Os Leprosos na Idade Média
Fani Farias de Souza
Acredita-se que a lepra havia sido introduzida na Europa Ocidental através das Cruzadas, devido ao contato com o leste onde era endêmica. Porém, este pensamento tem sido contestado pelos estudos mais recentes, na medida em que existem evidências da presença dos leprosos na Europa Ocidental antes das Cruzadas.
Por falta de um conhecimento mais específico sobre as doenças, havia na Idade Média uma dificuldade de se diagnosticar a lepra. Por isso, ela era muitas vezes confundida com outros tipos de enfermidades, principalmente com as de pele e venéreas. Partindo desta premissa, a segregação dos leprosos pode ser vista também como uma maneira, empregada pelos homens da Idade Média, de afastar da sociedade um símbolo vivo da lascívia e da promiscuidade. Neste sentido, a lepra era tida como um símbolo do pecado, como um sinal externo e visível de uma alma corroída pelo erro e, em especial, pela transgressão sexual.
A identificação do leproso era feita, inicialmente, através da denúncia. Qualquer pessoa que notasse uma doença de pele num vizinho, parente ou cônjuge, deveria indicá-lo à autoridade secular ou religiosa para que um tribunal fosse convocado.
O doente comparecia perante um júri composto por um médico, um preboste e um padre, que representavam a Ciência, o Estado e a Igreja. A pele do acusado sofria um exame minucioso e precisava passar por vários testes. Um deles afirmava que se pusesse uma pessoa ao luar, de forma que os raios lhe batessem na face, o leproso ficaria marcado por diversas cores, enquanto que o homem saudável pareceria pálido. Um outro dizia que se espalhasse cinzas de chumbo queimado na urina de um leprosos, elas ficariam a boiar, enquanto, normalmente, cairiam no fundo do recipiente.
Com esses tipos de teste, o número de pessoas consideradas leprosas era grande. Os suspeitos podiam contestar, mudar de jurisdição, ou mesmo exigir novos peritos. Mas, uma vez estabelecida a natureza da lepra pelo tribunal, os leprosos eram excluído da comunidade e de toda vida social. Em certos lugares eram realizadas cerimônias macabras que solenizava o dia da separação do leproso da sociedade. Esquematicamente, ela consistia em levar o doente à igreja, em procissão, ao canto do "Libera – me" como para um morto, para a celebração de uma missa que o doente escutava dissimulado sob um cadafalso, sendo depois acompanhado à sua morada. Durante a missa ou à saída da igreja tem lugar um ritual: "o padre deve ter uma pele na mão e com essa pele deve pegar terra do cemitério, três vezes, e pô-la na testa do leprosos, dizendo o seguinte: Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus." A leitura das proibições, como, por exemplo, entrar nos moinhos, tocar nos alimentos e etc. acompanhava a entrega e benção das luvas, da matraca e da caixa das esmolas, elementos que o leproso deveria usar para que assim fossem rapidamente reconhecidos pelos outros membros da sociedade.
Nas leprosarias, os doentes eram proibidos de tocar nos suprimento de comida, de andar de pés descalços, de ferver as suas roupas na hora de preparação da comida e de tirar água do poço, pois existia o medo de que suas mãos viessem a infectar as cordas das cacimbas.
As instituição específicas para o tratamento dos leprosos nasceram em um contexto de crescimento das hostilidades para com estes doentes e em meio a convicção de que eles deveriam ser separados do convívio social. Esses estabelecimentos teriam atingido a seu apogeu no final do século XI e início do século XII e o seu declínio no final do século XIII.
O crescimento das fundações de caridade para atender aos leprosos pode ser visto como um aspecto do desenvolvimento do individualismo religioso ( expressão pessoal de piedade ) e também para defender a riqueza, já que a acumulação ficava justificada se, ao menos parte dela, fosse gasta em atividades de caridade. Neste sentido, a Igreja desenvolveu um programa de ação contínuo e corrente para assegurar a segregação efetiva dos leprosos.
Um outro pensamento corrente na idade Média é de que, em certo sentido, os leprosos eram particularmente favorecidos por Deus, porque estavam sofrendo nesta vida, como Cristo havia sofrido. Deste modo, eles já estavam pagando em vida pelos pecados cometidos e quando viessem a falecer iriam direto para o céu. Não podemos esquecer que existia na Idade Média uma preocupação constante com a salvação da alma. Ou seja, a vida depois da morte era tida como certa, sendo assim, os ímpios não herdariam o reino do céu. Tal pensamento torna-se ambíguo, se considerarmos que os leprosos medievais carregavam consigo a marca do pecado e que por isso eram excluídos e segregados.
Sugestões de Atividades:
1º - Traçar um paralelo entre o tratamento social dado aos leprosos medievais e aos doentes de AIDS em nossa sociedade.
2º - Traçar um paralelo entre a forma como a lepra era vista no período medieval e no atual. Ou seja, em que pontos estas visões se aproximam e se afastam.
Para saber mais:
RICHARDS, Jeffrey. Sexo, Desvio e Danação. As Minorias na Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
LE GOFF, Jacques. As doenças têm História. Lisboa: Terramar, 1996.
GINZBURG, Carlo. História Noturna: Decifrando o Sabá. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/leprosos.htm
Fani Farias de Souza
Acredita-se que a lepra havia sido introduzida na Europa Ocidental através das Cruzadas, devido ao contato com o leste onde era endêmica. Porém, este pensamento tem sido contestado pelos estudos mais recentes, na medida em que existem evidências da presença dos leprosos na Europa Ocidental antes das Cruzadas.
