sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Oráculo do Apocalipse

Antes atacado e ridicularizado por Wall Street, o teórico
Roger Babson, que anunciou com dois meses de antecedência a
ocorrência do crash, é o novo guru financeiro americano

Agora eles acreditam na quebra: investidor falido coloca seu Cadillac Fleetwood à venda por 100 dólares em Wall Street

Via de regra, depois de tragédias ou catástrofes, surgem finórios que garantem ter anunciado a calamidade com semanas ou até meses de antecedência – são os chamados profetas do acontecido. Estes, porém, não têm encontrando muito espaço para apregoar seus supostos feitos no caso do crash da Bolsa de Nova York. Tudo porque, há pouco menos de dois meses, diante de uma platéia de peso, rodeado por lentes e microfones, um homem já havia monopolizado as atenções ao antecipar, com todas as letras, o colapso que se avizinhava de Wall Street. O teórico econômico Roger Babson, na ocasião ridicularizado pela maioria de seus pares, é agora, consumado o sinistro, visto e ouvido como autoridade inconteste pela população americana, que lamenta apenas não ter dado mais atenção quando ele, em 5 de setembro, disparou sua previsão: "Mais cedo ou mais tarde, o crash virá, e poderá ser tremendo".

Sábio de Wellesley: 'notória inexatidão'


Era a Conferência Anual das Empresas Nacionais, em pleno mês em que as médias do jornal The New York Times disparavam aos céus. O discurso sombrio de Babson teve, a bem da verdade, uma pequena reação no mercado – os índices do Times caíram 10 pontos e o volume de vendas foi alto (5.565.280 ações negociadas). O solavanco daquela quinta-feira foi apelidado de "Baixa de Babson". O mercado, contudo, recuperou-se na sexta e no sábado, e a patrulha de Wall Street, triunfante, tratou de rebater e até ironizar as palavras do teórico. A corretora Hornblower and Weeks emitiu a seguinte declaração: "Não vamos começar a vender ações descontroladamente por causa da previsão injustificada de um estatístico". O Barron’s, semanário econômico publicado pela Dow Jones, garantiu que o "sábio de Wellesley" não deveria ser levado a sério, até por conta da "notória inexatidão" de suas previsões anteriores. De fato, Babson, 54 anos, formado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) e sócio-fundador da Organização Estatística Babson – empresa que fornece boletins sobre ações a bancos e investidores –, vinha tropeçando ao lustrar sua bola de cristal ultimamente.

Polêmico, é autor de um trabalho que gira em torno de uma premissa muito discutível: o Babsonchart, índice econômico que criou em conjunto com o professor de engenharia George F. Swain. Fã de Isaac Newton, Babson acredita que as leis de ação e reação apresentadas pelo cientista podem explicar também o ciclo econômico, e criou um indicador, de acordo com seu conceito, supostamente capaz de prever o futuro na economia. Até agora momento, não havia tido grande sucesso. Mas seu instrumento o permitiu não apenas anunciar, em setembro, o iminente crash como também, no dia 22 de outubro – logo, dois dias antes da quinta-feira negra –, aconselhar os investidores a venderem suas ações. "Comprem ouro!", exortou. Depois desses arrebatadores acertos, o controverso teórico começa a ser tratado como um guru econômico, e os cursos do Instituto Babson – escola de administração e negócios fundada por ele em 1919 – recebem inúmeros pedidos de matrícula. Entretanto, para o bem de toda a sociedade, seus novos discípulos precisam torcer para que outra das previsões de Babson, sentenciada também na Conferência Anual das Empresas Nacionais, seja um equívoco estrondoso. Vaticinou o professor: "As fábricas fecharão, os empregados serão demitidos, o círculo vicioso entrará em plena ação e o resultado será uma séria depressão econômica".

Revista Veja

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