sexta-feira, 2 de abril de 2010

PROMESSA DA AMÉRICA


O tigre azul romperá o mundo.


Outra terra, a que não tem mal, a que não tem morte, vai nascer da aniquilação desta terra. Ela pede que seja assim. Pede a morte, pede o nascimento, esta terra velha e ofendida, ela está cansadíssima e, de tanto chorar por dentro, ficou cega. Moribunda, atravessa os dias, lixo do tempo, e quando é noite inspira piedade às estrelas. Logo logo, o Pai Primeiro executará as súplicas do mundo, terra querendo ser outra, e então solçtará o tigre azul que dorme debaixo de sua rede.


Esperando esse momento, osd índios guaranis peregrinam pela terra condenada.


- Você tem alguma coisa que dizer para nós, colibri?


Dançam sem parar, cada vez mais leves, mais voadores, e cantam os cantos sagrados que celebram o próximo nascimento da outra terra.


Lança raios, lança raios, colibri!


Buscando o paraíso chegaram até as costas do mar e até o centro da América. Rodaram selvas e serras e rios, perseguindo a terra nova, a que será fundada sem velhice nem doença nem nada que interrompa a incessante festa de viver. Os cantos anunciam que o milho crescerá por sua conta e as flexas voarão sozinhas na floresta; e não serão necessários o castigo e o perdão, porque não haverá proibição nem culpa.

Clastres, Hèléne. La terre sans mal. Le prophétisme tupi-guarani. Paris, Seuil, 1975.
Nimuendajú, Curt. Los mitos de crieación y de destrucción del mundo. Lima, Centro Amazónico de Antropologia, 1979.




Memórias do Fogo II
Eduardo Galeano

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