Por falta de um conhecimento mais específico sobre as doenças, havia na Idade Média uma dificuldade de se diagnosticar a lepra. Por isso, ela era muitas vezes confundida com outros tipos de enfermidades, principalmente com as de pele e venéreas. Partindo desta premissa, a segregação dos leprosos pode ser vista também como uma maneira, empregada pelos homens da Idade Média, de afastar da sociedade um símbolo vivo da lascívia e da promiscuidade. Neste sentido, a lepra era tida como um símbolo do pecado, como um sinal externo e visível de uma alma corroída pelo erro e, em especial, pela transgressão sexual.
A identificação do leproso era feita, inicialmente, através da denúncia. Qualquer pessoa que notasse uma doença de pele num vizinho, parente ou cônjuge, deveria indicá-lo à autoridade secular ou religiosa para que um tribunal fosse convocado.
O doente comparecia perante um júri composto por um médico, um preboste e um padre, que representavam a Ciência, o Estado e a Igreja. A pele do acusado sofria um exame minucioso e precisava passar por vários testes. Um deles afirmava que se pusesse uma pessoa ao luar, de forma que os raios lhe batessem na face, o leproso ficaria marcado por diversas cores, enquanto que o homem saudável pareceria pálido. Um outro dizia que se espalhasse cinzas de chumbo queimado na urina de um leprosos, elas ficariam a boiar, enquanto, normalmente, cairiam no fundo do recipiente.
Com esses tipos de teste, o número de pessoas consideradas leprosas era grande. Os suspeitos podiam contestar, mudar de jurisdição, ou mesmo exigir novos peritos. Mas, uma vez estabelecida a natureza da lepra pelo tribunal, os leprosos eram excluído da comunidade e de toda vida social. Em certos lugares eram realizadas cerimônias macabras que solenizava o dia da separação do leproso da sociedade. Esquematicamente, ela consistia em levar o doente à igreja, em procissão, ao canto do "Libera – me" como para um morto, para a celebração de uma missa que o doente escutava dissimulado sob um cadafalso, sendo depois acompanhado à sua morada. Durante a missa ou à saída da igreja tem lugar um ritual: "o padre deve ter uma pele na mão e com essa pele deve pegar terra do cemitério, três vezes, e pô-la na testa do leprosos, dizendo o seguinte: Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus." A leitura das proibições, como, por exemplo, entrar nos moinhos, tocar nos alimentos e etc. acompanhava a entrega e benção das luvas, da matraca e da caixa das esmolas, elementos que o leproso deveria usar para que assim fossem rapidamente reconhecidos pelos outros membros da sociedade.
Nas leprosarias, os doentes eram proibidos de tocar nos suprimento de comida, de andar de pés descalços, de ferver as suas roupas na hora de preparação da comida e de tirar água do poço, pois existia o medo de que suas mãos viessem a infectar as cordas das cacimbas.
As instituição específicas para o tratamento dos leprosos nasceram em um contexto de crescimento das hostilidades para com estes doentes e em meio a convicção de que eles deveriam ser separados do convívio social. Esses estabelecimentos teriam atingido a seu apogeu no final do século XI e início do século XII e o seu declínio no final do século XIII.
O crescimento das fundações de caridade para atender aos leprosos pode ser visto como um aspecto do desenvolvimento do individualismo religioso ( expressão pessoal de piedade ) e também para defender a riqueza, já que a acumulação ficava justificada se, ao menos parte dela, fosse gasta em atividades de caridade. Neste sentido, a Igreja desenvolveu um programa de ação contínuo e corrente para assegurar a segregação efetiva dos leprosos.
Um outro pensamento corrente na idade Média é de que, em certo sentido, os leprosos eram particularmente favorecidos por Deus, porque estavam sofrendo nesta vida, como Cristo havia sofrido. Deste modo, eles já estavam pagando em vida pelos pecados cometidos e quando viessem a falecer iriam direto para o céu. Não podemos esquecer que existia na Idade Média uma preocupação constante com a salvação da alma. Ou seja, a vida depois da morte era tida como certa, sendo assim, os ímpios não herdariam o reino do céu. Tal pensamento torna-se ambíguo, se considerarmos que os leprosos medievais carregavam consigo a marca do pecado e que por isso eram excluídos e segregados.
Sugestões de Atividades:
1º - Traçar um paralelo entre o tratamento social dado aos leprosos medievais e aos doentes de AIDS em nossa sociedade.
2º - Traçar um paralelo entre a forma como a lepra era vista no período medieval e no atual. Ou seja, em que pontos estas visões se aproximam e se afastam.
Para saber mais:
RICHARDS, Jeffrey. Sexo, Desvio e Danação. As Minorias na Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
LE GOFF, Jacques. As doenças têm História. Lisboa: Terramar, 1996.
GINZBURG, Carlo. História Noturna: Decifrando o Sabá. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/leprosos.htm
Esse blog é MARAVILHOSO!
ResponderExcluirMuito bom os textos aqui expostos. Extremamente educativosa e instrutivos.
Conhecimento, e cultura não ocupam espaço. E a história é tudo de bom . Eu amo história!
MT bom esse estudo me ajudou MT
ResponderExcluirBlog maravilhoso, tudo muito bem explicado de forma clara. Muito obrigada, me ajudou muito.
ResponderExcluirEra o que precisava
ResponderExcluirimportante materia sobre o assunto
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