos bairros ricos colocam-se sob a direção de lideranças fiéis ao governo de Versalhes. O que leva o Comitê Central a adotar algumas medidas enérgicas, em particular, a dotar-se de uma direção militar e a tomar o controle das prefeituras das regiões administrativas.

Cabe aqui assinalar que, entre 22 e 26 de março, são também instaladas Comunas, mais ou menos fugazes, em algumas outras cidades (Lyon, Marselha, Narbonne, Toulouse, Saint-Étienne, Le Creusot).

No dia 23, o Comitê Central lança um manifesto em que define suas perspectivas:

O princípio de autoridade está doravante impotente para restabelecer a ordem na rua, para fazer renascer o trabalho nas oficinas, e esta impotência é sua negação ... A independência da Comuna é a garantia de um contrato, cujas cláusulas, livremente debatidas, porão um fim ao antagonismo das classes e assegurarão a igualdade social ... Hoje, o povo de Paris é clarividente ... Rejeitará qualquer prefeito, qualquer representante do poder central imposto por um Governo estranho a suas aspirações.13

Apesar de indecisões, pressões e contrapressões, as eleições acabam confirmadas e realizadas no dia 26 de março. A taxa de abstenção (mais de 60%) é altíssima nos bairros burgueses. Mesmo assim, votam 229.267 parisienses, o que não é nada mau. No dia 28, o Comitê Central da Guarda proclama os resultados, instala a Comuna e declara abdicar de seus poderes em prol desta. São 86 eleitos (entre os quais 25 operários); 15 de seus membros, afinados com os prefeitos, abandonam a Comuna quase imediatamente, seguidos, pouco depois, por quatro outros. Para substituí-los, serão realizadas eleições complementares em 16 de abril.

No dia 29 de março, a Comuna organiza-se em dez comissões, tendo como base de referência os ministérios até então existentes (menos o dos cultos, que é suprimido): Militar, Finanças, Justiça, Segurança, Trabalho, Subsistência, Indústria e Trocas, Serviços Públicos, Ensino — coroadas por uma Comissão Executiva.

Nesse meio tempo, Versalhes não ficara inativo. Trouxe para a região parisiense tropas oriundas do interior; como o armistício autorizava a França a manter apenas quarenta mil soldados na região parisiense, Thiers negociou, com os alemães, a autorização para ali concentrar mais tropas, com o fim de restabelecer a ordem. Bismarck foi muito compreensivo: o acordo de 28 de março autorizou oitenta mil homens. Após outras negociações, Versalhes obterá, posteriormente, a autorização de concentrar 170 mil homens, dos quais cerca de cem mil serão prisioneiros gentilmente libertados pelos alemães para este fim específico.

No dia 30, o governo de Versalhes começa a investir contra Paris, apoderando-se do município fronteiriço de Courbevoie. Em 2 de abril, ocorre o primeiro confronto entre as tropas de Paris e as de Versalhes, com o revés dos parisienses; os prisioneiros são fuzilados pelos Versalheses. A notícia agita Paris. Cedendo à pressão popular, a Comuna decide enviar tropas contra Versalhes. Mal organizada, com ilusões de que os soldados de Versalhes não ousariam atirar contra os "federados" (a Guarda Nacional, os parisienses), a iniciativa resulta em um sério revés. Em 5 de abril, a Comuna toma a decisão de executar três reféns por cada federado executado por Versalhes (o decreto só será aplicado nos últimos dias da Comuna). A luta militar entra numa fase de guerra de bombardeios à distância, com escaramuças de vez em quando. Versalhes afirma várias vezes que não aceita qualquer pacificação ou conciliação, apenas a rendição pura e simples de Paris.

Em 19 de abril, é votada, quase por unanimidade (apenas um voto contra), uma Declaração ao Povo Francês, que apresenta o programa da Comuna e sua proposta de Constituição Comunalista, que, comentou Marx, teria "começado a regeneração da França".14

Em 21 de abril, há uma reestruturação das Comissões, que passam a ser encabeçadas por um delegado — os nove delegados constituindo a Comissão Executiva. Como isto não basta para fortalecer e agilizar a ação da Comuna, é criado um Comitê de Salvação Pública, de cinco membros, "responsável apenas diante da Comuna" (proposta que encontrou a oposição de uma importante minoria, entre os quais os membros da AIT). O novo comitê não terá o efeito mágico esperado por seus proponentes.

A partir de 26 de abril, os federados começam a perder posições: Les Moulineaux naquele dia; as fortificações de Moulin-Saquet em 4 de maio; perda de Clamart no dia seguinte; revés de Vanves, em 6 de maio; perda das fortificações de Issy no dia 8, dia em que Thiers lança um ultimato aos parisienses.

Em 9 de maio, o Comitê de Salvação Pública sofre uma renovação, na esperança de melhorar sua ação efetiva. Por sua vez, no dia 10, o governo de Thiers assina a paz com a Alemanha em Frankfurt.

No dia 20, os versalheses entram em Paris: um traidor lhes abriu uma porta; 130 mil homens começam a penetrar na cidade. O alerta é dado; iniciativas individuais de resistência são tomadas. No dia 22, o Comitê de Salvação Pública lança um apelo geral às armas. Os bairros populares enchem-se de barricadas. Pratica-se a guerra de ruas; para dificultar o avanço do adversário, incendeiam-se os edifícios na hora de abandoná-los. Os versalheses ver-se-ão obrigados a conquistar a cidade quarteirão por quarteirão. Em 24 de maio, a Comuna abandona o Hôtel-de-ville, para instalar-se na Prefeitura da 11ª região administrativa. No dia 25, acontece a última reunião da Comuna. No dia seguinte, resiste apenas um bolsão no bairro Saint-Antoine e arredores. A última barricada, na rua Oberkampf, é tomada pelos versalheses às 13 horas do dia 28 de maio.

Um total de 877 homens das forças de Thiers morreram durante os enfrentamentos; cerca de quatro mil dos combatentes federados. Com a queda da Comuna, termina a chamada Semana Sangrenta; as cortes marciais dos versalheses não cessam, contudo, de trabalhar e as execuções sumárias duram mais outra semana. O general Mac-Mahon reconheceu oficialmente 17 mil execuções; foram no mínimo vinte, talvez 25 mil. Uns dez mil federados conseguiram fugir para o exílio. Houve ainda 43.522 presos, que foram processados judicialmente; 91 foram condenados à morte, cerca de quatro mil à deportação na Nova Zelândia, uns cinco mil a penas variadas, de prisão, etc.

Algumas questões de interpretação

Revista O Olho da História

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